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Direito à moradia sob a ótica da Justiça como equidade de John Rawls

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20/02/2015 às 12:28
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A obra Rawls é de grande relevância para se pensar e implementar o planejamento urbano e o direito à moradia, na medida em que une um sentido normativo de sua teoria com o lado político e moral, com vistas à garantia de que todos os cidadãos possam viver com dignidade.

RESUMO: O artigo aborda o direito à moradia sob a ótica da teoria da justiça de John Rawls, que apresenta princípios para nortear a atuação estatal de maneira que todos os indivíduos possam usufruir de bens básicos, entendidos como direitos fundamentais.

Palavras-Chave: John Rawls, Justiça como equidade, Direito à moradia.

SUMÁRIO: INTRODUÇÃO; 1 JUSTIÇA COMO EQUIDADE; 1.1 PREMISSAS DA TEORIA RAWLSIANA; 1.2 POSIÇÃO ORIGINAL E VÉU DA IGNORÂNCIA; 1.3 PRINCÍPIOS DE JUSTIÇA; 2. BENS PRIMÁRIOS E DIREITOS FUNDAMENTAIS; 3. O DIREITO À MORADIA, PLANEJAMENTO URBANO E A JUSTIÇA COMO EQUIDADE; 3.1 PRINCÍPIO DA DIFERENÇA E MORADIA DIGNA; CONCLUSÃO; BIBLIOGRAFIA.


INTRODUÇÃO

A preocupação com questões urbanas tem aumentado a cada dia, na medida em que muitos problemas são sentidos por toda a população, direta ou indiretamente. Este fato tem levado à discussão a respeito de temas como trânsito, transporte público, saneamento básico e moradia, pela sociedade e diversos meios de comunicação.

Cada um desses assuntos assume grande importância, sendo o direito à moradia um dos mais interessantes em virtude do grande contrassenso que o acompanha. Isto porque a sociedade brasileira atribui grande valor à moradia, no entanto, é um país em que, notadamente, grande parcela da população vive em habitações inadequadas (SOUZA, 2008, p. 22).

O número de habitações irregulares tem se multiplicado durante as últimas décadas em todas as regiões do Brasil. Estima-se, conforme os dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, obtidos por meio do Censo Demográfico 2010 (IBGE, 2010), que o percentual de domicílios que contam com alguma inadequação habitacional é de cerca da metade do total existente atualmente no Brasil. Mais de cinco milhões de moradias dignas precisam ser construídas em todo o país para suprir a demanda atual, de acordo com os dados da Pesquisa Nacional de Amostra por Domicílio, de 2012 (IPEA, 2013, p. 3). Segundo esta pesquisa, o estrato de renda mais prejudicado com a falta de habitabilidade é o que aufere até três salários mínimos mensais (IPEA, 2013, p. 4).

Essa situação envolve outras tão ou mais complexas quanto, como a reforma agrária, economia interna e externa, política governamental e movimentos sociais, além do processo de urbanização – entendido como o fenômeno em que há um movimento migratório das áreas rurais para os centros urbanos – intensificado no Brasil, em especial a partir do séc. XX.

Ao mesmo tempo, urge a necessidade de se buscar o desenvolvimento econômico nos centros urbanos, com a construção de shoppings centers, empreendimentos habitacionais e comerciais, loteamentos, condomínios fechados. Tendo em vista estes acontecimentos, é imperioso notar que, enquanto as questões ambientais já ganharam espaço, com a crescente preocupação nacional e internacional, além da pressão exercida por ONGS, sociedade civil e Estado, dentre outros atores, as urbanísticas muitas vezes são deixadas de lado ou ainda não recebem a devida atenção. O que não parece fazer muito sentido, na medida em que muitos assuntos classificados como ambientais são, também, urbanos.

Daí decorre a importância da análise do pensamento de John Rawls (2008) presente na sua obra Uma Teoria da Justiça, em que são elaborados princípios que, pela sua generalidade, podem ser aplicados em muitas sociedades ocidentais (democráticas e que garantam algum nível de liberdade aos seus cidadãos), e que, pelo seu conteúdo, introduzem uma forma de guiar a atuação estatal, tendo em vista os interesses de toda a sociedade, e em particular, o das classes sociais menos favorecidas. A justificativa para não se utilizar obras mais recentes do autor se dá em face da diminuição ou perda do caráter normativo contido em Uma Teoria da Justiça, no que se refere à igualdade socioeconômica.

