Estima-se que, no Brasil, cerca de 2 milhões de casais apresentam problemas de infertilidade.
Levantamento estatístico aponta que 30% das causas de infertilidade são femininas, 30% são masculinas e 25% decorrem de problemas do casal, tanto do homem quanto da mulher.
A medicina moderna dispõe de inúmeras técnicas para ajudar no tratamento de infertilidade, desde as mais simples até as mais complexas, como, por exemplo, a fertilização in vitro e a injeção intracitoplasmática de espermatozóides.
A questão é que tais tratamentos nem sempre são financeiramente acessíveis e normalmente não possuem cobertura por planos de saúde.
Isso ocorre porque a legislação que dispõe sobre os planos e seguros privados de assistência à saúde prevê, expressamente, a possibilidade de exclusão de cobertura a tratamentos como a inseminação artificial.
Por outro lado, a mesma lei – que foi alterada em 2009 – estabelece ser obrigatória a cobertura pelos planos de saúde no que diz respeito ao “planejamento familiar”.
A fim de evitar contradições, a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), editou a Resolução Normativa nº 192/2009, na qual apontou expressamente em seu artigo 1º, § 2º que: “A inseminação artificial e o fornecimento de medicamentos de uso domiciliar, definidos nos incisos III e VI do art. 13 da Resolução Normativa – RN nº 167, de 9 de janeiro de 2008, não são de cobertura obrigatória de acordo com o disposto nos incisos III e VI do art. 10 da Lei nº 9.656, de 1998 e não estão incluídos na abrangência desta Resolução” (destacamos).
Contudo, há suficiente margem para fomentar discussões judiciais, o que de fato vem ocorrendo.
Em primeiro lugar, porque a Resolução da ANS enquanto dispositivo normativo tem alcance limitado vez que não pode contrariar texto de lei.
Com efeito, a Lei 9.263/96, considera como planejamento familiar “(…) o conjunto de ações de regulação da fecundidade que garanta direitos iguais de constituição, limitação ou aumento da prole pela mulher, pelo homem ou pelo casal”.
Ora, nesse contexto, a noção de planejamento familiar inclui não apenas os métodos de contracepção, como laqueadura das trompas e vasectomia, mas também os de concepção, como a fertilização in vitro.
Dessa forma, argumenta-se que eventual exclusão contratual na cobertura de tratamentos de infertilidade pode ser questionada judicialmente, garantindo-se a mais ampla cobertura no que toca ao planejamento familiar nos termos da lei (que sempre é bom lembrar, não pode ser restringido por dispositivos normativos de menor hierarquia legal).
Além disso, os planos de saúde estão sujeitos à aplicação do Código de Defesa do Consumidor (posicionamento este consolidado pela edição da Súmula 269, STJ), de tal sorte que cláusulas consideradas abusivas ou que desvirtuem a finalidade do contrato podem ser declaradas nulas pelo Judiciário.
Vale observar que A maternidade e a paternidade abrangem aspectos que englobam a dignidade da pessoa humana e da própria família, entidade que, é bom lembrar, goza inclusive de plena proteção constitucional.
Fato é que a questão do tratamento de infertilidade vai muito além de mera estipulação contratual e cabe o Judiciário equalizar situações de conflito entre cláusulas limitativas e as justas aspirações de inúmeros casais que almejam conceber filhos.