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Exceção de pré-executividade

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11/03/2004 às 00:00
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1.O PROCESSO DE EXECUÇÃO

Ao tutelar os interesse dos cidadãos, o Código de Processo Civil prevê três formas básicas de tutela (além dos procedimentos especiais, os quais não são objetos de nosso estudo), ou seja: a tutela de conhecimento, executiva e cautelar.

O processo de conhecimento, visa a composição do litígio, através de uma sentença, dizendo o Direito ao caso concreto colocado sob a tutela jurisdicional. Entretanto, o Estado vale-se de outro procedimento para tornar efetiva a tutela jurisdicional representada pela sentença. Qual seja, o Processo de execução. Processo autônomo, no qual o órgão jurisdicional, tendo por base a sentença ou título executivo extrajudicial, emprega as medidas coativas necessárias para efetivação e satisfação do direito do credor, reconhecido na sentença ou no título extrajudicial. Segundo José Carlos Barbosa Moreira [1]:

"Enquanto o processo de conhecimento visa à formulação, na sentença definitiva, da regra jurídica concreta que deve disciplinar a situação litigiosa, outra é a finalidade do processo de execução, a saber, atuar praticamente aquela norma jurídica concreta."

De plano, ressalta-se o caráter coativo do processo de execução, o qual coloca o devedor em posição de sujeição aos preceitos do título judicial ou extrajudicial. A própria terminologia do Código de Processo Civil, utilizada no art. 566, demonstra o caráter imperativo do processo de execução, ao denomina-la "execução forçada". Contrariamente ao processo de conhecimento, na execução o devedor ou réu não é citado para se defender e sim para pagar no prazo de 24:00hs. Respondendo pelo cumprimento das obrigações estampadas nos títulos judicial ou extrajudicial "com todos os seus bens presentes e futuros, salvo as restrições estabelecidas em lei", tal como disposto no art. 591 do CPC.

Outrossim, o processo de execução pressupõe que a situação da obrigação já se encontre definida, através de um pronunciamento judicial resultante de uma sentença (título executivo judicial) ou de um título executivo extrajudicial definido por lei. O que faz ressaltar outro ponto capital do processo de execução, qual seja, a inexistência no mesmo do contraditório em si. No dizer de Sálvio de Figueiredo Teixeira [2], "o contraditório, na execução, é eventual. A defesa do executado se faz através dos embargos do devedor (arts. 736/747), em suas várias modalidades".Posição aceita pela maioria da doutrina, que nega veementemente a possibilidade do contraditório no processo de execução em si, admitindo-o tão somente na ação autônoma e incidental dos embargos.

Verifica-se então que a execução, no sentido de satisfazer a obrigação estampada no título, coloca o devedor em situação de completa sujeição ao processo, tendo mitigadas as suas possibilidades de defesa. Fato este que tem gerado inúmeras críticas da doutrina, posto que o executado, no processo de execução, se transforma em verdadeiro sujeito passivo, não havendo qualquer possibilidade de contraditório, a menos que possua patrimônio para garantir o juízo. Neste contexto é que surge a importância do estudo de mecanismos processuais que possibilitem ao executado se defender na execução, sem, contudo, comprometer a efetividade e eficácia do processo executivo e sem negar ao credor o que lhe é realmente devido.


2.A DEFESA DO EXECUTADO

Conforme dito alhures, o executado responde com seus bens pelas obrigações assumidas, sendo que o processo de execução visa conseqüentemente à satisfação do crédito mediante a apreensão dos bens do devedor. Embora mitigada suas chances de se opor à pretensão executiva, ainda assim, restam ao devedor três formas básicas de se contrapor à execução contra ele proposta, quais sejam: a) os embargos do devedor, expressamente previstos no CPC; b) A ação anulatória do título e; c) a chamada "exceção de pré-executividade"; objeto de nosso estudo.

2.1– OS EMBARGOS

O art. 736 do CPC dispõe que o "devedor poderá opor-se à execução por meio de embargos, que serão autuados em apenso aos autos do processo principal". Sendo esta a forma clássica de defesa do devedor diante da execução.

Melhor definição das características e conceitos do instituto em questão nos dá o mestre José Frederico Marques [3]:

"O atual Código de Processo Civil, fez dos embargos do devedor um processo separado, que se liga ao processo executivo pelos laços da conexão, mas que tem curso procedimental à parte. Trata-se de processo de conhecimento que tem por objeto sentença constitutiva destinada a desfazer, no todo ou em parte, o título executivo, ou anular a execução. Objeto imediato dos embargos, portanto, é a tutela jurisdicional por meio de sentença constitutiva; e objeto mediato, o título executivo cuja eficácia é atacada ou a relação processual executiva".

