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A comunicação oral:

habilidade a ser desenvolvida pelas instituições de ensino diante das recentes alterações processuais que privilegiam o manejo da linguagem falada

27/01/2006 às 00:00
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Sempre muito se falou que a formação do advogado dependia da habilidade para a comunicação tanto escrita quanto oral. Ocorre que a comunicação escrita sempre pareceu predominar face à oral no direito processual brasileiro.

A linguagem oral era considerada até pouco tempo atrás habilidade essencial aos promotores de justiça e aos advogados criminalistas, diante de suas imprescindíveis atuações junto ao Tribunal do Júri.

Em que pese a predominância da forma escrita de expressão de atos processuais [01], verifica-se atualmente uma valorização da falada.

E essa valorização deve-se às doutrinas italianas, as quais introduziram no processo brasileiro a idéia de que um processo célere, justo, dinâmico, ágil e eficiente estaria a depender da simplificação das formas processuais, para o que seria necessária a adoção, em uma escala mais considerável, entre outras coisas, da oralidade processual.

Esse movimento não é contemporâneo ao Código de Processo Civil de 1973, o qual, a propósito, atenuou consideravelmente o princípio da oralidade, eis que limitou as referências aos mesmos ao disposto nos artigos 132 [02], 330 [03] e 522.

Atendendo aos ensinamentos da doutrina italiana, o direito brasileiro passou a privilegiar, a partir da década de 90, mediante reformas esparsas, o princípio da oralidade processual, homenageando um processo marcado pela concentração dos atos processuais (produção de provas preferencialmente em um único momento), pela imediação ou imediatidade (contato direto do juiz com as partes e as provas, sem intermediários), pela identidade física do juiz (direção do processo por um mesmo juiz, do início ao fim) e pela irrecorribilidade das decisões interlocutórias.

A primeira demonstração dessa mudança de paradigma foi a consagração da oralidade como princípio do sistema dos Juizados Especiais, no artigo 2º da lei que o disciplina - Lei n.º 9.099/95 - : "O processo orientar-se-á pelos critérios da oralidade, simplicidade, informalidade, economia processual e celeridade, buscando, sempre que possível, a conciliação ou a transação." (sem grifo no original)

Recentemente, em 20 de outubro de 2005, foi publicada no Diário Oficial da União a Lei n.º 11.187, de 19 de outubro de 2005, que "Altera a Lei n.º 5.869, de 11 de janeiro de 1973 – Código de Processo Civil, para conferir nova disciplina ao cabimentos dos agravos retido e de instrumentos e dá outras providências."

Referida lei representou um marco na ampliação da oralidade no processo civil pátrio, já que veio tornar obrigatória a interposição oral do recurso de agravo face às decisões proferidas em audiência.

A partir dessa lei, o parágrafo 3º do artigo 522 do CPC passou a ter a seguinte redação:

"Art. 522. Das decisões interlocutórias caberá agravo, no prazo de 10 (dez) dias, na forma retida, salvo quando se tratar de decisão suscetível de causar à parte lesão grave e de difícil reparação, bem como nos casos de inadmissão da apelação e nos relativos aos efeitos em que a apelação é recebida, quando será admitida a sua interposição por instrumento. (...)

§ 3º Das decisões interlocutórias proferidas na audiência de instrução e julgamento caberá agravo na forma retida, devendo ser interposto oral e imediatamente, bem como constar do respectivo termo (art. 457), nele expostas sucintamente as razões do agravante.".(sem grifo no original)

A alteração acima, no afã de conferir efetividade ao processo e inibir o intuito protelatório do réu, por dificultar a interposição do recurso de agravo, exige do advogado o exercício da habilidade da comunicação oral, bem como seu aprimoramento.

E essa obrigatoriedade de interposição de agravo oral face às decisões proferidas em audiência de instrução e julgamento exigirá do advogado, além do domínio das técnicas processuais, pleno domínio das questões versadas no processo, raciocínio lógico célere, capacidade de argumentação, bem como habilidade de improvisação, vez que de ora em diante terá que identificar a decisão passível de recurso imediatamente, manifestar sua intenção de recorrer e articular, no curtíssimo período de tempo que lhe é proporcionado para esse fim, as razões do recurso.

Para se obter sucesso em atos processuais dessa natureza, vê-se que não basta apenas falar, que é preciso saber expressar corretamente as razões de direito material e processual que possam ensejar a reforma da decisão recorrida, sendo imprescindíveis ao operador jurídico o domínio das habilidades acima mencionadas.

Tais inovações ensejam dúvidas com relação à preparação do advogado, especialmente o recém formado, para agir diante dessa nova técnica processual. A propósito, na rotina forense, constata-se esse despreparo e que os advogados estão muito mais adaptados à comunicação escrita do que à falada.

Diante dessa constatação, urge uma campanha voltada a estimular as instituições de ensino a desenvolverem entre os graduandos de direito a comunicação oral, elegendo uma disciplina específica para tanto, sob pena de aqueles restarem deficientemente formados. Às instituições fiscalizadoras, a exemplo do Ministério da Educação e Cultura (MEC) e da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), competirá dar início a essa campanha. Isso é o que se espera!

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Notas

01 Necessário salientar que mesmo os atos processuais oralmente manifestados são reduzidos a escrito (a termo).

02 O juiz, titular ou substituto, que concluir a audiência julgará a lide, salvo se estiver convocado, licenciado, afastado por qualquer motivo, promovido ou aposentado, casos em que passará os autos ao seu sucessor. Referido dispositivo declarou exceções ao princípio da identidade física do juiz que, como já dito, compõe o princípio da oralidade.

03 O conhecerá diretamente do pedido, proferindo sentença: I – quando a questão de mérito for unicamente de direito, ou, sendo de direito e de fato, não houver necessidade de produzir prova em audiência; II – quando ocorrer a revelia (art. 319).

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Sobre a autora
Adriana Estigara

Doutora pela PUC/SP Mestre em Direito Econômico e Social pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná. Advogada e Consultora na área do Direito Tributário, e Direito do Terceiro Setor, integrante do Lewis & Associados. Professora junto à Universidade Positivo nas graduação e na pós graduação junto às disciplinas de Direito Tributário.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ESTIGARA, Adriana. A comunicação oral:: habilidade a ser desenvolvida pelas instituições de ensino diante das recentes alterações processuais que privilegiam o manejo da linguagem falada. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 11, n. 938, 27 jan. 2006. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/7882. Acesso em: 19 abr. 2024.

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Título original: "A comunicação oral: habilidade que urge ser desenvolvida pelas instituições de ensino na formação do operador jurídico diante das recentes alterações processuais que privilegiam o manejo da linguagem falada".

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