Capa da publicação Proibição da leitura de memoriais em sustentação oral no STJ: e a independência do advogado?
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A independência do advogado e a tentativa de proibição da leitura de memoriais em sustentação oral no STJ

10/12/2015 às 10:03
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O STJ, ao apreciar a Proposta de Emenda Regimental nº 14, pretendeu proibir a leitura de memoriais por parte dos advogados na sustentação oral. Entretanto, houve rejeição, não tendo sido alcançado o quorum mínimo de 2/3. Nesse artigo faremos uma análise das implicações quanto à proposta.

Nos últimos dias, o meio jurídico (e notadamente os advogados) recebeu com enorme estranheza a tentativa por parte de alguns Ministros do STJ de proibir a leitura de memoriais pelos advogados no momento da sustentação oral.

Trata-se da Proposta de Emenda Regimental nº 14 que incluía a expressão “porém vedada a leitura de memoriais” à parte final do caput do art. 160 do Regimento Interno do STJ.[1]

Em verdade, os debates travados entre os Ministros demonstram uma séria preocupação no que diz respeito aos direitos e garantias dos advogados no exercício da profissão e, por consequência, dos seus representados.

Pois bem, tratou-se de proposta de autoria da ministra Nancy Andrighi que, felizmente, mereceu imediato rechaço do Ministro Humberto Martins – o qual, na ocasião, pediu vista regimental. Aliás, quando do retorno à pauta, a Comissão de Regimento Interno (presidida pelo Ministro Luís Felipe Salomão) acolheu o voto do Ministro Humberto Martins para retirar a expressão “vedada a leitura de memoriais”. 

Aliás, com o objetivo de ser fiel a esta explanação, segue excerto (retirado do site Migalhas) dos debates travados a partir deste momento[2]:

“(...) o Ministro João Otávio de Noronha proferiu discurso veemente a favor da proposição original de vedar a leitura de memoriais.

“Ninguém está cerceando o exercício da advocacia porque proíbe ler memorial. Tem quinze minutos para falar, pode consultar as notas, isso aqui não é casa de amador, é um Tribunal Superior.

Em qualquer Corte do mundo não se permite leitura de memorial. Aqui não se tira nenhuma liberdade – e a razão é muito simples, se é para ler memorial, que entregue antes ou na hora. Não podemos ficar quinze minutos, mais quinze minutos do outro, ouvindo o cidadão ler memorial que já recebi na véspera.

A sustentação oral é para destacar pontos importantes, tópicos capazes de influenciar a convicção do julgador. Não é um tempo meramente formal.

Não podemos nos intimidar porque a Ordem mandou um ofício, aliás hoje no almoço da Ordem dos Advogados o presidente perguntou exatamente “mas há quem leia memorial?". Eu disse "há e muitos".

A Constituição nos dá competência e atribuição de estabelecer as regras do nosso regimento interno. A sustentação oral é dirigida aos julgadores, e portanto temos sim legitimidade para determinar que seja feita oral, com consulta ampla a anotações, mas não se limite à leitura de memorial. Este destinatário final é o julgador, um ministro. Não é uma mera formalidade: é oportunidade que se dá ao advogado que com proficiência possa destacar tópicos capazes de sensibilizar a convicção do julgador.

Em Minas Gerais há muito era terminantemente proibida a leitura de memorial. Essa Corte está repleta de meninos ou de pessoas que estão se arvorando advogados no Tribunal Superior, que chegam aqui e não sabem o que fazer, nem como se dirigir aos ministros da Casa, e começam a ler memorial sem pé nem cabeça.

E na verdade vamos ter coragem de assumir: ninguém ouve leitura de memorial.

Não há ministro que tenha paciência para isso julgando a quantidade de processo que se julga no Brasil. Vamos cuidar da nossa realidade, vamos reconhecer nosso estado é de calamidade pública em matéria de julgamento de processo em razão de volume.”

Após, seguiu-se inúmeras manifestações dos ministros da Casa, seja a favor, seja contra a vedação de leitura dos memorais. Vejamos:

Francisco Falcão - "Um advogado que não sabe, durante quinze minutos, decorar sustentação oral, porque dá para decorar, não merece advogar no STJ. Eu sou oriundo da Ordem, mas acho que um advogado que não consegue decorar cinco minutos, dez minutos, uma sustentação oral, não merece advogar no STJ. E aqui é o segundo tribunal mais importante do país."

