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Vedação à dispensa discriminatória e/ou obstativa de direitos do empregado portador de HIV/AIDS

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08/04/2013 às 09:20
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É preciso aliar proteção e garantia de direitos, imprescindíveis à condição debilitada do empregado aidético, à razoabilidade na responsabilização do empregador, para que este não se sobrecarregue com deveres inerentes ao Estado.

Resumo: O presente estudo tem por objetivo sustentar como presumidamente discriminatória e/ou obstativa de direitos a dispensa sem justa causa do portador de HIV/AIDS. Conquanto a evolução da ciência acerca do tema, a discriminação em face do portador do vírus HIV e do doente de AIDS, assim como a moléstia, ainda é avassaladora na sociedade hodierna. A legislação brasileira, lado outro, pouco evoluiu em relação à matéria. Destarte, é preciso que o Poder Judiciário do país garanta direitos aos empregados que se encontrarem nessas circunstâncias, baseando-se, para tanto, nas demais fontes do ordenamento jurídico, em especial, nos princípios basilares do Direito. Nesse sentido já vêm decidindo os Tribunais Trabalhistas nacionais, garantindo o direito à saúde, ao emprego, ao respeito e à dignidade a esses indivíduos, entendimento esse esposado recentemente na Súmula 443 do TST, órgão máximo da Justiça Laboral pátria. Esse é, portanto, um passo determinante no processo de inclusão e permanência do portador de HIV no mercado de trabalho e na sociedade na qual se insere.

Palavras-chave: Dispensa Discriminatória. Presunção. Dispensa obstativa de direito. Empregado portador de HIV/AIDS. Direito à reintegração.

Sumário: 1 Introdução; 2 AIDS e interdisciplinaridade: considerações preliminares; 2.1 Conceito de HIV e AIDS; 2.2 breve abordagem histórica; 2.3 A atuação do vírus HIV: o portador assintomático e o portador sintomático; 3 Convenções, declarações e recomendações da Organização Internacional do Trabalho acerca do tema; 4 A dispensa do empregado portador de HIV/AIDS como presumidamente discriminatória e/ou obstativa de direitos; 5 Conclusão. Referências.


1 INTRODUÇÃO

A epidemia da AIDS, que aflige a sociedade moderna, ainda é, em muitos de seus aspectos, desconhecida. A gravidade da doença e a ausência de meios para sua cura, aliadas à falta de informação, geram preconceitos e atos discriminatórios em face dos indivíduos afetados pela moléstia.

Não se pode deixar de reconhecer que, desde a descoberta do vírus HIV, na década de oitenta, os estudos e pesquisas realizados a seu respeito em muito evoluíram, proporcionando melhor qualidade de vida aos infectados.

No entanto, ainda hoje, os soropositivos sofrem discriminação nos diversos setores da sociedade e, no âmbito laboral, seus direitos ainda são restritos. No Brasil, em particular, o número de infectados pelo vírus cresce assustadoramente, e, em sua grande maioria, atinge pessoas em plena idade produtiva.

Deste modo, sugere-se um breve estudo acerca da proteção ao emprego do portador de HIV/AIDS, entendendo-se como presumidamente discriminatória a despedida imotivada do soropositivo assintomático, e/ou obstativa de direitos a dispensa daquele que já tenha manifestado sintomas da síndrome, cabendo a reintegração como medida aplicável para sanar o ato demissional ilícito.

Ressalta-se que o tratamento diferenciado dispensado, por vezes, aos soropositivos assintomáticos e sintomáticos deve-se em razão da manifestação ou não dos efeitos da doença, que influenciam diretamente sua saúde física e mental, e, por consequência, sua capacidade laborativa.

A complexidade e atualidade do tema a ser abordado, assim como a precariedade normativa em relação à matéria, demonstram a relevância do estudo pelos estudiosos de Direito.


2 AIDS E INTERDISCIPLINARIDADE: CONSIDERAÇÕES PRELIMINARES

2.1 Conceito de AIDS e HIV

A sigla AIDS é originária do inglês, formada pelas iniciais da expressão Acquired Immune Deficiency Syndrome, que, traduzida para o português, significa Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (SIDA). No Brasil, no entanto, predomina a utilização do termo em inglês, sendo esta a forma adotada mundialmente (MARGONAR, 2006, p. 19).

