Sumário:I – INTRODUÇÃO; II – OS PRINCÍPIOS DO PROCESSO ADMINISTRATIVO: Conceitos; Princípios; Princípios de Direito; Princípios do Processo Administrativo; Dos Princípios Administrativos 2.1. Enumeração dos Princípios; 2.2. Definição dos Princípios do Processo Administrativo; 2.2.1. Legalidade 2.2.2. Finalidade; 2.2.3. Motivação; 2.2.4. Razoabilidade e Proporcionalidade; 2.2.5. Moralidade; 2.2.6. Ampla Defesa e Contraditório; 2.3.7. Segurança Jurídica; 2.2.8. Interesse Público; 2.2.9. Eficiência; 2.3. Existiriam Princípios implícitos do processo administrativo? 2.4. Dos Princípios Supralegais do Processo Administrativo; III – CONCLUSÕES; Referência Bibliográfica.
I - INTRODUÇÃO
A Lei nº 9.784, de 29 de janeiro de 1999, trouxe novidades das mais salutares para o direito administrativo brasileiro, principalmente se considerarmos que já data de mais de uma década a promulgação da Constituição Federal em vigor, a qual engendrou, ou pelo menos deu maior ênfase, a princípios norteadores do direito processual, como, por exemplo, o do devido processo legal e da ampla defesa.
A referida lei teve o escopo de regulamentar o processo administrativo no âmbito da Administração Pública Federal, mormente no que concerne ao relacionamento das instituições federais com os administrados, o que significa que só é aplicável nesta esfera da administração pública federal, muito embora já existam vários Estados do País aplicando, dentro do seu campo de atuação, leis similares à federal.
Dispõe o artigo 1º da lei: "Esta lei estabelece normas básicas sobre o processo administrativo no âmbito da Administração Federal direta e indireta, visando, em especial, à proteção dos direitos dos administrados e ao melhor cumprimento dos fins da administração". Logicamente, se estabelece normas básicas, não impede que se expeçam atos administrativos infralegais esmiuçando o seu conteúdo, inclusive para adaptá-la às condições e circunstâncias de cada órgão administrativo.
No presente trabalho, contudo, não abordaremos todo o conteúdo da lei 9.784/99, e nos limitaremos aos aspectos que orbitam em torno da fixação dos princípios norteadores do processo administrativo.
Tais princípios, antes previstos apenas esparsamente na legislação pátria, e cujos delineamentos eram praticamente fruto de um esforço da doutrina e da jurisprudência, vieram na mencionada lei de forma expressa, o que de certa maneira consolida o pensamento então vigente sobre a matéria, trazendo mais segurança ao sistema jurídico-processual.
A Lei, em seu artigo 2º, enumera os seguintes princípios como norteadores do processo administrativo: legalidade, finalidade, motivação, razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, ampla defesa, contraditório, segurança jurídica, interesse público e eficiência.
Tentaremos, nas próximas linhas, delimitar os contornos básicos de cada princípio, e tentar responder à seguinte indagação: persistem ainda no sistema princípios do processo administrativo que não estejam expressamente arrolados na lei?
II - OS PRINCÍPIOS DO PROCESSO ADMINISTRATIVO
1.Conceitos.
Cabe, antes de adentrarmos o cerne do tema enfocado no presente trabalho, revermos alguns conceitos básicos e fundamentais ao estudo dos princípios administrativos.
1.1.Princípios.
Segundo o Miguel Reale, os princípios seriam o fundamento básico de todo um sistema, a "base de validade das demais asserções que compõem dado campo do saber" [1]. Para ele, "os princípios são ‘verdades fundantes’ de um sistema de conhecimento, como tais admitidas, por serem evidentes ou por terem sido comprovadas, mas também por motivos de ordem prática de caráter operacional, isto é, como pressupostos exigidos pelas necessidades da pesquisa e da "práxis" [2].
1.2.Princípios de Direito.
Partindo de tal noção, diríamos que os "princípios de direito" seriam enunciados "fundantes" do sistema jurídico de um país, norteando a aplicação e interpretação das normas que compõem esse sistema.
1.3.Princípios do Processo Administrativo.
Logicamente que os princípios que norteiam o processo administrativo seriam as premissas básicas desse sistema normativo, o conjunto de preceitos legais ou supralegais que embasam a aplicação da lei processual administrativa.
