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Afinal, o condomínio é obrigado a contratar um profissional de educação física como responsável pelo espaço de academia?

14/01/2019 às 16:00
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Debate-se a obrigatoriedade da contratação de profissionais de educação física como responsáveis pelos espaços de academias em condomínios edilícios, à luz da nova Lei Estadual n.º 8.070/2018, do Estado do Rio de Janeiro.

A proliferação dos espaços de academias nas áreas comuns dos condomínios edilícios traz à tona a velha dúvida acerca da obrigatoriedade da contratação de profissionais de educação física para acompanhamento das atividades desenvolvidas nestes espaços.

A Assembleia Legislativa do estado do Rio de Janeiro decretou, no mês de agosto de 2018, a Lei Estadual n.º 8.070, que dispõe sobre a obrigatoriedade de registro de profissional de Educação Física como responsável técnico nos condomínios edilícios com espaços de academias nas condições que especifica. A referida Lei Estadual foi sancionada pelo governador Luiz Fernando de Souza “Pezão” e publicada no dia 20 de agosto de 2018.

De acordo com o artigo 1º da Lei Estadual n.º 8.070/2018, os condomínios edilícios que disponibilizarem espaços de academias deverão registrar responsável técnico junto ao Conselho Regional de Educação Física da 1ª Região – CREF1, quando a atividade física for dirigida e realizada em salas de treinamento físico.

Observa-se, assim, que a própria lei especifica as condições em que os condomínios edilícios serão obrigados a registrar responsáveis técnicos junto ao CREF, quais sejam: i) quando o condomínio disponibilizar espaço de academia; ii) quando a atividade física for dirigida; e iii) quando a atividade física for realizada em sala de treinamento físico.

Surge, então, a dúvida acerca da necessidade de contratação de profissionais de Educação Física pelos condomínios edilícios que optarem pela disponibilização de espaços de academias e equipamentos para os seus condôminos, mas não oferecerem os serviços de acompanhamento e orientação das atividades físicas, isto é, quando as atividades não forem, efetivamente, dirigidas.

A justificativa do projeto de lei n.º 4.027/2018, que deu origem à Lei Estadual n.º 8.070, indica que o objetivo do diploma normativo seria “garantir os direitos fundamentais da sociedade fluminense, dentre eles o acesso às práticas saudáveis, sem riscos a sua integridade física e social”, além de proporcionar “maior segurança aos condomínios edilícios”, uma vez que estes estariam operando “com respaldo profissional do respectivo responsável técnico”[1].

Sendo assim, a redação original do artigo 1º do projeto de lei n.º 4.027/2018 determinava que os condomínios edilícios que disponibilizassem espaços de academias deveriam registrar responsável técnico junto ao CREF da 1ª Região, sem mencionar qualquer outra condição ou limitação à referida obrigatoriedade[2].

Contudo, após o parecer da Comissão de Constituição e Justiça da Assembleia Legislativa do estado do Rio de Janeiro no sentido da constitucionalidade do projeto de lei com a imposição de emendas ao texto original, o artigo 1º da Lei Estadual n.º 8.070/2018 foi aprovado com a sua redação atual, acrescido da expressão balizadora “quando a atividade física for dirigida e realizada em salas de treinamento físico”. A lei, no entanto, não esclarece o conceito de atividade física dirigida, permitindo o debate acerca das hipóteses de cabimento e aplicação da norma.

De acordo com o Dicionário Priberam da Língua Portuguesa, o termo “dirigida” consiste no feminino singular particípio passado do verbo dirigir, que pode significar: “ter a direção de”; “ter poderes ou responsabilidades de administração, de gestão”; ou “orientar um grupo de pessoas”[3]. A atividade física dirigida, por conseguinte, é aquela administrada, gerida ou orientada por uma terceira pessoa.