A relevância da justiça rawlsiana se deveu à forma como a liberdade foi articulada com a igualdade, ao mesmo tempo em que compete, principalmente, ao Estado (guiado por princípios de justiça) se preocupar com a distribuição dos bens primários. Contudo, a atuação estatal é feita sem interferir nos planos individuais ou na concepção de vida que cada pessoa possui. Desta forma, há respeito ao indivíduo e se garante um mínimo para que ele tenha condições de perseguir seu plano de vida.

Esta é a razão pela qual a sua obra é de grande relevância para se pensar e implementar o planejamento urbano e o direito à moradia, na medida em que une um sentido normativo de sua teoria com o lado político e moral, com vistas à garantia de que todos os cidadãos possam viver com dignidade.

No primeiro capítulo, serão apresentados alguns conceitos constantes da obra Uma Teoria da Justiça, que se entende serem essenciais para a compreensão do pensamento de Rawls. Em seguida será introduzido o debate acerca dos bens primários como direitos fundamentais. Por fim, no terceiro capítulo serão abordadas algumas considerações sobre a Constituição Federal e o Estatuto da Cidade (lei federal 10.257/2001), além de algumas leis federais mais recentes, no que toca ao direito à moradia, à luz da teoria de Rawls. Ao final serão apresentadas as conclusões da presente pesquisa.

Para tanto, utilizou-se uma abordagem de natureza teórica. Já para a operacionalização deste método foram usadas as técnicas metodológicas de pesquisa bibliográfica, pesquisa documental e fichamento de textos.


1 JUSTIÇA COMO EQUIDADE

J. Rawls (2008) quer elaborar uma teoria da justiça que seja viável e alternativa às outras que dominavam, até então, a área da filosofia política inglesa. Para isso, é definido o papel da justiça, que para instituições sociais é a primeira virtude. Logo, não importa se estas instituições são ou não são eficientes e bem organizadas se forem injustas, caso em que devem ser abolidas ou reformuladas.

Em verdade, na época da publicação da obra Uma Teoria da Justiça, em 1971, o principal alvo a ser atingido era a concepção de justiça utilitarista[1] que predominava na teoria política anglo-saxã, cujo princípio pode ser lido como a maior felicidade do maior número possível de pessoas. Esta doutrina ética apresentava problemas, criticados pelo autor, como o fato de haver um conceito de justiça que andasse a reboque do bem (no caso, a felicidade) ou de considerar o bem-estar geral, mas não individual (ou o indivíduo como pessoa, diferente dos demais), o que pode levar a desvantagem de alguns, desde que traga vantagens para a maioria. Aqui, a sociedade é justa quando “as suas principais instituições estão organizadas de modo a alcançar o maior saldo líquido de satisfação, calculado com base na satisfação de todos os indivíduos que a ela pertencem”. O bem (felicidade) é definido independentemente do justo e o justo é aquilo que produz ou que eleva o bem a maiores patamares – é uma teoria teleológica. Porém, não importa como este bem está distribuído entre as pessoas ou as preferências dos grupos minoritários – o que pode prejudicar a publicidade, visto que este tipo de informação dificilmente será divulgado.

O que Rawls queria era fornecer uma alternativa a esta corrente de pensamento, em que o justo pudesse existir independentemente do bem e não estar subordinado a este – ou seja, uma teoria deontológica. Isto porque para o autor a justiça é uma virtude, cuja concepção mais racional é aquela que todos aceitariam se estivessem em condições de igualdade uns para com os outros.

A contribuição de Rawls, como bem observa Fleischcker (2006), não foi a criação da ideia de justiça distributiva ou a introdução da igualdade no discurso liberal, algo já debatido (mesmo que o objetivo fosse criticar ou se resumisse a igualdade formal/perante a lei), ainda que de forma incipiente, ou por outras escolas. Desta forma, algumas ideias são apresentadas.