Seriam, na concepção de Celso Antônio Bandeira de Mello, "diretrizes de acatamento obrigatório para Administração" [3]. Enfim, configuram cânones gerais, e supralegais, pois decorreriam do próprio sistema jurídico.
Alguns, em sua maioria, já estão previstos na própria Carta Magna, sendo inerentes a todo o direito processual, englobando os demais ramos do processo, como o processo civil e o processo penal.
2. Dos Princípios Administrativos.
2.1. Enumeração dos Princípios.
Antes mesmo da lei que regulamentou o processo administrativo no âmbito federal, vários juristas já dedicavam boa parte dos seus estudos à identificação dos princípios norteadores do direito processual administrativo.
Celso Antônio Bandeira de Mello, por exemplo, entendia que seriam 11 (onze) os princípios do processo administrativos, os quais deitavam raízes no texto constitucional, pois não havia ainda legislação que tratasse especificamente do processo administrativo.
Na concepção do renomado autor, seriam estes os princípios do processo administrativo: princípio da audiência do interessado; princípio da acessibilidade aos elementos do expediente; princípio da ampla instrução probatória; princípio da motivação; princípio da revisibilidade; princípio da representação e assessoramento; princípio da lealdade e boa fé; princípio da verdade material; princípio da oficialidade; princípio da gratuidade e princípio do informalismo.
Maria Sylvia Zanella di Pietro, tratando do tema, adotou cerca de oito princípios: publicidade; oficialidade; obediência à forma e aos procedimentos; gratuidade; ampla defesa e do contraditório; atipicidade; pluralidade de instâncias; economia processual.
Veja-se que havia entre os autores uma certa uniformidade em relação à maioria dos princípios, restando uns poucos que eram adotados de forma exclusiva por um ou outro autor.
A Lei, entretanto, arrolou apenas onze princípios, na sua maioria já previstos no texto constitucional, o que significa que eram também coincidentes com os que eram adotados pela grande maioria dos autores anteriormente à sua vigência.
São estes os princípios expressamente aduzidos no artigo 2º da Lei nº 9.784/99:
a)legalidade;
b)finalidade;
c)motivação;
d)razoabilidade;
e)proporcionalidade;
f)moralidade;
g)ampla defesa;
h)contraditório;
i)segurança jurídica;
j)interesse público;
k)eficiência.
No mesmo artigo, traz ainda a lei alguns "critérios" que devem ser também adotados no processo administrativos, critérios estes que estariam umbilicalmente ligados a um ou alguns dos princípios constantes do dispositivo. Veja-se, por exemplo, o critério da "atuação conforme a lei e o direito", que seria uma decorrência do princípio da legalidade, conjugado com outros princípios, como o da moralidade, o da proporcionalidade, etc.
Outro exemplo seria o do critério constante do inciso VII do artigo 2º: "indicação dos pressupostos de fato e de direito que determinarem a decisão;". Ora, tal critério nada mais é do que a atuação prática do princípio da motivação das decisões administrativas.
É indubitável que a lei, neste ponto, ousou antecipar-se ao doutrinador, fixando de já os contornos básicos de cada princípio, a noção primária de cada um.
Vejamos, agora, de forma individualizada, uma noção de cada princípio constante da lei.
2.2. Definição dos Princípios do Processo Administrativo.
2.2.1. Legalidade.
O princípio da legalidade seria, pela concepção da própria lei, "atuação conforme a lei e o direito" (art. 2º, inciso I).
De tal enunciado depreende-se, sem muitas delongas, que não basta ao administrador obedecer à lei tão somente, devendo o mesmo pautar-se também, em seus atos e decisões, nos princípios gerais do direito administrativo processual.
Na verdade, trata-se do mesmo princípio constitucional e administrativo da legalidade, que seria, na concepção de Bandeira de Mello, "a consagração da idéia de que a Administração Pública só pode ser exercida na conformidade a lei e que, de conseguinte, a atividade administrativa é atividade sublegal, infralegal, consistente na expedição de comandos complementares à lei" [4].
É clássica a definição de Hely Lopes Meirelles para esse princípio: "A legalidade, como princípio da administração, significa que o administrador público está, em toda sua atividade funcional, sujeito aos mandamentos da lei, e às exigências do bem comum, e deles não se pode afastar ou desviar, sob pena de praticar ato inválido e expor-se à responsabilidade disciplinar, civil e criminal, conforme o caso" [5].