Segundo dispõe o Ministério da Saúde Brasileiro (BRASIL, 2012), a AIDS é o estágio mais avançado da enfermidade que ataca o sistema imunológico, por meio do Vírus da Imunodeficiência Humana ou Human Immunodeficiency Virus (HIV). Sabe-se que não é uma doença hereditária, sendo seu agente causador transmitido “pela via sexual, sanguínea e materno-filial, ou seja, por meio da gravidez e do parto” (BARROS, 2011, p. 938).

Magno Luiz Barbosa (2008, p. 29) descreve o conceito dessa síndrome como sendo, na verdade, “a condição favorável para a manifestação de um conjunto de doenças, pela incapacidade do organismo para se defender”.

A doutrinadora Regiane Margonar, por sua vez, esclarece, segundo Clara Pechmann Mendonça, que o vírus HIV é aquele que

[...] atua sobre o sistema imunológico destruindo a sua capacidade de defesa, permitindo assim, que bactérias, outros vírus, parasitos como fungos e protozoários passem a ser invasores, pela situação orgânica oferecida, provocando o aparecimento de numerosas manifestações [em seu portador] […] (MARGONAR, 2006, p. 20, grifo nosso).

2.2 Breve abordagem histórica

Um novo estudo apresentado no início do século, segundo demonstra José Cabral Pereira Fagundes Junior, citado por Wagner Gusmão Reis Junior, indica que:

[…] o HIV evoluiu a partir de uma infecção de natureza benigna em algumas espécies de macacos para uma doença humana mortal provavelmente entre o final do século XIX e início dos anos 30 [do século XX], permanecendo confinada em certas regiões da África até que ciclos migratórios, viagens, surgimento de grandes cidades e a revolução sexual dos anos 60 e 70 promoveram a sua expansão mundial (REIS JUNIOR, 2005, p. 6, grifo do autor).

Destarte, foram nos Estados Unidos, na década de oitenta do século passado, onde se detectaram os primeiros casos de AIDS em humanos, quando a doença ainda não tinha sido assim denominada. Nas cidades de Los Angeles e Nova York, constatou-se que alguns homossexuais do sexo masculino estavam desenvolvendo um tipo de câncer muito raro conhecido como Sarcoma de Kaposi, e outros apresentando também um tipo incomum de pneumonia. Na mesma época, começaram a surgir casos idênticos na França, sem ocorrer qualquer vínculo entre estes e aqueles (BARBOSA, 2008, p. 28).

Consoante ensina Magno Luiz Barbosa (2008, p. 28), a causa de tais acometimentos, embora desconhecida na época, foi denominada de Acquired Immunodeficiency Syndrome (AIDS) ou Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (SIDA), “pois enfraquecia todo o organismo humano, deixando-o com baixa resistência frente às mais diversas doenças”. Mas, foi em 1983 que cientistas franceses identificaram o vírus causador da síndrome, sendo que, somente três anos depois, devido à discordância entre eles e cientistas norte-americanos, a sigla para o Human Immunodeficiency Virus ou Vírus da Imunodeficiência Humana (HIV) foi definida pela Organização Mundial de Saúde (OMS).

A partir de então, aponta o doutrinador supracitado, a AIDS “passou a ser uma das moléstias mais pesquisadas em todo o mundo”, tornando, assim, “o HIV um dos vírus sobre o qual mais se avançou no conhecimento” (BARBOSA, 2008, p. 28).

No entanto, ressalta o jurista,

[...] mesmo com toda pesquisa e todo estudo, muito ainda há para ser descoberto e analisado, tanto no que se refere a tratamentos clínico-ambulatoriais, quanto a medicamentos mais específicos e produtos vacinais, para que se alcance a cura. […] [Ademais,] para combater e lutar contra essa síndrome, são necessárias a mobilização e a conscientização da sociedade, construídas e tecidas no sentido de garantir espaço para a educação e a prevenção. Para isso, é imperiosa a mudança de hábitos, posturas e atitudes. (BARBOSA, 2008, p. 28, grifo nosso).

Para o autor, por mais que se tenha evoluído em relação à qualidade de vida dos aidéticos desde a descoberta da doença, a prevenção ainda é o melhor remédio no combate à propagação do vírus HIV. Isso porque o conceito de comportamento de risco substituiu, ao longo do tempo, a falsa ideia dos denominados grupos de risco, como os homossexuais (BARBOSA, 2008, p. 28).

No mesmo sentido, esclarece o Ministério da Saúde Brasileiro:

Há alguns anos, receber o diagnóstico de AIDS era uma sentença de morte. Mas, hoje em dia, é possível ser soropositivo e viver com qualidade de vida. Basta tomar os medicamentos indicados e seguir corretamente as recomendações médicas. Saber precocemente da doença é fundamental para aumentar ainda mais a sobrevida da pessoa. Por isso, [recomenda-se] fazer o teste sempre que passar por alguma situação de risco e usar sempre o preservativo (BRASIL, 2012, grifo nosso).

