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Prazo de reflexão do consumidor nos contratos eletrônicos de consumo

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13/09/2014 às 15:54
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2           Contratos que Evidenciam Relação de Consumo em Meio Eletrônico

Antes de adentrarmos nos contratos que evidenciam relação de consumo em meio eletrônico, serão abordados de forma breve os contratos de consumo, que são aqueles caracterizados pela relação de consumo, que se dá pelos pólos da relação contratual: de um lado o fornecedor e do outro o consumidor.

Como explica José Augusto Delgado, os contratos de consumo não fogem às regras do direito privado:

O contrato de relação de consumo, como já afirmado, não se desvincula dos valores adotados pelo direito privado para os contratos em geral. Apenas adota-os de modo mais flexível e com a produção de efeitos que visem a evitar abusos provocados por estamentos econômicos e mais fortes que se posicionam sempre como fornecedor do bem ou executor do serviço consumidor (DELGADO, 1999, p. 16).

Significa dizer que a obrigação contratual, a autonomia da vontade dos agentes contratantes, que estão presentes na teoria clássica do direito contratual, continuam vigentes e aplicáveis aos contratos de consumo, mas adaptadas e flexibilizadas “pela valorização dos aspectos éticos da boa-fé objetiva e da tutela especial à parte vulnerável nas negociações” (THEODORO JÚNIOR, 2009, p. 19/20).

Os contratos eletrônicos que evidenciam relação de consumo são aqueles realizados pela internet, nos quais ocorre o acordo entre duas ou mais pessoas para constituição, modificação ou extinção de um vínculo jurídico, de natureza patrimonial, cujas declarações de vontade emanadas para consenso serão expressas por aparelhos eletrônicos capazes de acessar a internet (BARBAGALO, 2001).

Vale lembrar que, segundo o art. 47 do CDC (BRASIL, 1990), as cláusulas dos contratos de consumo serão sempre interpretadas de maneira mais favorável ao consumidor. Como explica Cláudia Lima Marques (2009), sendo o consumidor a parte mais frágil da relação de consumo, quando uma cláusula contratual possuir dois ou mais sentidos ou existirem cláusulas obscuras e contraditórias, deve-se interpretar sempre de forma mais favorável ao consumidor.

2.1         Breve Noções Sobre o Comércio Eletrônico

Para entender o contrato eletrônico de consumo, é essencial enfrentar as breves noções sobre comércio eletrônico.

Para Albertin (2002, p.15) Comércio Eletrônico é “a realização de toda a cadeia de valor dos processos de negócios num ambiente eletrônico, por meio da aplicação intensa das tecnologias de comunicação e informação, atendendo aos objetivos do negócio.” Limeira (2003, p.38) entende que “o comércio eletrônico consiste na realização de negócios por meio da internet”.

De acordo com o entendimento acima, pode-se concluir que comércio eletrônico se trata de toda negociação de produtos, bens, serviços ou informações realizadas por meio eletrônico, em especial, pela internet. Comparando com a forma de comércio tradicional, o comércio eletrônico diferencia-se por ser contratado online, de forma rápida, usufruindo dos recursos da informática e tecnologia para efetuar suas operações.

Na visão de Fábio Ulhoa Coelho (2007, p.70/71):

Comércio eletrônico, assim, significa os atos de circulação de bens, prestação ou intermediação de serviços em que as tratativas pré-contratuais e a celebração do contrato se fazem por transmissão e recebimento de dados por via eletrônica, normalmente no ambiente da internet (COELHO, 2007, p.70/71).

Entende Cláudia Lima Marques (2009) que o comércio clássico de atos negociais entre empresários e clientes para vender produtos e serviços agora se realiza através de contratações à distância, conduzidas por meios eletrônicos, por internet ou por meios de telecomunicação de massa.

Todavia, assim como em todos os contratos presenciais, a contratação através da internet irá gerar direitos e obrigações.

No Business to Consumer ou Negócio a Consumidor ocorre a transação entre o fornecedor, em sítio na internet e o consumidor final, configurando-se, portanto, a relação de consumo, onde estão presentes o consumidor (adquirente do produto ou serviço) e o fornecedor (vendedor de um produto ou serviço). São, portanto, negociações eletrônicas entre fornecedores e consumidores. Esta modalidade representa a virtualização da compra e venda, circulação e prestação de bens e serviços. A diferença é que os consumidores escolhem e pagam os produtos pela internet. São exemplos de Business to Consumer as compras realizadas nos seguintes sites: www.submarino.com.br, www.shoptime.com.br, www.americanas.com.br.

