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Aborto: direito a licença médica e aspectos demissionais

Evelyn Priscila Santinon Sola
Lucia Cristina Florentino Pereira da Silva
18/11/2018 às 16:44
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Aborto e nascimento/parto são considerados diagnósticos distintos na área obstétrica e, consequentemente, divergem nos direitos trabalhistas da mulher.

Aborto, segundo Neme (2005) é definido como a “finalização da gestação antes que o feto adquira condições de viabilidade”. A Organização Mundial de Saúde conceitua essa ocorrência como a expulsão do feto com peso menor ou igual a 500 g, o que corresponde a uma idade gestacional entre 20 e 22 semanas.

Corroborando com o autor acima, a Secretaria de Saúde do Paraná especifica que aborto é a expulsão ou extração de um embrião ou feto pesando menos de 500g  (aproximadamente 20-22 semanas de gestação), independentemente ou não da presença de sinais vitais. 

Esclarecendo possíveis dúvidas conceituais, a Secretaria de Saúde do Paraná (2017) especifica que nascimento é a completa expulsão ou extração, do organismo materno, de um feto, independentemente do fato de o cordão ter sido cortado ou de a placenta estar inserida. Especifica, ainda, que fetos pesando menos de 500g não são viáveis e, portanto, não são considerados como nascimento para fins de estatísticas perinatais.

Na ausência de peso de nascimento, a idade gestacional de 20 a 22 semanas completas é considerada equivalente a 500g e, quando não é possível saber o peso ou idade gestacional, considerar-se-á o comprimento de 25cm (crânio - calcanhar), como equivalente a 500g.

Nesse mesmo sentido, a conceituação mais aceita para definição de nascimento, é aquela que se refere à idade gestacional do feto definida em semanas. Assim, é considerado como pré-termo o concepto nascido com viabilidade fetal, assim considerado acima de 20 semanas para a maioria, 22 semanas para alguns e inferior a 37 semanas em geral, enquanto não existir maturidade fetal. Considera-se, ainda, para classificação ao nascimento, além do pré-termo, o recém-nascido de termo com idade de 37 a 41 semanas e 6 dias e como pós-termo aquele com idade gestacional maior de 42 semanas (Correa, Correa Junior, 2004).

É, portanto, singular a distinção efetiva entre aborto e parto e que impacta, diretamente, o direito trabalhista da mulher, especificamente em relação à licença gestação.

Com relação ao direito à licença gestação, a mesma resguarda o direito da mulher frente ao nascimento de seu filho, inclusive sendo estendido à mulher que adotar ou obtiver guarda judicial para fins de adoção de uma criança, motivado pela importância do cuidado e da criação de vínculo entre a criança e a mãe nos primeiros meses de convívio.

Assim, clara seja a distinção entre aborto e nascimento, é justificada a inviabilidade de concessão de licença gestação, ou igual período de repouso remunerado, para mulheres que sofreram aborto espontâneo, justificada, entretanto, uma licença médica de até 14 dias (2 semanas).

 Importante relembrar que o segundo o Art. 395 do Decreto Lei nº 5.452 de 01 de maio de 1943, assegura à mulher, em caso de aborto não criminoso, comprovado por atestado médico oficial, um repouso remunerado de 2 (duas) semanas.


Demissão pós-aborto

Dessa forma, em caso de demissão sem justa causa, há que ser respeitado o prazo acima especificado, ou seja, a demissão somente pode ocorrer 15 dias após a data do atestado que comprova o quadro de aborto, desde que a mulher não esteja no gozo deste. No momento da demissão sem justa causa, todos os direitos trabalhistas devem respeitados, com pagamento integral do período em que a mulher permaneceu afastada sob licença médica. Lembrar que pode-se optar pela indenização do aviso prévio de 30 dias a partir da data da demissão, bem como devem ser respeitados e pagos os valores proporcionais relativos ao 13º salário e férias, devendo ser exigido o exame médico demissional evitando futuros problemas trabalhistas.

