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Estudo sobre a repristinação de normas e sua aplicação:

a revogação, pela MP nº 232, do art. 36 da Lei nº 10.637/02

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Discute-se o vigor de artigos de Medida Provisória que não foram convertidos em lei para revogar artigos de outras leis ordinárias.

Dispõe o art. 62 da CF: "Em caso de relevância e urgência, o Presidente da República poderá adotar medidas provisórias, com força de lei, devendo submetê-las de imediato ao Congresso Nacional".

O parágrafo 3º deste artigo assim dispõe: "As medidas provisórias, ressalvado o disposto nos §§ 11 e 12, perderão eficácia, desde a edição, se não foram convertidas em lei no prazo de 60 (sessenta) dias, prorrogável, nos termos do § 7º, uma vez por igual período, devendo o Congresso Nacional disciplinar, por decreto legislativo, as relações jurídicas delas decorrentes".

Em complementação, o parágrafo 11º deste artigo preconiza: "Não editado o decreto legislativo a que se refere o § 3º até 60 dias após a rejeição ou perda de eficácia de medida provisória, as relações jurídicas ou decorrentes de atos praticados durante sua vigência conservar-se-ão por ela regidas".

Já a Lei de Introdução ao Código Civil, traz a norma em seu artigo 2º que "a lei revogada não se restaura por ter a lei revogada perdido a vigência".

Desta forma, poder-se-ia questionar se o artigo da Medida Provisória, que por dispositivo constitucional tem eficácia de lei ordinária, poderia ter revogado em caráter definitivo outro artigo de lei ordinária, ainda que o primeiro não fosse convertido em lei quando da apreciação pelo Legislativo. Postula-se se a não conversão em parte da Medida Provisória não seria verdadeira repristinação de normas.

Roque Carazza [01] entende que:: "Em suma, a medida provisória tem vida efêmera, já que caduca decorrido o prazo de aprovação. Como se isso não bastasse, se neste exíguo prazo não for convolada em lei, perde eficácia ab initio. Em outras palavras, a rejeição da medida provisória opera efeitos ex tunc, isto é, faz com que este ato normativo caia por terra e, com ele, todos os efeitos que eventualmente produziu; [...] a medida provisória não revoga lei que dispõe em sentido contrário. Apenas suspende-lhe a eficácia. A revogação dar-se-á quando a medida provisória for convertida em lei. E, ainda assim, se não houver nenhuma inconstitucionalidade a tisná-la. Não havendo conversão, tudo volta ao estado anterior. A lei, que não fora revogada, mas tivera sua constitucionalidade suspensa, volta a produzir todos os seus regulares efeitos".

No mesmo sentido vai Alexandre de Moraes [02], para quem: "A edição da medida provisória paralisa temporariamente a eficácia da lei que versava a mesma matéria. Se a medida provisória for aprovada, convertendo-se em lei, opera-se a revogação. Se, entretanto, for rejeitada, restaura-se a eficácia da norma anterior. Isso porque, com a rejeição, o Legislativo expediu ato volitivo consistente em repudiar o conteúdo daquela medida provisória, tornando subsistente anterior vontade manifestada de que resultou a lei antes editada"

O Supremo Tribunal Federal assim já decidiu: "A Medida Provisória meramente susta a aplicabilidade e a execução de diplomas legislativos, somente com a conversão em lei dessa espécie normativa é que se operará, com eficácia ex tunc, a definitiva cessação da vigência do ato por ela revogado". (STF – Pleno – ADIN 712-2/DF – rel. Min. Celso de Mello, DJU 25.02.1993).

A própria Receita Federal admitiu a possibilidade do planejamento tributário em cisões e incorporações na exposição de motivos para a revogação do artigo 36, que o Congresso Nacional deixou de fora da Lei nº 11.119, entendendo, desta forma, não ter havido a revogação do art. 36 da Lei 10.637/02.

Desta forma, pode-se concluir com certa segurança de que no ordenamento brasileiro não se admite a revogação de artigo de lei ordinária por dispositivo constante em Medida Provisória que não foi convertido em lei, como é o presente caso.


Notas

01 Curso de Direito Constitucional Tributário, 20ª ed., São Paulo, Malheiros, 2.004.

02 Constituição do Brasil Interpretada, 2ª ed., São Paulo, Atlas, 2.003.

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Sobre o autor
Pedro Guilherme Modenese Casquet

Advogado. Bacharel em Direito pela Universidade de São Paulo. Especialista em Processo Tributário pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CASQUET, Pedro Guilherme Modenese. Estudo sobre a repristinação de normas e sua aplicação:: a revogação, pela MP nº 232, do art. 36 da Lei nº 10.637/02. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 10, n. 830, 11 out. 2005. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/7409. Acesso em: 27 abr. 2024.

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