Mauro Campbell – "A minha preocupação é a avaliação de que documento está sendo lido. Então o presidente do órgão interromperá o advogado se ele estiver lendo alguma nota para indagar “deixe-me ver se são memoriais ou notas apartadas”? Como vai ser feito praticamente isto?"

Regina Helena Costa – "A preocupação do ministro Humberto é muito compreensível, na minha visão leitura de memorial nunca foi e nem nunca será sustentação oral. Esse é o problema, com vedação ou sem vedação no regimento, leitura de memorial não é sustentação oral. Eu penso que devamos exortar os advogados a se prepararem para vir fazer sustentação oral. Porque essa ideia não contribui em nada para melhorar a advocacia, não contribui em nada para melhorar a performance dos advogados durante a sessão, do Ministério Público também se for o caso. Leitura de memorial nunca será sustentação oral. O que se faz hoje é tolerar. É uma tolerância porque efetivamente sustentação oral não é. O que interessa é falar de cor. Nós temos que aprimorar as coisas."

Herman Benjamin - "A própria expressão [da emenda] está dizendo sustentação oral. A sustentação oral só é infungível quando não se lê o documento. Se lê o documento, eu posso trocar qualquer advogado, colocar outro lá, não altera a ordem dos fatores, porque vai ler o texto. E por fim estamos a proteger antes de mais nada o jurisdicionado e o jurisdicionado, seja da coletividade representado pelo MP ou advogado, não está bem representado quando se lê o memorial. Temos que ter sinceridade aqui entre nós e perante os que frequentam nosso tribunal. Nós não prestamos atenção a memoriais lidos da tribuna, esta que é a verdade. É um desserviço ao jurisdicionado nós fazermos de conta que é assim mesmo e lavarmos as mãos."

O ministro Humberto tornou a reiterar seu voto: “Vamos criar um dispositivo que afronta a lei Federal 8.906/94. O advogado, tanto a falar lendo como falando de forma de improviso, ele está falando oralmente, aí é uma questão de semântica. Quando o advogado está fazendo a leitura ele não está deixando de fazer oralmente. Nós inclusive assistimos palestras e conferências em que se diz que deve ser feita oralmente mas de forma escrita, até para ter melhor coordenação dos trabalhos. Nós assistimos os melhores advogados do Brasil, a exemplo de Paulo Bonavides e outros, de Ada Pellegrini Grinover, chegar aqui e fazer a leitura. “Ah, então é memorial?” “Não, estou fazendo a organização.” O ministro também está lendo seu voto, preparou seu voto e está fazendo dentro da organização de seu voto. A forma é oral. Agora eu vou perguntar, “é o memorial que foi distribuído?” Qual a justificativa? Primeiro, uma lei Federal que dá ao advogado a liberdade na escolha da sua sustentação na defesa de seu cliente. É matéria constitucional. Mantenho meu entendimento. Fico triste quando falamos de democracia e cerceamos a liberdade de se falar."

Chegada sua vez de votar, o ministro Og Fernandes, em tentativa conciliadora, propôs que a emenda contivesse em sua parte final a palavra “mera” – “sendo vedada a mera leitura de memoriais”

O presidente Falcão questionou o Pleno e todos logo aderiram à sugestão conciliadora. Até o ministro Raul Araújo levantar o questionamento: “Retorna ao problema que tínhamos inicialmente. Não se trata de deliberarmos sobre o que gostamos de ouvir ou não, é o que podemos ou não fazer, e não podemos interferir, violar a atuação dos advogados na tribuna. Regimento interno de tribunal não é lei. Teremos o ato normativo questionado perante o Supremo Tribunal Federal, porque estamos violando preceito fundamental.”

E pronto, estava a proposta novamente em debate entre os ministros da Casa. O ministro Falcão tornou a colher os votos, em que se seguiram mais algumas manifestações acerca do tema:

Sérgio Kukina – "Desde o tempo de minha atuação no Ministério Público do Paraná em que eu participava das sessões de julgamento, talvez em 80% das sustentações orais não lidas eu percebia que depois de cinco, dez minutos de exposição o advogado dirigia seu olhar só para mim, porque os julgadores de regra não prestavam atenção na sustentação oral. O que é muito ruim. No STJ não sei se muda muito. Para mim penso que a questão da sustentação ser escrita, lida, ou falada, acaba se tornando irrelevante, porque de fato se somos nós os destinatários, parece que nós não usufruímos dessa benesse de ouvir o advogado. Sempre me incomodou, esta circunstância, por isso hoje o quanto possível procuro prestar atenção, e não só quando temos lá o Cândido Dinamarco sustentando, a Teresa Wambier, enfim, advogados medalhões, como no Paraná, quando o René Dotti fazia sustentação oral, todo mundo para para ouvir René Dotti, sujeito fechava a Veja (naquela época não tinha internet) para escutar. Não vejo utilidade prática em estarmos discutindo aqui. Penso que estaria interferindo na atividade do advogado. É uma contingencia, se o cliente elegeu mal seu representante, faz parte do jogo processual."