2.3 A atuação do vírus HIV: o portador assintomático e o portador sintomático

Ao contrair o vírus HIV, o sistema imunológico do indivíduo, responsável pela defesa do organismo contra doenças, “detecta a sua presença e inicia a produção de anticorpos, anti-HIV, na tentativa de neutralizar seus efeitos” (BARBOSA, 2008, p. 28).

No entanto, o vírus consegue se alojar em algumas células, sendo que as mais atingidas são as denominadas linfócitos T CD4+, um tipo de glóbulo branco. Consoante elucidação do Ministério da Saúde (BRASIL, 2012), “é alterando o DNA dessa célula que o HIV faz cópias de si mesmo” e, “depois de se multiplicar, rompe os linfócitos em busca de outros para continuar a infecção”.

Wagner Gusmão Reis Junior (2005, p. 7-8) explica que “o processo de instalação do vírus no organismo [em condições normais] pode levar algo em torno de noventa dias, porém a manifestação dos sintomas pode levar muito mais tempo, até mesmo anos” (grifo nosso). Ainda assim, desde o contágio, o HIV pode ser transmitido a outras pessoas, se não tomadas as precauções devidas.

Deste modo, denomina-se janela imunológica o intervalo de tempo entre a infecção do indivíduo pelo vírus e o início do processo de produção de anticorpos por seu sistema imunológico – soroconversão (BARBOSA, 2008, p. 30). Já o período de incubação caracteriza-se pelo período compreendido “entre a entrada do vírus no organismo e o aparecimento dos primeiros sintomas” (MARGONAR, 2006, p. 20).

“Ou seja, ter o HIV não é a mesma coisa que ter AIDS” (BRASIL, 2012). Portanto, faz-se necessária a utilização de denominações adequadas para caracterizar cada situação concreta de um portador do vírus.

Assim, é possível dividir o gênero soropositivo em duas espécies:

(1) assintomáticos ou pessoas vivendo com HIV: são os que, embora portadores do vírus, não manifestaram sintomas; e

(2) sintomáticos ou pessoas vivendo com AIDS: são os que manifestam os sintomas da sorologia e estão suscetíveis à ação mais cruel das infecções oportunistas. (REIS JUNIOR, 2005, p. 8, grifo nosso).

Sendo assim, um portador assintomático do HIV, isto é, durante o período de incubação do vírus, pode ter a mesma disposição e desempenhar as mesmas funções de um indivíduo saudável, haja vista a não manifestação de sintomas da AIDS (MARGONAR, 2006, p. 21). No que tange a sua capacidade laborativa, diz Alice Monteiro de Barros que, “no período de soropositividade assintomática, as condições de saúde do obreiro não são afetadas, mantendo-se a aptidão para o trabalho” (BARROS, 2011, p. 941). 

Já um portador sintomático do vírus HIV, ou seja, aquele indivíduo que passa a apresentar as doenças oportunistas relacionadas à AIDS, em função do enfraquecimento progressivo do sistema imunológico do seu organismo, encontra-se mais debilitado, e, por vezes, incapaz para a realização de suas atividades diárias, inclusive laborais.

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3 CONVENÇÕES, DECLARAÇÕES E RECOMENDAÇÕES DA ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO ACERCA DO TEMA

A princípio, pertinente se faz elucidar que a Organização Internacional do Trabalho (OIT), criada em 1919, integra o Sistema das Nações Unidas como uma de suas agências especializadas e é a instituição hoje “responsável pela formulação e aplicação das normas internacionais do trabalho (convenções e recomendações)”, dispondo, para tanto, “de apoio e reconhecimento universais na promoção dos Direitos Fundamentais no Trabalho” (OIT, 2012).

Acerca de suas convenções, sabe-se que, “uma vez ratificadas por decisão soberana de um país, passam a fazer parte de seu ordenamento jurídico” (OIT, 2012), sendo, portanto, dotadas de eficácia normativa (SÜSSEKIND et al. apud REIS JUNIOR, 2005, p. 43). Assim sendo, merecem realce, em relação à matéria em comento, as Convenções n. 111, 117 e 158 da referida instituição internacional.