Significa, enfim, a total submissão do processo administrativo aos ditames da lei, tendo, pois, como escopo principal, coibir arbitrariedades e excessos dos administradores públicos.
2.2.2. Finalidade.
Consoante dispõe a lei (art. 2º, inciso II), o princípio da finalidade teria por escopo o "atendimento a fins de interesse geral, vedada a promoção pessoal de agentes ou autoridades".
O inciso XIII do mesmo artigo dispõe que o operador jurídico deve fazer a "interpretação da norma administrativa da forma que melhor garanta o atendimento do fim público a que se dirige, vedada aplicação retroativa de nova interpretação".
Para Celso Antônio Bandeira de Mello, o princípio da finalidade é inerente ao da legalidade, "pois corresponde à aplicação da lei tal qual é;" [6]. E complementa: "Assim, o princípio da finalidade impõe que o administrador, ao manejar as competências postas a seu encargo, atue com rigorosa obediência à finalidade de cada qual. Isto é, cumpre-lhe cingir-se não apenas à finalidade própria de todas as leis, que é o interesse público, mas também à finalidade específica abrigada na lei a que esteja dando execução" [7].
Tal princípio, portanto, teria por cerne o coibir a atuação arbitrária dos administradores públicos, evitando que os mesmos pratiquem atos apenas para proveito pessoal e com desvio de finalidade. A lei não deve atender aos anseios pessoais do administrador, e sim ao interesse público. Com efeito, a finalidade precípua da lei é o interesse público, e é com tal desiderato que devem ser praticados os atos e decisões administrativas.
Não cabe, no âmbito administrativo, a prática de atos por mera vindita, ou em benefício pessoal do administrador ou de terceiros. Tais atos seriam nulos, por desobedecerem à sua finalidade, incidindo no chamado desvio de finalidade ou de poder.
2.2.3. Motivação.
Diz a lei que o administrador público deverá promover, na prática do ato, a "indicação dos pressupostos de fato e de direito que determinaram a decisão" (art. 2º, VII).
É a justificação do ato administrativo, a demonstração clara das razões que levaram à sua prática pelo administrador, afim de que se possa averiguar a sua adequação à lei e aos princípios de direito.
Segundo Di Pietro, "por meio da motivação, é possível verificar a existência e veracidade dos motivos e a adequação do objeto aos fins de interesse público impostos pela lei" ·.
Na concepção de Bandeira de Mello, "dito princípio implica para a Administração o dever de justificar seus atos, apontando-lhes os fundamentos de direito e de fato, assim como a correlação lógica entre os eventos e situações que deu por existentes e a providência tomada, nos casos em que este último aclaramento seja necessário para aferir-se a consonância da conduta administrativa com a lei que lhe serviu de arrimo" ·.
Face à relevância de tal princípio, a Lei nº 9.784/99 erigiu capítulo exclusivo para tratar da motivação, onde apontou as hipóteses em que necessariamente deverá haver a justificação do ato. São elas:
a) quando os atos neguem, limitem ou afetem direitos ou interesses;
b) imponham ou agravem deveres, encargos ou sanções;
c) decidam processos administrativos de concurso ou seleção pública;
d) dispensem ou declarem a inexigibilidade de processo licitatório;
e) decidam recursos administrativos;
f) decorram de reexame de ofício;
g) deixem de aplicar jurisprudência firmada sobre a questão ou discrepem de pareceres, laudos, propostas e relatórios oficiais;
h) importem anulação, revogação, suspensão ou convalidação de ato administrativo.
Ou seja, tal dever tem aplicação obrigatória em todo e qualquer ato decisório da administração. Os atos de mero andamento processual, de impulsionamento do processo, podem não ser motivados. Ex: despacho determinando a intimação de uma testemunha.
Não há necessidade de em todo e qualquer ato o administrador proferir relatório e análise minuciosa da matéria objeto de julgamento, podendo o mesmo fazer simples remissão a relatórios e pareceres, ou utilizar-se de meio eletrônico para tal.
2.3.4. Razoabilidade e Proporcionalidade.
Segundo Di Pietro, "o princípio da razoabilidade exige proporcionalidade entre os meios de que se utilize a Administração e os fins que ela tem que alcançar" [8].
Vê-se, pois, de logo, que tal princípio guarda certa similaridade com o princípio da proporcionalidade, poderíamos até dizer que a proporcionalidade é inerente à razoabilidade.
