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A proteção dos direitos humanos e sua interação diante do princípio da dignidade da pessoa humana

A proteção dos direitos humanos e sua interação diante do princípio da dignidade da pessoa humana

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A proteção dos direitos humanos relaciona-se com a dignidade da pessoa humana, núcleo básico do ordenamento jurídico brasileiro, onde direitos internacionalmente reconhecidos e assegurados convergem para a concretização da justiça social e da cidadania universal.

RESUMO

Esta pesquisa objetiva apresentar o processo de internacionalização dos direitos humanos, tendo como referência a pessoa humana e a evolução histórica dos direitos humanos, abordando-se, inclusive, a diferenciação entre direitos humanos e direitos fundamentais. Busca-se analisar a interação entre o Direito Internacional dos Direitos Humanos, e a respectiva sistemática internacional da proteção dos direitos humanos, e a Constituição Brasileira de 1988. O presente estudo tem, sobretudo, a finalidade de revelar como a proteção dos direitos humanos relaciona-se com o valor da dignidade da pessoa humana, núcleo básico e princípio fundante do ordenamento jurídico brasileiro, onde direitos e garantias internacionalmente reconhecidos e assegurados convergem para a concretização da justiça social e da cidadania universal, inspiradas nos ideais democráticos.

Palavras-chave: Direitos humanos, Direito Internacional dos Direitos Humanos, Constituição Brasileira de 1988, Dignidade da pessoa humana, cidadania.


ABSTRACT

This research intends to present the process of internationalization of human rights in reference to its historical evolution and the human being itself, including the differences between these and the fundamental rights. It has the objective of analysing the interaction of International Law of Human Rights with its own international arrangement of protection to the human rights and the Brazilian Constitution of 1988. Moreover, the present study aims revealing in which ways the protection of human rights relates to the value of human dignity, as basic core and fundamental principle of brazilian legal system, where world-wide acknowledged and assured rights and privileges lead to the achievement of social justice and universal citizenship, both inspired in democratic ideals.

Key-words: Human rights, International Law of Human Rights, Brazilian Constitution of 1988, human dignity, citizenship.


INTRODUÇÃO

O Direito, enquanto ciência social, sofre os reflexos decorrentes das diversas transformações da sociedade ocorridas ao longo do tempo. No mesmo sentido, os direitos humanos evoluem e conquistam um lugar cada vez mais considerável na consciência política e jurídica contemporânea, apresentando notável progresso em relação ao respeito às liberdades fundamentais e à concretização da verdadeira democracia.

O objetivo deste trabalho é analisar a relação entre a proteção dos direitos humanos e o princípio constitucional da dignidade da pessoa humana, tido como valor-guia [1] de toda a ordem jurídica, constitucional e infraconstitucional, bem como a influência e a interação existentes, tendo como cenário a ordem constitucional brasileira.

A partir do estudo da pessoa humana, tomada em sua igualdade e em sua liberdade, e de sua essência histórica, pretende-se desenvolver uma análise sobre os direitos humanos e sua evolução histórica, frente aos acontecimentos marcantes ao longo dos séculos e às significativas descobertas empreendidas pela Humanidade. Torna-se relevante apontar, neste mesmo capítulo, a diferenciação entre direitos humanos e direitos fundamentais, e a questão referente às dimensões ou gerações dos direitos fundamentais.

Num segundo momento, busca-se demonstrar o processo de internacionalização e de globalização da matéria atinente aos direitos humanos e como o Direito Constitucional Internacional trata, de modo específico, as normas constitucionais referentes às relações internacionais e, por conseqüência, ao próprio Direito Internacional. Nesse contexto, despontam o surgimento e a consolidação do Direito Internacional dos Direitos Humanos que, de modo autônomo e dotado de especificidades próprias, volta-se à construção de uma cultura universal de observância dos direitos humanos, tendo como desafio a aplicação efetiva destes, por meio de um sistema internacional de proteção dos direitos humanos.

O presente estudo monográfico apresenta-se, assim, com características interdisciplinares, pois situa-se na interação entre o Direito Constitucional e o Direito Internacional dos Direitos Humanos. Daí resulta o que se convencionou chamar Direito Constitucional Internacional, subentendido como um ramo do direito que busca igualmente resguardar o valor da primazia da pessoa humana.

Ao se abordar a dinâmica da relação entre a Constituição Brasileira e o sistema internacional de proteção dos direitos humanos, no terceiro capítulo, busca-se evidenciar os dispositivos constitucionais que disciplinam o Direito Internacional dos Direitos Humanos e a forma pela qual este reforça os direitos constitucionalmente assegurados. É nesse ínterim que se enfatiza a inclusão dos direitos enunciados nos tratados internacionais de direitos humanos, dos quais o Brasil seja signatário, no catálogo de direitos constitucionalmente consagrados.

Importante destacar-se o aprimoramento e o fortalecimento desencadeados pelos direitos oriundos dos tratados internacionais de direitos humanos na esfera da proteção dos direitos consagrados pelo ordenamento brasileiro. Ainda que se visualize uma situação de conflito entre o Direito Internacional dos Direitos Humanos e o Direito interno, há de prevalecer a norma mais favorável ao indivíduo, uma vez que se propugna pela primazia da pessoa humana.

Finalmente, o norte do presente trabalho aponta para o incessante processo de reconstrução dos direitos humanos, acenando ao princípio constitucional da dignidade da pessoa humana, como princípio fundante de uma ordem renovada, que é resultado da crescente internacionalização dos direitos humanos, em que emanam direitos e garantias internacionalmente reconhecidos e assegurados, delineando-se, por conseguinte, uma cidadania universal inspirada no valor da absoluta prevalência da dignidade da pessoa humana. Dessa forma, o estudo da proteção dos direitos humanos e sua relação com a consagração do princípio da dignidade da pessoa humana, à luz da Constituição Federal Brasileira, revela-se imperioso, à medida que contribui decisivamente para a concretização da justiça social e dos ideais democráticos.


1 A evolução histórica dos direitos humanos

1.1 A pessoa humana

Desde os tempos mais remotos busca-se compreender a pessoa humana e a complexidade de suas relações, especialmente os direitos universais a ela inerentes. A partir do período axial da História, o ser humano, tomado em sua igualdade essencial, é visto como um ser dotado de liberdade e razão, sem desconsiderar as significativas diferenças de sexo, raça, religião ou costumes sociais.

Não obstante, somente no século XX proclamou-se no preâmbulo da Declaração Universal de Direitos Humanos que "todos os homens nascem livres e iguais em dignidade e direitos". Importante ressaltar que essas premissas nasceram vinculadas ao advento da lei escrita, de abrangência geral e uniforme, igualmente aplicável a todos os indivíduos que convivem numa sociedade organizada.

Originalmente, foi em Atenas que a lei escrita manifestou sua preeminência a ponto de se constituir no fundamento da sociedade política. Tanto que, na democracia ateniense, aautoridade das leis escritas, de imediato, desbancou a soberania do indivíduo ou da classe social, constituindo-se numa ferramenta imprescindível contra o arbítrio governamental.

Entretanto, ao lado da lei escrita, os gregos consideravam a relevância da lei não-escrita, que designava, por vezes, o costume juridicamente aceito, noutras, as leis universais, de âmbito religioso e absoluto. Com o tempo, dissipou-se essa essência eminentemente religiosa das leis não-escritas que, para Aristóteles, constituíam-se em "leis comuns", permeadas pelo consenso universal em oposição às "leis particulares", próprias de cada povo.

Foi nesse contexto que surgiu, por iniciativa dos romanos, a expressão ius gentium, ou seja, o direito comum a todos os povos. Guido Fernando Silva Soares (p.24) adverte:

Na verdade, o jus gentium não era o que hoje denominamos Direito Internacional, nem o que, em séculos anteriores, se denominará de Direito das Gentes. Tratava-se de um corpo de normas que regulava, no interior do Império Romano, os direitos dos indivíduos (como a personalidade, as capacidades), seus relacionamentos interpessoais (como a família e as sucessões, os contratos e os efeitos dos atos lícitos e ilícitos), alguns aspectos do direitos criminal e, sobretudo, as normas sobre a atividade de produzir a norma jurídica (...) [2].

De outro lado, ao ser excluído o fundamento religioso impresso nas normas, necessitou-se buscar outra justificativa para a vigência dessas leis universais, aplicáveis a todos os homens, de forma igualitária, em todos os lugares do mundo. A filosofia estóica, que se desenvolveu entre 321 a.C. até meados do século III, abrangendo, praticamente, toda a Idade Média, pressupunha a unidade moral e a dignidade do homem como fatores indissociáveis. Logo, o homem é considerado filho de Zeus e portador de direitos inatos e iguais em todos os lugares do mundo, ainda que ocorressem diferenças individuais e grupais.

Para a tradição bíblica, Deus é visto como o modelo ideal a ser seguido por todos os seres. O cristianismo, por sua vez, trouxe consigo um modelo ético e concreto de pessoa: Jesus de Nazaré. Entretanto, a igualdade universal dos filhos de Deus realizou-se única e exclusivamente no plano sobrenatural, uma vez que o cristianismo compactuava com a escravidão e com a inferioridade da mulher e de determinados povos.

No período medieval, elaborou-se um conceito de pessoa partindo-se da "substância individual da natureza racional" [3], desenvolvida por Boécio, com enfoque nas características de permanência e invariabilidade. Nesse sentido, São Tomás de Aquino definiu o homem como "um composto de substância espiritual e corporal" [4].

Partindo-se da concepção de pessoa, no medievo, foi elaborado o princípio da igualdade essencial de todo ser humano, levando-se em conta as discrepâncias individuais e grupais, de natureza biológica ou cultural. Dessa forma, a essência do conceito universal de direitos humanos surgiu da igualdade essencial da pessoa, eis se tratarem de direitos comuns a toda a espécie humana, do homem enquanto homem, ou sejam, direitos resultantes da sua própria natureza.

Outra importante fase da elaboração teórica do conceito de pessoa, como sujeito de direitos universais, anteriores e superiores, a toda ordenação estatal, surgiu com o pensamento de Kant que, partindo da noção de "razão prática", inerente a todos os seres racionais, dotados de vontade própria, formulou o princípio de que todo ser humano existe como um fim em si mesmo, e não simplesmente como um meio através do qual a vontade age.

Chegou-se, assim, à constatação de que a dignidade da pessoa resulta, além da questão de ser esta, ao contrário das coisas, um ser considerado como um fim em si mesmo, também do fato de que, pela sua vontade racional, só a pessoa vive em condições de autonomia, ou seja, com capacidade de se nortear por suas próprias leis.

A concepção kantiana da dignidade da pessoa valoriza o ser humano e a busca de sua felicidade tanto em nível individual quanto coletivo, favorecendo a concretização da felicidade alheia. Tais premissas se constituem numa importante justificativa de reconhecimento, a par dos direitos e liberdades individuais e dos direitos humanos, na busca da realização de políticas públicas de conteúdo econômico e social, conforme preconizou a Declaração Universal dos Direitos Humanos.

Kant defendia o valor relativo das coisas em contraposição ao valor absoluto da dignidade humana, fato que desencadeou, relativamente ao conceito de pessoa, a descoberta do mundo dos valores. Assim é que sobre o fundamento da liberdade que se assentam as referências axiológicas ("preferências valorativas") e a ética de modo geral, isto é, o mundo das leis, sempre passíveis de violação [5].

Na segunda metade do século XIX, graças às contribuições inovadoras de pensadores como Nietzsche, se passou a compreender que o bem e o mal são resultados de uma avaliação consciente de cada indivíduo, na qual desponta a preferência por determinado valor. Logo, a compreensão da pessoa passa pelo reconhecimento de que o homem é o único ser que pauta sua vida em função de preferências valorativas, legislando conforme seus valores éticos e, voluntariamente, submetendo-se às normas valorativas.

