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Do princípio da disponibilidade no processo de execução

13/07/2006 às 00:00
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1 INTRODUÇÃO

A manifestação de desistência da ação constitui-se, como cediço, em ato jurídico processual de disposição, privativo do autor, causa extintiva do processo de cognição sem resolução do mérito. No processo de conhecimento encontra-se disciplinada a desistência da ação pelo artigo 267, inciso VIII, § 4º, do Código de Processo Civil.

O tema relacionado à desistência (entendo mais adequado o termo desistência do processo – apesar da discordância continuarei usando a terminologia do Código de Processo Civil por arraigada à praxis) da ação de conhecimento não vem gerando dissensões no seio da doutrina. No processo de execução, contudo, o artigo 569 do Código Instrumental Civil vem recebendo interpretações variadas, existindo corrente doutrinária propugnando pela limitação da aplicação do princípio da disponibilidade nesta modalidade de processo, exigindo o consentimento do executado em algumas situações para que seja extinta a relação processual juris satisfativa.

A finalidade do presente estudo, dessarte, é enfocar o alcance de incidência do princípio da disposição no processo de execução, não sem antes fazer uma análise, ainda que de forma sumária, da desistência da ação de conhecimento, para, ao final, apresentar a melhor solução à controvérsia existente.


2 DA DESISTÊNCIA NO PROCESSO DE CONHECIMENTO

O processo de conhecimento tem por finalidade precípua, como sabido, o acertamento de situações jurídicas conflituosas, com o escopo de criar norma jurídica concreta capaz de dirimir as relações existentes entre as partes. Não é por outra razão que o processo de conhecimento é marcado por ser um processo através do qual se busca a obtenção de uma sentença com resolução de mérito, capaz de adquirir imunização no que tange aos seus efeitos (a coisa julgada material é qualidade da sentença e não seu efeito).

Neste sentido, verifica-se do escólio de José Frederico Marques (1997, p.19) que:

"Processo de conhecimento é aquele em que a tutela jurisdicional se concretiza na mais genuína e básica de suas operações: o da sentença. Processo de conhecimento é processo de sentença, isto é: instrumento imanente à jurisdição, para que o órgão desta diga o direito do caso concreto ao compor o litígio".

Assim, por ter o processo de conhecimento o objetivo de eliminar incertezas, definindo o direito aplicável à crise jurídica levada à apreciação do Estado-Juiz, criando regra jurídica concreta para a normatização da relação existente entre os litigantes, é que a desistência da ação de conhecimento por parte do autor encontra certa limitação, conforme ressumbra da dicção do § 4º do artigo 267 do Código de Processo Civil.

Segundo Cruz e Tucci (1988, p.5), a desistência pode ser definida como "a abdicação expressa da posição processual alcançada pelo autor, após o ajuizamento da ação". Enfim, a desistência da ação consiste no ato do autor através do qual o mesmo abre mão de seu direito ao processo como instrumento da jurisdição, o que não implica em extinção do direito material que ele procurava proteger através do processo. A desistência da ação produz efeitos apenas processuais, não atingindo o direito material que permanece incólume, ao contrário do que ocorre com a renúncia ao direito sobre o qual se fundamenta a pretensão articulada (causa de extinção do processo com resolução de mérito). Tanto é verdade que a desistência da ação, com a conseqüente extinção anômala do processo (digo anômala pelo fato do processo não ter atingido a sua finalidade, qual seja, a apreciação do mérito), não tem o condão de impedir que a demanda seja novamente levada ao exame do Estado-Jurisdição, diante da ausência da autoridade da coisa julgada material.

