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O projeto do novo Código de Processo Civil favorece a conciliação?

07/10/2013 às 17:43
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O projeto do novo CPC busca valorizar, fortalecer e sistematizar, em âmbito nacional, os mecanismos visando à autocomposição e pacificação das partes, mormente os institutos da conciliação e mediação.

O Projeto do Novo Código de Processo Civil – PNCPC (Projeto de Lei nº 6.025/2005, atualmente em discussão e na iminência de votação na Câmara dos Deputados), segundo consta na sua Exposição de Motivos, pretende converter o processo em instrumento mais sintonizado com a realidade fática e o contexto social subjacente à causa, pelo que dá ênfase à possibilidade de as partes porem fim ao conflito pela via da composição, na medida em que entende que “a satisfação efetiva das partes pode dar-se de modo mais intenso se a solução é por elas criada e não imposta pelo juiz” (PNCPC, Exposição de Motivos, p. 12).

Assim, o PNCPC, quando trata das normas fundamentais do processo civil, registra que “o Estado promoverá, sempre que possível, a solução consensual dos conflitos” (art. 3º, § 2º), bem como que “a conciliação, a mediação[1] e outros métodos de solução consensual de conflitos deverão ser estimulados por magistrados, advogados, defensores públicos e membros do Ministério Público, inclusive no curso do processo judicial” (art. 3º, § 3º). Outrossim, insculpe que ao juiz incumbe a promoção, a qualquer tempo, “da autocomposião, preferencialmente com auxílio de conciliadores e mediadores judiciais” (art. 139, V), destacando, inclusive, que “os prazos se suspendem durante a execução de programa instituído pelo Poder Judiciário para promover a conciliação” (art. 221, parágrafo único).

Ademais, no seu art. 335, o PNCPC preconiza a denominada “audiência de conciliação”, que será realizada previamente à apresentação da contestação (a contestação é postergada). Nas palavras da sua Exposição de Motivos (p. 13):

“Como regra, deve realizar-se audiência em que, ainda antes de ser apresentada contestação, se tentará fazer com que autor e réu cheguem a acordo. Dessa audiência, poderão participar conciliador e mediador e o réu deve comparecer, sob pena de se qualificar sua ausência injustificada como ato atentatório à dignidade da justiça [art. 335, § 8º[2]]. Não se chegando a acordo, terá início o prazo para a contestação.”.

Ainda sobre a referida “audiência de conciliação”, o PNCPC reza que: i) é requisito da petição inicial a indicação optativa do autor pela realização ou não da audiência de conciliação (art. 320, VI); ii) ela se realizará se a petição inicial preencher os requisitos essenciais e não for o caso de improcedência liminar do pedido (art. 335, caput); iii) ela será designada com antecedência mínima de trinta dias, sendo o réu citado com pelo menos vinte dias de antecedência (art. 335, caput); iv) poderá haver mais de uma sessão destinada à composição das partes (art. 335, § 2º); v) ela pode ser realizada por meios eletrônicos (art. 335, § 7º); e vi) ela não será realizada se ambas as partes manifestarem expressamente desinteresse na composição ou se o processo não admitir a autocomposição (art. 335, § 4º).

Noutro giro, o PNCPC, como forma de fortalecimento da conciliação, elenca expressamente os conciliadores e os mediadores judiciais como profissionais auxiliares da Justiça (art. 149). Também, destina uma seção inteira (Seção VI do Capítulo III do Título IV do Livro III) para regulamentar, em âmbito processual, o trabalho desses profissionais, a qual engloba os artigos 166 usque 176, destacando-se os seguintes:

“Art. 166. Os tribunais criarão centros judiciários de solução consensual de conflitos, responsáveis pela realização de sessões e audiências de conciliação e mediação, e pelo desenvolvimento de programas destinados a auxiliar, orientar e estimular a autocomposição.

(...)

§ 2º Em casos excepcionais, as audiências ou sessões de conciliação e mediação poderão realizar-se nos próprios juízos, desde que conduzidas por conciliadores e mediadores.

§ 3º O conciliador, que atuará preferencialmente nos casos em que não tiver havido vínculo anterior entre as partes, poderá sugerir soluções para o litígio, sendo vedada a utilização de qualquer tipo de constrangimento ou intimidação para que as partes conciliem.