Evidentemente que, nesta conformidade, a teoria jurídica tenha sofrido influência significativa da realidade axiológica, especialmente quando se passou a identificar os direitos humanos como os valores mais importantes da convivência humana e também como fatores de agregação social. Por sua vez, o conjunto dos direitos humanos passou a formar um sistema, condizente com a hierarquia de valores prevalentes no meio social; embora essa hierarquia axiológica nem sempre coincida com o sistema normativo positivo. Daí, a tensão dialética entre a consciência coletiva e as leis estatais.

As correntes existencialistas do século XX também influíram na elaboração do conceito de pessoa, acentuando o caráter único, inigualável e irreprodutível da personalidade individual, que não se confunde com a função ou o papel que cada ser exerce.

A reflexão filosófica contemporânea revelou que o ser do homem não diz com questões permanentes e imutáveis, e sim com transformações e mudanças, uma vez que está em constante evolução e aperfeiçoamento. Ademais, a essência do ser humano é evolutiva; sua personalidade é sempre algo de incompleto e inacabado, revelando essa característica singular de um permanente inacabamento.

Relevante considerarem-se as contribuições das reflexões filosóficas contemporâneas sobre a essência histórica da pessoa humana, aliadas à comprovação do fundamento científico da evolução biológica, dando profunda elucidação à tese do caráter histórico, não tomado aqui de modo convencional, dos direitos humanos, revelando, assim, a inocuidade das discussões entre a prevalência de um direito natural estático ou do positivismo jurídico.

Nesse sentido, a Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948, aprovada de forma unânime pela Assembléia Geral das Nações Unidas, consolidou toda complexidade dessa elaboração teórica, proclamando que todo homem tem direito de ser, em todos os lugares, reconhecido como pessoa perante a lei, conforme disposto no art. VI daquele texto convencional.

É claro que inúmeros problemas ético-jurídicos, advindos do avanço tecnológico e da evolução social, despontaram no seio da sociedade moderna. Preocupações como a proteção da pessoa humana diante da engenharia genética e o momento em que se deve considerar a existência da vida humana são exemplos desses problemas. No mesmo sentido, dispõe o Código Civil Brasileiro, em seu art. 2º, que "a personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida; mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro" [6].

Partindo desse contexto, faz-se necessária uma análise sobre a afirmação da dignidade humana frente aos significativos períodos da história em que esta se manifesta.

1.2 A afirmação progressiva dos direitos humanos

Ao longo da história, tem-se constatado que a compreensão da dignidade da pessoa humana e de seus direitos estão associados à dor física e ao sofrimento moral. Em cada ciclo histórico em que se constatam atos de violência, massacres e explorações desmedidas, renova-se a consciência acerca da necessidade de novas determinações normativas que vinculem a existência de uma vida mais digna para todos.

Importante referir que a compreensão histórica dos direitos humanos e das diferentes etapas de sua afirmação está associada, sincronicamente, às grandes declarações de direitos decorrentes dos avanços técnico-científicos conquistados pela humanidade, que sempre e constantemente impulsionaram o movimento unificador da humanidade. Esses são os dois importantes fatores de solidariedade humana, um de ordem técnica, transformador dos meios de convivência; o outro, de natureza ética, visando harmonizar a vida social com o valor maior da justiça.

É mister explicitar que a solidariedade técnica diz respeito com a padronização de costumes e modos de vida, incluindo-se aqui a homogeneização de questões como o trabalho, a economia, o transporte, a comunicação, o lazer, a cultura, a política, dentre outras; enquanto que a solidariedade ética, alicerçada no respeito aos direitos humanos, objetiva a construção de uma cidadania mundial, independente das relações de dominação. Tais formas de solidariedade são indispensáveis para que não se interrompa ou se desagregue o referido movimento de unificação do gênero humano. A solidariedade humana, por seu turno, atua em três esferas fundamentais: no grupo social, nas relações intergrupais, bem como entre as sucessivas gerações ao longo dos tempos.

O estudo do processo de unificação da humanidade, outrossim, tem por base a afirmação histórica dos direitos humanos, partindo da análise de questões atinentes à democracia ateniense e à república romana, onde surge a consciência histórica acerca dos direitos humanos, que só foi possível graças à limitação do poder político. É, pois, nesse espaço que as instituições de governo devem existir sempre em função dos governados, jamais para benefício pessoal dos governantes. Daí que, a admissão da existência de direitos, sendo inerentes à condição humana, devem ser reconhecidos a todos, não figurando como mera concessão dos poderosos.

Já no século VI a.C., inicia-se a proto-história dos direitos humanos, quando da criação das primeiras instituições democráticas em Atenas e com a fundação da República Romana no século seguinte. A democracia ateniense baseou-se nos princípios da preeminência da lei e da participação ativa dos cidadãos na vida política, onde existia um respeito quase religioso que os gregos em geral devotavam às suas leis.

Por mais de dois séculos, o poder dos governantes atenienses foi bastante limitado, não somente pela soberania explícita das leis, como pelo aparato de instituições de cidadania ativa, pelas quais o povo pode governar-se a si próprio, pela primeira vez na história. A democracia ateniense concedeu a seu povo a escolha dos governantes e possibilidade de tomar as grandes decisões políticas em assembléia, havendo um sistema de responsabilidades condizentes com a soberania popular.

Na República Romana, para se limitar o poder político, recorreu-se à instituição de um complexo sistema de controles recíprocos entre os órgãos políticos, exemplo disso era a limitação do poder dos cônsules pelo Senado, cujas decisões eram submetidas à votação do povo.

Com a queda do Império Romano do Ocidente, no ano de 453 d.C., surgiu uma nova civilização impregnada de instituições clássicas, valores cristãos e costumes germânicos. Era o início da Idade Média, que teve dois períodos: a Alta Idade Média e a Baixa Idade Média. Nesse período retoma-se a idéia de limitação do poder dos governantes, pressuposto do reconhecimento, que se daria séculos depois, da existência de direitos comuns aos indivíduos, quer fossem do clero, da nobreza ou do próprio povo.

O feudalismo, durante toda a Alta Idade Média, instaurou o esfacelamento do poder político e econômico; contudo, a partir do século XI, ocorreu um movimento de reconstrução da unidade política, norteado por disputas entre o imperador e o Papa no território europeu. Assim que, contra os abusos da reconcentração de poder, surgiram manifestações de rebeldia: inicialmente com a Declaração das Cortes de Leão de 1188, na Península Ibérica, e, posteriormente, com a Magna Charta Libertatum, de 1215, na Inglaterra.

A Magna Charta Libertatum constituiu-se num pacto firmado pelo Rei João Sem-Terra e pelos bispos e barões ingleses. Este documento serviu como referência para alguns direitos e liberdades civis clássicos, tais como o habeas corpus, o devido processo legal e a garantia da propriedade, não obstante assegurando aos nobres ingleses, privilégios feudais, e alijando a população do acesso aos direitos consagrados no pacto.

No embrião dos direitos humanos despontou o valor da liberdade. Todavia, não se tratava de uma liberdade geral em benefício de todos – o que só ocorreria no final do século XVIII -; na verdade, constituía-se numa liberdade específica que atingia especificamente o clero e a nobreza.

Com o surgimento dos burgos, à margem dos castelos medievais, a liberdade pessoal expande-se da classe dos mercadores aos servos da gleba que, no caso de residirem por mais de ano e dia num burgo novo, desvinculavam-se do poderio do senhor feudal. Configurava uma espécie da usucapião da liberdade.

Nesse período, a Europa medieval assistiu ao desenvolvimento de novas técnicas e invenções nas áreas: econômica, agrícola, marítima, comercial, jurídica, etc. Tudo isso levou a crer que era necessário um mínimo de segurança e certeza na vida dos negócios, o que implicava a limitação do tradicional arbítrio do poder político.

No século XVIII, passou-se a viver o que se costuma chamar a "crise da consciência européia" [7], permeada por profundos questionamentos acerca das certezas tradicionais. Durante os dois séculos que sucederam a Idade Média, a Europa conheceu um extraordinário recrudescimento da concentração de poderes. Nesse período elaborou-se a teoria da monarquia absoluta, com Jean Bodin e Thomas Hobbes.

Dita crise fez com que ressurgisse em vários locais do mundo, imersos em guerras e em insatisfações em relação ao poder absoluto dos governantes, um sentimento de liberdade em contraposição à tirania. No entanto, as liberdades pessoais, que se objetivavam garantir pelo Habeas Corpus e pela Bill of Rights, não beneficiavam a todos os cidadãos; apenas os privilegiados do reino: o clero e a nobreza. A novidade é que a garantia dessas liberdades individuais acabou estendendo-se à burguesia rica, tendo reflexos no desenvolvimento do capitalismo industrial.

O Parlamento foi a principal instituição para a limitação do poder monárquico e garantia das liberdades na sociedade civil. A partir da Bill of Rights britânica, a idéia de um governo representativo, ainda que não de todo o povo, mas de suas camadas superiores, começa a se firmar como uma garantia indispensável das liberdades civis.

Com a Declaração de Direitos do Estado de Virgínia, de 12 de junho de 1776, é que se tem o registro de nascimento dos direitos humanos na história, quando em seu artigo I, dispôs:

Todos os seres humanos são, pela sua natureza, igualmente livres e independentes, e possuem certos direitos inatos, dos quais, ao entrarem no estado de sociedade, não podem, por nenhum tipo de pacto, provar ou despojar sua posteridade; nomeadamente, a fruição da vida e da liberdade, com os meios de adquirir e possuir a propriedade de bens, bem como de procurar e obter a felicidade e a segurança [8].

Tal fato constitui-se no reconhecimento solene de que todos os homens são igualmente vocacionados, pela sua própria natureza, ao aperfeiçoamento constante de si mesmos. A "busca da felicidade" [9], que igualmente consta na Declaração de Independência do Estados Unidos, é a razão de ser desses direitos inerentes à própria condição humana; razão essa aceitável por todos os homens, em todas as épocas. Ou seja, uma razão universal como a própria pessoa humana.

Da mesma forma, com o advento da Revolução Francesa, a idéia de liberdade dos seres humanos é reafirmada e reforçada: "Os homens nascem e permanecem livres e iguais em direitos" [10]. A única omissão referiu-se então ao reconhecimento da fraternidade, isto é, a exigência de uma organização solidária da vida em grupo, o que ocorreu quando da promulgação da Declaração Universal dos Direitos Humanos, pela Assembléia Geral das Nações Unidas, em 1948.

Como visto, a democracia moderna, reinventada praticamente ao mesmo tempo na América do Norte e na França, foi a ferramenta política utilizada pela burguesia para acabar com os privilégios do clero e da nobreza. Portanto, a idéia original da democracia moderna não foi a defesa da maioria pobre contra a minoria rica, mas sim a defesa da classe burguesa e rica contra o regime de privilégios mantidos por um governo irresponsável, em detrimento dos direitos sociais.

A Declaração Francesa dos Direitos do Homem e do Cidadão trouxe uma distinção entre os direitos do homem e os direitos do cidadão. No que tange ao homem, este é colocado como alguém que existe fora da sociedade, eis que preexiste a ela. Em relação ao cidadão, ele se encontra exatamente no centro da sociedade e sob a autoridade do Estado. Na esteira desses argumentos, Rogério Gesta Leal colaciona: "Dessa forma e novamente, como é próprio de concepções com forte veio jusnaturalista, os direitos do homem são naturais e inalienáveis, enquanto os direitos do cidadão são positivos e garantidos pelo direito positivo" [11].

Daí deriva o advento da geração ou dimensão dos primeiros direitos humanos e da reinstitucionalização da legitimidade democrática como obras decorrentes das grandes revoluções: a chamada Revolução Americana e a Revolução Francesa. A primeira que consolidou a restauração das antigas franquias e dos tradicionais direitos de cidadania, frente aos abusos e usurpações do poder monárquico. A segunda, ao contrário, objetivando a tentativa de transformação radical das condições de vida em sociedade e à missão libertária dos povos oprimidos.

Com a reinvenção das técnicas de produção econômica, decorrentes da introdução da máquina a vapor, emergiu, na Inglaterra, a Revolução Industrial. Fato que, aliado às demais etapas históricas e marcantes dos direitos humanos, coincide com as mudanças nos princípios básicos da ciência e da técnica.