É importante asseverar que o Réu ao oferecer resistência à pretensão jurídica de direito material contra ele deduzida está demonstrado, de forma inequívoca, interesse na obtenção de uma tutela jurisdicional, a qual será sempre de conteúdo negativo. O Réu ao contestar busca alcançar no processo uma sentença desfavorável aos interesses do Autor, ou seja, uma sentença declaratória negativa (improcedência do pedido). Tal fato não passou ao largo do magistério do professor Dinamarco (2005, p. 32), o qual, ao acentuar a bipolaridade alternativa do processo de conhecimento, obtemperou que:

"Da alternatividade da tutela jurisdicional a ser outorgada no processo de conhecimento decorre em primeiro lugar a sua bipolaridade alternativa, que se resolve no direito de ambas as partes a ele (direito ao processo) e à emissão da sentença de mérito que ele prepara. Não só o autor o tem, mas de igual modo o réu, a quem a lei oferece inclusive o poder de impedir a extinção do processo pela vontade unilateral do autor: o dispositivo que condiciona a desistência da ação à anuência do réu é visível manifestação dessa bipolaridade que rege o direito ao processo. Tanto o réu quanto ao autor a lei oferece o direito de esperar legitimamente pela sentença de mérito favorável e, portanto, pela tutela jurisdicional plena que ela em princípio é capaz de proporcionar".

Destarte, a bipolaridade alternativa do processo de conhecimento explica a necessidade da anuência do Réu à manifestação de desistência do Autor, quando já apresentada resposta à pretensão deduzida na inicial.

Portanto, pode ser afirmado que antes de apresentada a resposta do Réu poderá o Autor desistir ou abdicar da ação de forma unilateral (ato de desistência incondicionado). Uma vez apresentada a resposta haverá necessidade do consentimento ou anuência do Réu (o Réu, como afirmado anteriormente, terá demonstrado interesse na obtenção de tutela jurisdicional) para que o processo possa ser extinto sem resolução do mérito. Nesta última hipótese a desistência será condicionada ou bilateral, dependendo para produzir o efeito de extinguir o processo da concordância do Réu. Neste sentido, a redação do § 4ª do artigo 267 do CPC é infeliz, por não ser o transcurso do prazo relevante e sim a apresentação da resposta.

Assim, por existir no processo de conhecimento o interesse de qualquer das partes, inclusive do Réu, na obtenção de sentença de mérito, é que se faz necessário, uma vez apresentada resposta, o consentimento do sujeito passivo da relação processual para que a desistência possa gerar a extinção anômala do processo. Ademais, salta aos olhos o interesse do Réu no processo de conhecimento na obtenção de uma sentença de mérito desfavorável (favorável ao Réu) à pretensão veiculada pelo Autor capaz de restar adornada pela res judicata, impedindo, de uma vez por todas, o reajuizamento da demanda.

Bastante esclarecedora neste particular a lição do processualista Marcus Vinicius Gonçalves (2004, p. 281), ao pontificar que "justifica-se a necessidade de consentimento, pois a desistência não impede a repropositura da demanda. Por isso, é justo que ele (Réu), em determinadas circunstâncias, possa preferir o seguimento do processo, na busca de um resultado de mérito que ponha fim, de uma vez por todas, à lide, impedindo novas ações que versem sobre o mesmo assunto".


3 DA DESISTÊNCIA NO PROCESSO DE EXECUÇÃO

Para melhor compreensão da incidência do princípio da disponibilidade no processo de execução faz-se mister, primeiramente, um breve exame a respeito das características da aludida variante ou modalidade processual.

O processo de execução tem por objetivo satisfazer ou realizar determinado direito consubstanciado em um título executivo. Os atos praticados no processo de execução são reais, todos eles voltados para fazer atuar a regra jurídica concreta. A atividade intelectiva ou cognitiva no processo de execução será apenas acidental e, portanto, limitada. Como afirmado anteriormente não buscam as partes no processo de execução a obtenção de sentença com resolução de mérito. A cognição no processo de execução é limitada, por não ter o referido processo a finalidade de acertar o direito, sendo certo afirmar, porém, que o contraditório tem perfeita incidência na espécie. Aliás, o princípio constitucional do contraditório (informação + reação possível) é inerente a qualquer processo, não fugindo da regra o processo de execução.