A Convenção n. 111, de 1958, aborda o tema da “discriminação em matéria de emprego e ocupação” e foi ratificada pelo Brasil em 26 nov. 1965 (OIT, 2012). Segundo Alexandre Augusto Gualazzi, este tratado de caráter universal:

[…] a par de vedar discriminações no trabalho, aduz como repreensível “qualquer outra exclusão que tenha por efeito anular ou alterar a igualdade de tratamento no emprego”. Possibilitaria referida Convenção a proteção ao emprego dos trabalhadores infectados pela AIDS, e possivelmente, […] de portadores de outras doenças, quiçá infecto-contagiosas, desde que não colocadas em risco, neste último caso, a vida e a saúde de terceiros (GUALAZZI, 2005, p. 67, grifo nosso).

Também a Convenção n. 117 da OIT, de 1962, sob o título “Objetivos e Normas Básicas da Política Social”, aplica-se à matéria em exame, no sentido de estabelecer “como meta a supressão de toda discriminação contra os trabalhadores” (HIV/AIDS..., 2013).

Por sua vez, a Convenção n. 158 da mesma instituição, que versa sobre o tema “término da relação de trabalho por iniciativa do empregador”, foi ratificada pelo Brasil em 05 jan.1995, porém, denunciada no ano subsequente. O Decreto n. 2.100, de 20 dez. 1996, formalizou a denúncia do referido instrumento global, cessando, assim, sua vigência interna, no território pátrio, e liberando o Estado brasileiro da obrigação assumida (OIT, 2012).

Wagner Gusmão Reis Junior destaca parte da decisão final da Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 1.480-3 contra o Decreto n. 2.100/96, proposta pela Confederação Nacional do Transporte, “suscitando o controle concentrado de constitucionalidade relativamente ao teor” do diploma legal aludido, aduzindo que:

[…] vê-se, portanto, que a Convenção n. 158/OIT não mais se acha incorporada ao sistema de direito positivo interno brasileiro, eis que, com a denúncia, deixou de existir o próprio objeto sobre o qual incidiram os atos estatais […] questionados nesta sede de controle concentrado de constitucionalidade (REIS JUNIOR, 2005, p. 45).

Ainda assim, indispensável se faz mencionar a principal finalidade apreendida do texto da Convenção em estudo, seja por se tratar de norma dotada de conteúdo histórico, por já ter tido vigência no ordenamento jurídico nacional, quer seja por se tratar do reconhecimento pela OIT da “garantia de emprego como expressão de evolução humana refletida na atividade profissional e produtiva” (REIS JUNIOR, 2005, p. 45-46). Para tanto, reproduzir-se-á seu artigo 4º, in verbis:

Art. 4 – Não se dará término à relação de trabalho de um trabalhador a menos que exista para isso uma causa justificada relacionada com sua capacidade ou seu comportamento ou baseada nas necessidades de funcionamento da empresa, estabelecimento ou serviço (OIT, 2012).

Nesse sentido, compreende-se como causa justificada motivos “econômicos, tecnológicos, estruturais ou análogos” (art. 13), nos termos da Convenção, sendo do empregador o ônus de provar a razão ensejadora da extinção do contrato de trabalho (art. 9, 2, a) (REIS JUNIOR, 2005, p. 45-46).

Alice Monteiro de Barros adverte, portanto, que:

[…] não se poderá invocar como “causa justificada” o fato de o obreiro ser infectado pelo HIV, se ele se encontra em condições de trabalhar e tem comportamento irreprovável. Também não se enquadra como “causa justificada” ou “necessidade de funcionamento” o medo de colegas ou clientes diante de pessoas portadoras do HIV, no local de trabalho, que não ofereçam risco algum a outrem (TREBILCOCK apud BARROS, 2011, p. 948, grifos da autora).

Nem mesmo as ausências temporárias do empregado ao serviço, provocadas pelas enfermidades advindas do HIV, assim entendidas aquelas que se fundam na impossibilidade de o obreiro trabalhar, autorizam a dispensa com causa justificada (art. 6 da Convenção n. 158). As normas coletivas poderiam precisar os critérios definidores da “ausência temporária”. (BARROS, 2011, p. 948-949, grifos da autora).

Outrossim, merecem destaque algumas Declarações da Organização Internacional do Trabalho que se reportam à matéria objeto de análise.