Conclui-se então que os chamados "embargos do devedor", podem ser definidos como a ação de conhecimento, incidental à execução, autônoma, destinada a defesa do executado com o fito de desconstituir o título executivo ou anular a execução.

Em suas diferentes modalidades, quais sejam: a) embargos do devedor propriamente ditos (art. 738); b) embargos à arrematação e à adjudicação (art. 746) e; c) por último os embargos do art. 744 do CPC, para retenção por benfeitorias. Há sempre requisitos a serem preenchidos pelo devedor a fim de discutir a legalidade da execução. Sendo que em qualquer modalidade, para serem admitidos os embargos, obrigatoriamente o devedor deverá garantir o juízo pela penhora ou depósito de bem.

Ressalta-se, de plano, a principal característica dos embargos, qual seja, somente podem ser manejados após seguro o juízo pela penhora ou pelo depósito, tal como disposto expressamente no art. 737 do CPC. Daí concluirmos que, quando dos embargos, para o devedor oferecer sua defesa obrigatoriamente terá que dispor ou gravar parcela de seu patrimônio, para somente após, poder discutir seu direito.

Sem adentrar no mérito da questão, ainda, desde já é de se concluir que a forma básica de defesa do devedor no juízo da execução, ou seja, os embargos, para ser exercida, pressupõe um gravame anterior ao seu patrimônio. O que, em determinadas e restritas ocasiões, frise-se, poderá ferir o direito a ampla defesa e ao devido processo legal constitucionalmente garantidos ao devedor. Posto que para exercer sua defesa, o devedor obrigatoriamente terá que gravar parcela de seu patrimônio. Caso não possua o devedor patrimônio, a execução poderá ser perpetuar indefinidamente, colocando em risco a própria segurança jurídica. Entretanto, tais indagações serão posteriormente abordadas. O importante por ora, é caracterizar os "embargos" como meio legítimo e usual para o devedor se opor a execução contra ele proposta.

2.2.– AÇÃO ANULATÓRIA

Além dos embargos, ao devedor resta também a possibilidade de se buscar a desconstituição do título ou anulação da execução mediante ações ordinárias de conhecimento.

Mediante tais ações, o devedor discutiria a qualquer momento a nulidade do título ou do ato jurídico que a ele deu causa. Havendo a possibilidade de se alegar qualquer causa de anulabilidade e defeito do título tanto por erro, dolo, coação, estado de perigo, lesão ou fraude, como por qualquer das causas de nulidade previstas nos incisos do artigo 166 do Código Civil. Com as amplas possibilidades do contraditório e produção de provas inerentes ao processo cognitivo.

Vê-se então que tais ações, acaso propostas, livrariam o devedor do pesado ônus imposto pelos embargos, qual seja, o de ter seu patrimônio onerado pela penhora ou depósito. Aqui, diferentemente dos embargos, não há qualquer requisito ou pré-condição necessária à discussão da obrigação. Bastando-se, tão somente, quando da propositura, ater-se às condições da ação e pressupostos processuais.

Outrossim, mesmo nos casos de títulos executivos judiciais, constituídos por sentença, ainda assim restaria ao devedor a possibilidade de manejar a ação rescisória, quando verificadas algumas das hipóteses elencadas nos incisos do art. 485 do CPC.

Por fim, resta ainda solucionar a questão do processo de execução já em curso. Posto que, mesmo que instaurada a competente ação ordinária autônoma, visando a desconstituição do título ou anulação da execução, ainda assim estaria o devedor sujeito aos efeitos do processo executivo. Entendemos que no caso em tela, caberia a aplicação do art. 273 do CPC, que trata da tutela antecipada, posto que no caso haveria o fundado receio de dano irreparável (expropriação do patrimônio). Entretanto, ainda neste caso o devedor teria que fazer prova inequívoca de seu direito, afim de convencer o juiz da verossimilhança de suas alegações.

Por outro lado, restaria também ao autor da ação anulatória requerer, em sede de medida cautelar, a suspensão do processo executivo. Portanto, em ambas as hipóteses, restaria ao devedor a possibilidade de, após proposta a ação anulatória, suspender até o julgamento final desta, o processo executivo.

02.03 – "EXECEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE".