Tanto é assim que a definição desses dois princípios no bojo da lei 9.784/99, consta de um único dispositivo (art. 2º, VI), que, para nós, é irretocável. Vejamo-lo:
"VI – adequação entre meios e fins, vedada a imposição de obrigações, restrições e sanções em medida superior àquelas estritamente necessárias ao atendimento do interesse público;"
Deve haver, pois, na atuação administrativa, correspondência entre os fundamentos da sua prática e os resultados a serem alcançados, de modo que haja adequação entre os fins objetivados no ato e os meios utilizados para alcançá-los.
2.3.5. Moralidade.
O princípio da moralidade está previsto expressamente na Constituição Federal, consoante vemos no inciso LXXIII, do artigo 5º, onde se prevê a possibilidade ação popular para anulação de ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe e à moralidade administrativa.
Segundo tal princípio, a Administração e seus agentes deverão se portar de acordo com princípios éticos, com a boa-fé e com a lealdade processual, sob pena de estar-se praticando atos de improbidade administrativa.
A Lei multicitada, no inciso IV do artigo 2º, dá uma noção básica de tal princípio, na medida em que exige do administrador uma "atuação segundo padrões éticos de probidade, decoro e boa-fé".
Não basta somente o respeito à legalidade para a validade do ato administrativo, sendo, portanto, indispensável que tal ato respeite ainda preceitos de ordem moral e ética.
2.3.6. Ampla Defesa e Contraditório.
São consectários do princípio constitucional do devido processo legal, o qual implica que "ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal" (Art. 5º, LIV, CF).
Como nos diz Robertônio Pessoa, "O contraditório vincula-se visceralmente ao devido processo legal, e implica conhecimento, por parte dos interessados, dos atos mais relevantes da marcha processual, mormente aqueles que possam interferir na decisão a ser tomada ao cabo do processo" [9].
Para o mesmo autor, por meio da ampla defesa "o administrado tem o direito de argumentar e arrazoar (ou contra-arrazoar), oportuna e tempestivamente sobre tudo que contra ele se alega, bem como de ser levada em consideração as razões por ele apresentadas" [10].
Observe-se que para o acatamento do princípio da ampla-defesa não basta que seja concedido às partes o direito de oferecerem alegações no bojo do processo administrativo, sendo indispensável também que tais alegações sejam de fato apreciadas pelo julgador, de modo a que conste do texto da decisão as razões e motivos para a denegação ou acolhimento daquelas.
2.3.7. Segurança Jurídica.
O princípio da Segurança Jurídica se revela na submissão da administração a certas formalidades legais, as quais tem o escopo de preservar o direito das partes e garantir o atendimento das finalidades públicas.
Assim, no processo de licitação, por exemplo, há que se respeitar às normas que impõem as fases de habilitação e abertura de propostas, a fim de que seja escolhida a proposta mais vantajosa para a administração pública, e garantido o direito de igualdade entre os concorrentes.
Segundo a lei em comento, a Segurança Jurídica implica na "observância das formalidades essenciais à garantia dos direitos dos administrados".
Para isso se prestam o respeito aos prazos processuais, a adequação aos ritos procedimentais, a observância dos regimentos e normas de índole processual. Ou, como diz a lei, "adoção de formas simples, suficientes para propiciar adequado grau de certeza, segurança e respeito aos direitos dos administrados" (art. 2º, inciso IX).
2.3.8. Interesse Público.
A atuação administrativa deve guardar respeito aos direitos dos administrados, mas também não pode, sob tal pretexto, implicar em gravame ao interesse público.
Com efeito, o administrador deve interpretar a norma de modo que reste atendida a finalidade pública do ato administrativo, respeitando-se, pois, o interesse maior da sociedade.
Celso Antônio Bandeira de Mello distingue o interesse público primário do secundário. Para ele, "Interesse público, ou primário é o pertinente à sociedade como um todo e só ele pode ser validamente objetivado, pois este é o interesse que a lei consagra e entrega à compita do Estado como representante do Corpo Social. Interesse secundário é aquele que atina tão –só ao aparelho estatal enquanto entidade personalizada e que por isso mesmo pode lhe ser referido e nele encarnar-se pelo simples fato de ser pessoa" [11].
Destarte, o alcance de tal desiderato é objetivo primordial do Estado, e, dessa forma, não deve ser olvidado mesmo em sede de processo administrativo, o qual deve guardar plena consonância com os fins estatais.
