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Prática jurídica: audiência de custódia e o advogado de defesa

15/06/2019 às 09:00
Leia nesta página:

O advogado, ao participar de audiência de custódia, necessita estar atento a alguns pontos básicos e, sobretudo, à Resolução nº 213 do CNJ.

INTRODUÇÃO

O tema audiência, seja ela de qualquer área do Direito, gera inúmeras dúvidas, principalmente nos alunos que ainda estão cursando o curso de Direito, bem como aos advogados que começaram a militar na área e ainda não têm muita experiência. Baseado nisso, resolvi escrever esse pequeno artigo sobre Audiência de Custódia.

A intenção é ser o mais prático e objetivo possível. Não tenho a intenção de expirar o assunto, mas contribuir de alguma forma para dirimir eventuais dúvidas que porventura possam existir na atuação prática do Advogado.

Boa leitura.


AUDIÊNCIA DE CUSTÓDIA – ATO NORMATIVO

Os procedimentos da audiência de custódia não serão encontrados no Código de Processo Penal e nem no Código Penal, mas na Resolução 213 do Conselho Nacional de Justiça – CNJ.

Essa Resolução determina que toda pessoa presa em flagrante delito, independentemente da motivação ou natureza do ato, seja, obrigatoriamente, apresentada, em até 24 horas da comunicação do flagrante, à autoridade judicial competente, e ouvida sobre as circunstâncias em que se realizou sua prisão ou apreensão.

A norma também prevê a apresentação à autoridade judicial no prazo de 24 horas das pessoas presas em decorrência de cumprimento de mandados de prisão cautelar ou definitiva, aplicando-se, no que forem conexos, os procedimentos previstos na Resolução 213 (Art. 13).

Ademais, o artigo 13 informa que todos os mandados de prisão deverão conter, expressamente, a determinação para que, no momento de seu cumprimento, a pessoa presa seja imediatamente apresentada à autoridade judicial que determinou a expedição da ordem de custódia ou, nos casos em que forem cumpridos fora da jurisdição do juiz processante, à autoridade judicial competente, conforme lei de organização judiciária local.

Enfim, é na Resolução 213 do Conselho Nacional de Justiça – CNJ que você encontrará os procedimentos da audiência de custódia. Logo, a leitura desse diploma é fundamental para o Advogado.

Não deixem de ler.


FINALIDADE PRÁTICA DA AUDIÊNCIA DE CUSTÓDIA

Após saber qual norma rege a matéria, é interessante que o Advogado a leia com o objetivo de descobrir o que pode ser discutido na audiência de custódia. Então, nada melhor do que descobrir qual a finalidade da norma. Isso faz com que você direcione seu objetivo para o que realmente interessa e não perca tempo fazendo perguntas que não sejam relevantes ou não tenham relação com o procedimento.

Sem delongas, a finalidade prática da audiência de custódia é verificar se a prisão ocorreu de forma legal ou não, bem como verificar a existência de tortura ou maus tratos e se a prisão deve ser mantida ou não.

É extremamente importante que as finalidades estejam bem claras na mente do advogado, pois quando o Juiz deferir as reperguntas, o advogado as faça de acordo com a natureza do ato, requerendo ao final o que entender de direito (§1º, do Art. 8º). Por outras palavras, o advogado deve requerer o seguinte:

I - o relaxamento da prisão em flagrante;

II - a concessão da liberdade provisória sem ou com aplicação de medida cautelar diversa da prisão;

III - a decretação de prisão preventiva (Ministério Público);

IV - a adoção de outras medidas necessárias à preservação de direitos da pessoa presa.

Ao ler o §1º, do Art. 8º da Resolução 213, percebe-se quais requerimento podem ser feitos pelo advogado. Então, para que seja requerido o relaxamento da prisão em flagrante, o advogado deve verificar detidamente se a prisão efetuada está em conformidade com o disposto no art. 302, 304 e 306 do Código de Processo Penal. Caso exista ou existam vícios formais ou materiais que venham macular a prisão, será o caso de relaxamento da prisão em flagrante.

Lembrando que o artigo 5º, LXV, da Constituição Federal, diz que:

LXV – a prisão ilegal será imediatamente relaxada pela autoridade judiciária.

