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A corrupção em fundos de pensão

27/07/2016 às 08:18
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Como no mensalão, no petrolão, o escândalo que começa a ser desvendado, envolvendo fundos de pensão, é mais um retrato do que se tornou a questão do financiamento de campanha.

Mais uma vertente de corrupção é objeto de apuração.

Mensagens apreendidas no celular de empreiteiro e ex-presidente da OAS demonstram indícios de reprodução do esquema de corrupção das fornecedoras da Petrobras em fundos de pensão e no FGTS com pagamento de propina ao PT e PMDB.

Haveria cobrança de vantagens indevidas por operações de capitalização das empresas do grupo OAS.

As suspeitas viriam de emissões de debêntures que tiveram adesão de bancos estatais, fundos de pensão e FI-FGTS.

Haveria aquisição de debêntures emitidas pelas empresas, que são adquiridas ou por bancos públicos, como a Caixa Econômica Federal, por meio do FI – FGTS ou BNDS –, ou por fundos de pensão. Com isso haveria pagamento de vantagem indevida aos responsáveis por indicações políticas, inclusive doações oficiais.

Não há dúvidas de que os fundos de pensão, órgãos de previdência privada, revelam-se verdadeiras fontes malignas de corrupção. O Partido dos Trabalhadores sabe que está ali uma verdadeira “mina de dinheiro”.

Estão eles dentro do sistema previdenciário brasileiro.

A previdência social está organizada em três modalidades: oficial (mantida pelo governo); complementar fechada (oferecida por empresas ou associações de classe); e complementar aberta (comercializada pelas instituições financeiras). A regulamentação da previdência complementar, baseada na constituição de poupança para garantir aposentadoria ou pensão de dependentes, iniciou-se em 1977 e foi aprofundada a partir de 1998.

No que concerne à natureza jurídica das entidades de previdência fechada, dir-se-á que elas, reguladas que eram pela Lei nª 6.435, não quando não adotarem a forma de fundações, serão associações regidas pelas normas do Código Civil referentes aos contratos da sociedade, submetendo-se, quanto a extinção, às normas do mesmo diploma legal.  A matéria hoje está disciplinada pela Lei Complementar 109, de 29 de maio de 2001, que determina que as entidades fechadas organizar-se-ão sob forma de fundação ou sociedade civil, sem fins lucrativos (artigo 31, § 1º).

Art. 31. As entidades fechadas são aquelas acessíveis, na forma regulamentada pelo órgão regulador e fiscalizador, exclusivamente:

I - aos empregados de uma empresa ou grupo de empresas e aos servidores da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, entes denominados patrocinadores; e

II - aos associados ou membros de pessoas jurídicas de caráter profissional, classista ou setorial, denominadas instituidores.

Sendo assim dispôs a lei que o regime de previdência complementar é operado por entidades de previdência complementar que têm por objetivo principal instituir e executar planos de benefícios de caráter previdenciário (artigo 2º).

A debênture é um título de dívida, a médio e longo prazo, que confere a seu detentor um direito de crédito contra a companhia emissora, de forma que quem nele investe se torna credor dessa companhia.

A interpretação que se tem do artigo 2º da Lei 6.385/76 nos leva a entender que são considerados valores mobiliários os seguintes papéis: ações, bônus de subscrição, bônus do Banco Central, Certificado de Depósito a Médio ou Longo Prazo, Certificado de Depósito Bancário, Certificado de Privatização, Cédula Pignoratícia de Debêntures, Debêntures, Depósito interfinanceiro, Letra de Câmbio, Letra do Banco Central; Letra do Tesouro, Letras Financeiras dos Tesouros do Estados e Municípios, Letras do Tesouro Nacional, Letra hipotecária, Nota do Banco Central, Nota Promissória, Nota do Tesouro Nacional, obrigações da Eletrobrás, Obrigação do Fundo Nacional de Desenvolvimento, Partes Beneficiárias, Quota do Fundo Nacional de Desenvolvimento, Recibo de Depósito Bancário, Título da Dívida Agrária e Titulo de Desenvolvimento Econômico.

Há, ainda, o entendimento de que ações e debêntures (títulos de crédito representativos de empréstimo que uma companhia faz junto a terceiros e que asseguram a seus detentores direito contra a emissora nas condições constantes da escritura de emissão) são títulos representativos de capital.

Noticia-se que, de acordo com a Procuradoria-Geral da República, as mensagens indicam que o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), e o tesoureiro afastado do PT, João Vaccari Neto, cobraram "vantagens indevidas" por operações de capitalização das empresas do grupo OAS.

Assim, no  caso de Cunha, a Procuradoria diz ter indício de que ele teria cobrado a OAS por intermediar uma operação de venda de R$ 250 milhões em debêntures para o Fundo de Investimento do FGTS.

Em diálogo no dia 9 de dezembro de 2012, Pinheiro informou a Cunha, por meio do aplicativo Whatsapp, que a OAS ainda não havia recebido R$ 250 milhões da venda de debêntures da Caixa e que o dinheiro só estaria liberado em fevereiro de 2013.

Mas os fatos não ficam somente por aí.

Acusado de receber propina de contratos do fundo de investimentos FIFGTS, o ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha foi passado para trás pelo menos uma vez. Foi o que afirmou Fábio Cleto, ex-vice-presidente da Caixa e ex-integrante do conselho do fundo. Segundo Cleto, o combinado era que Cunha ficasse com 80% da propina paga por empresas interessadas em obter financiamentos do FI-FGTS. Mas isso não ocorreu em um caso: na liberação de R$ 500 milhões para um projeto habitacional em Pernambuco, da empresa Moura Dubeux.

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Segundo Cleto, a trama foi articulada pelo doleiro Lúcio Bolonha Funaro. Em sua delação premiada, Cleto contou que, normalmente, ficava com 4% da propina, Funaro com 12% e Alexandre Margotto, sócio do doleiro, com outros 4%. Mas, no financiamento do projeto habitacional, Funaro combinou com os dois para não falarem nada a Cunha. Assim, os três dividiriam igualmente a propina, que totalizaria R$ 14 milhões. Funaro, porém, não cumpriu o acordo e Cleto recebeu apenas R$ 75 mil. Não restou alternativa a não ser aceitar calado.

Segundo o termo de depoimento prestado em abril deste ano, Cleto disse que “não cobrou de Funaro o valor restante da propina devida pois sabia que seria infrutífera a cobrança”.

No mesmo dia, ele relatou que outro compromisso não cumprido por Funaro, que prometeu R$ 1 milhão a Cleto para alterar um contrato firmado com a empresa de celulose Eldorado, do grupo J&F, o mesmo do frigorífico JBS. Pelos mesmos motivos — “seria uma cobrança infrutífera” —, Cleto não reclamou o calote sofrido.

Como no mensalão, no petrolão, o escândalo que começa a ser desvendado, envolvendo fundos de pensão, é mais um retrato do que se tornou a questão do financiamento de campanha que tornou o Congresso Nacional um verdadeiro “balcão de negócios”, nutrindo um câncer chamado corrupção. E, no rol da criminalidade, incluem-se corrupção passiva, corrupção ativa, lavagem de dinheiro, organização criminosa dentre outros delitos.

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Sobre o autor
Rogério Tadeu Romano

Procurador Regional da República aposentado. Professor de Processo Penal e Direito Penal. Advogado.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ROMANO, Rogério Tadeu. A corrupção em fundos de pensão . Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 21, n. 4774, 27 jul. 2016. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/50674. Acesso em: 9 mai. 2024.

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