Como terceira forma de defesa do devedor executado em juízo, podemos arrolar a chamada "exceção de pré-executividade". Embora não tenha previsão legal expressa, tem seus contornos delimitados pela doutrina e jurisprudência já sedimentada em nossos tribunais.

Por se tratar o tema em questão, do objeto principal de nosso estudo, será abordado pormenorizadamente, nos tópicos a seguir, onde procuraremos delinear seus contornos e aspectos básicos bem como trazer a baila as polêmicas acerca de seu correto uso. Posto que, por se tratar de instituto criado pela doutrina, embora sedimentado pela jurisprudência, ainda encontra resistências à sua aplicação.


03. O CONTRADITÓRIO NO PROCESSO DE EXECUÇÃO

O Código de Processo Civil vigente, expressamente separou a atividade jurisdicional cognitiva da executória, instituindo o processo de execução à parte do processo cognitivo. Desta divisão, resultou que a execução se presta para satisfazer a prestação inadimplida a que tem direito o credor, pressupondo que o Direito já tenha sido acertado através de uma sentença ou título executivo extrajudicial.

Resulta então, que a maioria quase absoluta da doutrina sustenta que na execução propriamente dita não existe o contraditório. Sendo que o mesmo somente seria admitido nos embargos, processo distinto, que pode ser instaurado somente após a garantia do juízo pela penhora ou depósito.

Inobstante tal posicionamento dominante na doutrina, forçosamente há que se admitir que o ordenamento jurídico não é estanque, sendo que todas as normas legais se inter-relacionam, compondo um todo. Portanto, em hipótese alguma poderemos analisar o processo executivo como uma norma especial à parte, desagregada do restante do ordenamento jurídico.

A Constituição Federal de 1988, de forma ampla, no inciso LV, de seu art. 5º expressamente assegura que "aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e a ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes". De plano constatamos que o legislador constitucional em hipótese alguma discriminou ou tirou da abrangência do dispositivo qualquer tipo de processo. Diferentemente das Constituições anteriores, ampliou a aplicação do contraditório a todo e qualquer tipo de processo ou procedimento, a propósito, anota Uadi Lammêgo Bulos [4]:

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"A partir de 1988, a inovação foi profunda e significativa, porque ampliou a abrangência do contraditório. Agora ele abarca, além do processo penal, o civil e o administrativo."

Desta feita, teremos que admitir que a partir da vigência da Constituição Federal de 1988, o contraditório passou a ser traço imperativo e fundamental em qualquer tipo de processo quer judicial ou administrativo. O que, logicamente, nos faz discordar da doutrina que nega a aplicação do princípio ao processo de Execução. Com o devido respeito às abalizadas opiniões contrárias, ousamos sustentar que há contraditório no processo de execução sim, como em qualquer outro processo. A propósito do tema, Renato Vasconcelos Magalhães [5], citando Dinamarco, expõe:

"Um procedimento em que uma das partes compareça como mero sujeito passivo não é sequer ‘processo’. Como tal só se pode considerar o procedimento, como se disse antes, desde que animado por uma relação jurídica (relação jurídica processual)."

Ao se admitir o contraditório no processo de execução, não significa que estaremos admitindo que o mesmo possa ser amplo, geral e irrestrito. Posto que, se desta forma fosse admitido, o processo de execução perderia por completo a sua própria essência e finalidade, qual seja, a de satisfazer concretamente o direito reconhecida na sentença ou no título extrajudicial. Em hipótese alguma seria admissível no processo de execução a rediscussão de toda matéria já acertada na sentença (a qual foi proferida em outro processo sujeito ao amplo contraditório) ou em um título líquido, certo, exigível, formal e legalmente completo (posto que, também, para formação do mesmo, entendemos ter havido ampla liberdade do devedor em discutir suas condições, portanto contraditório). Ao se admitir o contraditório na execução, obrigatoriamente teremos que o admitir de forma restrita, atinente a própria validade do processo ou do título.

A propósito do tema, o Prof. Humberto Theodoro Júnior [6], em excelente trabalho de sua lavra, preleciona:

"Os atos executivos, então, não se propõe a resolver problemas ligados á relação jurídica material, e, destarte, não servem para estabelecer qualquer tipo de contraditório a seu respeito. Mas as questões próprias da execução forçada, isto é, aquelas que dizem respeito aos requisitos e pressupostos dos atos executivos, devem ser ‘tratadas e solucionadas com observância do contraditório, tal como se passa no processo de conhecimento’".