§ 4º O mediador, que atuará preferencialmente nos casos em que tiver havido vínculo anterior entre as partes, auxiliará aos interessados a compreender as questões e os interesses em conflito, de modo que eles possam, pelo restabelecimento da comunicação, identificar, por si próprios, soluções consensuais que gerem benefícios mútuos.

Art. 167. A conciliação e a mediação são informadas pelos princípios da independência, da imparcialidade, da autonomia da vontade, da confidencialidade, da oralidade, da informalidade e da decisão informada.

§ 1º A confidencialidade estende-se a todas as informações produzidas no curso do procedimento, cujo teor não poderá ser utilizado para fim diverso daquele previsto por expressa deliberação das partes.

§ 2º Em razão do dever de sigilo, inerente às suas funções, o conciliador e o mediador, assim como os membros de suas equipes, não poderão divulgar ou depor acerca de fatos ou elementos oriundos da conciliação ou da mediação.

§ 3º A aplicação de técnicas negociais, com o objetivo de proporcionar ambiente favorável à autocomposição, não ofende o dever de imparcialidade.

§ 4º A mediação e a conciliação serão regidas conforme a livre autonomia dos interessados, inclusive no que diz respeito à definição das regras procedimentais.

Art. 168. Os tribunais manterão cadastro de conciliadores e mediadores e das câmaras privadas de conciliação e mediação, que conterá o registro dos habilitados, com indicação de sua área profissional.

(...)

Art. 169. As partes podem escolher, de comum acordo, o conciliador, o mediador ou a câmara privada de conciliação e de mediação.

(...)

§ 3º Sempre que recomendável, haverá a designação de mais de um mediador ou conciliador.

(...)

Art. 175. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios criarão câmaras de mediação e conciliação, com atribuições relacionadas à solução consensual de conflitos no âmbito administrativo, tais como:

I - dirimir conflitos envolvendo órgãos e entidades da administração pública;

II - avaliar a admissibilidade dos pedidos de resolução de conflitos, por meio de conciliação, no âmbito da administração pública;

III - promover, quando couber, a celebração de termo de ajustamento de conduta.

Art. 176. As disposições desta Seção não excluem outras formas de conciliação e mediação extrajudiciais vinculadas a órgãos institucionais ou realizadas por intermédio de profissionais independentes.

Parágrafo único. Os dispositivos desta Seção aplicam-se, no que couber, às câmaras privadas de conciliação e mediação.”.

Por fim, o PNCPC, objetivando o estímulo da autocomposição, ainda dispõe que: a) instalada a audiência de instrução e julgamento, o juiz tentará conciliar as partes, sem prejuízo do emprego de outros métodos de resolução consensual de conflitos, como a mediação, a arbitragem[3] e a avaliação imparcial por terceiro (art. 365, parágrafo único), sendo esta avaliação (feita por terceiro de confiança das partes, de caráter sigiloso – inclusive para o magistrado – e não vinculante) destinada exclusivamente a orientar as partes na tentativa de autocomposição (art. 366); b) “as partes podem, de comum acordo, escolher o perito, indicando-o mediante requerimento, desde que (...) a causa possa ser resolvida por autocomposição” (art. 478, II), hipótese em que “a perícia consensual substitui, para todos os efeitos, a que seria realizada por perito nomeado pelo juiz” (art. 478, § 3º); c) será admitida a produção antecipada da prova nos casos em que “a prova a ser produzida seja suscetível de viabilizar tentativa de conciliação ou de outro meio adequado de solução de conflito” (art. 388, II); d) ”nas ações de família, todos os esforços serão empreendidos para a solução consensual da controvérsia, devendo o juiz dispor do auxílio de profissionais de outras áreas de conhecimento para a mediação e conciliação” (art. 709, caput), podendo o juiz, a requerimento das partes, suspender o processo enquanto os litigantes se submetem a mediação extrajudicial ou a atendimento multidisciplinar (art. 709, parágrafo único), bem como dividir a audiência de conciliação e mediação “em tantas sessões quantas sejam necessárias para viabilizar a solução consensual” (art. 711); e e) são títulos executivos judiciais passíveis de cumprimento de sentença “a decisão homologatória de autocomposição judicial, ainda que inclua matéria não posta em juízo”, e “a decisão homologatória de autocomposição extrajudicial de qualquer natureza” (art. 529, II e III).

