Sumário: Apresentação; 1. Lei 11.107/2005; 2. Consórcio Público – disposições gerais; 3. Celebração do contrato; 4. Protocolo de intenções; 5. Contrato de rateio; 6. Controle e responsabilidades; 7. Extinção do consórcio; 8. Gestão associada de serviços públicos; 9. Contrato de programa
APRESENTAÇÃO
Proponho-me neste artigo a tentar esclarecer todo o conteúdo da Lei nº 11.107/2005 que, com apenas 21 artigos, gera dificuldade de assimilação. Não se trata de comentários à lei para facilitar o entendimento, mas sim uma leitura analítica do texto da lei. Através da reordenação de alguns dispositivos e da conjugação de leitura do respectivo decreto regulamentador espero atingir tal objetivo.
1. LEI 11.107 DE 6 DE ABRIL DE 2005
Dispõe sobre normas gerais de contratação de consórcios públicos.
As normas de regência das associações civis são de aplicação subsidiária à organização e funcionamento dos consórcios públicos.
Irretroatividade: a lei não se aplica aos convênios de cooperação e correlatos celebrados antes de sua vigência
Regulamentação pelo Poder Executivo: Decreto 6.017 (de 17 de janeiro de 2007)
2. CONSÓRCIO PÚBLICO – DISPOSIÇÕES GERAIS
Definição de consórcio público: pessoa jurídica formada exclusivamente por entes federados (U-E-D-M) com a finalidade de cooperação federativa (realização de objetivos de interesse comum).
Forma de constituição: um consórcio público pode ser constituído na forma de associação pública ou civil, com seguintes diferenças:
Forma jurídica |
Personalidade jurídica |
Consequência |
Aquisição de personalidade com |
Associação pública |
direito público |
integra a administração indireta dos entes consorciados |
a vigência da lei de ratificação |
Associação civil |
direito privado |
sujeita-se às regras da legislação civil |
o registro público competente |
Autarquia interfederativa (ou multifederada): consórcio público na forma de associação pública, porque se trata de uma autarquia que simultaneamente pertence à administração indireta de mais de um ente federado.
Algumas peculiaridades:
Independente da personalidade jurídica o consórcio público deve observar as normas de direito público quanto à: a) licitações e contratos; b) prestação de contas; c) admissão de pessoal e regime jurídico de pessoal (que é o da CLT).
Consórcio entre União e Municípios: somente com a participação também dos respectivos Estados.
Consórcio sobre saúde: deve obedecer às normas do SUS
Consórcio público X convênio de cooperação: ambos são formas de cooperação federativa e visam à realização de objetivos de interesse comum; a diferença reside no fato de que os convênios são despersonificados, não possuem personalidade jurídica.
Objetivos do consórcio público: são determinados pelos entes consorciados dentro dos limites constitucionais e para alcançá-los têm os seguintes poderes:
Firmar contratos e convênios e receber auxílios de outras entidades e órgãos do governo;
Desapropriar ou instituir servidões, nos termos do contrato de consórcio;
Ser contratado com dispensa de licitação por toda a administração pública dos entes consorciados;
Outorgar concessão, permissão ou autorização de obras ou serviços públicos, desde que autorizado no contrato de consórcio;
Cobrar e arrecadar tarifas e outros preços públicos: a) pelo serviço que presta; b) pelo uso dos bens públicos que administra; ou, c) pelo uso de bens públicos do ente consorciado, mediante autorização específica.
3. CELEBRAÇÃO DO CONTRATO
Requisitos (não necessariamente nesta ordem):
Protocolo de intenções subscrito pelo ente federado
Lei do ente intencionado dispondo sobre a participação no consórcio
A disposição LEGAL de aceitação (aprovação) do protocolo de intenções pode ser prévia ou posterior; e assim esquematiza-se o seguinte:
Tempo em relação ao protocolo de intenções |
Consequência |
Celebração do contrato de consórcio se dá a partir da |
Lei anterior |
dispensa a ratificação |
publicação do protocolo de intenções |
Lei posterior |
configura ratificação |
vigência da lei |
A ratificação após 2 anos da subscrição do protocolo de intenções exige homologação da assembleia-geral.
Contrato em sentido não literal: o "protocolo de intenções" ratificado converte-se em "contrato de consórcio" público.
Participação legislativa: a lei é um dos requisitos da celebração do contrato
Celebração incompleta: é a celebração por apenas parte dos subscritores, desde que essa possibilidade seja prevista no protocolo de intenções.
Consorciamento parcial ou condicional: se dá com a ratificação com reserva com aceitação pelos demais subscritores.
