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HSBC lava dinheiro sujo dos cartéis da droga

19/07/2012 às 08:00
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Os bancos cumprem relevante papel no desenvolvimento da economia. Mas deles temos que esperar mais responsabilidade, visto que o sistema bancário mundial continua sendo o maior responsável pela lavagem mundial de dinheiro sujo.

Para aprimorar seus mecanismos de controle da lavagem de dinheiro sujo o Brasil, atendendo exigências internacionais, sobretudo do Gafi(Grupo de Ação Financeira contra a Lavagem de Dinheiro e o Financiamento do Terrorismo), acaba de alterar (e endurecer) sua legislação. Mas não é só por meio da alteração da lei que o Brasil vai alcançar esse objetivo. O bom exemplo veio do Senado norte-americano, que investigou e divulgou (em 17.07.12) a impostura do banco britânico HSBC (que possui 470 agências nos EUA e presta serviços a outros 1.200 bancos).

Um dos maiores bancos da Europa e do mundo (está presente em dezenas de países, incluindo o Brasil) acaboucolocando em risco o sistema financeiro dos EUA, na medida em que ilicitamente afrouxou os controles das operações que implicavam lavagem de dinheiro relacionada com o tráfico de drogas e o terrorismo, o que teria significado uma grande ameaça para a própria segurança dos EUA.

O relatório do comitê de investigação do Senado apontou “graves omissões do sistema antilavagem de dinheiro do HSBC (a filial americana)”, fazendo acusações também à matriz, que não vigiou de forma eficaz as operações suspeitas, deixando o banco em situação de vulnerabilidadefrente aos cartéis da droga. Divulgou-se que somente a filial mexicana fez transferências de US$ 7 bilhões para o HSBC entre 2007 e 2008.O HSBC ainda teria mantido relações financeiras com estabelecimentos bancários suspeitos de vínculos com supostas organizações terroristas.

Em nota oficial o banco pediu “desculpas” e reconheceu seus “erros”, comprometendo-se a “corrigir o que não funciona”.David Bagley, o executivo responsável pelo controle das operações financeiras, foi demitido. Não há ainda notícia de que ele esteja sendo processado criminalmente, de qualquer modo, três teorias criminológicas devem aqui ser recordadas: (a) teoria da ubiquidade do crime; (b) teoria da normalidade do delinquente e (c) teoria da associação diferencial de Sutherland.

Por força da primeira sabe-se que todas as classes sociais delinquem. Nenhuma classe social está isenta de cometer ilícitos. A segunda teoria parte da normalidade do delinquente, que “não é o pecador dos clássicos, irreal e insondável, nem o animal selvagem e perigoso do positivismo, que inspira temor, nem o inválido da filosofia correcional, que necessita de tutela e assistência, nem o pobre vítima da sociedade, mero pretexto para reclamar radical reforma das suas estruturas, como proclamam as teses marxistas. É o homem real e histórico do nosso tempo, que pode acatar as leis ou não cumpri-las por razões nem sempre acessíveis à nossa mente; um ser enigmático, complexo, torpe ou genial, herói ou miserável, porém, em todo caso, mais um homem, como qualquer outro” (García-Pablos e Gomes: 2010, p. 72). Em regra, o delinquente é um ser normal. Alguns são anormais (loucos, esquizofrênicos), mas é bom lembrar que existem anormais que não delinquem.

A terceira teoria, da associação diferencial, foi desenvolvida por Sutherland e seu discípulo Cressey, nos anos 30, nos EUA (Sutherland: 1940, p. 2-10). Eles investigaram a criminalidade do colarinho branco, a profissional e a econômica e concluíram que a conduta criminal se aprende, em interação com outras pessoas, mediante o processo de comunicação, do mesmo modo que se aprende o comportamento virtuoso ou qualquer outra atividade. A aprendizagem do comportamento criminal, que normalmente é longa, inclui: (a) técnicas de cometimento do crime, (b) de justificação da conduta criminosa e (c) as motivações. O crime não pode ser imputado à desorganização social ou às disfunções dos indivíduos das classes baixas, sim, à aprendizagem dos (des)valores criminais, o que pode suceder em qualquer cultura ou classe social.

A única maneira de controlar ou reduzir o poder do crime organizado consiste em eliminar ou diminuir drasticamente sua capacidade econômica, cada vez mais fortalecida em razão da mesclagem do dinheiro ilícito com o lícito, que é feita por meio da lavagem de dinheiro. Para o controle do crime organizado é fundamentala incriminação da conduta de quem "lava" (regulariza, legaliza ou legitima) o dinheiro obtido com as atividades ilícitas. Sem a possibilidade de legalização desse dinheiro haveria maior chance de controle das organizações criminosas.

As medidas de controle da lavagem de dinheiro, no entanto, não podem ser apenas repressivas. Há uma série de procedimentos preventivos nessa área, que já estão sendo executados com êxito em muitos países. Os bancos, posto que vivemos a era do capitalismo financeiro, cumprem relevante papel no desenvolvimento da economia. Mas deles temos que esperar mais responsabilidade, visto que o sistema bancário mundial continua sendo o maior responsável pela lavagem mundial de dinheiro sujo.

A trilogia formada pelo crime organizado + bancos negligentes + lavagem de dinheiro sujo representa hoje uma das maiores ameaças para os fundamentos e princípios da democracia, sobretudo nas regiões que não contam com instituições suficientemente desenvolvidas e estáveis.

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Sobre o autor
Luiz Flávio Gomes

Doutor em Direito Penal pela Universidade Complutense de Madri – UCM e Mestre em Direito Penal pela Universidade de São Paulo – USP. Diretor-presidente do Instituto Avante Brasil. Jurista e Professor de Direito Penal e de Processo Penal em vários cursos de pós-graduação no Brasil e no exterior. Autor de vários livros jurídicos e de artigos publicados em periódicos nacionais e estrangeiros. Foi Promotor de Justiça (1980 a 1983), Juiz de Direito (1983 a 1998), Advogado (1999 a 2001) e Deputado Federal (2019). Falecido em 2019.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

GOMES, Luiz Flávio. HSBC lava dinheiro sujo dos cartéis da droga. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3305, 19 jul. 2012. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/22245. Acesso em: 5 nov. 2024.

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