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Análise técnica do recurso de apelação: Extinção do duplo juízo de admissibilidade com o advento do novo Código de Processo Civil

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O artigo compara o procedimento de admissibilidade do recurso de apelação (CPC/73 e CPC/15) a fim de de esclarecer as mudanças operadas com o término dos dois juízos de admissibilidade na instância ordinária.

Resumo: O presente artigo científico objetiva contribuir para solidificação do debate do procedimento de admissibilidade a ser adotado no recurso de apelação, visando comparar os dois sistemas processuais, o revogado (CPC/73) e o vigente (CPC/15) a fim de esclarecer as mudanças operadas com o término dos dois juízos de admissibilidade na instância ordinária. Deste modo, embasado na utilização do método dedutivo e por meio da pesquisa bibliográfica aplicada constatou-se: 1) estabelecer uma análise comparativa entre os procedimentos de admissibilidade recursal frente à legislação revogada e a vigente; 2) analisar os aspectos positivos e negativos advindos da nova alteração técnico-procedimental e; 3) tecer conclusões sobre a pertinência da extinção do duplo juízo de admissibilidade do recurso de apelação e as consequências para as figuras processuais.

Palavras-chave: Admissibilidade Recursal, Revogação Expressa do CPC/73, Unificação dos juízos de admissibilidade recursal e de mérito.


Introdução

O recurso de apelação é um importante instrumento processual de garantia do duplo grau de jurisdição, que assegura ao prejudicado (parte, Ministério Público ou terceiro) a possibilidade de se insurgir contra sentenças contrárias aos seus interesses, permitindo, segundo assevera Cheim Jorge, uma segunda opinião diante da decisão desfavorável.

A relevância social é encontrada no presente artigo tendo em vista que as recentes inovações legislativas vigentes com o CPC/15 alteraram de forma significativa a sistemática procedimental do recurso de apelação, retirando o juízo a quo a análise inaugural da admissibilidade recursal, eliminando o que Nelson Nery Júnior convencionou chamar de competência diferida do juízo de origem para proferir juízo de admissibilidade do recurso de apelação, fazendo-se necessário o esclarecimento técnico processual adequado a fim de auxiliar os operadores do direito e, consequentemente, os jurisdicionados.

A relevância científica do debate reside na incipiente discussão sobre o tema, dado que tal alteração é resultado de uma recente mudança legislativa, fruto da vigência do CPC/15, se fazendo necessário o fomento da nova sistemática adotada pelo legislador ordinário e como a mudança procedimental modificará o dia-a-dia dos advogados, juízes, desembargadores e jurisdicionados.

A confecção deste artigo científico tem uma peculiar importância para a pesquisadora que, por ser amante e estudiosa do direito processual, busca contribuir para a solidificação do entendimento técnico jurídico dessa importante mudança no regular procedimento de tramitação do recurso de apelação.

Assim, por meio da metodologia científica, analisam-se as alterações promovidas no novel Código Processual, isto é, a extinção do duplo juízo de admissibilidade do recurso de apelação, refletindo-se sobre os efeitos positivos e/ou negativos da alteração legislativa e as suas consequências no direito processual civil.

Para desenvolver o presente tema utiliza-se o método dedutivo, partindo da análise abstrata do Código de Processo Civil de 2015 (CPC/15) para predizer a ocorrência de fenômenos particulares, isto é, o regular procedimento de admissibilidade do recurso de apelação.

Sua base de construção teórica é fundamentada na pesquisa bibliográfica, de natureza aplicada, das principais obras doutrinárias de direito processual civil, bem como a análise da legislação processual revogada e vigente, visando ao seu fim, analisar um objeto específico do direito processual - a extinção do juízo ordinário de admissibilidade do recurso de apelação.

Neste sentido, para a exata compreensão do tema, o presente artigo é desenvolvido em sete tópicos: Inicialmente são elencados aspectos relevantes sobre o duplo grau de jurisdição; após se suscita a revogação expressa do CPC/73, no que se refere ao tema em análise; em ato contínuo compara-se o juízo de admissibilidade dos dois sistemas processuais – CPC/73 e CPC/15; em sequência se elenca aspectos positivos e negativos advindos da adoção da nova sistemática de admissibilidade recursal; por fim, constrói-se uma conclusão sobre as modificações advindas com a extinção do duplo juízo de admissibilidade recursal.