2.3.9. Eficiência.
Segundo José Afonso da Silva, "eficiência significa fazer acontecer com racionalidade, o que implica medir os custos que a satisfação das necessidades públicas importam em relação ao grau de utilidade alcançados" [12].
É o chamado custo-benefício.
Em suma, tal princípio significa a "organização racional dos meios e recursos humanos, materiais e institucionais para a prestação de serviços públicos de qualidade em condições econômicas de igualdade dos consumidores" [13].
Em termos de processo administrativo, tal princípio implicaria numa atuação mais racional do administrador, que deverá atender os interesses públicos sem que necessite recorrer a formalidades inócuas e que somente têm o condão de burocratizar a atuação administrativa. Neste sentido, seria ilógico imaginar que o administrador público instituísse processo licitatório para comprar uma caneta, ou que instaurasse processo disciplinar para apurar fato praticado por servidor quando notoriamente já é reconhecida a sua inocência.
2.4. Existiriam princípios implícitos do processo administrativo?
Estudamos, pois, nas linhas anteriores, uma série de princípios expressamente arrolados na lei. No entanto, cabe se fazer nesse momento a seguinte indagação: existiriam outros princípios decorrentes da lei, mas não expressamente aduzidos por ela, ou seja, implícitos, e que devam ter aplicação obrigatória no processo administrativo?
Entendemos que sim, dado que o artigo 2º, se averiguarmos com mais detença os termos da lei, não esgota todo o manancial de princípios que guarnecem o processo administrativo.
Alguns princípios poderiam ser somados aos que foram expressamente arrolados pela lei, como por exemplo:
a)impessoalidade.
Embora estreitamente vinculado aos princípios da moralidade e da finalidade, poderíamos erigir o princípio da impessoalidade como um dos princípios que se aplicam ao processo administrativo, de maneira a evitar a atuação parcial dos administradores públicos.
Assim, é vedada a atuação do administrador público que busque sua promoção pessoal ou de terceiro, e não o interesse público, devendo o mesmo agir com o máximo de objetividade no trato com a coisa pública (inciso III, do Art. 2º, da Lei n. 9.784/99).
b)informalidade.
Significa tornar o rito processual mais célere e efetivo, afastando-se toda e qualquer informalidade que se mostre dispensável e impeça o livre acesso do administrado.
Nas palavras do Prof. Robertônio Pessoa, "deve-se despir o procedimento administrativo de todo formalismo que obstaculize ou impeça a participação do interessado, flexibilizando, dentro do possível, os requisitos de acesso do administrado à via Administrativa". [14]
Exemplo de tal princípio é a formulação do inciso IX do artigo 2º da mencionada lei do processo administrativo, o qual determina a "adoção de formas simples, suficientes para propiciar adequado grau de certeza, segurança e respeito aos direitos dos administrados".
c)Gratuidade.
Este implica na impossibilidade de cobrança de despesas processuais ou honorários advocatícios na esfera do processo administrativo, "ressalvadas as previstas em lei"(inciso XI, art. 2º, Lei n. 9.784/99). Como se vê, é consectário do princípio da informalidade, o qual sugere a supressão de quaisquer barreiras que possam ser impeditivas do livre acesso dos administrados às instâncias administrativas.
d)lealdade e boa-fé.
Tal princípio se infere da necessidade de as partes, tanto a administração como o administrado, se portarem de forma urbana e civilizada, evitando a prática de atos ilícitos e que impliquem em simulações e desrespeito à outra parte, expondo os fatos conforme a verdade, e colaborando com o esclarecimento destes.
É similar ao dever de lealdade e boa-fé previsto no Código de Processo Civil (Art. 14, II).
e)Publicidade.
Este princípio implica na "divulgação oficial dos atos administrativos, ressalvadas as hipóteses de sigilo previstas na Constituição" (Art. 2º, inciso V). Visa, portanto, tornar públicos os atos e decisões administrativas, possibilitando o acompanhamento e fiscalização da atuação do Estado pela sociedade e pelos órgãos competentes.
É também requisito indispensável à validade do ato administrativo.
Alguns outros princípios poderiam ser arrolados, por estarem implícitos na lei, a exemplo de: impulso oficial (art. 29, caput); indeclinabilidade da jurisdição administrativa (art. 48, caput); autotutela (art. 53); revisibilidade das decisões (art. 56).