Portanto, em conclusão, podemos afirmar que, tendo em vista a ampla aplicação do princípio da ‘ampla defesa’ e ‘contraditório’, é de se admitir que os mesmos também se aplicam ao processo executivo. Não de forma ampla, a ensejar a completa ineficácia do processo de execução, mas de forma restrita às condições, pressupostos e requisitos de validade da ação executiva e, de forma um pouco mais ampla, do título extrajudicial posto em execução.

Ademais, é de se reconhecer que o próprio CPC, no art. 598 dispõe que "aplicam-se subsidiariamente à execução as disposições que regem o processo de conhecimento". O que dá ampla possibilidade de aplicação ao processo de execução de todas as normas referentes aos pressupostos de constituição e desenvolvimento válido e regular do processo, perempção, litispendência, coisa julgada e qualquer questão referente às condições da ação.


04. "EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE" – CONCEITO E CARACTERÍSTICAS

Ao iniciar-se o estudo de qualquer instituto jurídico, é de primordial importância estabelecer-se, primeiramente, o conceito do mesmo. Daí retirando suas características, definições e delimitações dentro da Ciência Jurídica.

Conceito amplo e que encerra todos os aspectos do instituto da "exceção de pré-executividade", encontramos na ementa do acórdão proferido pela 1ª T. da 2ª C.Civ. do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás, no AI de n. 16.748-5/180, tendo como relator o Exmo. Desembargador Fenelon Teodoro Reis [7], vejamos:

"O incidente de exceção consiste na faculdade atribuída ao devedor, de submeter ao conhecimento do magistrado nos próprios autos da execução, independentemente de penhora ou embargos, em qualquer fase do procedimento, determinadas matérias suscetíveis de apreciação de ofício ou à nulidade do título que seja evidente e flagrante."

Também interessante, quanto ao conceito e objeto do instituto em questão, a doutrina de Danilo Knijnik [8], que a respeito da "exceção de pré-executividade", assim se pronuncia:

"(....)a ‘exceção de pré-executividade’ consiste na invocação do officium iudicis, tendo por objeto os pressupostos processuais, as condições da ação executiva e as objeções substanciais logicamente mediatizáveis pelo título executivo."

Analisando a definição e posicionamento acima citados, facilmente podemos oferecer uma definição acerca do instituo. A "exceção de pré-executividade" consiste na possibilidade do devedor, independentemente de penhora ou embargos, em qualquer fase do procedimento, submeter ao magistrado, nos próprios autos de execução, matéria atinente aos pressupostos processuais, condições da ação e nulidades ou defeitos do título executivo, desde que evidentes e flagrantes e suficientemente provadas de plano.

Ressalta-se a primeira e principal característica do instituto, ou seja, para ser manejado como meio de defesa no processo de execução independe de garantia do Juízo. Sendo que o devedor poderá manejar a "exceção de pré-executividade", sem que tenha de submeter seu patrimônio a gravame algum, podendo inclusive utilizar-se da "exceção" sem que possua patrimônio. Situação bem diversa dos embargos. Outrossim, diferentemente dos embargos, que somente podem ser interpostos no prazo de dez dias, a "exceção de pré-executividade" pode ser manejada, nos próprios autos do processo de execução, a qualquer tempo.

Por fim, outra característica marcante do instituto em questão, se refere a delimitação de seu campo de atuação. Diferentemente dos embargos, na "exceção de pré-executividade" somente poderá se alegar questões atinentes aos pressupostos processuais, condições da ação ou nulidades e defeitos flagrantes do título executivo. Posto que, na "exceção de pré-executividade" não se abre oportunidade para ampla produção de provas, sendo que as matérias argüíveis devem estar suficientemente demonstras. Tal imposição se faz necessária, tendo em vista que, se assim não o fosse, o instituto dos embargos à execução não teria fundamento em existir, levando o processo executivo como um todo a mais completa ineficácia.


05. HISTÓRICO

No curso da História, é relativamente recente a possibilidade de defesa do devedor no processo de execução. Em Roma, segundo ensinamento de Elio Longo, citado por Danilo Knijnik [9], a execução caracterizava-se:

"(....) pela natureza acentuadamente dispositiva e, pois, pelo predomínio da atividade da parte; redução, ao mínimo, da intervenção do órgão estatal; dificuldade, ou melhor, impossibilidade, no processo mais antigo, de identificar o objeto da execução com o objeto inadimplido e, daí, de assimilar o resultado final dessa à satisfação do direito violado; ao menos nos primórdios, características pessoais e sancionatórias da ação executiva em concomitância, no direito substancial, com um originário estado de indistinção da sanção civil daquela penal"