METODOLOGIA

O presente artigo científico é embasado no método dedutivo, que no nível de abstração mais elevado da análise do Processo Civil, parte do exame do Código de Processo Civil de 2015 (CPC/15) para predizer a ocorrência de fenômenos particulares, isto é, a extinção do juízo de admissibilidade recursal do juízo a quo na apelação.

No que se refere ao tipo de pesquisa adotado, utilizou-se a pesquisa bibliográfica com o levantamento, análise e seleção de livros e artigos referentes ao tema, sendo delimitada pela utilização do material técnico-jurídico da doutrina pátria, legislação revogada e vigente.

Quanto à natureza da pesquisa, adotou-se a pesquisa aplicada, visto que se analisou um objeto específico - o término do duplo juízo de admissibilidade recursal e as suas consequências nas relações jurídicas procedimentais no processo civil.

Por fim, quanto à forma de abordagem empregou-se a pesquisa qualitativa de dados, posto que através do levantamento bibliográfico foi possível tecer uma análise crítica sobre as alterações implementadas pelo CPC/15, no que se refere ao objeto do tema.


1. ASPECTOS RELEVANTES SOBRE O DUPLO GRAU DE JURISDIÇÃO

Para solucionar os conflitos de interesse, o Estado-Juiz proporciona ao jurisdicionado o acesso à Justiça.Aquele que se sentir lesado em seu direito subjetivo, poderá ingressar com uma demanda judicial, nascendo, assim, a ação. Cintra, Grinover e Dinamarco (2010) defendem que ação é o direito ao exercício da atividade jurisdicional (ou o poder de exigir esse exercício).

Para que o Poder Judiciário, em regra, através do juízo a quo possa analisar esse conflito de interesses, faz-se necessário a utilização de uma sequência de atos jurisdicionais, sempre respeitando o ordenamento jurídico, nascendo assim, o instrumento da jurisdição, o processo.

Após a admissibilidade da petição inicial, intimada as partes para a tentativa de conciliação e mediação, oportunizada ao demandado o contraditório e a ampla defesa, coletada as provas na instrução do processo, saneado eventuais omissões, caberá, por fim, ao juiz proferir a sua decisão – sentença.

A Lei 13.105/15 estabelece no seu art. 203, §1, que a sentença é o pronunciamento do juiz, com fundamento nos arts. 485 e 487, que põe fim à fase cognitiva do procedimento comum, bem como extingue a execução.

A sentença poderá ser terminativa ou definitiva, aquela põe fim ao processo, sem resolver o mérito, dado a ausência de um fator processual imprescindível para a análise da causa; nessa, o juiz decide o lide, total ou parcialmente, prestando a tutela jurisdicional requerida na ação.

Em obediência ao princípio da singularidade, caberá à parte, ao Ministério Público e ao terceiro prejudicado, não concordando com a decisão exarada em sentença, se valer do recurso de apelação.

Sua previsão encontra-se no art. 1.009 da CPC/15 que estabelece que “da sentença cabe apelação, que será interposto no juízo prolator da sentença atacada, através de petição específica, no prazo de 15 (quinze) dias, sendo oportunizado ao apelado apresentar contrarrazões em igual período.

Humberto Theodoro Júnior (2016, p. 1.275) conceitua apelação como

recurso que se interpõe das sentenças dos juízes de primeiro grau de jurisdição para levar a causa ao reexame dos tribunais do segundo grau, visando obter uma reforma total ou parcial da decisão impugnada , ou mesmo a sua invalidade.

Segundo Marcato (2004), a apelação é uma espécie de recurso ordinário de ampla cognição, que permite a análise da sentença terminativa ou de mérito, visto que permite a análise da sentença em todos os seus aspectos, ou seja, aplicação do Direito ao irrestrito reexame de toda a prova produzida no processo

Reforçando o instrumento apelação, Didier Jr (2009) defende que a apelação é o principal meio do qual atua o duplo grau de jurisdição, dado que permite ampla cognição pelo órgão ad quem, tendo advindo da apellatio romana, sendo utilizado por quase todos os países do mundo civilizado.

Marinoni e Mitidiero (2014) preconiza que a apelação busca a substituição da sentença por vício de forma (error in procedendo) e/ou por vício de julgamento (erro in judicando), possibilitando ao recorrente apontar a inadequação formal ou dos juízos fático-jurídicos ali apresentados.


2. VIGÊNCIA DO CPC/15 E A REVOGAÇÃO EXPRESSA DO CPC/73

O presente artigo elucida as principais alterações promovidas pelo advento do CPC/15 em relação a nova sistemática recursal vigente. Assim, faz-se necessário esclarecer a revogação expressa do CPC/73 frente a vigência do novo Código Processual.