Com a popularização dos computadores pessoais e o uso da Internet para fins comerciais, o comércio eletrônico transformou-se num mercado mundial outrora inimaginável. Destarte, qualquer tipo de transação para a aquisição de um produto ou de um serviço pode ser efetivado através de contratação eletrônica.

As transações realizadas via Internet envolvem sempre um fornecedor de bens ou serviços, um consumidor-usuário da Internet que adquire, como destinatário final, os produtos ou serviços colocadas à disposição num sítio de internet pelo fornecedor; e, por fim, uma contratação eletrônica.

Atente-se que, para que não seja litigiosa essa relação de consumo, o fornecedor deve ser, ao máximo, transparente e informar ao consumidor na relação consumerista quais são os passos envolvidos para que ele possa fechar a contratação sem problemas. Essa necessidade deve-se ao fato de que o consumidor é, sem dúvida alguma, o elo mais vulnerável dessa cadeia de consumo e não pode, por conseguinte, ser surpreendido por ofertas e publicidades enganosas e abusivas pelo fornecedor. Dessa forma, está garantida a proteção do consumidor durante a realização de uma relação de consumo no comércio eletrônico (COELHO, 1999).

Em suma, as práticas negociais de ofertar produtos e serviços pela Internet, em suas diversas modalidades, podem caracterizar como nas relações de consumo e os contratos, resultando em contratos de consumo que se submetem ao crivo do Código de Defesa do Consumidor.


3           PLENA APLICABILIDADE DO CDC AOS CONTRATOS REALIZADOS PELA INTERNET

Em outubro de 1988, foi promulgada a atual Constituição da República (BRASIL, 1988), e no inciso XXXII do artigo 5º está disposto o Direito do Consumidor que, de acordo com o artigo 48 das disposições transitórias, deveria o Congresso Nacional elaborar um Código de Defesa do Consumidor dentro de 120 dias da promulgação da Constituição Federal. Tal disposição foi cumprida com atraso, e em 11 de setembro de 1990 surge a lei nº 8.078 (BRASIL, 1990) que institui o Código de Defesa do Consumidor, passando a vigorar em março de 1991. Assim, surge uma nova disciplina conhecida hoje como Direito do Consumidor.

Até a promulgação do CDC em 1990, era utilizado o Código Civil de 1916 para regular as relações de consumo, o qual era centrado no individualismo, na autonomia da vontade e na propriedade privada, elementos fundamentais das relações privadas, e, portanto, inadequado para as relações jurídicas de consumo.

O legislador constituinte de 1988, verificando que estava ocorrendo desequilíbrio nas relações jurídicas de consumo, que o consumidor é a parte vulnerável, entendeu que era preciso dar uma resposta à sociedade. A lei só nasce depois do problema social, então a preocupação se dá no sentido de proteger o consumidor buscando reequilibrar a relação contratual.

O art. 1° do CDC estabelece normas de proteção e defesa do consumidor de ordem pública e interesse social. Isso significa dizer que são normas cogentes que regem as relações jurídicas de consumo, que não podem ser afastadas pela vontade das partes e que devem ser aplicadas de imediato. Essas normas podem ser aplicadas ex offício sempre que o juiz perceber, por exemplo, que em uma demanda versando sobre uma relação de consumo tenha sido utilizado, erroneamente, como fundamento o Código Civil, quando então, não havendo nenhum vício processual, o magistrado pode aplicar o CDC, mesmo sem o requerimento das partes. É a norma cumprindo sua função social e transformando a realidade (LORENZETTI, 2004).

Quando se consegue subsumir dos conceitos de consumidor, fornecedor,  produtos e serviços uma relação jurídica de consumo deve haver a aplicação do CDC, que é uma norma especial, antes de qualquer outra norma geral. Porém, caso o CDC não baste para resolver o problema, pode ser aplicado conjuntamente o Código Civil, ou Código de Processo Civíl, por exemplo, fenômeno denominado pela autora Cláudia Lima Marques como “diálogo das fontes”, que é a possibilidade de usar mais de um diploma de forma concomitante (SA, 2008).