Nessa esteira, o advogado vai verificar se constam, no auto de prisão em flagrante, os termos de depoimento do condutor e testemunhas, as notas de culpa e a comunicação às pessoas integrantes da família do flagrado. Depois, verificar se consta a comunicação à Defensoria Pública e ao Ministério Público.

Ademais, verificar se: 1) há provas suficientes que comprove a prática delitiva; 2) se o tempo exigido pelo estado de flagrância foi muito superior; 3) se ocorreram flagrantes forjados/preparados; 4) além de verificar se as exigências previstas no art. 304 do Código de Processo Penal estão corretas.

Um ponto importante é o fato de o mérito não ser discutido na Audiência de Custódia. Primeiro porque o inciso VIII, do art. 8º diz que a autoridade judiciária deve abster-se de formular perguntas com finalidade de produzir prova para a investigação ou ação penal relativas aos fatos objeto do auto de prisão em flagrante. Segundo, devem ser evitadas perguntas relativas ao mérito dos fatos e que possam constituir eventual imputação.

Agora, se por ventura o advogado não visualizar a necessidade de requerer o relaxamento da prisão em flagrante, pois entendeu que a prisão foi totalmente legal, é o momento de demonstrar se a manutenção da prisão é necessária ou não. Então, para que isso aconteça o advogado deve direcionar todos os seus esforços no sentido de demonstrar ao Juiz que não é o caso da decretação da prisão preventiva e, por conseguinte, que a concessão da liberdade provisória sem ou com aplicação de medida cautelar diversa da prisão será a medida da mais bela Justiça.

Posta assim a questão, agora o advogado vai ter que demonstrar não estarem presentes os motivos ensejadores da prisão preventiva (art. 312, CPP). Neste sentido, deve demonstrar que a liberdade do preso não prejudicará a ordem pública, pois não demonstra alta periculosidade, nem há demonstração de desassossego social.

Continuando, vai procurar demonstrar que o preso não é prejudicial à ordem econômica, nem à conveniência da instrução criminal, de forma que não há provas de que o preso possa fugir do distrito da culpa ou que irá prejudicar a busca da verdade real. Assim como não subsiste o periculum libertatis, sendo possível, no presente caso, a concessão da liberdade provisória sem ou com aplicação de medida cautelar diversa da prisão (art. 319, CPP).

Não se pode perder de vista que é importante o advogado verificar se o preso tem filho(a) ou alguém que dependa dele fora do estabelecimento prisional. Bem como verificar se ele tem residência fixa e trabalho lícito. Neste caso entendo que não precisa ser com carteira assinada, basta que o trabalho seja lícito.

Cumpre examinarmos, neste passo, o inciso IV, do §1º, do art. 8º, da Resolução 213, do CNJ.

Confira:

IV - a adoção de outras medidas necessárias à preservação de direitos da pessoa presa.

Conforme dito nos parágrafos anteriores uma das finalidades da audiência de custódia é verificar se o preso sofreu tortura ou maus tratos.

Então, havendo declaração da pessoa presa em flagrante delito de que foi vítima de tortura e maus tratos ou entendimento da autoridade judicial de que há indícios da prática de tortura, será determinado o registro das informações, adotadas as providências cabíveis para a investigação da denúncia e preservação da segurança física e psicológica da vítima, que será encaminhada para atendimento médico e psicossocial especializado (art. 11).

Diante disso, havendo declaração da pessoa presa em flagrante delito de que foi vítima de tortura e maus tratos, o advogado deve requerer a adoção de medidas necessárias à preservação de direitos da pessoa presa.

Sendo assim, caso o Juiz não encaminhe para os órgãos competentes, o advogado deve requerer que os dados contidos na audiência sejam encaminhados para os órgãos competentes. Aqui pode ser o Ministério Público, a Corregedoria da Polícia Militar ou Civil ou outro órgão com competência para averiguar o que foi dito pelo preso na audiência de custódia.

Passadas as breves e objetivas explicações sobre os artigos e os incisos citados nos parágrafos anteriores. Agora é bom trazer à tona o conteúdo dos protocolos I e II, da Resolução 213, do CNJ. Estes protocolos estão na parte final da norma.