A lei de introdução às normas do direito brasileiro, o Decreto Leinº 4.657/42, prevê no seu art. 2, §1., que “a lei posterior revoga a anterior quando expressamente o declare, quando seja com ela incompatível ou quando regule inteiramente a matéria de que tratava a lei anterior”.

Nesse diapasão, o CPC/15, em seu livro complementar, no art. 1.046, estabelece: “ao entrar em vigor este Código, suas disposições se aplicarão desde logo aos processos pendentes, ficando revogada a Lei 5.869, de 11 de janeiro de 1973”.

Assim, o CPC/15 expressamente revogou os preceitos estabelecidos no Código anterior, cabendo, por consequência, ao operador do direito se readequar às novas regras procedimentais.


3. DO JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE DO RECURSO DE APELAÇÃO NO CPC/73.

O CPC/73 iniciava o procedimento de tramitação do recurso de apelação no art. 514, que impunha ao interessado interpor petição dirigida ao juiz da causa, contendo os seguintes itens obrigatórios: nome e qualificação das partes, fundamentos de fato e de direito e o pedido de nova decisão.

Marinoni e Mitidiero (2014) sustentam que o presente artigo impõe a forma com que deve o recorrente redigir, portanto, a regularidade formal do recurso e o seu não atendimento leva ao não conhecimento do mesmo por ausência do requisito extrínseco de admissibilidade recursal.

Inicia, assim, a jornada de análise do juízo de admissibilidade do recurso, sendo complementado pelo art. 518, que prevê autorizar ao juiz a verificação da presença dos requisitos extrínsecos e intrínsecos, mandando processar a apelação, se presentes, e atribuindo os efeitos em que recebe, abrindo, logo em seguida, vista ao apelado para recorrer.

Para Marinoni e Mitidiero (2014, pg. 549),

o juízo de admissibilidade recursal nesse momento, é provisório em duas frentes: primeiro por que pode ser reexaminado pelo próprio juiz singular (art.518, §2, CPC/73); segundo por que não vincula o Tribunal.

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O §1 do mesmo artigo acrescentou um importante requisito negativo de admissibilidade recursal, qual seja, a disposição de que o juiz não receberá o recurso de apelação quando a sentença estiver em conformidade com súmula do Superior Tribunal de Justiça ou do Supremo Tribunal Federal. Nessa linha, sustenta Didier Jr. (2009) que o dispositivo decorre do sistema de força vinculante dos precedentes dos tribunais superiores, notadamente daquelas teses já consagradas pelos Tribunais.

O §2 acrescentava que após a apresentação da resposta do apelado, era facultado ao juiz, no prazo de 5 (cinco) dias, o reexame dos pressupostos de admissibilidade do recurso. Mais uma vez, o CPC/73 oportunizava ao juiz singular, levando em consideração as alegações trazidas nas contrarrazões de apelação, e no prazo legal, apreciar novamente os requisitos de admissibilidade do recurso em apreço.

Segundo Machado (2013) esse dispositivo instituiu o duplo juízo de admissibilidade da apelação em primeira instância, o que significa facultar ao magistrado o juízo de retratação, isto é, a possibilidade de voltar atrás em sua decisão de receber o recurso, após o oferecimento das contrarrazões.

Machado (2013, p. 962) acrescenta:

o recebimento da apelação passa a ser bifásico: na primeira etapa o magistrado aprecia os requisitos de admissibilidade apenas e face a sentença proferida e da apelação interposta e recebido o recurso, abrir-se-á necessariamente a segunda fase após as contrarrazões, cabendo nesta segunda etapa os reexames dos mesmos requisitos, agora em face à impugnação de admissibilidade apresentada pelo recorrido na resposta.

Neves (2013, p. 450-451), citando Assis, sustenta que:

nessa segunda oportunidade de analisar os requisitos de admissibilidade, de duas uma: O juiz se retrata da sua decisão prévia e passa a entender que os pressupostos de admissibilidade não foram preenchidos no caso concreto. Nesse caso, profere decisão interlocutória ao não receber a apelação, em pronunciamento recorrível por agravo de instrumento (art. 522, CPC/73)

Confirma o seu entendimento prévio, mantendo a decisão de recebimento da apelação e, em seguida, enviando os autos para o Tribunal competente, intimando antes o Ministério Público para manifestação sempre que este funcione no processo como fiscal da lei.