Antônio Carlos Efing salienta que o CDC tem como objetivo garantir a proteção do consumidor, utilizando-se de seus vários instrumentos preventivos e repressivos criados pelo legislador para efetivar a defesa do consumidor nas relações de consumo. Adiante, lembra que não constitui objetivo do CDC fazer parecer que o fornecedor é “o vilão das relações de consumo”, nem a “tábua de salvação dos consumidores”, pois o fim pretendido pelo CDC, por intermédio de seus princípios, é ensinar ao consumidor como se defender através dos instrumentos colocados à sua disposição para fazer prevalecer a justiça nas relações de consumo. Essa educação assume dupla ação, pois, à medida que o consumidor está mais informado, passa a exigir mais, o que obriga o fornecedor a educar-se no sentido de “observar as normas consumeristas com a atenção pertinente” (EFING, 2004, p. 102).

Embora tenha existido esse atraso na promulgação do Código de Defesa do Consumidor, seus idealizadores moldaram-na com o que havia de mais sofisticado no que se refere à proteção do consumidor, a ponto de tal diploma ter servido de inspiração para outros países, sendo uma lei eficiente no cumprimento de seus objetivos, e que, diante da relação de consumo firmada ou executada em meio eletrônico, há plena aplicabilidade do CDC. É o que menciona Rizzato Nunes, complementando que: “[...] o resultado foi tão positivo que a lei brasileira já inspirou a lei de proteção ao consumidor na Argentina, reformas no Paraguai e no Uruguai e projetos em países da Europa” (NUNES, 2007, p. 3).

O Código de Defesa do Consumidor é um subsistema autônomo do direito privado que deve ser aplicado prioritariamente em todas as relações jurídicas de consumo, porém, é um diploma que deve obediência à Constituição Federal, pois, como qualquer norma jurídica hierarquicamente inferior, a ela deve estar subordinada. Foi criado com o objetivo de equilibrar as relações de consumo onde, segundo a visão do legislador, o consumidor é sempre vulnerável, vide art. 4º, I do CDC (BRASIL, 1990).

Na visão de Cláudia Lima Marques, o Direito do Consumidor pode ser entendido como:

(…) o conjunto de normas e princípios especiais que visam cumprir com este triplo mandamento constitucional: 1) de promover a defesa dos consumidores (art. 5º, XXXII, da Constituição Federal de 1988: “O Estado promoverá, na forma da lei, a defesa do consumidor”); 2) de observar e assegurar como princípio geral da atividade econômica, como princípio imperativo da ordem econômica constitucional, a necessária “defesa” do sujeito de direitos “consumidor” (art. 170 da Constituição Federal de 1988: “A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre inciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: (…) V – defesa do consumidor; (...)”; e 3) de sistematizar e ordenar esta tutela especial infraconstitucionalmente através de um Código (microcodificação), que reúna e organize as normas tutelares, de direito privado e público, com base na idéia de proteção do sujeito de direitos (e não da relação de consumo ou do mercado de consumo, um código de proteção e defesa do “consumidor” (art. 48 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias da Constituição Federal de 1988: “O Congresso Nacional, dentro de cento e vinte dias da promulgação da Constituição, elaborará o código de defesa do consumidor” (MARQUES, 2009, p. 27).

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O CDC veio para proteger a parte considerada vulnerável (art. 4º CDC, 1990) na relação de consumo, qual seja, o consumidor, instituindo regras de proteção a serem aplicadas em caso de constatação da hipossuficiência do consumidor na relação contratual (THEDORO JÚNIOR, 2009).

3.1         Aplicação da Lei 8.078/90 ao Comércio Eletrônico

O comércio eletrônico consiste na utilização de tecnologias de informação avançadas, para o aumento de eficiência nas relações comerciais e para o desenvolvimento de contratos de maneira geral, quer entre empresas, quer entre pessoas naturais.

Há que se ter em conta o relevante valor jurídico das mensagens transmitidas no comércio eletrônico, pois elas formam declarações de vontade integrantes dos contratos ou que provam a execução dos respectivos direitos e obrigações. Deste ângulo, vários problemas surgem quanto à segurança do contrato eletrônico (sua aceitação, autenticação, confidencialidade, integridade), sua publicidade no momento da formação do contrato, a transmissão das declarações de vontade, a legitimidade representativa, a determinação do momento e do lugar da celebração do contrato e a responsabilidade civil dos contratantes (ALVIM, 1997, p. 250).