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O Protocolo I traz os procedimentos para a aplicação e o acompanhamento de medidas cautelares diversas da prisão para custodiados apresentados nas audiências de custódia.

O Protocolo II, por sua vez, contém os procedimentos para oitiva, registro e encaminhamento de denúncias de tortura e outros tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes.

Resumindo, no protocolo I você irá encontrar:

1. Fundamentos legais e finalidade das medidas cautelares diversas da prisão;

2. Diretrizes para a aplicação e o acompanhamento das medidas cautelares diversas da prisão;

3. Procedimentos para acompanhamento das medidas cautelares e inclusão social;

3.1. A atuação do Juiz deverá considerar os seguintes procedimentos:

3.2. A atuação das Centrais Integradas de Alternativas Penais ou órgãos similares deverá considerar os seguintes procedimentos:

3.3. A atuação das Centrais de Monitoração Eletrônica de Pessoas deverá considerar os seguintes procedimentos:

Por outro lado, no Protocolo II você irá encontrar:

1. Definição de Tortura;

2. Condições adequadas para a oitiva do custodiado na Audiência de Custódia;

3. Procedimentos relativos à coleta de informações sobre práticas de tortura durante a oitiva da pessoa custodiada;

4. Procedimentos para coleta do depoimento da vítima de tortura;

5. Questionário para auxiliar na identificação e registro da tortura durante oitiva da vítima

6. Providências em caso de apuração de indícios de tortura e outros tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes

Percebe-se que eles trazem fundamentos, diretrizes, questionários, procedimentos e as providências. Logo, vale muito a pena o advogado ler o conteúdo destes protocolos.


CONCLUSÃO

Objetivamente, o advogado, ao participar de uma audiência de custódia, deve analisar: 1) se a prisão ocorreu de forma legal ou não; 2) se o preso sofreu tortura ou maus tratos; 3) se a prisão deve ser mantida ou não; 4) requerer o relaxamento da prisão em flagrante; 5) requerer a concessão da liberdade provisória sem ou com aplicação de medida cautelar diversa da prisão; 6) requerer a adoção de outras medidas necessárias à preservação de direitos da pessoa presa.

Teoricamente, o advogado deve ter sempre em mente a Resolução 213 do CNJ, os requisitos dos artigos 302, 304, 306, 312 e 319, do Código de Processo Penal, bem como evitar fazer perguntas sobre o mérito, pois a finalidade da audiência de custódia é diversa da audiência de instrução e julgamento.

Espero que este artigo contribua e/ou ajude aos colegas de alguma forma.

Grande abraço.


Bibliografia

Brasil. (3 de out de 1941). Lei, decreto etc: DECRETO-LEI Nº 3.689, DE 3 DE OUTUBRO DE 1941 - Código de Processo Penal. Acesso em 10 de 04 de 2019, disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Decreto-Lei/Del3689.htm

Brasil. (5 de out de 1998). Lei, decreto, norma e etc: CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL DE 1988. Acesso em 11 de 04 de 2019, disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm

Brasil. (15 de dez de 2015). Lei, decreto, norma e etc: Resolução Nº 213 do Conselho Nacional de Justiça, 15 de dezembro de 2015. Acesso em 10 de 4 de 2019, disponível em http://www.cnj.jus.br/busca-atos-adm?documento=3059: http://www.cnj.jus.br/busca-atos-adm?documento=3059

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Sobre o autor
Fábio Bahia Bomfim

Olá! Sou advogado formado pela Universidade de Sergipe - FASE (atual Estácio Sergipe). E desde 2012 trabalho na defesa dos seus direitos. Atuo sempre com Objetividade, Agilidade e Disciplina. Meu foco é o resultado desejado pelo cliente. E o objetivo é alcançar a Advocacia de Excelência. Por isso, a Sinceridade, a Honestidade, a Confiança, o Trabalho e acima de tudo a Justiça sempre serão a base da minha relação com o Cliente. Enfim, meu compromisso é com você, cliente. Posso Ajudar!

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

BOMFIM, Fábio Bahia. Prática jurídica: audiência de custódia e o advogado de defesa. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 24, n. 5827, 15 jun. 2019. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/73243. Acesso em: 25 abr. 2024.

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