Caso a apelação não tenha sido recebida em um dos juízos de admissibilidade, caberia ao apelante se valer do gravo de instrumento (art. 522 do CPC/73).

Mantido o juízo de admissibilidade recursal caberia ao juiz encaminhar a apelação ao Tribunal de Justiça, ocasião em que haveria uma distribuição, tendo em regra designação de relator e revisor,além de ser julgada por órgão composto por três membros (art. 555, CPC/73)

Após distribuição, a apelação seguiria conclusa para o relator que segundo Didier Jr. (2009, p. 133):

Ao examiná-la, este poderá, aplicando o art. 557 do CPC, já lhe negar seguimento ou provimento, por ser intempestiva, deserta, inadmissível, manifestadamente improcedente ou contrária a súmula ou jurisprudência de tribunal superior. Diversamente, poderá o relator, aplicando o §1 – A, do art. 557 do CPC, já lhe dar provimento, quando a apelação estiver de acordo com súmula ou jurisprudência dominante de tribunal superior.

Verifica-se, conforme Neves (2013), que o CPC/73 previa ao relator do recurso de apelação a possibilidade de um terceiro juízo de retratação posto que este poderia inadmitir monocraticamente o andamento recursal.

Da decisão monocrática que nega o prosseguimento do recurso, cabia agravo interno, no prazo de 5 (cinco) dias, a ser decidido pela turma responsável pelo julgamento da apelação, caso não houvesse reconsideração da sua decisão.

Caso não houvesse decisão monocrática do relator, caberia a este a análise do processo para posterior elaboração de relatório, devendo este ser encaminhado ao revisor, a quem caberia opor vistos e pedir inclusão na pauta de julgamento, para posterior julgamento e análise da turma.

Antes do julgamento da apelação pela Turma Recursal, é facultado um quarto juízo de admissibilidade, a ser realizado pelo colegiado caso haja algum vício não detectado pelas análises anteriores.Neste sentindo, Neves (2013, p. 650) preconiza:

uma vez formado o órgão colegiado, proceder-se-á pela quarta vez o juízo de admissibilidade da apelação, sendo dois os possíveis resultados: (i) entendendo o órgão colegiado que o recurso não reúne condições de admissibilidade, não conhece a apelação, sendo a decisão recorrível, em tese, por recurso especial e/ou recurso extraordinário. (ii) concordando com todos os juízos de admissibilidade feitos anteriormente, o órgão colegiado conhece o recurso e o julga em seu mérito, em decisão recorrível, a depender do caso concreto, por embargos infringentes, recurso especial e/ou recurso extraordinário.

Assim, através da análise procedimental do trâmite do recurso de apelação sob a égide do CPC/73, verifica-se que era possível a ocorrência de até 4 (quatro) juízos de admissibilidade recursal: (a) 02 (dois) juízos realizados pelo juiz monocrático, no ato de recebimento da apelação e após as contrarrazões desta, ambos atacáveis por agravo de instrumento; (b) 02 (dois) juízos realizados pela segunda instância, o primeiro monocraticamente pelo desembargador relator, sujeito a agravo interno, e o segundo pela turma, atacável por embargos infringentes, recurso especial e recurso extraordinário.


4. DO JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE DO RECURSO DE APELAÇÃO NO CPC/15.

Feita as considerações sobre o juízo de admissibilidade do recurso de apelação no CPC/73, resta analisar as inovações trazidas com a vigência do CPC/15, que modificou o trâmite processual do recurso ora analisado.

O art. 1.009 mantém a mesma disposição do CPC anterior, prevendo que o recurso cabível para reformar ou decretar nulidade da sentença é o recurso de apelação.

O art. 1.010 mantém a obrigatoriedade de interposição de apelação dirigida ao juiz de primeiro grau, contendo necessariamente: nome e qualificação das partes, exposição do fato e do direito, razões do pedido de reforma ou de decretação da nulidade e o pedido de nova decisão.

Após o recebimento da petição de apelação caberá ao juiz, com base no §1, intimar o apelado para apresentar contrarrazões no prazo de 15 (quinze) dias. É possível o apelado interpor apelação adesiva, devendo juiz intimar o apelante para oferecer contrarrazões a apelação adesiva, em claro respeito ao princípio do contraditório.

Transcorrido o prazo para as manifestações descritas, e em obediência ao §3, o juízo a quo deverá remeter os autos ao tribunal, independentemente de juízo de admissibilidade. Eis aqui, a grande alteração trazida pelo legislador ordinário.