É importante salientar, contudo, a recente alteração trazida pela Lei nº 11.232/2005, a qual colocou fim à necessidade do processo executório ex intervallo quando o título for judicial (sentença condenatória – artigo 475 – I e segs. do Código de Processo Civil). Quando o título for judicial, encerrando condenação envolvendo obrigação por quantia certa, teremos um processo sincrético, com a instauração de execução forçada de natureza incidental, mera fase processual complementar sucessiva de natureza satisfativa. Não haverá necessidade da formação de estrutura processual executória autônoma para a realização do direito emanado do comando do ato sentencial. O processo será dividido em módulos processuais (cognitivo e executório).

No processo de execução, diferentemente do que ocorre no processo de cognição, por não ser possível a obtenção de sentença de mérito, não há que se falar em bipolaridade alternativa da tutela jurisdicional, uma vez que tem perfeita aplicação no mesmo o princípio do desfecho único, segundo o qual apenas o exeqüente poderá receber a seu favor a tutela satisfativa, posto que o único desfecho normal do processo de execução é a realização ou satisfação do crédito exeqüendo. Neste sentido, discorre Dinamarco (2005, p.33) o seguinte:

"No processo executivo já de antemão se sabe que a tutela consistente na satisfação de um direito somente poderá ser concedida ao exeqüente e jamais ao executado; ou se concede àquele ou a ninguém (desfecho único: Alfredo Buzaid). O máximo que pode o executado pretender é a extinção processual sem que seu patrimônio haja sido desfalcado – mas não pode esperar pela entrega de bem algum, em seu benefício, à custa do patrimônio do exeqüente".

O processo de execução (bem como o módulo processual incidental que se instaura na fase executória – Lei nº 11.232/2005) tem por finalidade satisfazer o direito (crédito) do exeqüente, sendo todos os atos processuais-reais praticados direcionados no sentido de ser alcançado este desiderato.

O princípio do desfecho único, portanto, tem profunda repercussão na desistência da ação de execução, afastando, inclusive, a aplicação ao processo de execução da regra inserta no § 4º do artigo 267 do CPC, que exige o consentimento do réu para que a desistência acarrete a extinção do processo.

Se o processo executório visa satisfazer o direito exteriorizado no título resta claro que o exeqüente deve ser o senhor da conveniência a respeito da continuidade ou não da relação processual juris satisfativa. Não seria crível, assim, exigir o consentimento do executado para que o processo de execução fosse extinto em decorrência da manifestação de desistência.

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Neste sentido, dispõe o artigo 569 do Estatuto Processual a respeito do princípio da disponibilidade da execução, com a seguinte redação: "o credor tem a faculdade de desistir de toda a execução ou de apenas algumas medidas executivas". Impende salientar que o dispositivo em exame não limitou a possibilidade de desistência da ação de execução, tendo permitido, inclusive, a desistência parcial ou total, não condicionando a extinção do processo ao consentimento do executado. Fica na esfera de conveniência do exeqüente, portanto, desistir ou não do processo de execução.

Outro não é o entendimento emanado do processualista Câmara (2005, p. 160), ao acentuar que:

"Ao contrário do que ocorre no processo cognitivo, em que a desistência da ação manifestada após a contestação só levará à extinção do processo se com ela consentir o réu, no processo executivo (ou na fase executiva de um processo misto), em que o desfecho normal é necessariamente favorável ao demandante, o demandado não precisa manifestar seu consentimento para que a desistência acarrete a extinção do processo".

A regra de disponibilidade da ação de execução aplica-se ainda que o executado tenha articulado embargos. Neste particular, residem ou encontram-se as dúvidas a respeito da melhor exegese a ser dada ao artigo 569, parágrafo único, letras "a" e "b" do Código de Processo Civil.

Dispõe o parágrafo único do artigo 569 do Código de Processo Civil que "na desistência da execução, observar-se-á o seguinte: a) serão extintos os embargos que versarem apenas sobre questões processuais, pagando o credor às custas e os honorários advocatícios; b) nos demais casos, a extinção dependerá da concordância do embargante".