Retirada do ente federado do consórcio: depende de ato formal de seu representante em assembleia-geral, nos termos definidos em lei.
Alteração ou extinção do contrato – requisitos:
Instrumento aprovado pela assembleia-geral
Ratificação também por lei (princípio da simetria das formas jurídicas)
4. PROTOCOLO DE INTENÇÕES
Conceito: contrato preliminar que se converte em contrato de consórcio público depois de aprovado (ratificado) por lei do ente consorciado.
Cláusulas necessárias (obrigatórias):
Básicas, onde incluem-se:
a) denominação, finalidade, prazo de duração e sede;
b) identificação dos entes consorciados; e,
c) indicação da área territorial de atuação. Quanto a área de atuação temos o seguinte quadro:
Corresponde à soma das áreas dos |
Quando o consórcio for constituído |
Municípios |
somente por Municípios |
por 1 Estado + Municípios desse mesmo Estado | |
Estados |
por mais de 1 Estado |
Estado(s) e DF |
pelo DF + 1 ou mais Estados |
Município(s) e DF |
pelo DF + 1 ou mais Municípios |
Previsão da forma jurídica: se associação pública ou civil (pessoa jurídica de direito privado sem fins econômicos).
Normas sobre a assembleia-geral, dentre elas as seguintes: a) previsão de que a assembleia-geral seja a instância máxima; b) regras de convocação e funcionamento; c) número de votos para deliberações; d) número de votos que cada consorciado possui, assegurado 1 voto a cada; e, e) regras de elaboração e modificação do estatuto.
Critérios para autorizar a representação dos consorciados, em assuntos de interesse comum.
Mandato do representante legal, principalmente: a) forma de eleição; b) prazo de duração; e, c) obrigatoriedade de ser chefe do Poder Executivo de um ente consorciado.
Sobre empregados públicos: a) quantidade, formas de provimento e remuneração; e, b) casos de contratação temporária (por excepcional interesse público).
Condições para celebração de contrato de gestão (ou termo de parceria).
Autorização para gestão associada de serviços públicos, explicitando: a) os serviços públicos e a área de prestação; b) competências com exercício transferido ao consórcio; c) autorização para licitar ou outorgar concessão, permissão ou autorização dos serviços; d) condições para elaboração de contratos de programa; e, e) critérios técnicos de estabelecimento, reajuste e revisão de tarifas e outros preços públicos.
Direito do consorciado adimplente com as suas obrigações de exigir pleno cumprimento do contrato.
Cláusula proibida:
É nula a determinação de contribuição financeira ou econômica de ente federado, com exceções à
a) doação, destinação ou cessão de bens (móveis ou imóveis); e,
b) transferência ou cessão de direitos por força de gestão associada de serviços públicos.
Outras questões:
Cessão de servidores: permitida na forma e condições da legislação de cada consorciado.
Publicidade: o protocolo de intenções deve ser publicado no órgão oficial.
Prazo de duração indeterminado: previsão constante no decreto regulamentador.
Objeto do estatuto: organização e funcionamento de cada órgão constitutivo do consórcio público.
5. CONTRATO DE RATEIO
Conceito (Decreto 6.017/07): instrumento pelo qual os entes consorciados se comprometem a fornecer recursos financeiros ao consórcio público para realização de suas despesas.
Periodicidade: será formalizado em cada exercício financeiro.
-
Vigência: prazo não superior ao das dotações que o suportam, com exceções aos contratos que tenham por objeto exclusivamente: a) programas e ações contemplados em plano plurianual; OU, b) a gestão associada de serviços públicos custeados por tarifas ou outros preços públicos.
Aplicação vedada de recursos: os recursos entregues por meio de contrato de rateio não podem atender a despesas genéricas (tidas em orçamento como de aplicação indefinida).
Legitimidade para cobrar obrigações: qualquer ente consorciado e o próprio consórcio público podem exigir o cumprimento de obrigações previstas no contrato de rateio.
Dever de informar despesas: as despesas realizadas com os recursos decorrentes de contrato de rateio devem ser informadas aos entes consorciados para que possam ser contabilizadas nas respectivas contas de cada um.
Exclusão por inadimplência: o ente consorciado que não consignar, em sua lei orçamentária ou em créditos adicionais, as dotações para as despesas assumidas em contrato de rateio pode ser excluído, após prévia suspensão.
6. CONTROLE E RESPONSABILIDADES
Controle pelo Tribunal de Contas: o consórcio público está sujeito ao controle pelo Tribunal de Contas que fiscaliza as contas do chefe do Poder Executivo representante legal do consórcio.