A evolução do comércio eletrônico trouxe aos consumidores uma variedade e quantidade imensurável de produtos e serviços oferecidos na internet. Atualmente, é comum para grande parte dos consumidores a negociação pela rede mundial de computadores. Entretanto, as relações realizadas através da internet encontram amparo nas disposições legais vigentes, principalmente as que se referem ao Código de Defesa do Consumidor. Vale destacar que o artigo 13 do projeto de lei nº 1589/99 (OAB/SP, 1999) dispõe que aplica-se ao comércio eletrônico as normas de defesa e proteção do consumidor.


4           Direito de reflexão: conceito e aplicação

Neste tópico será testada a possibilidade de aplicação do prazo de reflexão aos contratos que evidenciam relação de consumo em meio eletrônico. Porém, antes, para melhor entendimento, é mister explicar de forma objetiva como e quando o consumidor faz jus ao direito de reflexão ou arrependimento.

O prazo de reflexão é um direito reconhecido ao consumidor, ou a quem for a ele legalmente equiparado, de poder arrepender-se e voltar atrás da vontade que haja manifestado, celebrando relação jurídica de consumo.

Para o Direito brasileiro, conforme disposto no artigo 49 do CDC, existem apenas dois pré-requisitos para que o direito de arrependimento possa ser exercido: 1) a contratação de fornecimento de produtos e/ou serviços tenha ocorrido fora do estabelecimento comercial; e 2) seja realizado dentro do prazo legal previsto de 7 (sete) dias (GRINOVER, 1998).

Em relação ao primeiro requisito, cumpre esclarecer sobre considerar ou não se os negócios via internet são realizados dentro ou fora do estabelecimento comercial, tendo em vista que há uma sujeição ao regime do direito de arrependimento em toda relação de consumo que seja celebrada fora do estabelecimento comercial.

É importante ressaltar que a situação da ausência física no estabelecimento comercial na realização do processo decisório de aquisição de produto e/ou serviço, caracteriza-se fundamental para o reconhecimento do direito de se arrepender. Dessa forma, fica evidente a falta de impressões em relação à falta da proximidade do objeto pretendido, instrumentos capazes de alterar ou, ao menos, influir a escolha do contratante.

Sendo caracterizada a relação de consumo em negócio celebrado com uso de meio eletrônico, aplica-se o Código de Defesa do Consumidor, os quais permitem a conclusão de que nos referidos casos, ocorre apenas uma mudança na forma de contratar (que é livre), mas a essência jurídica permanece a mesma.

O artigo 49 do Código de Defesa do Consumidor (1990) dispõe:

Art. 49 O consumidor pode desistir do contrato, no prazo de 7 dias a contar de sua assinatura ou do ato de recebimento do produto ou serviço, sempre que a contratação de fornecimento de produtos ou serviços ocorrer fora do estabelecimento comercial, especialmente por telefone ou a domicílio. (BRASIL, 1990, p. 806)

Portanto, o CDC (BRASIL, 1990) permite ao consumidor ter um prazo para refletir sobre a compra que realizou fora do estabelecimento comercial, podendo desistir de tal compra no prazo estipulado, sem necessidade de justificar o motivo da desistência (GRINOVER, 2007).

Importante lembrar que se for da essência do negócio a realização fora do estabelecimento comercial, não caberá direito de arrependimento. Como exemplo, a compra e venda de um imóvel, que em regra é celebrada no cartório de notas, na presença do oficial. Neste caso, apesar da compra e venda ter sido celebrada fora do estabelecimento comercial, deve-se levar em consideração que as tratativas preliminares (sinal, compromisso de compra e venda etc) foram realizadas no estabelecimento comercial (imobiliária) e, portanto, não caberá a aplicação do direito de arrependimento (GRINOVER, 2007).

Cumpre ressaltar que o direito de arrependimento tem, portanto, um alcance restrito, já que somente protegerá os consumidores que adquirem produtos fora do estabelecimento comercial. Entende-se que o mercado pressiona o consumidor a adquirir produtos, sendo que o consumidor nem sempre conhece, efetivamente, o objeto da contratação, e o prazo de reflexão permite que o consumidor manifeste sua vontade de forma livre, esclarecida e, sobretudo, convicta (NERY JÚNIOR, 2001).

