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Moeda falsa e outros crimes

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20/04/2015 às 14:28
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Para a imitação da moeda, não se faz necessário que ela seja perfeita. A conduta se perfaz quando o agente consiga dar-lhe, através de um artifício material, a aparência de uma moeda de curso legal.

I – A MOEDA FALSA E OS CRIMES CONTRA A FÉ PÚBLICA

Nos estudos sobre a matéria tem-se que Gaetano Fliangieri (Scienza della legislazione, Milão, 1817, IV, 109), atribuiu por fé pública, a fé que é depositada em certas pessoas, as quais, por força do cargo que ocupam ou a função que desempenham, são merecedoras da confiança geral.

Por sua vez, para Pietro Mirto (La falsità in atti, Milão, 1955, pág. 72), a falsidade é limitada à confiança que é imposta através da eficácia jurídica atribuída pela lei a certas coisas, sinais ou formas exteriores. Sendo assim, é conhecida a opinião de Carrara, incluindo entre os crimes contra a fé pública, o peculato, a bancarrota, a falsidade monetária, a falsidade em documento público e a falsidade em selos. Excluía todas outras falsidades pessoais e em ato, que atentavam apenas contra o que chamava de fé privada. Assim pensaram Pessina, Civoli e Tolomei, entre outros.

Arturo Rocco, autor do Projeto do Código Penal Italiano, sustentava, em sua monografia L¨oggeto del reato e della tutela giuridica penale, Roma, 1932, volume I, pág. 595) ser a fé pública “ a confiança que a sociedade deposita nos objetos, sinais e formas exteriores (moedas, emblemas, documentos), aos quais o Estado, mediante o direito, privado ou público, atribui um valor probatório qualquer, bem como a boa-fé e o crédito dos cidadãos nas relações da vida comercial e industrial”.

Realmente a fé pública, como bem nos ensinou VIncenzo Manzini (Trattato di diritto penale italiano, Torino, 1951, volume VI, pág. 437) é a confiança enquanto fenômeno permanente, enquanto costume social e não como fato meramente contingente e individual (estelionato, apropriação indébita, etc).

Em verdade, não se pode duvidar que a fé pública configura um bem-interesse que merece a tutela do direito. A fé pública é um interesse público que é similar à segurança pública e a limpeza pública.

Francesco Antolisei (Manuale di diritto penale, parte speciale, Milão, 1977, volume II, pág. 536), nos faz atentar que a atividade do falsário busca atingir “ aquele interesse específico que é garantido pela genuinidade e pela veracidade dos meios de prova”, daquele interesse que, se a falsidade não houvesse ocorrido, os meios probatórios não teriam sido lesados. Incriminando a moeda falsa a lei não tutela apenas a fé pública, mas também o interesse estatal na regularidade da circulação monetária.

Porém, como nota Paulo José da Costa Jr. (Comentários ao Código Penal, volume III, 1989, São Paulo, Saraiva, pág. 332) a necessidade da prova só se faz sentir num momento posterior àquele em que o respeito à verdade deveria fazer-se, quer no sentido da genuinidade, quer no de veracidade. A moeda deve ser genuína no instante em que é cunhada, como o documento deve ser verdadeiro no momento da redação do ato. Após a moeda entrar em curso, ou o documento ter sido redigido, como bem ensinou Paulo José da Costa, poderá ser contestada a sua genuinidade ou a sua veracidade, surgindo a necessidade do que chamamos de prova.

A doutrina traz requisitos para a caracterização geral do crime de falso: a imitação ou alteração da verdade; a possibilidade de dano; o dolo.

Como lecionou Heleno Cláudio Fragoso (Lições de direito penal, volume II, Rio de Janeiro, Forense, 5ª edição, 1986, pág. 291), o primeiro requisito atende-se quando se apresenta ou se altera a realidade, de forma a proporcionar uma falsa representação da mesma. É a imitação ou a mutação da verdade. No primeiro caso, o agente  forma ou fabrica a moeda ou o documento falso; no segundo, altera o documento ou a moeda genuínos, assim como atende-se a esse requisito quando alguém formula uma declaração falsa (artigo 299, 300, 301, etc), caso em que (como se tem do exemplo da falsidade ideológica) o falso está não na falta de autenticidade, mas na falta de veracidade. De tal forma que o importante é que se apresente como verdadeiro ou autêntico o que é falso, o que proporciona uma falsa representação da realidade. Essa a primeira característica do crimen falsi.

A segunda característica é a relevância jurídica da falsidade, que se expressa na possibilidade de dano. Isso porque não se pune o falso inócuo que não envolve qualquer dano ou perigo de dano.