Responsabilidade dos agentes públicos na gerência do consórcio:
a) NÃO RESPONDEM pessoalmente pelas obrigações contraídas pelo consórcio público;
b) RESPONDEM pelos atos praticados ilegalmente ou contra disposição do respectivo estatuto.
Retirada de ente: não são prejudicadas as obrigações assumidas com o consórcio. E os bens que destinou ao consórcio público só serão retrocedidos se houver prévia disposição nesse sentido (no contrato de consórcio ou no respectivo instrumento de transferência ou alienação).
7. EXTINÇÃO DO CONSÓRCIO
Não prejudica as obrigações constituídas
Responsabilidade solidária temporária: Os entes consorciados respondem solidariamente pelas obrigações remanescentes até que haja decisão indicativa dos responsáveis por cada obrigação (assegurada o direito de cobrança regressiva)
Extinção das obrigações: depende de prévio pagamento das indenizações eventualmente devidas.
Os bens, direitos, encargos e obrigações decorrentes da gestão associada de serviços públicos custeados por tarifas ou outros preços públicos serão atribuídos aos titulares dos respectivos serviços.
8. GESTÃO ASSOCIADA DE SERVIÇOS PÚBLICOS
Conceito (Decreto 6.017/07): exercício de atividades de planejamento, regulação ou fiscalização de serviços públicos pelo consórcio público ou por meio de convênio de cooperação acompanhadas ou não da:
a) Prestação de serviços públicos; OU
b) Transferência (total ou parcial) de encargos, serviços, pessoal ou bens necessários à continuidade dos serviços transferidos
Nota necessária: A lei complica um pouco quanto a este tema (no qual está contido também o "contrato de programa") porque as suas disposições possuem abrangência mais ampla, vez que se aplicam também fora do âmbito do consórcio público, podendo se dá por meio de convênio de cooperação. Em razão disto, as disposições legais pertinentes não fazem referência exclusiva ao termo "ente consorciado", mas genericamente a "ente da Federação", ou então os termos "consorciado" e "conveniado" aparecem conjuntados alternativamente.
9. CONTRATO DE PROGRAMA
Obrigatoriedade: quando um ente da Federação (ou uma entidade de sua administração indireta) estiver incumbido da prestação de serviço público perante outro ente da Federação ou para com consórcio público.
Objeto: constituição e regulação das obrigações pertinentes do ente ou entidade prestador(a), não abrangendo as obrigações cujo descumprimento não acarrete qualquer ônus a ente da Federação ou a consórcio público.
Condição de validade: o atendimento ao objeto é essencial ao contrato de programa.
Cláusula proibida: é nula a atribuição ao contratado dos poderes de planejamento, regulação e fiscalização dos serviços por ele próprio prestados.
Obediência e previsão: o contrato de programa deve: a) atender à legislação de concessões e permissões e à de regulação dos serviços; e, b) prever procedimentos de transparência da gestão econômica/financeira de cada serviço.
Cláusulas necessárias (obrigatórias) no caso de transferência de encargos, serviços, pessoal ou bens necessários à continuidade dos serviços transferidos:
Encargos transferidos e responsabilidade subsidiária do transferidor
Penalidades pelo não cumprimento dos encargos transferidos
Momento de transferência dos serviços e deveres quanto a sua continuidade
Indicação do responsável pelo ônus e passivo do pessoal transferido
Preço dos bens que sejam transferidos (alienados) ao contratado
Identificação dos bens que terá transferida apenas sua administração
Vigência: permanece vigente mesmo quando extinto o consórcio público ou o convênio de cooperação que autorizou a gestão associada de serviços públicos.
Celebração por entidade da administração indireta dos entes consorciados ou conveniados: possibilidade mediante previsão no contrato de consórcio/convênio enquanto for integrante da administração indireta de ente consorciado/conveniado.
Convênio dos consórcios públicos com a União: poderá ser celebrado para viabilizar a descentralização e a prestação de políticas públicas em escala adequada.
BIBLIOGRAFIA
ALEXANDRINO, Marcelo. PAULO, Vicente. Resumo: de direito administrativo descomplicado. 3. ed. São Paulo: Método, 2010.
BRASIL. Legislação. Decreto nº 6.017 de 17 de janeiro de 2007. Disponível em: <www.planalto.gov.br/legislação>. Acesso em: 15 set 2011.
BRASIL. Legislação. Lei nº 11.107 de 6 de abril de 2005. Disponível em: <www.planalto.gov.br/legislação>. Acesso em: 15 set 2011.