1.1  PREMISSAS DA TEORIA RAWLSIANA

A justiça assegura a cada individuo uma inviolabilidade que nem a maioria ou o bem-estar da sociedade pode violar, tais direitos estão, portanto, fora de negociações políticas ou de variações segundo interesses sociais. No entanto, em face da constatação de que as sociedades são marcadas por conflitos entre seus membros, existe a necessidade de um denominador comum a todos, que são os princípios de justiça. Eles irão servir de fio condutor para a escolha entre os diversos modos de organização social que definem essa divisão de vantagens: “são um modo de atribuir direitos e deveres nas instituições básicas da sociedade e definem a distribuição apropriada dos benefícios e dos encargos da cooperação social”.

O autor adota algumas premissas, como a que sua teoria será aplicada a uma sociedade bem ordenada e regulada por uma concepção pública de justiça (“aquela em que todos aceitam e sabem que outros aceitam os mesmos princípios de justiça e as instituições sociais fundamentais geralmente atendem a esses princípios”). Depois delimita as instituições essenciais, que são a constituição política e arranjos econômicos e sociais mais significativos, de onde se tem como exemplos a proteção da liberdade de pensamento e de consciência, mercados competitivos, a propriedade privada dos meios de produção e a família monogâmica.

O objeto principal da justiça é a estrutura básica da sociedade, cuja concepção[2] oferece um padrão por meio do qual se devem avaliar os aspectos distributivos dessa estrutura.

Nesse passo, só há justiça entre iguais. Entretanto, não se trata de uma justiça interpretada como igualdade (no sentido de igual tratamento), mas como equidade, a permitir tratamentos desiguais, desde que justificados. A justiça como equidade (ou como imparcialidade) quer associar a liberdade com a equidade, o que demanda a escolha dos princípios da justiça no acordo original por pessoas livres, racionais e em posição inicial de igualdade, para reger os acordos subsequentes. Cuida-se de uma doutrina derivada da teoria do contrato social, que ao invés de inaugurar determinada sociedade ou estabelecer uma forma de governo, ela deseja que o acordo original tenha como objeto a seleção de princípios de justiça. O que permite perceber que o estado de natureza da teoria tradicional é tratado aqui como a posição original.

1.2  POSIÇÃO ORIGINAL E VÉU DA IGNORÂNCIA

A posição original é uma situação hipotética composta por pessoas morais, cujo resultado de deliberação não será influenciado ou condicionado por contingências arbitrárias ou forças sociais.

Nessa posição originária, como instrumento de asseverar a igualdade entre todos, coloca-se o véu da ignorância sobre estes, o que não deixa que se conheçam seus valores, preferências, interesses, condições pessoais, etc. O acordo é feito entre pessoas éticas como seres racionais com objetivos próprios e capazes de ter um senso de justiça. Como todos são iguais, nem é necessário que se utilize regras de votação como a regra da maioria, o pacto é justo e até a unanimidade é viável, sem favorecer ninguém ou prejudicar grupos específicos.

A preferência por princípios de justiça, como o princípio da utilidade dentre outros deve ser justificada: como todos estão no mesmo patamar, a opção por um princípio como o da utilidade deve ser rejeitada, porque pode levar a exigência de sacrifício de direitos de um grupo em favor de uma maior felicidade ou satisfação de uma maioria. Como não se sabe quem faz parte do grupo que poderá ser sacrificado, adota-se uma postura cautelosa e prudente no momento da escolha, que não irá prejudicar ninguém.

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Na verdade se trata de um problema de deliberação, em que todos devem concordar racionalmente com uma concepção em detrimento de outra. O resultado dependeria, então, da quantidade de informações disponíveis, pois é plausível afirmar que na posição original, cada um escolherá um princípio de justiça que o beneficie. Aí entra, naturalmente, o véu da ignorância, pois a finalidade é reduzir complexidades e contingências que levam à discórdia, ao atrito. A justiça como equidade é uma justiça procedimental pura, em que não há um critério independente do justo, mas há um procedimento adequado para chegar a um resultado justo, que é a posição original sob o véu da ignorância.