Por fim, o agente deverá ter consciência de causar o dano a que se refere a ação delituosa.

É certo que o Código Imperial seguiu o sistema do código penal francês, sem classificação sistemática dos crimes desta espécie. Por sua vez, o Código Penal de 1890, no título VI, Parte Especial, previa os crimes contra a fé pública, incluindo, porém, observem, o falso testemunho e a denunciação caluniosa, que, em verdade, são crimes contra a Administração da Justiça.

Bem disse ainda Heleno Cláudio Fragoso (obra citada, pág. 292),  que nem todos os crimes de falso estão entre os crimes contra a fé pública, estando entre os crimes patrimoniais alguns delitos que têm características de crimes de falso, como a emissão de cheques sem fundo sem suficiente provisão de fundos (artigo 171, § 2º, nº VI), a duplicata simulada (artigo 172), a emissão irregular de conhecimento de depósito ou warrant (artigo 178). O registro de nascimento inexistente é crime contra a família (artigo 241). Isso porque a legislação atribuiu uma maior importância a ouros aspectos do fato incriminado.

Seja como for, o Código Penal, no titulo X, divide a matéria com relação ao crime de falso em quatro capítulos:

  1. Moeda falsa;
  2. Da falsidade de títulos e outros papeis públicos;
  3. Da falsidade documental;
  4. De outras falsidades.

 O presente artigo tem o modesto propósito de estudar o crime de moeda falsa, que contempla: moeda falsa (artigo 289); crimes assimilados à moeda falsa (artigo 290); petrechos para a falsificação de moeda (artigo 291) e emissão de títulos ao portador sem permissão legal (artigo 292) e ainda estudar outros crimes descritos em legislação extravagante.


Ii – CRIME DE MOEDA FALSA

Observemos a redação do artigo 289, seu caput, parágrafos.

Art. 289 - Falsificar, fabricando-a ou alterando-a, moeda metálica ou papel-moeda de curso legal no país ou no estrangeiro:

Pena - reclusão, de três a doze anos, e multa.

Nas Ordenações Filipinas, no Livro V, tít. 12, se dispunha: “ Moeda falsa he toda aquella, que não he feita per mandado do Rei, em qualquer maneira que se faça, ainda que seja feita daquella materia e forma, de que se faz a verdadeira moeda, que o Rei manda fazer: porque conforme a Direito ao Rei somente pertence faze-la, e a outro algum não, de qualquer dignidade que seja. E por moeda falsa ser cousa muito prejudicial na Republica, e merecem ser gravemente castigados os que nisso forem culpados, mandamos que todo aquelle, que moeda falsa fizer, ou a isso der favor, ajuda ou conselho, ou for dello sabedor, e o não descobrir, morra morte natural de fogo, e todos os seus bens sejam confiscados para a Coroa do Reino”.

A matéria foi contemplada no Código Imperial, no artigo 173, configurando uma forma agravada “ se a moeda não for fabricada da matéria ou com o peso legal”. A pena era de prisão, com trabalho, por um a quatro anos, além de multa. Por lei de 3 de outubro de 1833, a pena passou a ser de galés para a Ilha de Fernando de Noronha, pelo duplo da pena de prisão cominada pelo Código criminal (artigo 8º). Na reincidência a pena passou a ser de galés perpétuas.

O Código de 1890, já na República, previa este crime no artigo 239, introduzindo outras modalidades do fato delituoso, com as alterações feitas pelos Decretos 2.110, de 30 de setembro de 1909, e 4.780, de 27 de dezembro de 1923.

Observe-se pela gravidade das penas aplicadas, hoje abominadas no direito penal moderno, a resposta estatal a tal crime, que foi objeto da Convenção de Genebra, de 20 de abril de 1929, Convenção ratificada pelo Brasil pelo Decreto 3.074, de 14 de setembro de 1938.

A objetividade jurídica do crime é a veracidade probatória.

 O sujeito ativo pode ser qualquer pessoa, daí ser um crime comum. Porém se se tratar de funcionário público, diretor, gerente ou fiscal de banco de emissão que fabrica, emite ou autoriza a fabricação, a conduta recai no artigo 289, § 3º, que comina pena agravada no limite Maximo de quinze anos, e não doze.

Sujeito passivo  é a coletividade.

Estudemos a conduta.

A conduta se perfaz com o fabricar, alterar a moeda de curso legal no país, ou no estrangeiro.