Desta forma, versando os embargos apenas sobre matérias processuais (ex. alegação de falta de pressupostos processuais ou condições da ação executiva) a manifestação de desistência da ação de execução, com a conseqüente extinção do processo de execução, acarretará de forma automática a extinção dos embargos, ficando o exeqüente-embargado sujeito ao pagamento das custas e honorários. Neste caso, o executado-embargante sequer será ouvido. Os embargos serão extintos por falta de interesse, uma vez que os embargos se opunham apenas ao processo de execução, inexistindo debate a respeito da existência ou não do direito material afirmado. Contudo o embargado-exequente deverá arcar com as custas e honorários a serem arbitrados nos embargos, em atenção ao princípio da causalidade. É preciso lembrar que se os embargos forem mistos ou baralhados, por envolverem matérias processuais e de mérito, não se aplica a regra em comento, incidindo o disposto na letra "b".

Se o exeqüente manifesta desistência da ação de execução na pendência de embargos de mérito (ex. alegação de que o crédito foi obtido mediante dolo ou coação), preceitua a alínea "b" que a extinção dependerá da concordância do embargante. Da interpretação do referido dispositivo, parte da doutrina e da jurisprudência vem entendendo, a meu ver de forma equivocada, que para a extinção do processo de execução haverá a necessidade do consentimento do embargante. Discordando o embargante teriam curso os embargos e o processo de execução.

Neste diapasão, concluindo pela necessidade da anuência ou concordância do executado-embargante para que o processo de execução seja extinto, encontra-se Costa Machado (2006, 991), sustentando que:

"O motivo é bastante claro: como o devedor se opõe materialmente à pretensão executiva, tem ele o direito de não ver encerrada a execução até que se julguem definitivamente os embargos, até que fique perfeita e imutavelmente definida a relação creditória; antes disso, portanto, a extinção da execução, e conseqüentemente dos embargos, depende do consentimento do devedor-embargante".

Na mesma linha de entendimento o magistério emanado de Nelson Nery (1998, p. 1002), a saber: "quando os embargos versarem sobre matéria de mérito, deverá haver concordância do embargante para que o credor possa desistir da execução. O embargante, todavia, não pode opor-se injustificadamente à desistência da ação".

A jurisprudência, da mesma forma, vem discrepando a respeito do tema, como se infere da ementa abaixo reproduzida, in verbis :

"PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. DESISTÊNCIA APÓS O OFERECIMENTO DOS EMBARGOS. DISCORDÂNCIA DA EMBARGANTE. Havendo discordância expressa da embargante quando do pedido de desistência da execução, não cabe a extinção dos feitos sem julgamento de mérito. Inteligência do art. 569, parágrafo Único, letra b do CPC. Doutrina e jurisprudência a respeito. Sentença desconstituída. Apelação provida" (TJRS – Rel. Desor. Antônio Corrêa Palmeiro da Fontoura - 29/06/2005 – Ap. Civ. 70008736704).

Estou certo, contudo, ousando discordar dos eminentes processualistas que entendem ser necessária a concordância do embargante na hipótese da alínea "b" já referida para que ocorra a extinção do processo de execução, que a mencionada concordância é desnecessária em qualquer situação, sejam ou não os embargos de mérito, circunstância, aliás, sem relevância ou repercussão no que tange à extinção do processo executório em conseqüência da desistência.