Conclui-se, portanto, que o PNCPC busca valorizar, fortalecer e sistematizar, em âmbito nacional, os mecanismos visando à autocomposição e pacificação das partes, mormente os institutos da conciliação e mediação em sede processual civil. Noutros termos, o CPC projetado favorece a conciliação, porquanto objetiva, com procedimentos mais bem definidos, estimular a utilização da conciliação e mediação, prestigiando e fortalecendo, desse modo, os meios alternativos de solução de controvérsia.


Referências Bibliográficas

Exposição de Motivos do Projeto do Novo Código Civil. Disponível em: <http://www2.camara.leg.br/atividade-legislativa/comissoes/comissoes-temporarias/especiais/54a-legislatura/8046-10-codigo-de-processo-civil/arquivos/quadro-comparativo-do-cpc-atual-e-pl-8.046-11>. Acesso em: 19 ago.2013.

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MENDES, Gilmar Ferreira. Direitos Fundamentais e Controle de Constitucionalidade: estudos de direito constitucional. 4ª ed. São Paulo: Saraiva, 2012.

PINHO, Humberto Dalla Bernardina de. A Mediação e o Código de Processo Civil Projetado. In Revista de Processo. V. 207. Maio de 2012. P. 213 e ss.

Projeto de Lei nº 6.025/2005. Disponível em: <http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=302638>. Acesso em: 20 set.2013.

Sítio do Tribunal de Justiça do Estado de Pernambuco. Disponível em: <http://www.tjpe.jus.br/concilia/oque.asp>. Acesso em: 20 set.2013.


Notas

[1] Sobre a diferenciação entre a mediação e a conciliação, o sítio do Tribunal de Justiça do Estado de Pernambuco, com simplicidade e maestria, assim as diferencia: “O que é mediação? É uma forma de solução de conflitos em que um terceiro neutro e imparcial auxilia as partes a conversar, refletir, entender o conflito e buscar, por elas próprias, a solução. Nesse caso, as próprias partes é que tomam a decisão, agindo o mediador como um facilitador. (...) O que é conciliação? É uma forma de solução de conflitos em que as partes, através da ação de um terceiro, o conciliador, chegam a um acordo, solucionando a controvérsia. Nesse caso, o conciliador terá a função de orientá-las e ajudá-las, fazendo sugestões de acordo que melhor atendam aos interesses dos dois lados em conflito.”. Portanto, na mediação, há o auxílio a pessoas em conflito para, por si mesmas, identificarem alternativas de soluções para o litígio, ao passo que, na conciliação, há a sugestão, pelo conciliador, de soluções para o litígio.

[2] PNCPC, art. 335, § 8º: “O não comparecimento injustificado do autor ou do réu à audiência de conciliação é considerado ato atentatório à dignidade da justiça e será sancionado com multa de até dois por cento da vantagem econômica pretendida ou do valor da causa, revertida em favor da União ou do Estado.”.

[3] Com relação à arbitragem, prevista na Lei nº 9.307, de 23 de setembro de 1996, ela é entendida como o “mecanismo extrajudicial de solução de controvérsias”, consoante o qual “as partes litigantes investem, por meio de uma convenção arbitral (cláusula compromissória) e compromisso arbitral, uma ou mais pessoas de poderes decisórios para resolver seus conflitos relativos a direitos patrimoniais disponíveis” (In MENDES, Gilmar Ferreira. “Direitos Fundamentais e Controle de Constitucionalidade: estudos de direito constitucional”. 4ª ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 224).

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Sobre o autor
Wendson Ribeiro

Procurador Federal. Graduado em Direito e pós-graduado em Direito Público pela Universidade de Brasília - UnB.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

RIBEIRO, Wendson. O projeto do novo Código de Processo Civil favorece a conciliação?. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3750, 7 out. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/25432. Acesso em: 20 abr. 2024.

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