Laurita Vaz – "Achei muito importante essa observação [do ministro Kukina]. Eu também fico extremamente preocupada e até constrangida quando vejo, principalmente na Corte Especial, colegas que começam a conversar, sai do local, vai conversar com outros colegas, e não presta nenhuma atenção naquilo que o advogado está falando. É uma forma de desrespeito ao advogado. Eu confesso que quando estou presidindo a Corte Especial e vejo colega fazendo isso fico extremamente constrangida e contrariada. É momento de nós refletirmos este nosso lado. Mas o aprimoramento é necessário."

Rogério Schietti – "Fico extremamente incomodado quando vejo advogado lendo memorial, mas me incomoda muito mais um improviso mal feito. Não vejo relação de lógica e consequencialidade entre uma sustentação oral efetivamente oral, de qualidade, e sustentação oral escrita de má qualidade. São relações que não se complementam. Não há meios eficazes de se fiscalizar se o advogado está lendo o memorial."

Nefi Cordeiro – "A opção da leitura é péssima para o advogado na sustentação, mas é lícita e não vejo como alterar pelo regimento interno. E o tratamento no processo penal isso é até comum. Não vejo como reprimir essa péssima opção do advogado."

Marcelo Navarro – "Como disse o ministro Schietti, o mal improviso pode ser pior do que uma boa leitura. É impossível fiscalizar o que ele está lendo, se é memorial, um papel que ele fez. E isso vai colocar o tribunal em xeque por menos que não se queira, porque os juízes leem seus votos? Claro, o juiz está trazendo 100 votos, mas vai dizer isso... E depois se for questionado no STF. Talvez valha a pena a gente ter um pouquinho mais de paciência. Até porque, sendo um tribunal da cidadania, o que eu vou fazer com a parte que não tem dinheiro para contratar um bom advogado, só tem dinheiro para contratar um advogado pobrezinho que não sabe improvisar, mas escreveu aquilo e vai trazer através da leitura? É triste mas nós temos que julgar para todos."

Nancy Andrighi – "Já que se falou o que incomoda para um e para outro, o que incomoda para mim é que eu rigorosamente leio todos os memoriais na noite anterior ao julgamento e me incomoda ouvir a leitura no dia seguinte. Se há incômodo, há incômodo de todas as formas. Se fôssemos tribunal de 2º grau, concordo com todas as colocações, especialmente a do colega Navarro. Mas somos uma Corte diferenciada, de uniformização. Aí a postura tem que ser diferenciada. Não estamos cerceando os advogados, estamos apenas aprimorando os advogados."

(Grifei)

A votação terminou empatada. Portanto, de forma bastante apertada, não alcançou o quorum qualificado de 2/3 para alteração do Regimento Interno do STJ.

Contudo, pelo que se vê dos posicionamentos dos Ministros do Tribunal da Cidadania, a tentativa de se imiscuir na atividade do advogado revela verdadeira afronta à independência funcional.

Se a sustentação oral será feita de improviso, decorada ou lida, trata-se de questão que compete unicamente ao causídico. O patrono da causa irá decidir se lhe convém, num determinado caso, proferir sustentação baseada em apontamentos escritos ou seguir roteiro mental.

Aliás, a diversidade de casos impõe que, muitas das vezes, leia-se memorial em questões extremamente detalhadas. Noutras, nas quais tenha que se referir apenas a princípios e situações hipotéticas, haveria maior facilidade para o exercício do improviso.

Enfim, não se pode conferir solução única para todos os casos. E mais: o modo de laborar no processo compete apenas ao advogado; faz parte da essência do seu trabalho a autonomia e a independência.