Quando o espírito do consumidor não está preparado para uma abordagem mais agressiva, derivada de práticas e técnicas de vendas mais incisivas, não terá discernimento suficiente para contratar ou deixar de contratar, dependendo do poder de convencimento empregado nessas práticas mais agressivas. Para essa situação é que o Código prevê o direito de arrependimento (NERY JÚNIOR, 2001, p.494).

Ao consumidor é assegurada a devolução da quantia eventualmente paga, inclusive a quantia referente aos custos de envio. Assim explica Cláudia Lima Marques:

Em caso de arrependimento, todos os gastos e despesas do consumidor, inclusive o de transporte do bem, devem ser imediatamente devolvidos. O parágrafo único do art. 49 não deixa dúvida a respeito: Se o consumidor exercitar o direito de arrependimento previsto neste artigo, os valores eventualmente pagos, a qualquer título, durante o prazo de reflexão, serão devolvidos, de imediato, monetariamente atualizados (MARQUES, 2009, p.292).

Vale dizer que quando o artigo 49 prevê o direito de arrependimento “especialmente por telefone ou a domicílio” não está limitando a sua forma de interpretação, mas sim destacando as formas de contratação por meio eletrônico mais comuns praticadas à época do surgimento do Código de Defesa do Consumidor (BRASIL, 1990) ou até mesmo exemplificando os métodos de contratação fora do estabelecimento comercial, mas nunca os limitando. Assim, como ficará demonstrado, caberá direito de arrependimento também ao consumidor que realiza compras pela internet.

Assim, entendem que não há o que se falar em direito de arrependimento à luz do CDC para os casos de aquisição de bens imóveis. Porém como vimos anteriormente, há as questões dos contratos de muitipropriedade e também nada impede e já vem sido feita está pratica dos fornecedores venderem seus imóveis pela televisão e outros locais sem ser no Cartório, onde o consumidor adquire o bem e posteriormente se faz a escritura. Segundo RIZZATO (2004, pág. 614) "Quem afirma que a regra do art. 49 não se aplica a imóveis, esquece-se de observar o mercado de consumo contemporâneo".

Ainda é polêmica a relação ao direito de reflexão relacionado a serviços, primeiro no caso do serviço de execução imediata, posteriormente, para serviços de execução continuada.

No caso de compras efetuadas pela internet, caberá o direito de arrependimento pela impossibilidade do consumidor ter contato físico com o produto, independentemente das informações, fotos, descrição das características e qualidades dos produtos disponíveis no site onde foi feita a compra. O prazo para a manifestação do referido direito nos contratos eletrônicos é de 07(sete) dias contados a partir da data de recebimento do produto. “Nada substitui o contato direto do consumidor com o bem, fator imprescindível para uma decisão de compra” (MARQUES, 2009, p.292).

O prazo para manifestação da desistência é de sete dias “a contar de sua assinatura ou do ato de recebimento do produto ou serviço. No caso de compra pelo telefone e internet, a contagem inicia-se a partir do ato de recebimento do produto e não do dia da solicitação(contratação). A interpretação deve prestigiar a finalidade da norma: proteger o comprador que, até o recebimento físico do bem, não pode examinar adequadamente o produto (MARQUES, 2009, p.292).

Ademais, presentes os requisitos para a configuração de uma relação de consumo, não há porque não se aplicar o Código de Defesa do Consumidor (BRASIL, 2009) também às negociações feitas pela internet. A não existência de legislação mais específica não impede sua aplicabilidade às relações de consumo realizadas pela internet, visto que o internauta é o potencial consumidor e as empresas e empresários que disponibilizam seus produtos ou serviços na rede mundial de computadores são os fornecedores.

Por enquanto, na ausência de norma mais específica, a legislação existente é capaz de resolver os conflitos resultantes de transações por meios eletrônicos, garantindo a segurança jurídica, ao aplicar normas e princípios básicos da relação de consumo, independentemente das várias formas de contratação disponíveis. As relações de consumo realizadas por meios eletrônicos são perfeitamente válidas e se sujeitam às leis em vigor, como o Código Civil (BRASIL, 2002) e o Código de Defesa do Consumidor (BRASIL, 1990) e, mesmo que se crie uma legislação específica para tratar de tal forma de comércio, os fornecedores de produtos ou serviços na rede mundial de computadores não poderão e nunca puderam alegar, quanto ao não cumprimento da obrigação, a falta de norma específica sobre a matéria.