Fabricar é a contrafação da moeda metálica ou do papel-moeda. Contrafazer é criar uma coisa totalmente similar à outra, de maneira a levar ao engano sobre a sua essência.

Mas, para a imitação da moeda, não se faz necessário que ela seja perfeita. A conduta se perfaz quando o agente consiga dar-lhe, através de um artifício material, a aparência de uma moeda de curso legal, como já ensinou Manzini (obra citada, pág. 445).

Alterar a moeda é modificá-la para que venha a apresentar um maior valor, seja pela limadura, raspagem ou serradura.

É indiferente o processo de fabricação, seja litografia ou off-set; cunhagem; alteração.

É indiferente à lei, a quantidade, a qualidade da moeda falsificada, seja real, dólar, euro. Mas é indispensável que se trate de moeda de curso forçado ou legal, que se traduz na obrigatoriedade de aceitação da moeda nas relações econômicas.

 Aquele que fabricar moeda rara, fora de circulação, poderá incorrer em crime de estelionato. Mas, Heleno Cláudio Fragoso (obra citada, pág. 299) nos ensina que a modificação do dinheiro recolhido, para reintroduzi-lo em circulação, configura a fabricação. Outra questão a estudar  diz respeito a dúvida se  a conduta, consubstanciada    na aposição de números e de letras de cédulas verdadeiras, no recorte e na colagem de fragmentos de papel-moeda, compondo outra, de maior valor,  se representaria no crime previsto no artigo 289 (alteração da moeda) ou ainda do artigo 290 (formar cédula).

Para Magalhães Noronha (Direito Penal, volume IV, São Paulo, Saraiva, 1986, pág. 106), na linha de Nelson Hungria (Comentários do Código Penal, volume IX, pág. 211), trata-se de alteração, uma vez que a cédula já existia e é modificada pela substituição de números e letras. Isso difere da formação, artigo 290, criação de cédula com fragmentação de outras, já sem valor (RTJ 33/506).

O crime é de perigo, com a fabricação da moeda, independentemente de ser ela posta ou não em circulação. Se o agente desistir de forma voluntária da falsificação deverá responder pelo crime do artigo 291 (petrechos para falsificação), que tem natureza residual e subsidiária. Mas admite-se a tentativa, pois ele pode ser verificado de forma fragmentária.

E se a falsidade for grosseira? O crime será impossível, por absoluta impropriedade do objeto (artigo 17), afirma Paulo José da Costa Jr. (obra citada, pág. 336). Mas pode o crime ser visto como estelionato (artigo 171), se conseguir iludir alguém, mesmo sendo grosseira a contrafação, como afirmam, de forma correta, Alberto Silva Franco e outros (Código penal e sua interpretação jurisprudencial, São Paulo, 1980, volume IV, titulo I, pág. 812, n.8). Ocorre o estelionato quando a moeda é grosseiramente falsificada, sendo insuscetível de iludir uma pessoa de diligência ordinária (RTJ 85/430; RF 148/365).

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Exige-se o dolo genérico, vontade livre e consciente de fabricar moeda, imitando ou alterando a verdadeira, sabendo o agente que procede ilegitimamente, criando uma situação de perigo, não se exigindo uma finalidade de se obter um proveito econômico, ou de introduzir a moeda em circulação (dolo especifico).


III – CIRCULAÇÃO DE MOEDA FALSA

§ 1º - Nas mesmas penas incorre quem, por conta própria ou alheia, importa ou exporta, adquire, vende, troca, cede, empresta, guarda ou introduz na circulação moeda falsa.

Trata-se de crime de ação múltipla, tipo misto alternativo, que deve, na enumeração apresentada, ser interpretado de forma taxativa. Seja como for há a prática de um único crime, no fato de se adquirir a moeda falsa e introduzi-la em circulação.

Importar é introduzir no País. Exportar é retirar do país para o estrangeiro. Vender é alienar a moeda falsa. Trocar é permutar. Ceder é transferir a terceiro a moeda, a qualquer título. Emprestar é ceder provisoriamente, sob condição de ser restituída a própria coisa. Guardar significa ter o agente a moeda  consigo, em depósito ou sua disposição. Introduzir na circulação significa passar a moeda a terceiro de boa-fé, utilizando-se dela para adquirir alguma coisa.

O objeto material é a moeda falsa, nacional ou estrangeira.