No Direito Germânico, também não foi diferente. Ao credor se atribuía inclusive a possibilidade de efetuar a "penhora de mão própria ou penhora privada, as quais ‘as leis, antes de proibir, incentivavam, embora outorgando-lhes alguma regulamentação’". [10]

De certa forma, o Direito Moderno absorveu os elementos e influências tanto de Roma, como do Direito Germânico. O que resultou em um processo baseado na certeza do direito pleiteado (título ou sentença), mas que fosse assegurado a efetivação deste direito, através de atos executivos que importem na efetivação sem a rediscussão do mérito.Embora acatando a tese de que na execução não se rediscute mérito, o Código somente prevê a possibilidade de rediscussão da obrigação mediante "embargos", após seguro o juízo. Ou seja, para que se admita qualquer atitude defensiva do devedor, obrigatoriamente o mesmo terá que, previamente, garantir o juízo através de seu patrimônio.

Conforme já dito alhures, o instituto da "exceção de pré-executividade", é criação recente da Doutrina. Sendo que com o correr dos estudos sobre a matéria, tem sido aceito pela jurisprudência da maioria dos Tribunais Pátrios. Segundo a maioria absoluta da doutrina, os primeiros estudos sobre o tema em nosso País, são atribuídos ao imortal mestre Pontes de Miranda, com base no Parecer n. 95 [11]. O qual versava "sobre pedidos de decretação de abertura de falência, baseados em títulos falsos, e de ação executiva em que a falsidade dos títulos afasta tratar-se de dívida certa."

O inigualável estudo, do qual resultou o parecer, se deve ao fato de que a Companhia Siderúrgica Mannesmann, teve vários títulos falsos, supostamente de sua emissão, executados. Bem como, pedidos de falência lastreados em títulos falsos, o que levou, após penhoras sucessivas, ao agravamento de seus depósitos bancários, com a conseqüente risco de paralisação de suas atividades.

No citado parecer o mestre sustenta com sua invejável capacidade argumentativa, a possibilidade de discussão, anteriormente a penhora, da "falsidade" do título. Com precisão, doutrina [12]:

"As letras de câmbio, as notas promissórias, os cheques e outros títulos cambiariformes são líquidos; porém a certeza há de resultar do que está escrito, de veracidade das assinaturas e da observância das exigências legais. Se o sacador ou aceitante da letra de câmbio, dentro das vinte e quatro horas, diz que a sua assinatura é falsa, ou que o nome é igual, ou parecido, porém não foi ele que se vinculou ao título cambiário ou cambiariforme, o juiz tem de decidir quanto a isso, porque está em exame a pretensão à execução, e não o mérito da causa."

Algumas resistências à aplicação do instituto surgiram, notadamente de Alcides de Mendonça Lima, citado por Ricardo Ludwig M. Pantin [13]. Argumenta, que ao se admitir a "exceção de pré-executividade", que:

"(....)será, sem dúvida, o caos do processo de execução, não mais protegendo o credor, como é de sua índole, para favorecer o devedor, em completa deturpação de sua acepção teleológica" (....) ‘a antecedência da penhora é conditio sine que non da atitude do devedor-executado.’"

A par das resistências, o instituto ganhou corpo na doutrina e Jurisprudência. Sendo defendido por inúmeros doutrinadores de peso, alguns pregando sua utilização de forma mais tímida, outros ampliando seu leque de atuação. Sendo que o tema tem inspirado inúmeros estudos e questionamentos, tanto que, nas palavras de Humberto Theodor Júnior [14]:

" a atenção da literatura processual brasileira, nas últimas décadas do século XX, voltou-se para um fenômeno de relevante significado prático: a possibilidade de o executado provocar o juiz a pronunciar-se sobre a ausência de requisitos legais da execução (....)", ou seja a chamada "exceção de pré-executividade".

Certo é que a "exceção de pré-executividade", inobstante os que negam sua aplicação, é largamente utilizada como legítimo recurso processual colocado à disposição do devedor para sua defesa no processo executivo. Sendo que a maioria dos Tribunais Pátrios já enfrentaram o tema, na absoluta maioria das vezes, reconhecendo a possibilidade de manejo do instituto em questão.

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Sobre o autor
Rômulo Resende Reis

Advogado, Pós-graduado em Direito Processual Civil.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

REIS, Rômulo Resende. Exceção de pré-executividade. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 9, n. 247, 11 mar. 2004. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/4936. Acesso em: 3 mai. 2024.

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