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Apontamentos acerca da nova estrutura do processo de execução de obrigação de fazer e não fazer de título judicial.

Alterações introduzidas pelas Leis nº 8.952/1994 e 10.444/2002

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20/01/2005 às 00:00
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10. Defesa do executado

Como previamente declarado anteriormente, a plena admissibilidade dos embargos do executado não se concilia com o modelo legal da execução imediata, que quer ser ágil e portanto apta a efetivar no menor tempo possível a tutela executiva. Os embargos são fator de inevitáveis demoras, porque lentos em seu processamento formal e, sobretudo, porque no sistema brasileiro tem sempre o efeito de suspender a execução, enfraquecendo sensivelmente a eficácia abstrata do titulo executivo (art. 739, § 1º) e essas demoras são incompatíveis coma eficácia das sentenças mandamentais, por definição, impetuosas e impacientes.

A doutrina brasileira é fortemente comprometida com a tese da negativa dos embargos a toda e qualquer execução imediata.

Da incompatibilidade sistemática entre a execução imediata e os embargos do executado não se infere, porém a suposta inadmissibilidade total destes, nem muito menos a total absoluta negativa de qualquer oportunidade de defesa ao executado; essa postura radical viria de encontro às garantias do devido processo legal e do contraditório, não sendo assimilada pela ordem constitucional. (art. 5º, LIV e LV, CF). Os julgados e as manifestações doutrinarias que se repetem na negativa da faculdade de embargar centram a atenção nos embargos de mérito, que são opostos com o objetivo de negar a existência atual da obrigação, porque já extinta pelo adimplemento, prescrição etc. (art. 461, VI); como a ocorrência desses fatos extintivos é extremamente improvável quando a execução se faz sine intervallo, é mais que legítima a exclusão em tese, dos embargos a esta. Em casos extraordinários, sendo opostos os embargos com fundamento muito plausível em um pagamento amparado por prova desde logo apresentada ou, evidenciando-se a prescrição intercorrente, eles devem ser admitidos e recebidos com o efeito suspensivo que lhe é próprio (CPC, art. 738, § 1º); só em caráter excepcionalíssimo, porém, e sempre segundo a prudente apreciação do juiz em cada caso, como se dá em relação aos embargos à execução de sentença proferida em ação possessória, segundo a jurisprudência corrente do país. Fora desses casos excepcionais, as defesas de mérito que o devedor tiver serão apresentadas mediante simples petição e sem suspensão do processo executivo.


11. A execução imediata na teoria geral do processo civil

O conjunto das técnicas instituídas pelo art. 461 do CPC representa a superação de alguns preciosos dogmas preservados pela doutrina como penhores da segurança das partes, mas que em alguma medida podem ser legitimamente atenuados em vista da maior efetividade da tutela jurisdicional.

O dogma do exaurimento da competência do juiz ao cabo do processo de conhecimento, sendo-lhe proibido inovar depois de publicada a sentença (art. 463), é atingido por uma legitima transgressão quando o art. 461, caput, autoriza o juiz a determinar "providências que assegurem o resultado prático equivalente ao do adimplemento". Determinar essas providências pode implicar alterações profundas no decisum contido em sentença, como no caso de uma condenação a instalar filtros antipoluição, acabar substituída pela ordem de suspender as atividades nocivas; essa é a inovação que seria perigosamente inadmissível segundo a regra geral contida no art. 463 do CPC, mas permitida pela disciplina da execução especifica e imediata.

Também significativamente atenuado o dogma da correlação entre o provimento e a demanda porque as "providências que assegurem o resultado prático equivalente ao do adimplemento" não corresponderão mais ao que houver sido pedido ao início do processo cognitivo; tratar-se-á de medidas diferentes das pedidas justamente porque a concessão daquelas que foram pedidas ter-se-á revelado insuficiente para levar o obrigado a cumprir o direito.

Todas essas transgressões a dogmas são de absoluta propriedade segundo o pensamento processualístico moderno, que privilegia a busca de resultados.


12. Execução imediata em face da Fazenda Pública

A execução especifica há de atuar com a mesma eficácia tanto sobre os entes públicos inadimplentes, prestadores de serviços públicos, quanto sobre os particulares, porque as únicas ressalvas que a CF e o CPC fazem em relação a Fazenda são as que dizem respeito à execução por dinheiro (CF, art. 100, e CPC, art. 730) [6]. Seria incompatível com a índole do Estado de direito imunizar os entes estatais às medidas enérgicas que o Código de Processo Civil estabelece à realização especifica dos direitos em casos nos quais não se trata de desfalcar o patrimônio publico mas de impor aos agentes do Estado certos comportamentos exigidos pelo direito (um fazer, um não-fazer). Nessa linha, o STJ chegou a afirmar que "as astreintes podem ser fixadas pelo juiz de oficio, mesmo sendo contra pessoa jurídica de direito publico, que ficará obrigada a suporta-las caso não cumpra a obrigação de fazer no prazo estipulado". Qualquer tratamento diferenciado nessa matéria seria um privilégio inconstitucional e antidemocrático. Tratando-se de assegurar o equilíbrio entre os valores da autoridade do Estado e da liberdade dos particulares, é indispensável impor aos órgãos estatais o cumprimento especifico do que, mediante a observância da clausula due process em um processo regular, houver decidido o Poder Judiciário. (p. 467-468)

