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TRT de São Paulo: terminar a obra

01/11/2000 às 00:00
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Em 1992, O Presidente do Tribunal Regional do Trabalho de São Paulo, o juiz Nicolau dos Santos Neto, deu início a um projeto grandioso: a construção de duas Torres no bairro da Barra Funda, na cidade de São Paulo, onde seria abrigado o maior complexo da Justiça do Trabalho no País. Os prédios abrigariam no mínimo 112 varas, plenários para julgamentos, biblioteca, gabinetes de Juízes, entre outros. Aprovado o projeto, iniciou-se a construção do prédio que seria um dos maiores casos de desvio de verbas de obras públicas no Brasil. Em 1999, motivada por denúncias, a CPI do Judiciário, combatida por muitos, investigou o caso. As denúncias recebidas pela CPI foram fundamentais para tecer alguns esclarecimentos relativos a responsabilidade e conexão dos suspeitos que atuaram no desvio dos recursos financeiros destinados a obra pública.

A liberação de verbas pelo Tesouro Nacional para a construção iniciou em 1992. Destinou-se, ao todo, R$ 263,9 milhões para realização da obra. A receptora dos recursos foi a Inkal, empresa contratada mediante licitação (fraudelenta, segundo a Procuradoria da República). Em 1998, por decisão da Justiça Federal, a obra foi paralisada em decorrência do bloqueio dos repasses de verbas por suspeita de superfaturamento. Logo após, apurou-se que foram desviados cerca de 169 milhões de reais para paraísos fiscais do total de recursos destinados a obra. Hoje o prédio encontra-se inacabado e, segundo o Tribunal de Contas da União, com apenas 69% da obra concluída.


Hoje, depois de descoberto todo o esquema de corrupção que visava o desvio das verbas e algumas prisões terem sido decretadas, o prédio permanece inacabado. Apesar de o Tesouro ter gasto mais de 263 milhões de reais na obra, a mesma não foi terminada. O prédio vale hoje cerca de 57 milhões no mercado imobiliário. O que fazer com o edifício inacabado? Esta é a pergunta que o Governo Federal está se fazendo. No intuito de achar a melhor saída para o assunto, o presidente Fernando Henrique Cardoso designou a formação de uma comissão de "notáveis", visando a realização de um estudo que apresentasse as melhores alternativas. A comissão tinha como Presidente o jurista Oscar Dias Correa, ex-Ministro da Justiça do Governo José Sarney. Formada por arquitetos, juristas e engenheiros, este grupo de nove pessoas chegou a uma conclusão em 11 de setembro de 2000, cerca de 20 dias antes do prazo estipulado.

A comissão teceu valiosas considerações e orientações acerca do caso. A mais importante é aquela indicativa da conclusão das obras do Tribunal. Entretanto, a retomada deverá ser realizada de uma forma extremamente comedida e simples. Para isto, a União deverá abrir processo licitatório para a contratação de uma nova empresa, onde, por motivos óbvios, será vedada a participação da Construtora Inkal. Além disto, a comissão acenou com outras orientações, entre elas, a que estipula que serão gastos no máximo 38 milhões de reais para a conclusão da obra. Outra, é a total utilização do espaço das duas torres de 20 andares. Na opinião da comissão, toda a Torre 1, mais seis andares da Torre 2, abrigarão cerca de 80 varas do trabalho. Do restante, cinco andares da Torre 2 serão ocupados pelo Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo e nove por entidades que agem no defesa de direitos da cidadania. O nome do complexo também deverá ser modificado, deixará de se chamar "Fórum Nicolau dos Santos Neto" e passará a se chamar "Fórum da Cidadania".

A idéia da constituição de uma comissão visando fornecer parecer sobre o caso foi uma atitude correta. Depois do escândalo ocorrido, somente um grupo idôneo e alheio a estrutura pública e política, provendo total transparência as suas ações, é capaz de transmitir algum tipo de segurança para a população quando se fala no destino do esqueleto de concreto em que se transformou o Tribunal. Resta ao Presidente, acatar as decisões da comissão. São Paulo necessita urgentemente de uma nova sede para Justiça do Trabalho, que hoje funciona em condições precárias. Logo, a população não pode ser punida pela ineficácia do Estado em conduzir e fiscalizar suas obras. O término da construção de maneira séria é a única forma de terminar com a idéia de que a obra se torne um símbolo da corrupção, além disto, é louvável e necessária a troca do nome do Tribunal. O primeiro passo foi dado. Resta a União seguir as orientações da Comissão e prover à população aquilo que ela merece, ou seja, uma estrutura decente para o funcionamento da Justiça do Trabalho paulista.

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Sobre o autor
Márcio Chalegre Coimbra

advogado habilitado em Direito Mercantil pela Unisinos, especialista em Direito Internacional pela UFRGS

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

COIMBRA, Márcio Chalegre. TRT de São Paulo: terminar a obra. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 5, n. 47, 1 nov. 2000. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/1884. Acesso em: 16 abr. 2024.

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