O Supremo Tribunal Federal decidiu que o uso de moeda falsa não comporta aplicação do principio da insignificância, como se lê de decisão da Segunda Turma, por unanimidade de votos, no HC 112.708, Relator Ministro Ricardo Lewandowski,  impetrado pela Defensoria Pública da União em favor de irmãos condenados, no Maranhão, por colocar em circulação duas notas falsas de R$50,00 (cinqüenta reais). A esse propósito, ainda decidiu o Supremo Tribunal Federal, na matéria, na mesma linha, no HC 105.638/GO, Relator Ministra Rosa Weber; no HC 111.266/SP e ainda no HC 97.220/MG, Relator Ministro Ayres Brito.

O tipo penal, como se vê, não tem como pressuposto a ocorrência de um prejuízo econômico objetivamente quantificável, mas a proteção de um bem intangível, que corresponde à confiança que a população deposita em sua moeda, colocando em risco a credibilidade do sistema financeiro, o que impede o reconhecimento da atipicidade da conduta, mesmo que não tenha resultado em prejuízo de monta.

Totalmente irrelevante que a moeda falsa seja passada a terceiro de boa-fé  em pagamento de um negócio que pode ser moral ou imoral, lícito ou ilícito, não importando que o terceiro que recebe a moeda esteja a praticar uma conduta ilícita, como quando o tóxico é adquirido com moeda falsa. Até mesmo é indiferente se a moeda é dada como esmola.

A moeda falsa, repita-se, deve ser apta a enganar, pois a falsificação rude pode ser configurada como estelionato.

Se o passador da moeda houver participado da falsificação, auxiliando o agente principal, responde pelo crime previsto no artigo 289 , em coautoria, a teor do artigo 29 do CP.

É admissível a forma tentada.

Na modalidade de guardar é crime permanente, podendo comportar a forma omissiva, não deixando de ter consigo, ou em depósito a moeda, falsa, após ter realizado uma conduta comissiva, passando a ter a coisa em depósito.

O elemento subjetivo é o dolo genérico, que consiste na vontade consciente de praticar qualquer das modalidades referenciadas.


IV – CIRCULAÇÃO DE MOEDA FALSA RECEBIDA DE BOA-FÉ

§ 2º - Quem, tendo recebido de boa-fé, como verdadeira, moeda falsa ou alterada, a restitui à circulação, depois de conhecer a falsidade, é punido com detenção, de seis meses a dois anos, e multa.

O tipo penal privilegiado era previsto no Decreto 4.780, 27 de dezembro de 1923, que passou a integrar a Consolidação das Leis Penais, artigo 242.

O sujeito ativo é qualquer um que não seja o falsificador, ou pessoa que houver recebido a moeda que sabe falsa. Sujeito passivo é a pessoa que recebe a moeda falsificada.

O objeto material é o mesmo das hipóteses anteriores. O agente recebe, de boa-fé, como verdadeira moeda falsa ou alterada, mas a restitui à circulação, depois de conhecer a falsidade.

É crime doloso que admite a tentativa.


V – FABRICAÇÃO OU EMISSÃO IRREGULAR DE MOEDA

- É punido com reclusão, de três a quinze anos, e multa, o funcionário público ou diretor, gerente, ou fiscal de banco de emissão que fabrica, emite ou autoriza a fabricação ou emissão:

I - de moeda com título ou peso inferior ao determinado em lei;

II - de papel-moeda em quantidade superior à autorizada.

Salvaguarda-se a moeda metálica, na primeira modalidade. A segunda modalidade envolve a chamada “ peste circulante”, de nefastas consequências. Em ambas as hipóteses é crime formal, que se consuma com a prática da ação, independentemente do resultado, exigindo a forma dolosa (dolo genérico).

Trata-se de crime formal que se consuma com a fabricação ou, conforme o agente, com a simples autorização, sendo possível a tentativa. No entanto, exigindo para a consumação a fabricação ou emissão, tem-se a lição de Nelson Hungria (obra citada, pág. 226) e ainda de Magalhães Noronha (obra citada, volume IV, pág. 175).

Interessante a lição de Heleno Cláudio Fragoso (obra citada, pág. 314) quando diz que poderá haver concurso material se o agente praticar, a seguir, qualquer outro crime com a moeda produzida irregularmente, seja peculato, estelionato, como exemplo. Porém leve-se em conta que o crime de moeda falsa contém os elementos do estelionato, tendo classificação especial em virtude do interesse público em reprimir a fraude e absorvendo os delitos patrimoniais (RF 129/550, 183/315).


VI – DESVIO E CIRCULAÇÃO INDEVIDA

§4º - Nas mesmas penas incorre quem desvia e faz circular moeda, cuja circulação não estava ainda autorizada.