O fato da Lei Estadual n.º 8.070/2018 só ter sido aprovada pela Assembleia Legislativa do estado do Rio de Janeiro após a inclusão das condicionantes (“quando a atividade física for dirigida e realizada em salas de treinamento físico”) em seu artigo 1º, ademais, deixa clara a intenção do legislador de limitar a aplicação da norma aos casos dos condomínios que ofereçam os serviços de orientação profissional das atividades físicas praticadas pelos condôminos. Em outras palavras, a lei determina que, caso o condomínio decida oferecer o serviço em questão, será obrigado a registrar um responsável técnico junto ao Conselho Regional de Educação Física da 1ª Região.

Por certo, a obrigatoriedade da contratação de professores para o acompanhamento das atividades desenvolvidas particularmente pelos condôminos nas academias dos condomínios configuraria uma limitação indevida à liberdade de utilização das partes comuns pelos condôminos, prevista pelo artigo 1.335, inciso II, do Código Civil brasileiro[4].

Tal imposição não apenas limitaria o uso dos espaços de academia aos horários em que existissem professores disponíveis, mas também aumentaria substancialmente os gastos do condomínio, podendo até mesmo inviabilizar a instalação de academias em edifícios de menor porte.

Tratar-se-ia, ademais, de um paternalismo desnecessário, tendo em vista que os condôminos possuem o direito, ratificado pela própria Lei Estadual n.º 8.070/2018[5], de contratarem professores de Educação Física (personal trainers) para orientarem, individual e particularmente, as suas atividades físicas nas academias dos condomínios.

Destaca-se, por fim, que o próprio Conselho Federal de Educação Física explica, em seu website[6], que os condomínios só precisarão contratar profissionais de Educação Física quando as atividades da academia forem orientadas, e não quando apenas disponibilizarem o espaço e os aparelhos aos condôminos.

Dessa forma, cabe a cada condômino assumir a responsabilidade pela prática de atividades físicas não supervisionadas nas áreas comuns do condomínio, não tendo a Lei Estadual n.º 8.070/2018, salvo melhor juízo, determinado a necessidade de acompanhamento por um profissional de Educação Física nestes casos.

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Notas

[1] Tramitação do projeto de lei n.º 4.027/2018 disponível no website <http://www2.alerj.rj.gov.br/lotus_notes/default.asp?id=3&url=L3NjcHJvMTUxOS5uc2YvZTAwYTdjM2M4NjUyYjY5YTgzMjU2Y2NhMDA2NDZlZTUvNTdlMmE0NDMwMzljN2VhZDgzMjU4MjdhMDA2MjkwNzU/T3BlbkRvY3VtZW50>, acessado em 09 de janeiro de 2019, às 17:24 horas.

[2]  Idem.

[3]  <https://dicionario.priberam.org/dirigida>, acessado em 10 de janeiro de 2019, às 12:45 horas.

[4] Art. 1.335. São direitos do condômino:

II - usar das partes comuns, conforme a sua destinação, e contanto que não exclua a utilização dos demais compossuidores.

[5] Art. 2º.  Fica facultado, a cada condômino, contratar um responsável técnico devidamente registrado no Conselho Regional de Educação Física para orientar a sua atividade física.

[6]  <http://www.confef.org.br/confef/conteudo/1363>, acessado em 10 de janeiro de 2019, às 13:18 horas.

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Sobre o autor
Pedro Henrique Vianna Barbosa

Advogado especialista em Direito Condominial e Imobiliário, sócio-fundador do escritório de advocacia Barbosa e Biar Advogados Associados, graduado em Direito pela Fundação Getulio Vargas do Rio de Janeiro e pós-graduado pela Escola de Magistratura do estado do Rio de Janeiro.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

BARBOSA, Pedro Henrique Vianna. Afinal, o condomínio é obrigado a contratar um profissional de educação física como responsável pelo espaço de academia?. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 24, n. 5675, 14 jan. 2019. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/71328. Acesso em: 16 abr. 2024.

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