O fato de nos embargos de mérito ocorrer o questionamento a respeito do próprio direito material afirmado pelo exeqüente é totalmente desinfluente para impedir a desistência unilateral da execução. É preciso mais uma vez recordar que o processo de execução é informado pelo princípio da satisfatividade, sendo os atos nele praticados voltados à realização do direito do exeqüente. Não é possível ao executado opor-se à extinção de um processo de execução que existe para satisfazer o direito do exeqüente, na qual o desfecho normal só poderá ser a implementação deste direito. A melhor conclusão, consentânea com a natureza jurídica do processo de execução, é que o embargante deverá ser ouvido apenas para dizer se insiste ou não com o prosseguimento dos embargos, atento ao fato de que os embargos possuem natureza de processo de conhecimento incidente. Quanto ao processo de execução, não poderá o executado colocar qualquer obstáculo à sua extinção. O interesse do executado de que os embargos tenham curso regular, apesar da extinção do processo de execução, reside na circunstância de que a sentença proferida no âmbito da citada ação cognitiva incidental (embargos) produz coisa julgada material, evitando que o exeqüente possa novamente articular a mesma demanda executória. Poderá o executado, por certo, ter interesse em obter sentença de mérito favorável à pretensão deduzida nos embargos. O que não pode ser admitido é a possibilidade do embargante insistir no prosseguimento de uma execução cujo desfecho é único, por ser o processo executório voltado para realizar o direito do exeqüente. Não tenho nenhuma sombra de dúvida de que o embargante só poderá, ao ser ouvido, requerer o prosseguimento dos embargos, em busca de uma sentença de mérito favorável à pretensão deduzida em sítio de embargos. Aliás, não deve causar perplexidade o fato dos embargos terem curso uma vez extinto o processo de execução.

Sobre o tema, leciona Dinamarco (1996, p.286), com a acuidade jurídica que lhe é peculiar, que:

"Consulta-se o devedor, na hipótese de embargos de mérito (versando sobre a existência do próprio crédito), para o fim exclusivo de determinar se a desistência da execução acarretará ou deixará de acarretar a extinção do processo dos embargos. Quer ele concorde ou não, a extinção do processo executivo é fatal porque, como visto, o executado não tem interesse jurídico no prosseguimento da execução. A distinção de situações ocorridas, contida no artigo 569, diz respeito exclusivamente ao reflexo que a desistência da execução projetará sobre o processo dos embargos: a extinção destes dependerá da concordância do executado num caso e independerá no outro. Não teria significado racional permitir que o executado insistisse em continuar sendo agredido em seu patrimônio, ou seja, permitir que teimasse em exigir que o exeqüente prosseguisse numa execução que não lhe convém".

Continua o eminente processualista, afirmando que:

"Se a execução ficar extinta pela desistência mas os embargos não se extinguirem porque o embargante preferiu sua continuação, eles prosseguirão como ação declaratória autônoma, destinada (como desde o início, aliás) à obtenção de uma sentença declarando que o crédito existe ou que não existe. Reafirma-se a utilidade do conceito da ação declaratória autônoma, que está fazendo falta em nossa literatura".

Alexandre Câmara (2005, p. 161), com propriedade jurídica, acentua que :

"Tratando-se de embargos que versem sobre matéria de mérito da execução (e.g., embargos em que se alegue a inexistência da obrigação), a desistência da execução só levará à extinção dos embargos se com isso concordar o executado. Poderá, pois, o executado optar por manter pendente o processo instaurado em razão de seus embargos, devendo-se dizer que, a partir de agora tal demanda não merecerá mais o nome de embargos, devendo ser tratada como ação declaratória autônoma".

Zavaski (2000, p.85), traz a lume, sobre o tema, elucidativo magistério, pontificando que "a concordância a que se refere a letra b do parágrafo único diz respeito exclusivamente à extinção dos embargos e não da execução. Esta, mesmo pendente embargos de mérito, continua sujeito ao princípio da disponibilidade".

À mesma conclusão chegou Araken de Assis (2002, p. 1361), obtemperando que "o exeqüente tem a livre disponibilidade da execução, podendo desistir a qualquer momento, em relação a um, a alguns ou a todos os executados, mesmo porque a execução existe em proveito do credor, para a satisfação do seu crédito".

Da mesma forma, o colendo Superior Tribunal de Justiça sufragou ser incabível a oposição do executado à desistência da ação de execução, ainda quando pendente de apreciação embargos deflagrados, consagrando, desta forma, o princípio da disponibilidade, quando do julgamento do Resp. nº 7.370/PR, ao entendimento de que "se a desistência ocorre após o oferecimento dos embargos, imprescindível se faz a audiência da parte executada para aferir-se do seu interesse no prosseguimento dos embargos" (STJ, 4ª Turma, rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, DJU 04/11/91).