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O que na se reconhece ao pretenso usuário é o interesse em acionar o Poder Público com base no art. 461, para que promova a execução dos serviços públicos inexistentes no local para possibilitar o seu uso, pois essa providencia esta fora da interferência do Poder Judiciário, por envolver mérito administrativo.


Referências bibliográficas:

ASSIS, Araken de. Manual do processo de execução. 8. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002.

DIDIER JR., Fredie. Notas sobre o novo art. 287 do CPC e a sua compatibilização com a tutela específica prevista nos arts. 461 e461-A do CPC. Revista de Direito Processual. São Paulo, n. 109, p.169-172. jan./mar., 2003.

DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de direito processual civil. 4. ed. São Paulo: Malheiros, 2004, v. 4.

_________________. A reforma da reforma. 6. ed. São Paulo: Malheiros, 2003.

RODRIGUES NETTO, Nelson. Notas sobre as tutelas mandamental e executiva lato sensu nas leis 10.358/2001 e 10.444/2002. Revista de Direito Processual. São Paulo, n. 110 p.196-224. abr./jun., 2003.

THEODORO JUNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil. 33. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002.

WAMBIER, Luiz Rodrigues et al. Curso avançado de processo civil: processo de execução. 5. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. v. 2.


Notas

1 Obrigação de fazer caracteriza-se por possuir como objeto uma prestação de fato, diferente da prestação de dar, cujo objeto é uma prestação de coisa. Versa sobre prestação positiva

2 Obrigação de não fazer tem por objeto, prestação de fato para se abster do ato. Em regra, ocorre nas ações reais, onde há previsão legal proibitiva

3 É oportuno recordar que o art. 461 é praticamente reprodução integral do art. 84, criado para o microssistema ou subsistema do Código de Defesa do Consumidor (CDC). Era inevitável, como veio realmente a acontecer, que a referida regra privilegiando a tutela especifica fosse sendo gradativamente transplantada para outras leis esparsas (Estatuto da Criança e Adolescente, art. 213; Lei Antitruste, art. 62) até atingir patamar de norma geral no sistema processual pátrio (art. 461 do CPC).

4 A execução imediata pelo sistema desenhado no art. 461 e seus parágrafos entrou no direito positivo brasileiro pela porta do CDC (ver nota 3); uma disciplina instituída inicialmente para a tutela jurisdicional referente aquele campo especifico (relações de consumo) passou-se, por obra da Reforma, a uma disciplina integrante do processo civil comum e, portanto, destinada a uma eficácia muito mais ampla. A origem mais remota desse modo de executar é a Lei do Mandado de Segurança, que impõe a execução imediata e fortemente imperativa das decisões concessivas do writ, quer proferidas em caráter liminar, quer em julgamento final.

5 "A medida coercitiva representada pela multa, concebida para induzir o devedor a cumprir espontaneamente as obrigações que lhe incumbem, principalmente as de natureza infungível, não é de natureza reparatória. Vale dizer, sua imposição não prejudica o direito do credor à realização especifica da obrigação ou a recebimento do equivalente monetário, ou ainda à postulação das perdas e danos. A multa em suma, tem natureza puramente coercitiva" (Kazuo Watanabe apud Dinamarco, 2003, p. 237).

6 Assim não pensam Barbosa Moreira, Lopes da Costa, Vicente Greco Filho. Na visão deste ultimo jurista, "a eficácia fica sacrificada pela impossibilidade jurídica da execução especifica da obrigação de fazer, porque o Judiciário, perante o sistema constitucional vigente, não pode praticar atos administrativos na esfera do Executivo, pois estaria invadindo área privativa de outro poder."

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Sobre a autora
Janine Medeiros Santos

aluna bolsista do Programa de Recursos Humanos ANP-MCT/UFRN nº 36 (Especialização em Direito do Petróleo e Gás Natural), bacharelanda em Direito pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SANTOS, Janine Medeiros. Apontamentos acerca da nova estrutura do processo de execução de obrigação de fazer e não fazer de título judicial.: Alterações introduzidas pelas Leis nº 8.952/1994 e 10.444/2002. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 10, n. 562, 20 jan. 2005. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/6206. Acesso em: 16 mai. 2024.

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