A emancipação histórica do indivíduo frente aos grupos sociais a quem sempre se submetera, como família, clã, clero e estamento, derivou das declarações de direitos norte-americana e francesa. É assim que o indivíduo se torna mais vulnerável às vicissitudes da vida, uma vez que perdeu muito da proteção familiar, estamental e religiosa. Em contrapartida, a sociedade liberal ofereceu-lhe a segurança da legalidade, com a garantia da igualdade de todos perante a lei.

Nesse sentido, constitui-se numa verdadeira falácia a pretendida isonomia oferecida, uma vez que a massa crescente de trabalhadores tinha que se submeter às pressões capitalistas para sobreviver. O resultado dessa atomização social foi uma forte pauperização das classes proletárias na primeira metade do século XIX, que desencadeou, por sua vez, uma profunda indignação dos trabalhadores e o sentimento de organização da classe.

A Constituição francesa de 1848 incorporou algumas das reivindicações econômicas e sociais; entretanto, o pleno reconhecimento dos direitos humanos de caráter econômico e social somente se deu no século XX, com a Constituição do México de 1917 e a Constituição de Weimar de 1919.

A contribuição do movimento socialista, iniciado na primeira metade do século XIX, implicou o reconhecimento dos direitos humanos de caráter econômico e social dos grupos sociais marginalizados e esmagados pela miséria. Os socialistas perceberam, desde logo, que esses flagelos sociais eram dejetos do sistema capitalista de produção, que atribuía um valor maior aos bens de capital em oposição aos seres humanos.

Contrapondo-se aos fundamentos do capitalismo, emergiram os direitos humanos de proteção do trabalhador, que só puderam prosperar quando os detentores do capital foram obrigados a se compor com os trabalhadores. Daí se conclui o absurdo enfraquecimento do respeito a esses direitos no mundo inteiro, em favor do lucro especulativo.

As normas constitucionais dos séculos XIX e XX da maioria dos países ocidentais vão introduzir os princípios políticos e filosóficos protetivos dos Direitos Humanos em regras jurídicas expressas e tidas, geralmente, como principiológicas. Tal processo de positivação foi fundamental para estruturar, em corpos normativos,

os dispositivos jurídicos atinentes a tais direitos que, ora positivados, transformam-se em Direitos Fundamentais.

Registra-se a afirmação de Rogério Gesta Leal (2000, p.38), que corrobora os argumentos expendidos:

É assim que esta conjuntura dá ensejo para o recrudescimento dos Direitos Humanos como, por exemplo, fomento à autodeterminação dos povos e pela crescente exigência do término de práticas ilícitas dos Estados, bem como o respeito às garantias constitucionais, principalmente individuais [12].

1.3 Direitos humanos e direitos fundamentais

Para uma melhor compreensão do presente estudo, faz-se necessária a distinção entre as expressões "direitos humanos" e "direitos fundamentais", que comumente são utilizadas como sinônimos. Não resta dúvida de que os direitos fundamentais, de certa forma, são também direitos humanos, no sentido de que seu titular sempre será o ser humano, mesmo que esteja representado por uma determinada coletividade, como povo, nação, Estado.

Tem-se que os direitos fundamentais são o conjunto de direitos e liberdades do ser humano institucionalmente reconhecidos e positivados no âmbito do direito constitucional positivo de determinado Estado, enquanto que os direitos humanos estão abarcados pelo direito internacional, porquanto extensivos a todos os seres humanos, independentemente de sua vinculação a determinada ordem constitucional, apresentando validade universal e caráter supranacional.

Assim, os direitos fundamentais nascem e se desenvolvem com a Constituição na qual foram reconhecidos e assegurados. Não resta dúvida de que o reconhecimento oficial dos direitos humanos, pela autoridade política competente, gera muito mais segurança às relações sociais, exercendo, também, uma função pedagógica junto à comunidade, no sentido de fazer prevalecer os grande valores éticos, os quais, sem esse reconhecimento oficial, tardariam a se impor na vida coletiva.

Interessante referir a contribuição de Celso Lafer ao afirmar que "o valor da pessoa humana enquanto conquista histórico-axiológica encontra a sua expressão jurídica nos direitos fundamentais do homem" [13].

Há que se considerar, de toda a sorte, que existe uma íntima relação entre os direitos humanos e os direitos fundamentais, pois muitas das Constituições que surgiram após a Segunda Guerra Mundial se inspiraram tanto na Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948, quanto nos documentos internacionais e regionais que lhe sucederam. Nos últimos anos, tem-se observado um processo de aproximação e de harmonização entre o conteúdo das declarações internacionais e os textos constitucionais, o que se vem denominando de Direito Constitucional Internacional.

Entre as diversas terminologias adotadas, destaca-se o uso recente da expressão "direitos humanos fundamentais" por determinados autores.

Esta terminologia, ao menos em nosso entender, embora não tenha o condão de afastar a pertinência da distinção traçada entre direitos humanos e direitos fundamentais, revela, contudo, a nítida vantagem de ressaltar, relativamente aos direitos humanos de matriz internacional, que também estes dizem com o reconhecimento e proteção de certos valores e reivindicações essenciais de todos os seres humanos, destacando, neste sentido, a fundamentalidade em sentido material, que – diversamente da fundamentalidade formal – é comum aos direitos humanos e aos direitos fundamentais constitucionais (...) [14].

Importante atentar-se para o fato de não existir uma identidade necessária entre o elenco dos direitos humanos e direitos fundamentais reconhecidos, nem entre o direito constitucional dos Estados e o direito internacional, tampouco entre as Constituições, pelo simples fato de que, muitas vezes, o rol dos direitos fundamentais constitucionais está aquém do catálogo dos direitos humanos constantes dos documentos internacionais; ao passo que, outras vezes, está bem além, tal qual ocorre com a nossa atual Constituição Federal.

É fundamental levar-se em conta a distinção quanto ao grau de efetiva aplicação e proteção das normas consagradoras dos direitos fundamentais e dos direitos humanos, sendo que em relação aos primeiros, há, geralmente, melhores condições para se concretizarem efetivamente em face da existência de instâncias dotadas de poder para fazerem cumprir e respeitar esses direitos.

Ressalta-se o fato de que a eficácia (jurídica e social) dos direitos humanos que não fazem parte do rol dos direitos fundamentais de determinado ordenamento depende da sua recepção na ordem jurídica interna e, ainda, do status jurídico que esta lhe atribui, vez que lhe falta cogência. Logo, a efetivação dos direitos humanos depende da boa vontade e da cooperação dos Estados individualmente considerados, e da ação eficaz dos mecanismos jurídicos internacionais de controle.

Daí que o processo de positivação dos direitos humanos, transformando-os em direitos fundamentais, gera polêmica e debate envolvendo sua natureza, significados, implicações políticas e jurídicas relevantes, principalmente quando se ressalta o fato de que estes direitos não se apresentam tão apenas diante do Estado, mas, fundamentalmente, como oponíveis em relação aos demais cidadãos e nas suas inter-relações cotidianas, designando a expressão "direitos públicos subjetivos" [15].

1.3.1 Dimensões dos direitos fundamentais

Os direitos fundamentais sofreram várias mutações históricas desde seu reconhecimento nas primeiras Constituições, no tocante a conteúdo, titularidade, eficácia e efetivação. Nesse contexto histórico, costuma-se referir a existência de três gerações de direitos e até mesmo de uma de quarta geração. Há muitas críticas em relação ao termo "geração de direitos", por conduzir ao entendimento equivocado de que os direitos fundamentais se substituem ao longo do tempo; daí a preferência da maioria dos autores pela expressão "dimensão de direitos".

Ressalta o Professor Ingo Sarlet (2001, p. 47-48) que:

Em que pese o dissídio na esfera terminológica, verifica-se crescente convergência de opiniões no que concerne à idéia que norteia a concepção das três (ou quatro, se assim preferirmos) dimensões dos direitos fundamentais, no sentido de que estes, tendo tido sua trajetória existencial inaugurada com o reconhecimento formal nas primeiras Constituições escritas dos clássicos direitos de matriz liberal-burguesa, se encontram em constante processo de transformação, culminando com a recepção, nos catálogos constitucionais e na seara do Direito Internacional, de múltiplas e diferentes posições jurídicas, cujo conteúdo é tão variável quanto as transformações ocorridas na realidade social, política, cultural e econômica ao longo dos tempos. Assim sendo, a teoria dimensional dos direitos fundamentais não aponta, tão-somente, para o caráter cumulativo do processo evolutivo e para a natureza complementar de todos os direitos fundamentais, mas afirma, para além disso, sua unidade e indivisibilidade no contexto do direito constitucional interno e, de modo especial, na esfera do moderno ‘Direito Internacional dos Direitos Humanos’ [16].

A vinculação essencial dos direitos fundamentais à liberdade e à dignidade humana, enquanto valores históricos e filosóficos, conduzem sem óbices ao significado de universalidade inerente a esses direitos como ideal da pessoa humana.

1.3.2 A primeira dimensão de direitos

Os direitos fundamentais da primeira dimensão têm suas raízes especialmente na doutrina iluminista e jusnaturalista dos séculos XVII e XVIII, que defende como finalidade precípua do Estado a realização da liberdade do indivíduo, bem como nas revoluções políticas do final do século XVIII, que marcaram o início da positivação das reivindicações da classe burguesa nas primeiras Constituições escritas do ocidente.

Constituem-se em direitos de defesa ou oposição diante do Estado, delimitando uma zona de não-intervenção do Estado diante da autonomia individual. Destacam-se os direitos de inspiração jusnaturalista, tais como os direitos à vida, à liberdade, à propriedade e à igualdade perante a lei, que delimitam a chamada igualdade formal. Mais tarde, se complementam pela liberdade de expressão coletiva, tais como as liberdades de expressão, de imprensa, de reunião, de associação, etc.; e pelo direitos de participação política, como o direito de voto e a capacidade eleitoral passiva. Algumas garantias processuais: devido processo legal, direito de petição e habeas corpus, também se incluem nesta classificação.

Os direitos da primeira dimensão ou direitos da liberdade apresentam como titular o indivíduo, são oponíveis ao Estado, traduzem-se como faculdades ou atributos da pessoa e detêm uma subjetividade que é seu traço mais característico; enfim, constituem-se em direitos de resistência ou de oposição ao Estado [17].

1.3.3 A segunda dimensão de direitos

No século XIX surgem os movimentos reivindicatórios que exigiam do Estado uma atuação efetiva na realização da justiça social. Ressalte-se a dimensão positiva destes direitos, uma vez que não se pretende mais evitar a intervenção estatal no plano da liberdade individual, mas, sim, de propiciar o direito de participação no chamado bem-estar social, realizando-se, por conseguinte, a liberdade e a igualdade, ambas em sentido material.

Nesta categoria estão os direitos a prestações sociais estatais, como assistência social, saúde, educação, trabalho, dentre outros que se reportam à pessoa tomada individualmente. Estes direitos fundamentais consagraram-se, sobretudo, nas Constituições do segundo pós-guerra, porquanto constituíam-se em objeto de diversos pactos internacionais.

Além dos direitos sociais, econômicos e culturais de cunho positivo, abarcam-se também as denominadas liberdades sociais, como a liberdade de sindicalização, o direito à greve, os direitos fundamentais dos trabalhadores (férias, repouso semanal remunerado, salário mínimo, jornada de trabalho limitada, etc.).

Com o advento dos direitos fundamentais da segunda geração, descobriu-se o aspecto objetivo, a garantia de valores e princípios com que escudar e proteger as instituições. Os direitos sociais originaram o despertar de uma consciência acerca da importância de salvaguardar o indivíduo e de proteger a instituição. Descobria-se, então, um novo conceito dos direitos fundamentais: as garantias institucionais [18].

Na fase da primeira geração, os direitos fundamentais consistiam basicamente no estabelecimento das garantias fundamentais da liberdade; a partir da segunda geração, tais direitos passaram a compreender, além das garantias, também os critérios objetivos de valores, bem como os princípios básicos que animam a lei maior, projetando-lhe a unidade e fazendo a congruência fundamental de suas regras.