4 CONCLUSÃO

O regramento inserto no § 4º do artigo 267 do Código de Processo Civil aplica-se apenas ao processo de conhecimento, não podendo o autor desistir da ação cognitiva sem a anuência do réu uma vez apresentada a contestação, por demonstrar o réu, ao articular resistência à pretensão, interesse e direito na obtenção de tutela jurisdicional.

No processo de execução o exeqüente possui livre disposição da ação, não ficando sua manifestação de desistência condicionada, ainda que aforados embargos, à concordância do executado-embargante, mercê da inteligência do artigo 569, alíneas a e b do Código de Processo Civil.

Com a desistência da ação de execução os embargos que versarem apenas sobre matérias processuais ou formais também serão extintos, não havendo necessidade de ser ouvido o embargante-executado, por falta superveniente de interesse de agir, devendo o exeqüente, contudo, em homenagem ao princípio da causalidade, arcar com as custas e a verba honorária. Estando sendo procedimentalizados embargos de mérito quando da manifestação da desistência da execucional deverá o executado-embargante ser ouvido para dizer se tem interesse no prosseguimento dos embargos aviados, não podendo ele, dessarte, opor-se à extinção do processo de execução. Optando o executado pelo curso regular dos embargos, com o fim de alcançar sentença de mérito, os embargos passarão a ter normal desenvolvimento sob a forma de ação declaratória autônoma (entendo que poderá ser também ação desconstitutiva autônoma). Caso o executado opte pela extinção dos embargos deverá o exeqüente, igualmente, suportar as custas processuais e os honorários, também em homenagem ao princípio da causalidade.


REFERÊNCIAS

ASSIS, Araken de.Manual do Processo de Execução. 8ª edição, editora RT, São Paulo: 2002, p. 136.

CÂMARA, Alexandre de Freitas. Lições de Direito Processual Civil. 10ª edição, Lumen Júris, Rio de Janeiro: 2005, p.160 e 161.

CRUZ E TUCCI, José Rogério.Desistência da Ação. Saraiva, São Paulo: 1988, p. 5.

DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de Direito Processual Civil. Vol III, 5ª edição – Editora Malheiros, São Paulo: 2005, p. 32 e 33.

DINAMARCO, Cândido Rangel. Reforma do Código de Processo Civil. Editora Malheiros, São Paulo: 1996 p. 286 e 287.

GONÇALVES, Marcus Vinicius Rio. Novo Curso de Direito Processual Civil. Vol. 1, editora Saraiva, São Paulo: 2004, p. 281) .

MACHADO, Antônio Cláudio da Costa. Código de Processo Civil Interpretado. 5ª edição, Manole, Barueri-SP: 2006, p. 991.

MARQUES, José Frederico. Manual de Direito Processual Civil. Vol. II, Editora Bookseller, 1ª edição, Campinas: 1997, p.19.

NERY, Nelson. Código de Processo Civil Comentado. Ed. RT, 4ª edição, São Paulo: 1998, p.1002.

STJ, 4ª Turma, rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, DJU 04/11/91.

TJRS – Rel. Desor. Antônio Corrêa Palmeiro da Fontoura - 29/06/2005 – Ap. Civ. 7000873670 .

ZAVASKI, Teori Albino. Comentários ao Código de Processo Civi. Vol. 8, editora RT , São Paulo: 2000, p. 85.

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Sobre o autor
Reinaldo Alves Ferreira

juiz de Direito em Rio Verde (GO), professor universitário, professor da Escola Superior da Magistratura do Estado de Goiás, professor do curso Axioma Jurídico, especialista em Direito Processual Civil, mestre em Direito Empresarial pela UNIFRAN

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

FERREIRA, Reinaldo Alves. Do princípio da disponibilidade no processo de execução. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 11, n. 1107, 13 jul. 2006. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/8652. Acesso em: 19 abr. 2024.

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