Fundamental se faz indicar a “Declaração sobre os Princípios e Direitos Fundamentais no Trabalho”, de 1998, integrada pelas Convenções fundamentais da OIT. Esse documento é uma “reafirmação universal” (OIT, 2012) sobre o reconhecimento da “necessidade de se respeitar, promover e aplicar um patamar mínimo de princípios e direitos nas relações de trabalho, que são essenciais para os trabalhadores”. Além do mais, “entroniza o princípio da não-discriminação em matéria de emprego ou ocupação, reafirmando, assim, o compromisso e a disposição das nações participantes” da OIT. Muitos dos princípios previstos nessa Declaração podem ser reconhecidos em dispositivos esparsos na Constituição da República Federativa Brasileira (BRASÍLIA, TST. RR 721340-83.2006.5.12.0035, 3ªT, Min. Rosa Maria Weber Candiota da Rosa, 2010, grifo nosso).

Da mesma maneira, evidencia-se a “Declaração da Reunião Consultiva sobre a AIDS e o Local de Trabalho”, proveniente de uma associação entre a Organização Mundial da Saúde (OMS) e a OIT, cujo teor apresenta instruções gerais sobre as vias de transmissão do vírus HIV. Infere-se dessa Declaração que, na grande maioria dos ambientes de trabalho e profissões, não há risco de contaminação ou transmissão do HIV. Ressalva-se aqui, por exemplo, o caso dos trabalhadores da área de saúde. A Declaração orienta também, segundo Alice Monteiro de Barros, que:

[…] as pessoas soropositivas, sem sintomas da doença, devem ser tratadas como qualquer empregado, e às que apresentam sintomas ou enfermidade relacionados com o HIV ou com a AIDS deve-se atribuir o mesmo tratamento dado ao empregado enfermo […] (BARROS, 2011, p. 939).

Em relação às Recomendações, sabe-se que se parecem com as Convenções, mas com elas não se confundem, vez que aquelas, diferentemente dessas, “não geram, por sua natureza, a obrigação de serem transformadas em normas internas”. As Recomendações são, na verdade, orientações da OIT “de como os Estados devem pautar seu Direito Trabalhista”. (ARIOSI, 2004, grifo nosso).

Nesse sentido, importante ressaltar a Recomendação n. 200 da referida instituição internacional:

A Recomendação n.º 200 veda a discriminação de trabalhadores portadores do vírus HIV ou acometidos da Síndrome da Imunodeficiência Adquirida - AIDS, e estabelece, entre outras obrigações dos Estados Membros da OIT, a de assegurar que os trabalhadores não sejam discriminados ou estigmatizados com base no seu status - real ou suposto - de portadores do vírus HIV (artigo 3, c), nem que essa condição sirva de base a condutas discriminatórias que impeçam o recrutamento ou a continuidade no emprego (artigo 10) ou importem a terminação da relação de trabalho (artigo 11). Recomenda a OIT, ainda, que os Estados Membros promovam a manutenção do emprego e a contratação de pessoas que vivem com o vírus HIV (artigo 22), bem como assegurem o acesso e fruição, por todos os trabalhadores e suas famílias, dos serviços de prevenção, tratamento, atenção e apoio em relação ao HIV e AIDS, salientando que o lugar de trabalho (leia-se, empregador) "deveria desempenhar a função de facilitar o acesso a esses serviços" (artigo 3, e).

A Recomendação n.º 200 da OIT exorta, ainda, os Estados Membros a considerar a possibilidade de oferecer uma proteção igual à que estabelece a Convenção sobre a discriminação em matéria de emprego e ocupação (Convenção n.º 111, de 1958), com o escopo de impedir toda discriminação baseada na condição, real ou suposta, de portador do HIV (artigo 09) (BRASÍLIA, TST. RR 61600-92.2005.5.04.0201, 1ªT, Min. Lelio Bentes Corrêa, 2011, grifo do autor).

Vale assinalar, igualmente, o “Repertório de Recomendações Práticas da OIT sobre o HIV/AIDS e o Mundo do Trabalho” composto por “dez princípios-chave” e cujo intuito é o de “estabelecer formas de enfrentar o HIV/AIDS no ambiente laboral, visando prioritariamente abolir a discriminação que envolve a doença e os seus portadores” (BARBOSA, 2008, p. 111).

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Sobre a autora
Nayara Ribeiro Rodrigues

Especialista pela Pós-Graduação Lato Sensu em Direito do Trabalho do Instituto de Educação Continuada na Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais – IEC PUC Minas. Bacharela em Direito pela Universidade de Itaúna – UI.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

RODRIGUES, Nayara Ribeiro. Vedação à dispensa discriminatória e/ou obstativa de direitos do empregado portador de HIV/AIDS. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3568, 8 abr. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/24095. Acesso em: 25 abr. 2024.

Mais informações

Professora-orientadora: Ana Carolina Gonçalves Vieira.

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