Do exposto, é de se concluir que além daqueles princípios arrolados expressamente no artigo 2º da Lei nº 9.784/99, outros devem ser admitidos como de acatamento obrigatório, por decorrerem dos próprios ditames legais.
2.5. Dos Princípios Supralegais do Processo Administrativo.
Entendemos que também é perfeitamente aceitável a existência de princípios que, embora não constem expressamente na lei, são decorrência do próprio sistema jurídico, estando previstos constitucionalmente ou na condição de princípios gerais de direito.
Ora, não há como negar que existem no sistema jurídico princípios que são superiores, e que tem aplicabilidade em vários ramos do direito processual, sendo, portanto, supralegais.
Os princípios do devido processo legal, do interesse público, da instrumentalidade das formas, são princípios que, aplicáveis ao direito processual judicial, também são de aceitação obrigatória no direito processual administrativo, dado o seu grau de generalidade e aplicabilidade ao processo, como categoria geral que tem por escopo garantir o aspecto dialético e a segurança jurídica na realização da pacificação social.
Normalmente, podem ser princípios regentes do direito processual administrativo inúmeros postulados previstos na Constituição Federal, como a legalidade, isonomia, inadmissão das provas ilícitas, devido processo legal, publicidade, impessoalidade, moralidade, e outros, que mesmo tendo sido expressamente açambarcados pela lei, persistem como vetores maiores do sistema.
III – CONCLUSÕES
Os princípios do processo administrativo podem ser, enfim, classificados em expressos, implícitos e supralegais, levando-se em consideração o critério de previsão dos mesmos no bojo da Lei nº 9.784/99.
Os primeiros, contidos no artigo 2º da citada lei, são os da legalidade, finalidade, motivação, razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, ampla defesa, contraditório, segurança jurídica, interesse público e eficiência.
Os implícitos são aqueles que embora não previstos no mencionado dispositivo da lei, estão também no bojo da lei, e podem ser encontrados em sua maioria dentre os critérios previstos no parágrafo único do artigo 2º, além de outros previstos em dispositivos diversos. Podemos arrolar como tais os princípios da impessoalidade, informalidade, gratuidade, lealdade e boa-fé, e o da publicidade.
Por fim, reconheceu-se no presente estudo a existência de princípios anteriores à própria lei, os supralegais, os quais foram, em sua maioria, previstos na Constituição Federal, como os do devido processo legal, igualdade ou isonomia, licitude das provas, etc.
Em suma, o Administrador deve respeitar não só os princípios previstos no artigo 2º, mas todos os outros, implícitos ou supralegais, sob pena de incorrer na prática de ato ilegal ou inconstitucional, passível de anulação pelo Poder Judiciário ou pela própria administração pública.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 9. ed. São Paulo: Atlas, 1998.
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 17. Ed. São Paulo. Malheiros. 1992.
MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 3. ed. São Paulo: Atlas. 1998.
PESSOA, Robertônio dos Santos. Processo Administrativo. In: Jus Navigandi, n. 51.[internet] .(capturado em 17.jul.2002).
REALE, Miguel. Lições Preliminares de Direito. 19. Ed. São Paulo: Saraiva. 1991.
NOTAS
1 In: Lições Preliminares de Direito. 19ª ed., São Paulo: Saraiva.1991. p. 299.
2 Ibid.
3 BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de Direito Administrativo. 5ª ed., São Paulo: Malheiros. 1994. p. 255. Nessa edição o autor identifica alguns princípios norteadores do processo administrativo, mesmo não havendo na época legislação que tratasse explicitamente da matéria. Respondia, então, à indagação: "há ou não princípios gerais aplicáveis ao procedimento administrativo?".
4 Ob. Cit. p. 47.
5 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 17. Ed. São Paulo. Malheiros. 1992. p.82.
6 Ob.Cit. p. 52.
7 Idem. p. 53.
8 Ob. Cit. p. 72.
9 PESSOA, Robertônio dos Santos. Processo Administrativo. In: Jus Navigandi, n. 51.[internet](capturado em 17.jul.2002).
10 Idem.
11 Ob. Cit. p. 46.
12 AFONSO DA SILVA, José. Curso de Direito Constitucional Positivo. 16. ed., São Paulo: Malheiros. p. 651.
13 Idem, p. 652.
14 Ob.Cit.