A concepção de objetividade e de valores relativamente aos direitos fundamentais fez que o princípio da igualdade tanto quanto o da liberdade, tomasse também um novo sentido, deixando de ser mero direito individual que demanda tratamento igual e uniforme para assumir uma dimensão objetiva de garantia contra atos de arbítrio do Estado [19].

1.3.4 A terceira dimensão de direitos

Dotados de alto teor de humanismo e universalidade, os direitos da terceira dimensão tendem a se consolidar enquanto direitos que não se destinam especificamente à proteção dos interesses de um indivíduo, de um grupo ou de um determinado Estado. Têm primeiro por destinatário o gênero humano mesmo, num momento expressivo de sua afirmação como valor supremo em termos de existencialidade concreta.

Também chamados de direitos de fraternidade ou de solidariedade concernentes aos grupos humanos; são direitos de titularidade coletiva ou difusa, por vezes esta titularidade revela-se indefinida e indeterminável. Dentre os mais citados, encontram-se os direitos à paz, à autodeterminação dos povos, ao desenvolvimento, ao meio ambiente e qualidade de vida, direito à conservação e utilização do patrimônio histórico e cultural e o direito de comunicação.

Tratam-se de reivindicações fundamentais do ser humano decorrentes do impacto das novas tecnologias, do trauma ocasionado pelas guerras e pelos conflitos, do processo de descolonização pós-guerra, bem como de outros fatores. O direito ao desenvolvimento diz respeito tanto a Estados como a indivíduos, todavia em relação a estes traduz-se numa pretensão ao trabalho, à saúde e à alimentação adequada [20].

Os direitos de terceira dimensão são considerados como direitos de solidariedade ou fraternidade em face de sua implicação universal ou, no mínimo, transindividual, e porque exigem esforços e responsabilidades em escala até mesmo global para sua efetivação. Grande parte desses direitos ainda não se encontram reconhecidos pelo direito constitucional; por outro lado, pertencem à seara do direito internacional, do que dá conta uma variedade de tratados e outros documentos transnacionais nesse sentido.

Muito especial e oportuna a contribuição do Professor Ingo Sarlet (2001, p. 52):

Ainda, neste contexto, costumam ser feitas referências às garantias contra manipulações genéticas, ao direito de morrer com dignidade, ao direito à mudança de sexo, igualmente considerados, por parte da doutrina, de direitos da terceira dimensão, ressaltando-se que, para alguns, já se cuida de direitos de uma quarta dimensão. Verifica-se, contudo, que boa parte destes direitos em franco processo de reivindicação e desenvolvimento corresponde, na verdade a facetas novas deduzidas do princípio da dignidade da pessoa humana, encontrando-se intimamente vinculados (à exceção dos direitos de titularidade notadamente coletiva e difusa) à idéia da liberdade-autonomia e da proteção da vida e outros bens fundamentais contra ingerências por parte do Estado e dos particulares [21].

1.3.5 A quarta dimensão de direitos

Há uma tendência de se reconhecer a existência de uma quarta dimensão dos direitos fundamentais, ainda que se aguarde pela sua consagração no plano do direito internacional e das ordens constitucionais internas. Destaca-se o posicionamento do Professor Paulo Bonavides que sustenta ser a quarta dimensão "o resultado da globalização dos direitos fundamentais, no sentido de uma universalização no plano institucional, que corresponde, na sua opinião, à derradeira fase de institucionalização do Estado Social" [22].

Arrolam-se aqui os direitos à democracia (direta) e à informação, bem como o direito ao pluralismo. Deles depende a concretização da sociedade aberta ao futuro, em sua dimensão de máxima universalidade, para a qual parece o mundo inclinar-se no plano de todas as relações de convivência. Tratam-se de direitos em processo de formação.

Relevantes os ensinamentos do Professor Paulo Bonavides ao afirmar:

Ao contrário, os direitos da primeira geração, direitos individuais, os da segunda, direitos sociais, e os da terceira, direitos ao desenvolvimento, ao meio ambiente, à paz e à fraternidade, permanecem eficazes, são infra-estruturais, formam a pirâmide cujo ápice é o direito à democracia; coroamento daquela globalização política para a qual, como no provérbio chinês da grande muralha, a Humanidade parece caminhar a todo o vapor, depois de haver dado o seu primeiro e largo passo [23].

Enfatiza-se, por derradeiro, que os direitos da quarta geração compendiam o futuro da cidadania e o porvir da liberdade de todos os povos, eis que somente com eles será legítima e possível a globalização política.

A fim de se complementar o estudo desta questão, é importante a formalização de uma análise objetiva do contexto dos direitos humanos, como fonte dos tratados internacionais de proteção dos direitos humanos.


2 A internacionalização dos direitos humanos

2.1 Precedentes históricos do processo de internacionalização dos direitos humanos

É pública e notória a discussão acerca do fundamento e da natureza dos direitos humanos, especialmente quando se questiona tratarem-se eles de direitos naturais e inatos, direitos positivos, direitos históricos ou direitos atrelados ao sistema moral. Os estudos contemporâneos inclinam-se pela historicidade dos direitos humanos, uma vez que esses se constituem num processo constante de construção e aperfeiçoamento de si mesmos.

Segundo as lições de Norberto Bobbio extrai-se que "os direitos do homem nascem como direitos naturais universais, desenvolvem-se como direitos positivos particulares, para finalmente encontrarem sua plena realização como direitos positivos universais" [24].

Dada a relevância da questão da proteção dos direitos humanos, colaciona-se ao presente estudo dos precedentes históricos do processo de internacionalização e universalização dos direitos humanos: o Direito Humanitário, a Liga das Nações e a Organização Internacional do Trabalho. Outrossim, faz-se mister referir a redefinição de conceitos como a soberania estatal absoluta e o status do indivíduo no cenário internacional.

O Direito Humanitário é considerado a primeira expressão, no plano internacional, do vínculo limitativo à liberdade e à autonomia dos Estados, mesmo em se tratando de conflito armado. É um instituto relacionado diretamente com a lei da guerra, que objetiva fixar limites à atuação do Estado, assegurando, ao mesmo tempo, a observância de direitos fundamentais e a proteção das populações civis e dos militares fora de combate, como feridos, doentes, prisioneiros, náufragos.

Quando do advento da Liga das Nações, esta reforçou a idéia de relativização da soberania dos Estados. Criada após a Primeira Guerra Mundial, sua finalidade era promover a cooperação, paz e segurança internacionais e condenar as agressões externas contra seus membros. A Convenção da Liga das Nações, de 1920, apresentava preceitos genéricos referentes aos direitos humanos no tocante ao sistema das minorias e aos parâmetros internacionais do direito ao trabalho, pelos quais os Estados comprometiam-se a assegurar condições dignas de trabalho para homens, mulheres e crianças; incorporando obrigações de repercussão internacional, sob pena de incorrerem em sanções econômicas e militares impostas pela comunidade externa.

A Organização Internacional do Trabalho também influenciou o processo de internacionalização dos direitos humanos. Igualmente criada após a Primeira Guerra Mundial, tinha como objetivo promover padrões internacionais de condições de trabalho e bem estar, levando seus Estados-partes ao compromisso de assegurar condições dignas aos trabalhadores.

É possível verificar que as referidas Organizações influenciaram decisivamente, cada qual a sua maneira, no processo de internacionalização dos direitos humanos, projetando o tema dos direitos humanos na ordem internacional, e registrando o fim de uma época em que o Direito Internacional era visto apenas como a lei da comunidade internacional dos Estados. Rompeu-se, assim, com a idéia de soberania nacional absoluta, vez que foram admitidas intervenções no âmbito interno em prol dos direitos humanos.

Logo, já não mais se considera um problema de jurisdição interna a forma pela qual o Estado trata os seus cidadãos, porque delegou-se ao indivíduo o papel fundamental de sujeito de direito internacional, conferindo-lhe direitos e obrigações no plano internacional. É nessa perspectiva que se consolidam a capacidade processual internacional dos indivíduos e a concepção de que os direitos humanos, não mais se limitando à exclusiva jurisdição doméstica, constituem em matéria de legítimo interesse internacional.

2.2 O Direito Constitucional Internacional

No século XIX, a constitucionalização dos direitos humanos inaugura uma nova fase no desenvolvimento dos sistemas de proteção destes direitos. Dessa forma, os direitos constantes das Declarações de Direitos passaram a ser inseridos nas Constituições dos Estados. Nesse contexto, os Estados passam a acolher as Declarações em suas Constituições, e as Declarações de Direitos, por sua vez, vão se incorporando à história do constitucionalismo.

O Direito Internacional dos Direitos Humanos concentra seu objeto nos direitos da pessoa humana. Por conseguinte, revela um conteúdo materialmente constitucional, uma vez que os direitos humanos, ao longo da experiência constitucional, sempre foram considerados como matéria constitucional. Entretanto, no plano do Direito Internacional dos Direitos Humanos, a fonte desses direitos é de natureza internacional.

É no cerne do Direito Constitucional Internacional que se objetiva equacionar as duas sistemáticas — nacional e internacional — em prol do modelo que mais eficazmente consiga proteger os direitos da pessoa humana. Ou seja, como as duas ordens (nacional e internacional) conjugam-se para reafirmar o valor da dignidade humana.

Antônio Augusto Cançado Trindade ressalta que:

(...) no domínio da proteção dos direitos humanos, na atualidade, faz-se mister expressar no direito interno as conquistas do direito internacional, ao invés de se tentar projetar neste a medida do direito interno. Há que se reduzir a distância entre as esferas internacionalista e constitucionalista. Nesse contexto, é necessário buscar uma maior concordância e aproximação entre o direito internacional e o direito interno, conjugando-se a realidade interna com os meios de proteção internacional dos direitos humanos [25].

Na verdade existe uma identificação entre o direito internacional e o direito público interno, na medida em que constitui objeto tanto de um quanto de outro a garantia de proteção cada vez mais eficaz dos cidadãos. Reafirma-se, assim, a indissociabilidade entre direitos e garantias, revelando a anterioridade ou a precedência dos direitos individuais em face do direito estatal.

Nesse sentido, afirma Antônio Augusto Cançado Trindade que:

Nas raízes do próprio pensamento constitucionalista mais esclarecido se encontra apoio para a proteção internacional dos direitos humanos. Há pouco menos de duas décadas, Mauro Cappelletti ressaltava que a proteção dos direitos humanos, no plano do direito interno, requer instrumentos processuais adequados, e é tamanha sua importância que transcende o sistema ordinário de proteção judicial; assim, em caso de ameaça aos direitos constitucionalmente reconhecidos, há que prover meios processuais extraordinários de proteção. E é quando nem mesmo estes são disponíveis que as garantias consagradas nos tratados e instrumentos internacionais de proteção dos direitos humanos operam em favor dos que necessitam de proteção. E segundo estes tratados de direitos humanos não é suficiente que os Estados Partes contem com um sistema de tutela jurídica de ‘caráter genérico’; encontram-se eles na obrigação de prover instrumentos processuais adequados e eficazes para a salvaguarda dos direitos constitucionalmente consagrados. Há, entre os constitucionalistas, os que revelam sensibilidade para as afinidades e interação entre o direito internacional e o direito interno no tocante à proteção dos direitos humanos [26].

Nas últimas décadas, os instrumentos internacionais de proteção dos direitos humanos têm-se incorporado de modo significativo em algumas Constituições, tais como: a Constituição Portuguesa, de 1976; a Constituição da República Federal da Alemanha (com emendas até dezembro de 1983); a Constituição da Espanha, de 1978; a Constituição do Peru, de 1978; a Constituição da Guatemala, de 1985; a Constituição do Chile, de 1989; a Constituição Brasileira de 1988, dentre outras. De modo geral, nos exemplos aqui elencados, os princípios e dispositivos referentes aos direitos humanos, do Direito Internacional Público, integram o direito interno, com maior ou menor grau de hierarquia.