Voltando aos debates empreendidos pelos Ministros, parece-nos que os mesmos se sentem incomodados mais com a “qualidade” dos advogados do que com as suas sustentações. Observe-se que alguns deles utilizaram-se dos seguintes argumentos: “advogado pobrezinho que não sabe improvisar”, “Eu penso que devamos exortar os advogados a se prepararem para vir fazer sustentação oral”, “um advogado que não consegue decorar cinco minutos, dez minutos, uma sustentação oral, não merece advogar no STJ”, “Essa Corte está repleta de meninos ou de pessoas que estão se arvorando advogados no Tribunal Superior, que chegam aqui e não sabem o que fazer, nem como se dirigir aos ministros da Casa, e começam a ler memorial sem pé nem cabeça. E na verdade vamos ter coragem de assumir: ninguém ouve leitura de memorial.”.

Difícil de acreditar que tais ilações provieram de Ministros de uma das mais importantes Cortes deste país. De todo modo, afora os argumentos acima referidos, muitos outros Ministros sentiram-se simplesmente incomodados com a “perda de tempo” das sustentações orais, como se as mesmas fossem “irrelevantes”. Daí a solução seria “tolerar”.

Lembrando que, em que pese muitos dos Ministros serem provenientes da Advocacia ou do Ministério Público, mantiveram-se insensíveis quanto à questão em debate.

Com a devida vênia, precisamos recorrer a um ponto de partida anterior, “o advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei” (art. 133 da Constituição Federal).

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Toda e qualquer interpretação que se queira dar à possibilidade de ler ou não memoriais na sustentação oral deve ter como base a Constituição e a lei dela decorrente: o Estatuto da OAB.

A Lei nº 8.906/94 afirma que “são direitos do advogado: I - exercer, com liberdade, a profissão em todo o território nacional.”. Como se pode falar de liberdade se se tenta determinar o que pode e o que não pode ser feito na essência da atuação profissional?

Mais à frente, ressalta-se que “o advogado, no exercício da profissão, deve manter independência em qualquer circunstância.” (art. 31, §1º). E mais: “nenhum receio de desagradar a magistrado ou a qualquer autoridade, nem de incorrer em impopularidade, deve deter o advogado no exercício da profissão” (art. 31, 2º).

Ora, não importa a forma como a sustentação oral será proferida, ela deve ser feita do modo que o advogado entender melhor. Por mais que desagrade aos juízes ter que ouvi-las, isto não é argumento para impedir que elas sejam feitas.

Ademais, o advogado não atua em juízo para entreter os juízes, mas para convencê-los e trazerem os pontos de vista de seus representados.

Em verdade, parece-nos que alguns dos Ministros olvidaram o teor do art. 6º: “Não há hierarquia nem subordinação entre advogados, magistrados e membros do Ministério Público, devendo todos tratar-se com consideração e respeito recíprocos.”.

Ao se afirmar que os Ministros não prestam atenção a sustentações orais (sejam lidas ou não), diz-se claramente que os mesmos não estão exercendo com propriedade o seu mister de considerar todos os argumentos das partes. Ou seja, está havendo menosprezo com relação ao contraditório e à ampla defesa[3].

Ademais, não importa a idade nem a experiência do jurista, cada um tem a sua função e deve exercê-la com independência, autonomia e respeito mútuo. Assim como o advogado, o juiz/ministro pode ler o seu voto ou declará-lo de improviso, sendo aquele muito mais freqüente do que este.

Neste sentido, diante da esdrúxula proposta de disciplinar o exercício da sustentação oral, deve-se dizer ainda que compete à OAB disciplinar o exercício da profissão, e não ao Poder Judiciário. Aliás, com relação ao ponto específico da sustentação, nem mesmo a OAB poderia determinar manu militari o improviso aos advogados sem afrontar a Constituição e a lei.

Desse modo, a situação teve tão grave repercussão que o próprio Conselho Federal da OAB emitiu imediatamente a seguinte nota[4]:

“A Diretoria do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil e o Colégio de Presidentes de Seccionais, diante da decisão proferida pelo Superior Tribunal de Justiça quando da votação de proposta de alteração do Regimento Interno do STJ visando a impedir a leitura de peças por advogados durante as sustentações orais vem, de público:

Lamentar que medida de tal natureza tenha sido levada ao exame do Tribunal;

Reafirmar que a defesa é ampla e compete exclusivamente ao advogado escolher a forma da sustentação, se de improviso ou recorrendo aos memoriais;

Repelir os termos ofensivos à jovem advocacia brasileira, ressaltando que entre os jovens advogados e os mais antigos o único traço de distinção é o número de inscrição;

Saudar os Ministros que, fazendo valer a amplitude do direito de defesa e o elenco das prerrogativas profissionais, impediram que prosperasse a emenda atentatória ao livre exercício da advocacia.”.

