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Aposentadoria especial do cortador de cana.

Implicações da OJ 173 da SDI-1 do TST

14/07/2014 às 14:18
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Breve análise acerca da implicação previdenciária do inciso II da OJ 173 da SDI-1 do TST, com a possibilidade de aposentadoria especial, ou conversão em tempo comum do trabalho realizado a céu aberto pelo cortador de cana.

No ano de 2012 foi alterada a Orientação Jurisprudencial 173 da Seção de Dissídios Individuais-1 do Tribunal Superior do Trabalho, que passou a ter a seguinte redação:

173. ADICIONAL DE INSALUBRIDADE. ATIVIDADE A CÉU ABERTO. EXPOSIÇÃO AO SOL E AO CALOR. (redação alterada na sessão do Tribunal Pleno realizada em 14.09.2012) – Res. 186/2012, DEJT divulgado em 25, 26 e 27.09.2012

I – Ausente previsão legal, indevido o adicional de insalubridade ao trabalhador em atividade a céu aberto, por sujeição à radiação solar (art. 195 da CLT e Anexo 7 da NR 15 da Portaria Nº 3214/78 do MTE).

II – Tem direito ao adicional de insalubridade o trabalhador que exerce atividade exposto ao calor acima dos limites de tolerância, inclusive em ambiente externo com carga solar, nas condições previstas no Anexo 3 da NR 15 da Portaria Nº 3214/78 do MTE.

Não é difícil se estabelecer o vínculo entre a OJ 173 e a atividade profissional dos cortadores de cana, já que é de conhecimento público a realização deste trabalho a céu aberto e exposto a toda sorte de variações climáticas.

A redação da OJ 173 se justifica, num primeiro momento, pela grande quantidade de pedidos judiciais que pretendiam obter aos cortadores de cana a percepção do adicional de insalubridade pela exposição ao sol, em especial pela radiação solar, o que obrigou o TST por diversas vezes a tomar posição contrária a estes pedidos uma vez que ausente previsão legal para tanto.

Este posicionamento adotado pelo TST como no RR 81100-80.2007.5.15.0036, era uma resposta a demandas judiciais que infelizmente não fizeram a adequação dos pedidos aos termos da Norma Regulamentadora - 15 do MTE, que de fato, jamais previu alguma forma de adicional de insalubridade para a simples exposição ao sol.

Somente após decisões negativas mantidas pelo TST, o novo caminho foi sinalizado com bastante clareza, e pode ser observado no inciso II da OJ 173. Não é a simples exposição ao sol, mas o calor medido em níveis superiores ao estabelecido no Anexo 3 da NR-15 que faz surgir o direito ao adicional de insalubridade.

Os valores indicados no Anexo 3 da NR-15 são obtidos por meio de medição no local de trabalho com instrumento próprio e especificado no mesmo anexo, a saber: termômetro de bulbo úmido natural, termômetro de globo e termômetro de mercúrio comum, e seus valores são referidos a partir do “Índice de Bulbo Úmido Termômetro de Globo” – IBUTG cuja metodologia de cálculo também é apresentada no Anexo 3.

Assim, o reconhecimento da atividade do trabalho do cortador de cana será considerada insalubre sempre que no local de trabalho se verificar a exposição à calor superior ao previsto no Anexo 3, de forma técnica e independentemente de fornecimento de EPI.

Após esta breve e simplificada exposição da OJ 173 da SDI-1 do TST, bem como da NR-15 do MTE, fica claro também a implicação previdenciária deste entendimento, apesar da escassa jurisprudência (no âmbito previdenciário) sobre o tema nos leva a crer que suas implicações embora claras, não foram devidamente assimiladas pelos colegas Advogados (a quem recai o ônus do primeiro julgamento da causa).

De forma simples, podemos dizer que a aposentadoria especial é devida ao segurado que tiver exercido sua atividade profissional em locais ou condições de trabalho considerados nocivos à sua integridade física, dito de outra forma, que tenha exercido atividades insalubres ou por período variável: 15, 20 ou 25 anos dependendo do grau de insalubridade correspondente.

Já é conhecida a lição de Sérgio Pinto Martins a respeito da aposentadoria especial: “um benefício de natureza extraordinária, tendo por objetivo compensar o trabalho do segurado que presta serviços em condições adversas à sua saúde ou que desempenha atividade com riscos superiores aos normais”.

A atividade do cortador de cana, em raras ocasiões deixará de ser considerada insalubre após realização de laudo técnico pericial. Poderia hipoteticamente, ser considerada como atividade salubre nos meses onde normalmente há uma baixa na temperatura regional (outono e inverno), mas sem muita dificuldade é possível imaginar no mínimo 6 meses de atividade laboral exercida em condições insalubres no ano.

Sendo atestada a insalubridade pela Justiça do Trabalho, a consequência será fatalmente a utilização desta decisão para a concessão de benefício previdenciário, seja na aposentadoria especial ou por meio da conversão do tempo exercido em atividade especial em tempo comum.

Esta possibilidade jurídica poderia ser ainda mais benéfica ao trabalhador se a própria empresa elaborasse o Laudo Técnico das Condições Ambientais do Trabalho – LTCAT, fizesse o recolhimento mensal do adicional de insalubridade ao INSS por meio de GFIP específica, mas infelizmente a realidade dos trabalhadores cortadores de cana no país caminha na direção oposta, o que certamente forçará um verdadeiro “combo” de ações judiciais: uma de natureza trabalhista para o reconhecimento da insalubridade, e outra previdenciária para forçar o reconhecimento desse tempo pelo INSS.

É certo que o tema ainda carece de maior debate jurídico, em especial no âmbito do Direito Previdenciário, uma vez que até o momento, poucos são os julgados pelo país afora nos TRF’s que indiquem a realização destes pedidos junto ao Poder Judiciário.

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Todavia à margem da carestia de pedidos judiciais, o fato é que a possibilidade de aposentadoria especial para o cortador de cana (e por que não dizer para inúmeros trabalhadores rurais expostos a condições similares) ainda que por meio dessa construção legal é real, e deve beneficiar amplamente um batalhão de cortadores de cana espalhados pelo país.

Aos que atuam na área previdenciária, o debate se faz necessário e mais do que isso, a defesa desse direito aos cortadores de cana, sabidamente um trabalho que mereceria a inutilizada garantia constitucional do adicional de penosidade, pois certamente esse direito não será garantido sem trabalho.

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Sobre o autor
Marcelo Gonçalves da Silva

Advogado Previdenciário.Especialista em Docência no Ensino Superior.Colunista do Portal Educação e da Jus Navigandi

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SILVA, Marcelo Gonçalves. Aposentadoria especial do cortador de cana.: Implicações da OJ 173 da SDI-1 do TST. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 19, n. 4030, 14 jul. 2014. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/28776. Acesso em: 19 mar. 2024.

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