A atual Constituição Brasileira fortalece a tendência das Constituições recentes de reconhecer a relevância da proteção internacional dos direitos humanos, na medida em que proclama que o Brasil se rege em suas relações internacionais pelo princípio da prevalência dos direitos humanos (artigo 4º, inciso II) [27], constituindo-se em Estado Democrático de Direito que apresenta como fundamento a dignidade da pessoa humana (artigo 1º, inciso III) [28], e trazendo, de modo expresso, que os direitos e garantias constitucionais não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que o país seja parte (artigo 5º, §2º) [29]. Acrescenta-se, ainda, que as normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais possuem aplicação imediata (artigo 5º, §1º) [30].

Ressalta-se que, na Constituição Brasileira de 1988, os direitos se fazem acompanhar necessariamente das garantias, conforme disposto no art. 5º, §1º. Do que se depreende que as conquistas do direito internacional em favor da proteção do ser humano projetam-se no direito constitucional, enriquecendo-o, e evidenciando que a busca de proteção cada vez mais eficaz da pessoa humana encontra apoio no cerne do pensamento tanto internacionalista quanto constitucionalista.

O caráter especial dos tratados de proteção internacional dos direitos humanos encontra-se, com efeito, reconhecido e sancionado pela Constituição de 1988, não se fazendo necessária a intermediação do Poder Legislativo, tal qual para os tratados internacionais em geral. Distintamente no caso de tratados de proteção internacional dos direitos humanos em que o Brasil é parte, os direitos neles garantidos passam a integrar o elenco dos direitos constitucionalmente consagrados, com aplicação direta e imediata no ordenamento jurídico interno, de acordo com o artigo 5º, §§ 1º e 2º.

Desse modo, os fundamentos últimos da proteção dos direitos humanos transcendem o direito estatal, e o consenso generalizado em torno da necessidade da internacionalização de sua proteção corresponde a uma manifestação cultural atual, juridicamente viabilizada pela congruência de finalidades entre o direito internacional e o direito interno quanto à proteção da pessoa humana.

O fenômeno internacional acompanha as Constituições há muito tempo, sendo que a Constituição norte-americana foi a primeira a trazer dispositivos concernentes à ação exterior do Estado. Contudo, o tratamento constitucional do Direito Internacional, pelo menos até a Segunda Guerra Mundial, ficava adstrito ao impacto do Direito Internacional no Direito interno, restringindo-se a temas como divisão de competências em matéria de relações exteriores e incorporação do Direito Internacional pelo Direito interno.

Após a Segunda Guerra Mundial, o tratamento constitucional do Direito Internacional passou a se preocupar com o próprio conteúdo do Direito Internacional e sua organização estrutural. Nesse contexto surgem dois fenômenos importantes a saber: a Internacionalização do Direito Constitucional e a Constitucionalização do Direito Internacional.

O primeiro é visível na inclusão, em todas as Constituições modernas, de verdadeiros preceitos de Direito Internacional. O segundo revela-se pela criação de organismos políticos, a que todos os Estados juridicamente organizados aderem, organismos que adotam, à guisa de tratados fundadores, verdadeiras Constituições internacionais, providas de órgãos que assemelham-se aos existentes nas instituições internas dos Estados. Tratam-se de fenômenos complementares e concomitantes, uma vez que os sistemas constitucionais internos continuam evoluindo no sentido de internacionalizarem os seus Direitos Constitucionais num processo contínuo.

Logo, é na convergência desses dois fenômenos que se encontra o atual tratamento constitucional do Direito Internacional. Inúmeras Constituições contemporâneas estão engajadas na formação do Direito Internacional, negando-se, assim, a idéia de separação entre ordem internacional e ordem interna. É nesse contexto que se faz necessário e relevante o estudo do Direito Constitucional Internacional.

O Direito Constitucional Internacional não se configura exatamente como um ramo da ciência jurídica; sua denominação cumpre mais um papel didático, no sentido de especificar as normas constitucionais que tratam das relações internacionais e, por conseqüência, do próprio Direito Internacional.

Tal denominação é característica dos sistemas continentais, tendo apresentado especial impacto na França. Os sistemas anglo-saxônicos, por sua vez — sobretudo o norte-americano, preferem referir-se ao chamado Direito das Relações Exteriores, que seria mais abrangente que o Direito Constitucional Internacional, uma vez que envolve o tratamento constitucional e infraconstitucional das relações exteriores.

A doutrina do início do século XX tinha um especial interesse pelos temas envolvendo as relações entre o Direito interno e o Direito Internacional. Para além das teorias que buscavam explicar tal relacionamento, surgiu a noção de Direito Constitucional Internacional.

Na visão de Celso D. de Albuquerque Mello, o Direito Constitucional Internacional, pode ser definido (2000, p. 6):

Como as normas constitucionais que regulamentam as relações exteriores do estado. Estas normas variam de uma constituição para outra, isto é, entre os estados, bem como dentro do próprio estado cada constituição de acordo com o momento histórico inclui ou elimina determinadas normas [31].

No mesmo sentido, acrescenta (2000, p. 36):

O Direito Constitucional Internacional é a tentativa de adaptar a Constituição à ordem jurídica internacional que se sobrepõe a ela. A Constituição é a manifestação da soberania estatal e o DIP a sua negação ou, pelo menos, a sua crescente limitação. A nosso ver não existe um D. Constitucional Internacional por falta de um objeto definido e método próprio. O que existe são normas constitucionais de alcance internacional que devem ser analisadas em cada caso procurando compatibilizar os dois ramos da Ciência Jurídica [32].

George Rodrigo Bandeira Galindo considera que foi Mirkine-Guetzévitch quem utilizou e divulgou o termo Direito Constitucional Internacional de forma correta:

Embora seu conceito tenha variado com os anos, chega ele, em 1948, à idéia de que seria ‘um conjunto de regras constitucionais nacionais que possuem, por seu conteúdo, um significado, uma eficácia internacional’. Mas tal noção surge já no período entre-guerras, onde se desenvolve uma tendência de harmonização entre as regras de Direito Internacional e as regras de Direito Constitucional [33].

Acredita-se que a definição de Mirkine-Guetzévitch se coaduna melhor com a idéia de que os fenômenos da Internacionalização do Direito Constitucional e Constitucionalização do Direito Internacional não podem ser compartimentalizados. A influência do Direito Constitucional no Direito Internacional é justamente a maior característica do Direito Constitucional Internacional posterior à Segunda Guerra Mundial, no tratamento das relações internacionais [34].

Assim, as diversas Constituições possuem a função de construir e fortalecer o Direito Internacional, devendo seu conteúdo, portanto, cumprir este papel. Neste sentido, determinadas normas constitucionais possuem e devem possuir uma significação internacional, uma vez que são voltadas para fora e não somente para dentro do sistema jurídico interno.

2.3 O processo de internacionalização dos direitos humanos

A verdadeira consolidação do Direito Internacional dos Direitos Humanos surge em conseqüência da Segunda Guerra Mundial, em meados do século XX. Trata-se de um movimento recente na história, que surgiu como resposta às atrocidades e às violações de direitos humanos cometidas durante a dominação nazista, em que a era Hitler ficou conhecida pela lógica da destruição e da descartabilidade dos seres humanos, onde os indivíduos tornaram-se supérfluos, abolindo-se o valor da pessoa. A partir desses acontecimentos, se fez necessária a reconstrução dos direitos humanos, como paradigma ético capaz de restaurar a lógica do razoável e de aproximar o direito da moral.

Partindo dessa premissa, os esforços de reconstrução dos direitos humanos constituíram-se em referencial para a ordem internacional contemporânea. Passa-se a acreditar que a proteção dos direitos humanos ultrapassara o âmbito interno do Estado para ser concebida como problema de relevância internacional, junto à comunidade internacional, delimitando-se, por conseguinte, a soberania estatal.

Paralelamente, tem-se a necessidade de uma ação internacional mais eficaz para a garantia e proteção dos direitos humanos, fato que impulsiona o processo de internacionalização desses direitos, desencadeando o surgimento de uma sistemática normativa de proteção internacional, que possibilitou a responsabilização do Estado quando suas instituições internas demonstram-se falhas ou omissas na efetiva proteção dos direitos humanos.

Há que se considerar, neste contexto, a significativa contribuição do Tribunal de Nuremberg, entre 1945-1946, ao movimento de internacionalização dos direitos humanos, quando os aliados, ao final da Segunda Guerra Mundial, convocaram um Tribunal Militar Internacional, fruto do Acordo de Londres de 1945, com o intuito de responsabilizar os alemães pelos horrores da guerra.

Este Tribunal, invocando o costume internacional, buscou a condenação criminal das pessoas envolvidas na prática de crime contra a paz, crime de guerra e crime contra a humanidade. Ressalte-se que, de acordo com o art. 38 [35] do Estatuto da Corte Internacional de Justiça, o costume internacional — enquanto evidência de uma prática geral aceita como norma — é fonte do Direito Internacional e tem eficácia erga omnes, aplicando-se a todos os Estados.

Ao aplicar o costume internacional, deliberou o Tribunal de Nuremberg:

O Direito da guerra deve ser encontrado não apenas nos Tratados, mas nos costumes e nas práticas dos Estados, que gradualmente obtêm reconhecimento universal e ainda nos princípios gerais de justiça aplicados por juristas e pelas Cortes Militares. Este Direito não é estático, mas está em contínua adaptação, respondendo às necessidades de um mundo em mudança. Além disso, em muitos casos os Tratados nada mais fazem do que expressar e definir com maior precisão os princípios de direito já existentes. (...) a agressão da guerra é não apenas ilegal, mas criminal. A proibição da agressividade da guerra é demanda da consciência do mundo e encontra sua expressão em uma série de Pactos e Tratados a que o Tribunal já fez referência [36].

Desta forma, os indivíduos que colaboraram com o nazismo foram condenados criminalmente com fundamento na violação de costumes internacionais, embora muita discussão tenha sido suscitada acerca da afronta ao princípio da legalidade do direito penal, especialmente quando se defendeu a tese de que os atos punidos pelo Tribunal de Nuremberg não eram considerados crimes quando foram cometidos.

Com efeito, notável foi o significado do Tribunal de Nuremberg para a internacionalização dos direitos humanos, eis que, além de consolidar a questão da limitação da soberania nacional, reconheceu aos indivíduos direitos protegidos pelo Direito Internacional.

2.3.1 A Carta das Nações Unidas

O processo de internacionalização dos direitos humanos fortaleceu-se após a Segunda Guerra Mundial, graças à contribuição de significativos fatores, em que se destaca a forte expansão de organizações internacionais com objetivos de cooperação internacional. As Nações Unidas, organização internacional inspirada pelas forças aliadas da II Guerra, assim como suas agências especializadas, passaram a caracterizar uma nova ordem internacional, instaurando um novo modelo de conduta das relações internacionais, essencialmente preocupado com questões atinentes à manutenção da paz e segurança internacionais, ao desenvolvimento de relações amistosas entre as nações, à cooperação internacional nas áreas social, econômica, cultural, ambiental, etc.; e, sobretudo, com a proteção internacional dos direitos humanos.

Com o intuito de facilitar o alcance desses objetivos, as Nações Unidas foram organizadas em diversos órgãos, destacando-se: a Assembléia Geral, o Conselho de Segurança, a Corte Internacional de Justiça, o Conselho Econômico e Social, o Conselho de Tutela e Secretariado, conforme dispõe o art. 7º da Carta da ONU [37], assim como outros órgãos subsidiários posteriormente criados.

Ao Conselho Econômico e Social coube promover a cooperação no que tange a questões econômicas, sociais, culturais, e aos direitos humanos. No exercício de suas atividades compete-lhe fazer as recomendações destinadas a promover o respeito e a observância dos direitos humanos e criar as comissões necessárias ao desempenho de suas funções. Destarte, foi criada, em 1946, a Comissão de Direitos Humanos da ONU, integrada por cinqüenta e três membros governamentais eleitos, para um mandato de três anos, pelo Conselho Econômico e Social.

Ao tratar da Comissão de Direitos Humanos da ONU, Flávia Piovesan citando Thomas Buergenthal (2000, p. 138), refere:

Esta comissão deve submeter ao Conselho Econômico e Social propostas, recomendações e relatórios relativos aos instrumentos internacionais de direitos humanos, à proteção das minorias, à prevenção da discriminação e demais questões relacionadas aos direitos humanos. A Declaração Universal, os pactos, as Convenções e muitos outros instrumentos de direitos humanos adotados pela ONU foram redigidos pela Comissão [38].