A legislação consumerista é a que mais apresenta embasamento, visto que o Código de Defesa do Consumidor (BRASIL, 1990) apresenta vários dispositivos capazes de proteger os internautas quando na efetivação de compras de produtos ou serviços realizadas online.

Segundo Cláudia Lima Marques (2004, p.146), cabe ao fornecedor provar o não arrependimento nas contratações realizadas pela internet (inversão do ônus da prova), mesmo que a declaração de vontade parta do consumidor, pois aquele que lucra responde pelos riscos criados. Portanto, as empresas que se utilizam do mundo virtual e efetuam contratação à distância devem estar preparadas para os riscos, tanto do erro quanto do direito do consumidor de arrepender-se.

Contudo, existe uma divergência doutrinária a respeito do assunto. Apesar de ser entendimento minoritário entre os doutrinadores, alguns entendem que as compras realizadas pela internet não são passíveis de aplicação do direito de arrependimento. Assim entende Fábio Ulhôa Coelho (2007, p.70):

A rede mundial de computadores (internet) tem sido largamente utilizada para a realização de negócios. Em razão disto, criou-se um novo tipo de estabelecimento, o virtual. Distingue-se do estabelecimento empresarial físico, em razão dos meios de acessibilidade. Aquele o consumidor ou adquirente de bens ou serviços acessa exclusivamente por transmissão eletrônica de dados, enquanto o estabelecimento físico é acessível pelo deslocamento no espaço. A natureza do bem ou serviço objeto de negociação é irrelevante para a definição da virtualidade do estabelecimento. Se alguém adquire, via internet, um eletrodoméstico, a mercadoria nada tem de virtual, mas como a sua compra decorreu de contrato celebrado com o envio e recepção eletrônicos de dados via rede mundial de computadores, considera-se realizada num estabelecimento virtual. (COELHO, 2007, p.70)

Conforme verificado, o professor entende que as compras realizadas na internet são  efetuadas no estabelecimento comercial, mesmo que virtual e, portanto, não cabe aplicar o prazo de reflexão. A não aplicabilidade do direito de arrependimento estaria ligada ao fato de que o consumidor não é pego de surpresa pelo fornecedor em grande parte das compras realizadas pela internet, já que o consumidor procura o estabelecimento virtual, acessa o site, escolhe o produto, disponibiliza os dados para cobrança, informa o endereço para envio da mercadoria, entre outros, não havendo motivo para o consumidor ter o direito de arrepender-se (COELHO, 2007).

Entretanto, apesar de questionamentos contrários por uma pequena parte dos doutrinadores, a jurisprudência é totalmente favorável a aplicação do art. 49 do CDC (BRASIL, 1990) aos contratos de consumo realizados por meios eletrônicos.

O artigo 49 do CDC dispõe que a relação pode ser rescindida pelo consumidor arrependido, dentro do prazo estipulado legalmente, sem que o mesmo tenha que pagar pelo preço do produto e do serviço ofertado, visto que o consumidor não estava totalmente decidido e preparado para a contratação, e também dá margem ao desenvolvimento das organizações que utilizam essa comercialização fora do estabelecimento, tendo em vista que o prazo de sete dias para se arrepender é curto e que o suporte deste ônus pelo fornecedor já está embutido no preço do produto, já que está englobado no risco da atividade dos fornecedores.

É importante enfocar que devem ser respeitados os princípios jurídicos que embasam as contratações, principalmente relacionado a boa-fé e o da lealdade nas relações contratuais eletronicamente firmadas, para que se evite prejuízos e problemas para ambas as partes e, caso existam, tenham uma menor proporção e dimensão nesse tipo de comércio tão usado na sociedade contemporânea.

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Sobre a autora
Danielle Silva

Advogada

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SILVA, Danielle. Prazo de reflexão do consumidor nos contratos eletrônicos de consumo. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 19, n. 4091, 13 set. 2014. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/29699. Acesso em: 18 mai. 2024.

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