Existem algumas limitações na adoção dos princípios, que decorrem da função de conciliação das reivindicações que as pessoas fazem umas às outras e às instituições. Os princípios, por exemplo, devem ser gerais; ter aplicação universal; ser públicos; e a concepção do justo deve impor uma ordenação às reivindicações conflitantes. A publicidade, em particular, é relevante para se contrapor ao utilitarismo e pela sua necessidade natural em uma teoria contratualista, em que as partes devem conhecer as concepções de justiça para saber como eles interferem nas instituições da vida social e nas suas próprias vidas.

Já o véu da ignorância é o ponto de partida equitativo (é uma espécie de igualdade forçada) para que o justo seja alcançado sem a interferência de contingências específicas, mas com a apresentação de informações genéricas. Ninguém sabe o seu lugar na sociedade, posição de classe, habilidades, inteligência, a sua concepção de bem, dentre outros. No entanto, elas entendem as relações políticas, base da organização social, e outros fatos genéricos. Aqui percebe-se a união entre a autonomia e a objetividade: as pessoas são autônomas quando agem conforme aquilo que elas próprias, enquanto seres éticos livres e racionais decidiram; e os princípios de justiça são escolhidos assim, de forma que na sua eleição não entram em debate questões subjetivas, como valores e preferências pessoais.

Assim, os princípios de justiça podem ser definidos com autonomia e objetividade.

1.3  PRINCÍPIOS DE JUSTIÇA

A autonomia lida aqui tem relação com a autonomia kantiana, que é vista quando uma pessoa age de acordo com os princípios escolhidos por ela como a expressão mais adequada possível de sua natureza, como um ser racional livre e igual. Os princípios de justiça mantêm relação com o imperativo categórico kantiano, que é um princípio de conduta que se aplica a uma pessoa em virtude de sua natureza de ser racional livre e igual, sem interesse particular.

Para guiar a discussão a respeito dos princípios de justiça, deve-se trazer à baila a distribuição dos bens sociais primários, que para o autor são o autorrespeito, autoestima, direitos, liberdades, oportunidades, renda, riqueza. Estes bens são aqueles que todos desejam, independentemente do que mais desejam ou de seus planos de vida. Ou ainda, podem ser compreendidos como os bens essenciais para que uma pessoa possa ter a vida que deseja, com dignidade.

Acontece que na vida em sociedade, uma série de fatores podem afetar a forma como estes bens são distribuídos, por força dos talentos naturais (inteligência, aptidão física, dentre outros), sociais (renda ou posição social), ou de características pessoais (idade, gênero, etnia), a conduzir a uma situação em que algumas pessoas concentrem os bens sociais e outros indivíduos fiquem desprovidos do acesso a estes bens. Então, os princípios de justiça devem reduzir as loterias naturais e sociais, ao mesmo tempo em que devem ser sensíveis à ambição individual ou ao esforço.

Em outras palavras, admite-se a desigualdade, desde que seja controlada, pois ninguém poderá ter todos os bens primários e todos os indivíduos farão jus a uma parcela destes bens. Ao passo que alguma concentração de bens sociais será permitida, devido ao mérito e esforço, respeitada a regra anterior, de que todos farão jus a alguma parcela.

Para apresentar os princípios de justiça desenhados pelo autor é importante ter em mente que outras regras devem acompanhar a sua interpretação e aplicação, como as regras de prioridade, na sua versão final, os princípios de justiça com as regras de prioridade são demonstrados por RAWLS (2008, p. 333) da seguinte maneira:

Primeiro princípio

Cada pessoa deve ter um direito igual ao mais abrangente sistema total de liberdades básicas iguais que seja compatível com um sistema semelhante de liberdades para todos.

Segundo princípio

As desigualdades econômicas e sociais devem ser ordenadas de tal modo que, ao mesmo tempo:

a) Tragam o maior benefício possível para os menos favorecidos, obedecendo às restrições do princípio da poupança justa,

b) Sejam vinculadas a cargos e posições abertos a todos em condições de igualdade equitativa de oportunidades.

Primeira regra de prioridade (A prioridade da liberdade)

Os princípios da justiça devem ser classificados em ordem lexical e portanto as liberdades básicas só podem ser restringidas em nome da liberdade.