Para idênticos efeitos, foi criado o Alto Comissariado para os Direitos Humanos, em 1993, objetivando evitar a guerra, manter a paz e a segurança internacionais; momento em que emergem novas questões relacionadas com a promoção e a proteção dos direitos humanos. Assim sendo, a agenda da comunidade internacional passa a ter novos contornos, delineados pela coexistência pacífica entre os Estados, conjugada com a busca de formas inéditas de cooperação econômica e social e de promoção universal dos direitos humanos.

Neste sentido, a Carta das Nações Unidas de 1945 colaborou diretamente para a internacionalização dos direitos humanos, partindo do consenso entre os Estados que elevam a promoção desses direitos a propósito e finalidade das Nações Unidas. Conforme dispõe em seu artigo 1º [39], um dos propósitos das Nações Unidas é encorajar o respeito aos direitos humanos e liberdades fundamentais para todos, sem distinção de raça, sexo, língua ou religião. No mesmo sentido, o artigo 55 reitera a finalidade de promoção dos direitos humanos:

Com o fim de criar condições de estabilidade e bem-estar, necessárias às relações pacíficas e amistosas entre as Nações, baseadas no respeito ao princípio da igualdade de direitos e da autodeterminação dos povos, as Nações Unidas favorecerão: a) níveis mais altos de vida, trabalho efetivo e condições de progresso e desenvolvimento econômico e social; b) a solução dos problemas internacionais econômicos, sociais, sanitários e conexos; a cooperação internacional, de caráter cultural e educacional; e c) o respeito universal e efetivo dos direitos humanos e das liberdades fundamentais para todos, sem distinção de raça, sexo, língua ou religião [40].

Giza-se que, embora a Carta das Nações Unidas estabeleça a importância de se promover e de se respeitar os direitos humanos e as liberdades fundamentais, a mesma não definiu o conteúdo e o alcance das expressões "direitos humanos" e "liberdades fundamentais", revelando uma imprecisão de linguagem. Somente, em 1948, com a Declaração Universal dos Direitos Humanos, é que se definiram claramente essas expressões, por meio da fixação de um código comum e universal dos direitos humanos, concretizando-se a obrigação legal ínsita à promoção dos direitos humanos.

2.3.2 A Declaração Universal dos Direitos Humanos

A Declaração Universal dos Direitos Humanos foi aprovada de forma unânime por 48 Estados, apresentando apenas 8 abstenções. Sua expressão repercutiu, inclusive, no plano moral das Nações, despertando a consciência dos povos para a questão de seus destinos. Por conseguinte, a ausência de questionamentos ou reservas por parte dos Estados em relação aos princípios da Declaração, granjeou-lhe um status de código e plataforma comum de ação, consolidando a afirmação de uma ética universal, ao consagrar um consenso sobre valores de cunho universal a serem observados pelos Estados.

Segundo Flávia Piovesan:

A Declaração Universal de 1948 objetiva delinear uma ordem pública mundial fundada no respeito à dignidade humana, ao consagrar valores básicos universais. Desde seu preâmbulo, é afirmada a dignidade inerente a toda pessoa humana, titular de direitos iguais e inalienáveis. Vale dizer, para a Declaração Universal a condição de pessoa é o requisito único e exclusivo para a titularidade de direitos. A universalidade dos direitos humanos traduz a absoluta ruptura com o legado nazista, que condicionava a titularidade de direitos à pertinência à determinada raça (a raça pura ariana). A dignidade humana como fundamento dos direitos humanos é concepção que, posteriormente, vem a ser incorporada por todos os tratados e declarações de direitos humanos, que passam a integrar o chamado Direito Internacional dos Direitos Humanos [41].

Concomitantemente à universalidade dos direitos humanos, a Declaração de 1948 traça a indivisibilidade destes direitos, dispondo sobre a categoria dos direitos civis e políticos ao lado dos direitos econômicos, sociais e culturais. Destarte, define o sentido e o alcance da expressão "direitos humanos e liberdades fundamentais", conjugando o discurso liberal e discurso social da cidadania, bem como o valor da liberdade e o valor da igualdade, constituindo-se, assim, numa extraordinária inovação.

Até então, numa perspectiva histórica, era gritante a dicotomia entre o direito à liberdade e o direito à igualdade. No final do século XVIII, as duas principais declarações anteriormente referidas (a Declaração Francesa de 1789 e a Declaração Americana de 1776), valorizavam o padrão liberal-contratualista, que reduzia os direitos humanos aos direitos à liberdade, segurança e propriedade, complementados pela resistência à opressão. O discurso liberal de cidadania, tendo como coadjuvantes os direitos humanos, firmava-se como uma reação aos excessos do regime absolutista, a fim de limitar a atuação do Estado.

Com o fortalecimento do discurso social da cidadania, aliado à teoria marxista-leninista, surgiu, em 1917, a Declaração dos Direitos do Povo Trabalhador e Explorado da República Soviética Russa, onde o valor da liberdade desencadeou a materialização do valor igualdade e o Estado passou a ter importante atuação no processo de transformação social e de prestação social. Ao lado da Constituição de Weimar e da Constituição Mexicana, essa Declaração destacou-se por conter um discurso social da cidadania, apresentando em sua base o direito à igualdade somado a uma gama de direitos econômicos, sociais e culturais.

Na verdade, a Declaração de 1948 inaugura a concepção contemporânea de direitos humanos ao conjugar o valor da liberdade com o valor da igualdade, delegando a esses uma unidade interdependente e indivisível, o que faz com que sejam complementares e interativos. Em suma, é preciso garantir-se a efetividade dos direitos econômicos, sociais e culturais para que se assegure a realização dos direitos civis e políticos, e vice-versa.

Daí, decorre como inferência lógica não ser possível se cogitar da liberdade desvinculada da justiça social. Ou seja, todos os direitos humanos são universais, decorrentes da dignidade humana, e compõem um complexo integral, único e indivisível, em que os direitos coexistem de forma dependente e inter-relacionada.

Como valor jurídico, a Declaração Universal de 1948 não é um tratado, tampouco possui força de lei; foi adotada pela Assembléia Geral das Nações Unidas como uma resolução que consagra o reconhecimento universal dos direitos humanos e das liberdades fundamentais mencionados na Carta da ONU. Assim sendo, os Estados-membros das Nações Unidas têm a obrigação de assegurar o respeito e a observância universal dos direitos constantes da Declaração.

Ainda que não possua a forma de tratado internacional, a Declaração Universal de 1948 tem força jurídica obrigatória e vinculante, uma vez que porta em si a interpretação autorizada do termo "direitos humanos" como consta na Carta das Nações Unidas. Outrossim, a natureza vinculante da Declaração é reforçada pelo fato de que, por mais de cinqüenta anos desde sua adoção, tornou-se direito costumeiro internacional e princípio geral do Direito Internacional.

José Afonso da Silva (p. 168-169) chama a atenção para o problema da eficácia das normas da Declaração Universal dos Direitos Humanos ao dispor que:

O problema é ainda mais agudo em se tratando de uma Declaração Universal, que não dispõe de um aparato próprio que a faça valer, tanto que o desrespeito acintoso e cruel de suas normas, nesses quarenta anos, constituíra uma regra trágica, especialmente no nosso continente e também no nosso país. Não é, pois, sem razão que se afirma que o regime democrático se caracteriza, não pela inscrição dos direitos fundamentais, mas por sua efetividade, por sua realização eficaz [42].

Ademais, a notória influência que a Declaração de 1948 ainda exerce sobre os ordenamentos jurídicos dos Estados deriva da evidência que os direitos nela previstos têm sido incorporados pelas Constituições nacionais e, muitas vezes, tornam-se fontes para as decisões judiciais de âmbito interno. Considera-se, ainda, de modo geral, que os Estados que desrespeitam os postulados da Declaração, violando os direitos expressos ou ultrapassando os limites impostos, merecem desaprovação incondicional por parte da comunidade internacional.

Assim sendo, o período pós-guerra impulsionou a emergência do movimento de internacionalização dos direitos humanos, criando uma sistemática internacional de proteção dos direitos humanos, mediante um sistema de monitoramento e fiscalização internacional, que elevam o tema dos direitos humanos à condição de legítimo interesse da comunidade internacional.

2.4 O Direito Internacional dos Direitos Humanos

A questão referente aos direitos inerentes à pessoa humana vem se afirmando ao longo dos tempos nas mais diversas regiões do mundo; entretanto, a abordagem jurídica dessa questão é recente e floresceu, conforme exposto, graças ao surgimento da Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948. No mesmo sentido, a proteção internacional dos direitos humanos vem se desenvolvendo, no decorrer da história, influenciada por movimentos sociais e políticos, teorias filosóficas, avanços científicos e jurídicos.

De acordo com os ensinamentos de Antônio Augusto Cançado Trindade:

A idéia dos direitos humanos é, assim, tão antiga como a própria história das civilizações, tendo logo se manifestado, em distintas culturas e em momentos históricos sucessivos, na afirmação da dignidade da pessoa humana, na luta contra todas as formas de dominação e exclusão e opressão, e em prol da salvaguarda contra o despotismo e a arbitrariedade, e na asserção da participação na vida comunitária e do princípio da legitimidade. O reconhecimento destes valores e conceitos básicos, formando padrões mínimos universais de comportamento e respeito ao próximo, constitui um legado, mais do que do chamado pensamento ocidental, das mais diversas culturas, da consciência universal de sucessivas gerações de seres humanos, tendo presentes suas necessidades e responsabilidades [43].

É inegável a valiosa contribuição das correntes jusnaturalistas, da democracia grega, do Renascimento e do Iluminismo, para a conceituação jurídica contemporânea dos direitos humanos, que considera esses como inerentes a cada ser humano e, sobretudo, inalienáveis, antecedendo os direitos do Estado, e elevando o valor justiça acima do direito estatal positivo.

Com o despertar da consciência individual, há o reconhecimento dos direitos pessoais e das liberdades fundamentais, vinculando-se a noção de bem comum aos direitos humanos com o intuito de se garantir a emancipação do homem de qualquer tipo de servidão. Aqui, verifica-se que o processo de generalização da proteção do ser humano, em nível internacional, originado a partir da Declaração Universal de 1948, sempre considerou a universalidade dos direitos humanos, inerentes a todo ser humano, inobstante a diversidade cultural.

Os direitos pessoais invocados na Declaração Universal de 1948 atingiram efetivamente quase todas as Constituições nacionais, estendendo seus efeitos no plano do direito interno. Mesmo apresentando uma multiplicidade cultural, religiosa, política e social, grande parte dos países buscaram ratificar ou aderir aos tratados de direitos humanos de aplicação universal.

A questão da universalidade dos direitos humanos colabora diretamente para a identificação do Direito Internacional dos Direitos Humanos como um ramo autônomo do Direito Internacional contemporâneo, constituindo-se num "direito de proteção" [44], que tem o objetivo maior de salvaguardar os direitos dos seres humanos e não dos Estados. Logo, compõe um sistema de normas, com uma multiplicidade de instrumentos internacionais de proteção, de natureza e efeitos diversos, aplicáveis tanto em nível global como em nível regional, que visam assegurar a proteção do ser humano em qualquer circunstância e em todas as áreas da atividade humana.

Aliados ao Direito Internacional dos Direitos Humanos, estão o Direito Internacional Humanitário e o Direito Internacional dos Refugiados, que convergem na ampliação da proteção dos direitos humanos e prevalência destes. Na última década, constatou-se uma crescente preocupação da comunidade internacional com as condições de vida em todos os países, e, por conseguinte, com a interação entre: direitos humanos, democracia e desenvolvimento, conforme se depreende das seguintes Conferências Mundiais das Nações Unidas realizadas: a) Meio Ambiente e Desenvolvimento, Rio de Janeiro, 1992; b) Direitos Humanos, Viena, 1993; c) População e Desenvolvimento, Cairo, 1994; d) Desenvolvimento Social, Copenhague, 1995; e) Mulher, Beijing, 1995; e f) Assentamentos Humanos, Istambul, 1996.