 O elemento material do crime é desviar e fazer circular. Um tipo misto que exige ambas as modalidades para seu aperfeiçoamento. O agente desvia, retirando o dinheiro de onde se encontrava, e o faz circular antes da data autorizada.

Como acentua Nelson Hungria (obra citada, pág. 226) “ o desvio a que se refere o texto legal deve preceder o antecipado lançamento da moeda na circulação”.

O desvio sem ocorra a circulação se caracteriza em tentativa.

O crime é comum.

O elemento subjetivo é o dolo.  


VII – COMPETÊNCIA

Os crimes previstos no artigo 289, violando a fé pública da União, seu patrimônio e interesses, devem ser apreciados pela Justiça Comum Federal (RF 133/239). Ainda é da Justiça Federal (artigo 109, V, da CF) a competência para instruir e julgar crimes de falsificação de moeda estrangeira, como ainda se vê da leitura do artigo 3º da Convenção promulgada pelo Decreto nº 3.074, de 14 de setembro de 1938. Por sua vez, a competência da Justiça Comum Estadual existirá se o papel não tiver curso legal e a falsificação for apenas para fins numismáticos ou mero elemento de fraude comercial ou estelionato (RT 444/414).


VIII  – CRIMES ASSIMILADOS A MOEDA FALSA

Art. 290 - Formar cédula, nota ou bilhete representativo de moeda com fragmentos de cédulas, notas ou bilhetes verdadeiros; suprimir, em nota, cédula ou bilhete recolhidos, para o fim de restituí-los à circulação, sinal indicativo de sua inutilização; restituir à circulação cédula, nota ou bilhete em tais condições, ou já recolhidos para o fim de inutilização:

Pena - reclusão, de dois a oito anos, e multa.

Parágrafo único - O máximo da reclusão é elevado a doze anos e multa, se o crime é cometido por funcionário que trabalha na repartição onde o dinheiro se achava recolhido, ou nela tem fácil ingresso, em razão do cargo.

Qualquer pessoa pode cometê-lo.

São varias as condutas previstas:

  1. Formar cédula, nota ou bilhete representativo da moeda com fragmentos de verdadeiros, imprestáveis ou não, quando o agente usa, justapõe fragmentos de cédulas, formando uma moeda falsa com aparência de autêntica; com pedaços forma uma. Já se entendeu que a simples aposição de números ou dizeres de uma cédula verdadeira em outra, configura o crime previsto no artigo 290 do CP (RT 175/515, dentre outros);
  2. Suprimir sinal indicativo da inutilização da cédula, quando o agente apaga, elimina o sinal, por lavagem, raspagem, utilização de substâncias químicas, preenchimento de perfuração, por exemplo;
  3. Restituição à circulação do papel nas condições já mencionadas (formado por fragmentos ou com o sinal indicativo de inutilização  suprimido).

Praticando o agente duas condutas só responde por um crime.

Por sua vez, não prevendo a lei outras condutas, aplica-se o artigo 180 (receptação) para aquele que recebe, a qualquer título (importação, aquisição, compra, empréstimo, cessão, troca, guarda em nome próprio ou em nome alheio).

O tipo penal é doloso. Para Júlio Fabbrini Mirabete (Manual de direito penal, volume III, São Paulo, Atlas, 22ª edição, pág. 189), na primeira conduta o tipo está consumado com a simples formação do papel-moeda, independente de qualquer lesão, exigindo-se, porém, a imitatio veri. Na segunda modalidade, a consumação ocorre com a supressão do sinal indicativo de inutilização e na terceira, com a entrada da moeda em circulação.

O crime é plurissubsistente, podendo haver tentativa. 

O parágrafo único, do artigo 290, prevê um crime com violação dos deveres do cargo, um crime especial que apenas pode ser cometido por funcionário público (artigo 327 do CP). Ainda cita-se Mirabete (obra citada, pág. 190), que considera indispensável para a existência desse crime funcional que a conduta seja praticada na repartição onde o agente trabalha, normalmente o local onde o dinheiro é recolhido, ou que, não o sendo, possa ingressar facilmente no local em decorrência das suas atividades no cargo em que ocupa. Porém, a referência à pena de multa de quarenta mil cruzeiros está prejudicada, a teor do artigo 2º da Lei 7.209/84.

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Sobre o autor
Rogério Tadeu Romano

Procurador Regional da República aposentado. Professor de Processo Penal e Direito Penal. Advogado.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ROMANO, Rogério Tadeu. Moeda falsa e outros crimes. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 20, n. 4310, 20 abr. 2015. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/32719. Acesso em: 19 mar. 2024.

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