Existem dois casos:

a) Uma redução da liberdade deve fortalecer o sistema total das liberdades partilhadas por todos;

b) Uma liberdade desigual deve ser aceitável para aqueles que têm liberdade menor.

Segunda regra de prioridade (A prioridade da Justiça sobre a eficiência e sobre o Bem-estar)

O segundo princípio da justiça é lexicalmente anterior ao princípio da eficiência e ao princípio da maximização da soma de vantagens; e a igualdade equitativa de oportunidades é anterior ao princípio da diferença. Existem dois casos:

a) Uma desigualdade de oportunidades deve aumentar as oportunidades daqueles que têm uma oportunidade menor;

b) Uma taxa excessiva de poupança deve, avaliados todos os fatores, tudo somado, mitigar as dificuldades dos que carregam esse fardo.

No que toca ao primeiro princípio, percebe-se que ele não é absoluto, mas suas restrições constituem hipóteses excepcionais, assim como se dá prioridade para as liberdades básicas, em detrimento da igualdade material. O segundo princípio, que se subdivide em dois, admite desigualdades sociais, desde que controlada, ou seja, não se trata de um sistema igualitário ao extremo ou mesmo de se conceber um Estado paternalista.

Após a escolha dos princípios de justiça, as partes irão estabelecer uma convenção constituinte e depois as leis e assim por diante, pois são decisões necessárias para reger uma sociedade complexa. Há um processo constituído de quatro etapas: a cada passo aumenta-se o conhecimento das contingências e os conflitos começam a surgir, o que já significa a adoção de regras, como a regra da maioria, para que se possa chegar a um termo. A primeira fase é a opção pelos princípios de justiça na posição original, a seguinte é a escolha de uma constituição (estágio da convenção constituinte) em que se nota o princípio da liberdade igual; a terceira é a fase da produção legiferante ou estágio legislativo, momento em que o princípio da diferença pode ser implementado; e a última é a execução das leis e a atuação do judiciário ou estágio de aplicação das normas. Este processo (que nem sempre é realizado desta forma) permite que se chegue a um acordo, pois há um terreno comum a todos, que começa na posição original.

Tendo em vista a forma como são articulados os princípios de justiça e a hierarquia entre eles, falta fundamentar a razão da prioridade da liberdade, que pode ser explicada pelo fato de que os interesses e objetivos fundamentais devem estar protegidos pelo primeiro princípio, logo, para Rawls a este deve ser dada a prioridade. Quanto aos meios que permitem alcançar interesses secundários, desconhecidos na posição original, é atribuído um lugar subordinado. O que resulta na impossibilidade de restringir liberdades em nome de bens ou fruições econômicas. Ao contrário, a restrição na sua liberdade infringe a base de autorrespeito em uma sociedade justa e enfraquece a sua posição política, o que destrói a autoestima. Pois é a posição da igual cidadania que atende à necessidade de status, tornando imprescindível a precedência das liberdades iguais, que significa igualdade na base social do respeito.

Algumas questões são interessantes. A prioridade para a liberdade pode ser interpretada como uma necessidade para uma sociedade que respeite o mérito e não force as pessoas a fazerem algo que não desejam, apenas para aumentar a fruição econômica. Por outro lado, o princípio da diferença, que permite a discussão sobre saúde pública, cotas em universidades públicas para pessoas de baixa renda, limitação da influência econômica em pleitos políticos, interferência do Estado sobre o território para a garantia da moradia digna, perdeu a força em obras posteriores, a ponto de Gargarella (2008, p. 222-248) falar em “novo Rawls”, que se preocupou mais com a viabilidade prática de sua teoria do que com o igualitarismo econômico.

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Sobre o autor
Gabriel Moraes de Outeiro

Doutor em Desenvolvimento Sustentável do Trópico Úmido pela UFPA. Doutorando em Direito pela UFPA. Mestre em Direito pela UFPA. Especialista em Direito Tributário pela Universidade Anhanguera-Uniderp. Professor e pesquisador da Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará (Unifesspa) Advogado.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

OUTEIRO, Gabriel Moraes. Direito à moradia sob a ótica da Justiça como equidade de John Rawls. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 20, n. 4251, 20 fev. 2015. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/36462. Acesso em: 24 abr. 2024.

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