O Direito Internacional dos Direitos Humanos sustenta que o homem é sujeito tanto do direito interno quanto do direito internacional, possuindo, em ambos casos, personalidade e capacidade jurídica próprias. Há que se considerar, assim, a constante e dinâmica interação entre o direito internacional e o direito interno, contrariando a doutrina clássica, estática e compartimentalizada, que insiste na prevalência de um sobre o outro. O elemento nuclear sempre será a proteção do homem, ou seja, a primazia da norma mais favorável às vítimas, desimportando, assim, as questiúnculas sobre primazia de ordenamentos jurídicos.

Para o cumprimento das obrigações internacionais de proteção é fundamental a participação dos órgãos e das instituições de direito interno, a quem compete aplicar concretamente os dispositivos internacionais. É nesse contexto que, para o estudo da temática dos direitos humanos, é necessária a análise das normas de direito internacional e de direito constitucional de forma harmônica e integrada.

Assim que, o Direito Internacional dos Direitos Humanos insurge-se contra a classificação simplista e fragmentada dos direitos humanos como "gerações de direitos" [45], uma vez que defende a unidade fundamental de concepção e a indivisibilidade de todo os direitos humanos, em detrimento de sua categorização em determinada geração de direitos, e a busca pela expansão e fortalecimento dos direitos individuais e sociais. Assim, não é possível coadunar-se com a seletividade discricionária em relação aos destinatários ou às condições de aplicação das normas. O Direito Internacional dos Direitos Humanos está a serviço da defesa da pessoa humana contra todas as formas de dominação e arbitrariedade.

É de se ressaltar que o Direito Internacional dos Direitos Humanos não opera sobre as relações entre iguais; outrossim, existe para defender os mais fracos, os vulneráveis, remediando os efeitos das disparidades e amenizando o desequilíbrio que afeta os direitos humanos. Constata-se, pois, que a evolução histórica da proteção internacional do direitos humanos originou-se na mobilização da sociedade civil contra a repressão, a dominação e a exclusão.

Destarte, os instrumentos de proteção internacional têm se afirmado como uma reação à violação dos direitos humanos, no momento em que se mostram falhos ou inadequados os mecanismos de direito interno. Daí, que o sentido do Direito Internacional dos Direitos Humanos está atrelado à premissa de que os direitos humanos são inerentes ao ser humano e antecedem a qualquer forma de organização política.

Por esses motivos, a proteção internacional dos direitos humanos não se esgota na ação do Estado, puramente, devendo considerar as necessidades prementes e condições das supostas vítimas. Independentemente do que o ordenamento jurídico nacional estipula, os termos e os conceitos consagrados nos tratados de direitos humanos possuem um sentido autônomo.

É nesse sentido que se constata o surgimento e a consolidação do Direito Internacional dos Direitos Humanos como disciplina autônoma e dotada de especificidades próprias, voltada à construção de uma cultura universal de observância dos direitos humanos.

2.4.1 O sistema de proteção internacional dos direitos humanos

O movimento internacional de direitos humanos e a criação de sistemas normativos de implementação desses direitos passam, então, a ocupar um lugar de destaque na agenda da comunidade internacional, propiciando o surgimento de inúmeros tratados de direitos humanos, bem como de organismos governamentais e não-governamentais comprometidos com a defesa, proteção e promoção dos referidos direitos. O processo de universalização dos direitos humanos desencadeou a necessidade de implementação dos direitos humanos, mediante a criação de uma sistemática internacional de monitoramento e controle, também conhecida como "international accountability" [46].

Partindo-se do estudo da Carta da ONU de 1945, que estabelece que os Estados-partes devem promover a proteção dos direitos humanos e liberdades fundamentais, e da Declaração Universal de 1948, que define e fixa o elenco dos direitos e liberdades fundamentais a serem garantidos, constata-se, sob um enfoque estritamente legalista, que a Declaração não apresenta força jurídica obrigatória e vinculante. Após muitas discussões acerca de qual seria o modo mais eficaz para se obter o reconhecimento e a observância dos direitos previstos na Declaração de 1948, optou-se pelo entendimento de que esta deveria ser juridicizada na forma de tratado internacional, juridicamente obrigatório e vinculante no âmbito do Direito Internacional.

De 1949 a 1966, desenvolveu-se o processo de juridicização da Declaração, que culminou na elaboração de dois tratados que passavam a incorporar os direitos constantes da Declaração: o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos e o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais. Esse fato configurou-se na mais significativa expressão do movimento internacional dos direitos humanos, traduzindo central importância para o sistema de proteção em sua globalidade.

Juntamente com a Declaração Universal de 1948, os Pactos Internacionais de 1966 compõem a Carta Internacional dos Direitos Humanos, ou International Bill of Rights, que, por sua vez, inaugura o sistema global de proteção desses direitos, ao lado do qual já se vislumbravam os contornos dos sistemas regionais de proteção: europeu, interamericano e africano. Nesse contexto, surgem inúmeros tratados multilaterais de direitos humanos referentes a determinadas violações de direitos, como o genocídio, a tortura, a discriminação racial, a discriminação contra as mulheres, a violação de direitos das crianças, etc., que resultarão em Convenções Internacionais específicas.

É fundamental atentar para a questão de que os tratados internacionais de direitos humanos, ao contrário dos tratados internacionais tradicionais, não visam ao equilíbrio de interesses entre os Estados, e sim buscam garantir o exercício de direitos e liberdades fundamentais dos indivíduos. Da mesma forma, o Direito Internacional dos Direitos Humanos não objetiva substituir o ordenamento nacional ou se sobrepor a este; contudo, coloca-se como direito paralelo e suplementar ao direito nacional, a fim de corrigir omissões e deficiências.

No sistema internacional de proteção dos direitos humanos a comunidade internacional tem responsabilidade subsidiária, ao passo que a responsabilidade dos Estados é primária. Logo, os procedimentos internacionais possuem natureza subsidiária e constituem-se numa garantia adicional de proteção dos direitos humanos, quando as instituições nacionais falham.

Objetivando fundamentar essas assertivas, passa-se ao estudo dos tratados internacionais mais importantes do sistema global de proteção dos direitos humanos.

2.4.2 O Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos

Tal qual o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, foi aprovado pela Assembléia Geral das Nações Unidas, em 1966, entrando em vigor somente 1976, quando obteve o número de ratificações necessárias. Até a data de 30 de junho de 1996, ratificaram o Pacto 132 Estados-partes.

O processo de elaboração desse Pacto foi permeado por intensas discussões na ONU acerca da conveniência da existência de dois pactos diversos ou de um pacto único. Inicialmente, a Comissão de Direitos Humanos operacionalizou seus trabalhos sobre um projeto único de pacto, abarcando as duas categorias de direitos. Entretanto, sob a influência dos países ocidentais, a Assembléia Geral, em 1951, propugnou pela elaboração de dois Pactos a serem aprovados simultaneamente, com o intuito de enfatizar a unidade dos direitos neles previstos.

Na verdade, a ONU não deixou de reafirmar a indivisibilidade e a unidade dos direitos humanos, ainda que houvessem dois Pactos distintos, ressaltando que, sem os direitos sociais, econômicos e culturais, os direitos civis e políticos só existiriam no plano nominal e, de outra banda, sem direitos civis e políticos, os direitos sociais, econômicos e culturais apenas existiriam no plano formal.

O Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos acabou por incorporar uma gama de direitos civis e políticos mais extensa do que a apresentada na Declaração Universal. O Pacto, na verdade, estipula a obrigação dos Estados-partes assegurarem imediata aplicação dos direitos nele elencados a todos os indivíduos sob sua jurisdição, tomando as providências necessárias para isso. Logo, cabe ao Estado-parte compor um sistema legal capaz de responder com eficácia às violações dos direitos civis e políticos. Daí, resultar sua auto-aplicabilidade.

Fundamental é a colaboração de Flávia Piovesan (2002) quando afirma:

No sentido de assegurar a observância dos direitos civis e políticos, o Pacto desenvolve uma sistemática peculiar de monitoramento e implementação internacional desses direitos – uma special enforcement machinery. O Pacto oferece, assim, suporte institucional aos preceitos que consagra, impondo obrigações as Estados [47].

Ao ratificarem o Pacto, os Estados-partes, por seu turno, assumem a obrigação de encaminhar relatórios ao Comitê de Direitos Humanos, acerca das medidas tomadas nas áreas: legislativa, administrativa e judiciária, para assegurar os direitos contidos no Pacto e prestar contas à comunidade internacional. Esse Comitê é o principal órgão de monitoramento, sendo formado por 18 membros nacionais dos Estados-partes, que atuam de forma independente e autônoma, desvinculados de seu Estado, nos termos do art. 29 do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos [48].

O Pacto estabelece, ainda, um mecanismo de comunicações interestatais, no qual a determinado Estado-parte é facultado alegar violação dos direitos humanos por parte de outro Estado-parte (art. 41) [49]; desde que haja uma declaração em separado, de ambos Estados envolvidos — denunciante e denunciado —, reconhecendo a competência do Comitê para tais comunicações. Ao se recorrer ao procedimento das comunicações interestaduais, admite-se o fracasso das negociações bilaterais e o esgotamento das soluções no âmbito interno. Cabe, então, ao Comitê, intervir na disputa, apresentando proposta de solução amistosa.

Além dos direitos constantes da Declaração de 1948, o Pacto ampliou o catálogo dos direitos civis e políticos, destacando-se: o direito à vida; o direito de não ser submetido à tortura ou a tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes; o direito a não ser escravizado, nem submetido à servidão; os direitos à liberdade e à segurança pessoal e a não se sujeitar à prisão ou detenção arbitrárias; o direito a um julgamento justo; a igualdade perante a lei; a liberdade de movimento; o direito a uma nacionalidade; o direito de casar e formar família; as liberdades de pensamento, consciência e religião; as liberdades de opinião e de expressão; a liberdade de associação; o direito de sindicalizar-se e o direito de voto e de participação do governo, dentre outros, nos termos dos artigos 14 [50] e 15 [51] do Pacto.

O Pacto estabelece direitos inderrogáveis, como o direito à vida, a proibição da tortura e de qualquer forma de tratamento cruel, desumano ou degradante, a proibição da escravidão e servidão, o direito de ser reconhecido como pessoa, o direito de não ser preso por inadimplemento contratual, etc. Contudo, admite, em casos excepcionais, a derrogação temporária dos direitos que apresenta, nos termos do artigo 4º [52], dentro dos limites impostos pela decretação do estado de emergência, proibindo-se atos discriminatórios fundados em raça, cor, sexo língua, religião ou origem social. Admite, ainda, se necessário à segurança nacional ou à ordem pública, a limitação de determinados direitos, conforme disposto nos artigos 21 [53] e 22 [54].

Importante referir a existência do Protocolo Facultativo ao Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, que adiciona o mecanismo das petições individuais submetidas ao Comitê de Direitos Humanos, revelando-se num significativo avanço no plano internacional. Dessa forma, é assegurado ao indivíduo o direito de denunciar violações de direitos enunciados no Pacto, sob a forma de petição, evidenciando-se a capacidade processual internacional dos indivíduos.

De qualquer sorte há que se levar em conta a necessidade da ratificação do Estado violador do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos e do Protocolo Facultativo para que se admita a petição ou comunicação individual, reconhecendo, assim, a competência do Comitê. Nesse sentido, sob a forma de um Protocolo distinto e opcional, os Estados-partes podem consentir em levar ao exame do Comitê de Direitos Humanos comunicações feitas por indivíduos, que estejam sob sua jurisdição e que tenham sofrido violação de direitos constantes do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos.

Na linguagem do Protocolo Facultativo a comunicação tem o caráter de ser individual; entretanto, admite-se que organizações ou terceiros interessados representem a vítima da violação, encaminhando as comunicações. Reitera-se que é fundamental que as comunicações contenham violação a um ou mais direitos previstos no Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos e, também, que seja comprovado o esgotamento dos recursos de jurisdição interna, bem como que a matéria não esteja sob exame de outra instância internacional.