Por fim, importante destacar o seguinte trecho do voto do Ministro Humberto Martins:

“A independência do advogado, portanto, desponta como elemento fundamental do regime jurídico da advocacia, sendo condição intrínseca ao exercício da advocacia. Por isso, é indispensável que o advogado esteja imune a toda forma de ingerência e interferência externa sobre sua atuação profissional, seja essa interferência oriunda de outros litigantes, de interessados no processo ou mesmo do órgão julgador. (...)

Com efeito, o advogado atua em nome da liberdade, protegendo os direitos fundamentais de seu cliente, e é nessa condição que luta contra todas as possíveis manifestações de arbítrio, daí por que a proteção da autonomia profissional do advogado e de sua independência no exercício de sua profissão é matéria diretamente ligada à efetiva tutela dos direitos fundamentais dos cidadãos. Por isso, uma discussão sobre restrições à autonomia e independência do exercício da advocacia não pode ser vista unicamente pelo ângulo das prerrogativas dos advogados. Na verdade, tal restrição refere-se ao exercício do direito da parte à ampla defesa e ao contraditório, por isso que qualquer restrição a seu exercício há que ser compatível com nosso regime jurídico-positivo, além de ser adequada, necessária e proporcional. (...)

De fato, a proposta de proibir a leitura de memoriais pelos advogados durante a sustentação oral é medida que representa uma indevida incursão do órgão julgador sobre o modo como o advogado irá realizar seu trabalho, e traz implícito um juízo de valor sobre a forma mais adequada de realizar a sustentação oral. Todavia, tal juízo me parece ser privativo do advogado. Aos tribunais cabe tão somente, no exercício de seu autogoverno, definir o tempo de sustentação e os casos em que ela será admitida, mas não o modo como o advogado deverá fazê-la. (...)

Finalizo reafirmando que o reconhecimento da necessária liberdade de atuação dos advogados e da Ordem dos Advogados do Brasil é imperativo para que possamos aprofundar a jornada em prol do aumento da democracia e da justiça social. Como disse Rui Barbosa, magistral jurista e Presidente do Instituto dos Advogados Brasileiros (lAB), antes da criação da Ordem: “A liberdade não é um luxo dos tempos de bonança. É, sobretudo, o maior elemento de estabilidade das instituições.”

Assim, seja por entender que a medida proposta não é compatível com o regime jurídico constitucional da advocacia, seja por entender que a proibição criaria uma restrição ao direito de defesa que não serviria para acelerar o julgamento dos processos, penso que deve ser suprimido do projeto de emenda regimental n. 14 a parte final do caput do art. 160, na parte que afirma “porém vedada a leitura de memoriais”.”.

Não fosse a sensatez do Ministro Humberto Martins ao divergir da proposta da Ministra Nancy Andrighi, talvez hoje os advogados não pudessem mais levar os memoriais prontos para serem lidos perante o STJ.

Amanhã poderíamos ter mais e mais restrições. Inclusive algumas delas até mesmo sugeridas por colegas advogados[5], como critérios de idade ou seleção prévia para habilitar advogados a fazer sustentação oral.

Enfim, por ser imprescindível para o bom e fiel patrocínio de uma causa, cabe unicamente ao advogado (independente e autônomo) discernir sobre a forma como proferirá a sua sustentação oral.


Notas

[1] Texto atual: “Art. 160. Nos casos do § 1º do artigo anterior, cada uma das partes falará pelo tempo máximo de quinze minutos, excetuado o julgamento da ação penal originária, na qual o prazo será de uma hora (art. 229, V).”

[2]http://www.migalhas.com.br/Quentes/17,MI230913,101048-STJ+tenta+proibir+que+advogado+leia+durante+a+sustentacao+oral

[3] Art. 5º. (...) LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes;

[4] http://www.oab.org.br/noticia/29071/oab-lamenta-exame-de-medida-restritiva-aos-advogados-pelo-stj

[5] http://www.conjur.com.br/2015-dez-07/alberto-toron-relevante-debate-leitura-sustentacao-oral

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Sobre o autor
Gentil Ferreira de Souza Neto

Procurador de Estado e Advogado. Mestre em Direito Constitucional. Especialista em Direito Público e Direito Constitucional.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SOUZA NETO, Gentil Ferreira. A independência do advogado e a tentativa de proibição da leitura de memoriais em sustentação oral no STJ. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 20, n. 4544, 10 dez. 2015. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/45218. Acesso em: 31 out. 2024.

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