Inúmeros julgados comprovam a consistência da defesa na questão, devendo ser considerado o período de duas semanas para afastamento após o diagnóstico do quadro de aborto, conforme abaixo especificado:

“TRT-3 - RECURSO ORDINARIO TRABALHISTA RO 00629201316203000 0000629-13.2013.5.03.0162 (TRT-3)

Data de publicação: 25/07/2014

Ementa: GESTANTE. ABORTO ESPONTÂNEO. PARTO PREMATURO. ESTABILIDADE PREVISTA NO ARTIGO 395 DA CLT . A distinção entre aborto e parto prematuro se mostra relevante, visto que as consequências jurídicas são distintas: em caso de aborto não criminoso, comprovado por atestado médico, é devido repouso de 2 (duas) semanas a título de salário-maternidade (artigo 93 , § 5º , do Decreto 3.048 /99 c/c artigo 395 da CLT ). Ocorrendo parto antecipado, ainda que de natimorto, comprovado por atestado médico, a empregada terá direito a 120 (cento e vinte) dias de salário maternidade (artigo 93 , § 4º , do Decreto 3.048 /99) e à estabilidade prevista no artigo 10, II, b,do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias. Sendo inconteste a ocorrência de aborto espontâneo no primeiro trimestre de gestação, atestado pelo profissional médico, o direito obreiro cinge-se à estabilidade no emprego por duas semanas (artigo 395 da CLT ).”

“TRT-3 - RECURSO ORDINARIO TRABALHISTA RO 00385201313603000 0000385-65.2013.5.03.0136 (TRT-3)”

Data de publicação: 06/10/2014

Ementa: estabilidade provisória - gestante - natimorto. A legislação previdenciária distingue claramente as hipóteses de aborto e parto prematuro: o aborto não criminoso, comprovado por atestado médico, dá direito ao período de duas semanas de descanso (artigo 93, §5º, do Decreto 3.048/99 c/c artigo 395 da CLT). Já na hipótese de parto antecipado de natimorto, comprovado por certidão de óbito, a empregada faz jus à estabilidade prevista no artigo 10, II, "b", do ADCT. No caso, tendo havido parto antecipado de natimorto, a empregada faria jus à indenização, pois não se lhe manteve o emprego, nos termos do art. 10 do ADCT. Todavia, em face dos limites fixados no recurso, a indenização devida à reclamante corresponderá à estabilidade no emprego, desde a confirmação da gravidez até 2 semanas após à data do sinistro ocorrido.

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“TRT-3 - RECURSO ORDINARIO TRABALHISTA RO 00132201003403002 0000132-97.2010.5.03.0034 (TRT-3) ”

Data de publicação: 25/02/2011

Ementa: ABORTO ESPONTÂNEO. ESTABILIDADE PROVISÓRIA. A empregada tem direito à estabilidade provisória até o momento do aborto espontâneo, fazendo jus, a partir daí, ao repouso semanal remunerado de duas semanas disposto no artigo 395 da CLT . Até o momento em que sofre o aborto, justifica-se a estabilidade no emprego, tendente a proteger a saúde e a subsistência do nascituro, que, neste lapso, ainda está presente no corpo de sua genitora, carente de proteção.

Dessa forma, é importante a distinção entre parto e aborto, visto a divergência nos direitos trabalhistas que envolvem a mulher e consequentemente refletem no exercício dos profissionais de saúde que atuam na área obstétrica.


Bibliografia:

CORREA MD et al. Noções práticas de Obstetrícia. Belo Horizonte: Coopmed. 2004.

JUSBRASIL. ARTIGO 395 DA CLT. Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/busca?q=ARTIGO+395+DA+CLT&p=2. Acesso em: 16 ago 2017.

NEME, B.  Obstetrícia Básica . São Paulo: Sarvier. 2005.

SECRETARIA ESTADUAL DO PARANÁ. Conceitos e definições. Disponível em: http://www.saude.pr.gov.br/modules/conteudo/conteudo.php?conteudo=668. Acesso em: 16 ago 2017.

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Sobre as autoras
Evelyn Priscila Santinon Sola

Advogada. Doutora em Ciências pela Universidade de São Paulo USP mestre em Direito pela UNISANTOS MBA em Comércio Internacional pela Universidade de São Paulo USP e máster Management Stratégigue et Génie des Organisations - CAEE Internacional Manager pela Universidade em Grenoble França. Pós-graduada em Educação a Distância: Planejamento Implantação e Gestão. Docente de Direito da UNIP Sorocaba.

Lucia Cristina Florentino Pereira da Silva

Docente da Escola de Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo- USP. Mestrado e Doutorado pela Universidade de São Paulo.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

P., Evelyn Priscila Santinon Sola ; SILVA, Lucia Cristina Florentino Pereira. Aborto: direito a licença médica e aspectos demissionais. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 23, n. 5618, 18 nov. 2018. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/60955. Acesso em: 20 abr. 2024.

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