Gonçalves (2016, p. 848) defende que “no atual CPC, salvo no recurso extraordinário e especial, não cabe ao órgão a quo fazer esse juízo de admissibilidade, que será feito exclusivamente pelo órgão ad quem”. Em seguida, reforçando que “a função do órgão a quo será apenas fazer o processamento do recurso, enviando-o oportunamente ao ad quem, que terá tanto o exame de admissibilidade recursal quanto, se caso, o de mérito”.

Freire (2016) leciona que a eliminação do juízo de admissibilidade do juízo a quo foi uma importante alteração legislativa promovida pelo legislador ordinário. Este autor reitera que o Enunciado 99 do FPPC preconiza que “órgão a quo não fará juízo de admissibilidade da apelação”, e que oenunciado 208 do FPPC acrescenta que “cabe reclamação por usurpação da competência do Tribunal de Justiça ou do Tribunal Regional Federal, contra decisão de juiz de 1° grau que inadmitir recurso de apelação”.

A reclamação, instrumento processual sem previsão no CPC/73, é uma ampliação do instituto previsto no art.102, I, l e 105, I, f da Constituição Federal de 1988 (CF/88),e será utilizada, conforme estabelece o art. 988 do CPC/15, pela parte interessada ou Ministério Público, a fim de preservar a competência do tribunal. Neste interim, sempre que o juiz singular inadmitir a remessa nos autos ao tribunal, qualquer que seja a alegação, caberá reclamação, visto que apenas o juízo ad quem pode realizar o julgamento de admissibilidade recursal da apelação.


5. ANÁLISE DOS ASPECTOS POSITIVOS ADVINDOS DA EXTINÇÃO DO JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE PELO JUÍZO A QUO.

As alterações promovidas com o advento do CPC/15 refletem positivamente em pelo menos três linhas de argumentação empírica:

Na Imparcialidade do juízo ad quem tendo em vista queno regular andamento processual, o juiz monocrático conhecerá do pedido do autor, das razões da parte contrária, saneando eventuais omissões e coletando as provas que se fizerem necessárias, para posterior confecção da sentença. Verifica-se, assim, que o juiz de primeira instância exerce a jurisdição de forma mais próxima das partes e por mais tempo, podendo, em tese, ser parcial com uma delas. Essa propensão de parcialidade tem-se prejudicada, pelo menos em tese, em relação ao juízo ad quem, visto que este não conhece as singularidades e interesses dos envolvidos.

A extinção do retrabalho do juiz singular na verificação da admissibilidade recursal da apelação posto que as alterações promovidas no trâmite do recurso de apelação e, por consequência, a retirada do juízo de admissibilidade da primeira instância, acarretou a extinção do retrabalho do juiz singular que não mais precisará verificar tais requisitos. Reprisa-se que no CPC/73, tal juízo poderia ser efetivado em duas oportunidades, conforme explicações alhures, e mesmo assim, ser reformado pelo juízo ad quem. Neste sentido, constata-se que essa alteração diminuiu significativamente o trabalho dos juízes monocráticos, que não mais precisarão se preocupar com a admissibilidade recursal da apelação, atividade esta exclusiva da segunda instância, sob pena de reclamação.

A impossibilidade de utilização do agravo de instrumento para atacar a decisão interlocutória que inadmite recurso de apelação dado que a retirada da análise da admissão do recurso de apelação pelo juiz monocrático, extinguiu a possibilidade jurídica de utilização do agravo de instrumento para atacar decisão interlocutória que inadmitia o prosseguimento do recurso analisado, tal qual previa o CPC/73. Logo, caso o juízo ao quo desrespeite o art. 1.010, ou seja, faça juízo de admissibilidade e não remeta ao tribunal o recurso de apelação, caberá ao prejudicado se valer de reclamação a fim de salvaguardar competência do tribunal.

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Sobre a autora
Luiza Veneranda Pereira Batista

Delegada de Polícia do estado de Goiás. Especialista em Direito Constitucional. Especialista em Direito Processual Civil. Especialista em Direito Processual Penal. Especialista em Criminologia. Formada em Direito pela Universidade Federal do Amazonas.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

BATISTA, Luiza Veneranda Pereira. Análise técnica do recurso de apelação: Extinção do duplo juízo de admissibilidade com o advento do novo Código de Processo Civil. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 23, n. 5623, 23 nov. 2018. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/63596. Acesso em: 25 abr. 2024.

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