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Como estimular a abertura de capital?

08/08/2004 às 00:00
Leia nesta página:

A questão surge num momento em que o mercado foi surpreendido com a redução sofrida pelos títulos da dívida pública brasileira em sua participação na carteira de recomendação do JP Morgan e do Citigroup.

A apreensão surge em razão de a avaliação das instituições tornar os papéis brasileiros menos atrativos e da confiança dos investidores na economia brasileira ficar abalada, estimulando uma fuga de capitais do país.

Aliado a isso, há a barreira levantada pelo alto custo para o registro e a manutenção da condição de companhia aberta, e o fluxo permanente de informações minuciosas a serem prestadas a CVM intimida os empresários.

Abaixo, algumas considerações sobre o ônus da abertura, manutenção e fechamento de capital para as empresas.


Quanto custa abrir o capital?

A empresa deverá arcar com diversos custos para atender às exigências legais, tais como:

- taxa de registro da emissão na CVM calculada em função do volume;

- serviços de assessoria jurídica;

- gastos com o prospecto de lançamento e com a divulgação da operação aos atuais acionistas e investidores potenciais;

- o custo de intermediação financeira, com a remuneração dos trabalhos de coordenação, eventual garantia e distribuição. A lei exige que a abertura de capital seja feita por meio de um intermediário financeiro – corretora de valores, banco múltiplo, banco de investimento ou distribuidora – que exerce o papel de coordenador da operação;

- deverá contratar uma auditoria externa;

- deverá proceder à adaptação do estatuto à nova condição da sociedade, em atendimento às exigências legais específicas, entre elas a constituição do Conselho de Administração, a criação do cargo de Diretor de Relações com Investidores, espécies de ações, suas preferências e vantagens e outros itens que se fizerem necessários;

- deverá providenciar o registro da companhia na Bolsa de Valores, se for o caso.

Um exemplo é a pesquisa feita pela Bovespa (Revista Bovespa edição outubro/dezembro/2003), em uma emissão virtual de R$ 150 milhões, onde os custos totais iniciais ficariam em torno de 3,76% do valor da operação.

Segundo a pesquisa, as principais despesas referem-se aos contratos de coordenação e distribuição de ações, (comissões pagas ao intermediário financeiro) que chegam a 90% do total de custos iniciais para abrir o capital.


Manutenção da condição de companhia aberta

Para a manutenção da condição de companhia aberta a CVM cobra uma taxa trimestral de fiscalização.

As empresas que listarem seus valores mobiliários em Bolsa de Valores devem pagar anuidade à mesma, de acordo com os valores fixados pelas próprias Bolsas.

Uma companhia aberta deve arcar com diversos custos para manter tal condição, tais como: divulgar trimestralmente informações financeiras, publicar seus balanços anuais e seus comunicados de fatos relevantes, auditoria externa, consultoria jurídica, manter um departamento de acionistas, deverá ter uma contabilidade ampliada e especializada para atender às exigências da CVM e vários outros.


Quanto custa

fechar o Capital?

O fechamento de capital por vezes é mais oneroso do que manter aberto.

Por determinação legal, os controladores precisam, ao decidir fechar o capital, fazer uma oferta pública de compra de ações detidas pelos sócios minoritários. Não é um ônus pequeno. Para fechar o capital é necessário que pelo menos 2/3 das ações sejam tiradas de circulação. Se os acionistas minoritários não aceitarem o valor oferecido e discordarem da proposta de fechamento de capital, a operação deve ser cancelada.


Conclusão

A resposta para que as empresas se sintam estimuladas a abrir o capital, então, está na criação de processos mais simplificados para registro das empresas e das emissões, na redução de custos e, principalmente, na simplificação do processo de prestação de informações. Deve-se adotar medidas que facilitem o acesso das empresas ao mercado de capitais.

É claro que para fomentar o mercado de capitais e torná-lo atraente, é necessário que os investidores tenham confiança na lisura dos procedimentos. É extremamente importante que exista credibilidade e transparência nas informações.

Mas o exagero de normas, custos altos, informações minuciosas e multas pesadas assustam as empresas. Elas ficam com receio de abrir o capital e não conseguir atender a todas as exigências legais e respectivas despesas. Isso não moraliza o mercado de capitais. Ao contrário, mata as companhias abertas e desestimulam outras a abrirem o capital.

Basta verificar o número de empresas que fecharam o seu capital e se retiraram do mercado ou olhar para as empresas que abrem o capital mas continuam "fechadas". Elas arcam com os custos para manter o registro de companhia aberta, mas não recorrem ao mercado para buscar recursos.

Verifica-se que o mercado de capitais brasileiro não representa alternativa de captação de recursos para a maioria das empresas. Elas dependem quase que exclusivamente de recursos próprios para giro e investimentos ou de empréstimos bancários.

Somente um grupo minoritário das maiores empresas utiliza recursos captados no mercado de capitais. Existem somente 759 empresas registradas na CVM e destas, apenas 369 são negociadas no pregão.

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De acordo com informações da CVM, foram concedidos somente 14 registros de companhia aberta no ano de 2003. Consta que 51 registros foram cancelados, 67 empresas estão inadimplentes e 177 estão com o registro suspenso.

É de interesse público o desenvolvimento de um mercado de capitais que possibilite a adequada transferência de recursos e viabilize o desenvolvimento econômico e social.

Isto aquece a economia do país, gera novos empregos e atrai novos investimentos nacionais e estrangeiros. É louvável estabelecer regras e aplicar punições aos faltosos a fim de moralizar o mercado de capitais e restabelecer a confiança por parte do investidor.

Mas vamos simplificar as exigências e diminuir os custos das empresas. Burocracia em excesso é um retrocesso. A Sabedoria nunca esteve nos extremos. Os extremos são radicais e rígidos. A Sabedoria está no ponto de equilíbrio.

Moralizar não é assustar com multas pesadas. Não é intimidar com excesso de burocracia.

Moralizar é conscientizar, estabelecer normas justas e que estimulem e facilitem a abertura de capital. É mostrar que todos serão beneficiados, empresários, investidores, empregados, enfim, a sociedade como um todo. É, acima de tudo, dar o exemplo.

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Sobre a autora
Mariangela Monezi

advogada em São Paulo (SP), atuante em direito Comercial, Direito Societário e Mercado de Capitais

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MONEZI, Mariangela. Como estimular a abertura de capital?. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 9, n. 397, 8 ago. 2004. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/5549. Acesso em: 6 mai. 2024.

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