O Comitê, após o recebimento da comunicação, abrirá prazo de 6 meses para o Estado apresentar esclarecimentos e alegações acerca da matéria suscitada. Em seguida, os esclarecimentos prestados pelo Estado serão encaminhados ao autor ou autora para análise, sendo-lhe possibilitado prestar informações adicionais. Levando em conta todas as informações, o Comitê proferirá, então, uma decisão, por meio do voto da maioria dos membros presentes, que será publicada no relatório anual do Comitê à Assembléia Geral.

Além de declarar a alegada violação a direito previsto no Pacto, o Comitê pode, outrossim, determinar que o Estado repare a violação cometida e adote as medidas necessárias à estrita implementação do Pacto. Ressalte-se, todavia, que tal decisão não apresenta força obrigatória ou vinculante e tampouco há sanção prevista para o Estado que não cumprir as determinações. Inobstante o Estado violador, quando condenado no plano internacional, está sujeito a sofrer conseqüências na esfera política por meio de sanções morais constrangedoras.

Há que se atentar para a questão de que o Brasil, embora tenha firmado o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos em 1992, não fez a declaração opcional prevista no artigo 41, referente às queixas interestatais, e tampouco aderiu ao Protocolo Facultativo de petições individuais, demonstrando a falta de interesse e vontade política sobre a matéria [55].

O Comitê de Direitos Humanos vem adotando medidas no sentido de monitorar e fiscalizar a ação dos Estados em relação às decisões do Comitê. Exemplo disso é a solicitação ao Estado de informações acerca dos procedimentos adotados em relação ao caso, num prazo de 180 dias. Logo, o relatório anual do Comitê apontará os Estados que deixaram de atender à solicitação ou que falharam no tratamento eficaz da vítima, bem como indicará os Estados que cumpriram as decisões emanadas do Comitê.

2.4.3 O Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais

O objetivo primordial do Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais foi a incorporação e a expansão dos dispositivos relacionados com os direitos sociais, econômicos e culturais estabelecidos na Declaração Universal na forma de preceitos juridicamente obrigatórios e vinculantes. Assim, tal qual um tratado internacional, o Pacto norteou-se pela busca de uma linguagem de direitos que implicasse obrigações no plano internacional, conforme a sistemática da international accountability [56], ou seja, por meio da criação de obrigações legais aos Estados-partes, esse pacto atribui responsabilização internacional para o caso de violação dos direitos que elenca.

Até a data de 30 de junho de 1996, 134 Estados-partes ratificaram o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais. Este Pacto traz em seu conteúdo um extenso catálogo de direitos entre os quais se destacam: o direito ao trabalho e à justa remuneração, o direito a formar e a associar-se a sindicatos, o direito a um nível de vida adequado, o direito à moradia, o direito à educação, o direito à saúde, o direito à previdência social e o direito à participação na vida cultural da comunidade.

O Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais difere-se do Pacto dos Direitos Civis e Políticos, pois, enquanto este estabelece direitos endereçados aos indivíduos, o primeiro estabelece deveres concernentes aos Estados. Os direitos sociais, econômicos e culturais apresentam uma forma de realização progressiva, ou seja, não possuem auto-aplicabilidade, uma vez que estão condicionados à atuação do Estado, a quem compete adotar todas as medidas possíveis com o intuito de alcançar progressivamente a plena realização dos direitos previstos pelo Pacto (art. 2º, parágrafo 1º) [57].

Tais direitos constituem-se em direitos relativos e programáticos, que demandam aplicação progressiva e dependem de um mínimo de recursos econômicos disponível, assim como de suporte técnico-econômico, de cooperação econômica internacional e da previsão, como prioridade, diante da agenda política do Estado. Logo, demandam o emprego de um espaço de tempo considerável em relação aos direitos previstos pelo Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos.

A sistemática de monitoramento e implementação dos direitos do Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais contempla o mecanismo de relatórios a serem encaminhados pelos Estados-partes. A exemplo do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, esses relatórios devem conter as medidas adotadas pelo Estado-parte no sentido de dar cumprimento aos direitos previstos no Pacto. Esses relatórios serão submetidos ao Secretário-Geral das Nações Unidas que, por sua vez, encaminhará cópia ao Conselho Econômico e Social para análise.

O Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais não cria um comitê próprio como órgão de monitoramento, diferentemente do que ocorre com o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos. Também não prevê o mecanismo de comunicação inter-estatal; tampouco, mediante Protocolo Facultativo, permite a sistemática das comunicações individuais. Logo, o mecanismo de proteção dos direitos sociais, econômicos e culturais restringe-se à sistemática dos relatórios, destacando-se que existe a obrigação dos Estados em reconhecer e progressivamente implementar os direitos enunciados no Pacto.

Flávia Piovesan (2000) reitera que:

(...) da obrigação da progressividade na implementação dos direitos econômicos, sociais e culturais decorre a chamada cláusula de proibição do retrocesso social, na medida em que é vedado aos Estados retrocederem no campo da implementação destes direitos. Vale dizer, a progressividade dos direitos econômicos, sociais e culturais proíbe o retrocesso ou a redução de políticas públicas voltadas à garantia destes direitos [58].

É fundamental que se reconheça que os direitos econômicos, sociais e culturais são autênticos e verdadeiros direitos fundamentais, integrando, além da Declaração Universal e do Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, outros tratados internacionais, como a Convenção sobre a Eliminação da Discriminação Racial, a Convenção sobre os Direitos da Criança e a Convenção sobre a Eliminação da Discriminação contra a Mulher, etc.

Por fim, constata-se que a violação aos direitos sociais, econômicos e culturais é conseqüência tanto da ausência de forte suporte e intervenção governamental, como da falta de pressão internacional em favor dessa intervenção. Trata-se, portanto, de um problema de ação e prioridade governamental e implementação de políticas públicas, que sejam capazes de atender a graves problemas sociais. Não se pode olvidar a questão da globalização econômica, que vem agravando as desigualdades sociais e aprofundando as marcas da pobreza absoluta e da exclusão social.

Concomitante a esses dispositivos convencionais, outros de suma importância merecem referência, como abaixo se delimita.

2.4.4 Outras Convenções Internacionais de Direitos Humanos

Por certo existem outros instrumentos internacionais de proteção dos direitos humanos que integram e complementam o sistema especial de proteção, no plano internacional.

A partir da International Bill of Rights [59], que foi o marco do processo de proteção internacional dos direitos humanos, muitas outras Convenções e Declarações em relação à matéria passaram a tutelar determinados grupos tidos como vulneráveis e, ainda, outras relativas a determinadas violações. Tal fenômeno se deve ao surgimento e ao desenvolvimento de direitos até então não tutelados pelo ordenamento existente.

É o que Norberto Bobbio (1992, p. 68-69) [60] denomina "multiplicação de direitos" quando aborda tanto o aumento dos bens merecedores de tutela, com a ampliação dos direitos a prestação, como também a extensão da titularidade de direitos, alargando-se o próprio conceito de sujeito de direito e, abrangendo, assim, além do indivíduo, a coletividade, os grupos organizados, os grupos vulneráveis e a própria humanidade.

O processo de internacionalização dos direitos humanos, associado ao fenômeno da multiplicação dos direitos, fez surgir um complexo sistema internacional de proteção, onde interagem os sistemas geral e especial de proteção. Tratam-se de sistemas complementares, em que o sistema especial visa à prevenção da discriminação ou à proteção de pessoas vulneráveis, que necessitam de proteção especial. De fato, deixa-se de considerar o indivíduo de forma genérica e abstrata, para tomá-lo em sua especificidade e concreticidade, levando-se em conta as categorias relacionadas a gênero, idade, etnia, sexo, etc., com o intuito de reconhecer direitos endereçados às crianças, aos idosos, às mulheres, às pessoas vitimadas pela tortura e pela discriminação racial, dentre outros.

As Convenções que integram o sistema especial de proteção são direcionadas para determinado sujeito de direito, isto é, visam responder a determinada violação de direito, uma vez que adotam como sujeito de direito o indivíduo historicamente situado, levando em conta, outrossim, a peculiaridade e a particularidade de suas relações sociais. Nesse contexto, destacam-se a Convenção Internacional sobre a Eliminação de todas as formas de Discriminação Racial, a Convenção sobre a Eliminação de todas as formas de Discriminação contra Mulher, a Convenção sobre os Direitos da Criança, a Convenção contra a Tortura, a Convenção para a Prevenção e Repressão do Crime do Genocídio, dentre os principais instrumentos internacionais.

Passa-se, assim, ao estudo dos direitos básicos trazidos pelas referidas Convenções e de seus respectivos mecanismos de proteção. Via de regra, tais instrumentos adotam a sistemática de relatórios; por vezes, permitem o sistema de comunicações interestatais e o sistema de petições individuais, como cláusulas facultativas. Ressalte-se que as Convenções prevêem, como órgão de monitoramento dos direitos, o chamado Comitê, que é competente para apreciar os relatórios encaminhados pelos Estados-partes e para considerar as comunicações interestatais e as individuais.

2.4.4.1 Convenção Internacional sobre a Eliminação de todas as formas de Discriminação Racial

A Convenção Internacional sobre a Eliminação de todas as formas de Discriminação Racial foi adotada pela ONU em 21 de dezembro de 1965, com o objetivo primordial de se erradicar o racismo, num contexto marcado pelo crescente ingresso de países africanos nas Nações Unidas, pelo ressurgimento das atividades nazifascistas na Europa e pelas preocupações ocidentais com o anti-semitismo.

É fundamental destacar no preâmbulo da Convenção que qualquer "doutrina de superioridade baseada em diferenças raciais é cientificamente falsa, moralmente condenável, socialmente injusta e perigosa, inexistindo justificativa para a discriminação racial, em teoria ou prática, em lugar algum" [61].

Em seu artigo 1º, a Convenção traz como definição de discriminação racial,

qualquer distinção, exclusão, restrição ou preferência baseada em raça, cor, descendência ou origem nacional ou étnica, que tenha o propósito ou o efeito de anular ou prejudicar o reconhecimento, gozo ou exercício em pé de igualdade dos direitos humanos e liberdades fundamentais [62].

Logo, a discriminação remete a toda distinção, exclusão, restrição ou preferência que vise prejudicar ou anular o exercício, em igualdade de condições, dos direitos humanos e liberdades fundamentais, nos planos: político, econômico, cultural, social, civil, etc., implicando sempre desigualdade.

Impõe-se urgência nas tratativas de erradicação de todas as formas de discriminação, fundamentadas em raça, cor, descendência ou origem nacional ou étnica, a fim de que se possa garantir o pleno exercício dos direitos civis e políticos e também dos direitos sociais, econômicos e culturais, anteriormente abordados. Ratificando a Convenção, os Estados-partes obrigam-se, no campo internacional, a eliminar a discriminação racial, de modo progressivo, assegurando uma igualdade efetiva.

Há que se considerar que o combate à discriminação constitui-se numa medida emergencial e insuficiente, fazendo-se necessária, juntamente com a proibição da discriminação, a implementação de políticas compensatórias e de estratégias promocionais que garantam a igualdade no plano material por meio da inserção e da inclusão dos grupos socialmente vulneráveis no âmbito social. Nesse sentido, a Convenção prevê no artigo 1º, parágrafo 4º, a possibilidade de "discriminação positiva" [63], também denominada de ação afirmativa, que denomina o conjunto de medidas especiais e temporárias que objetivam acelerar o processo de igualdade por parte de grupos socialmente vulneráveis, remediando-se um passado discriminatório.

Dentre os principais direitos consagrados pela Convenção, destacam-se o direito à igualdade perante a lei, sem qualquer distinção de raça, cor, origem, nacionalidade ou etnia; o direito a tratamento equânime perante os Tribunais e demais órgãos administradores da justiça; o direito a recursos e remédios judiciais quando da violação a direitos assegurados pela Convenção; o direito à segurança e proteção contra violência; o direito ao voto; a proibição de propaganda e organizações racistas; o direito de acesso aos lugares e serviços públicos, proibida qualquer discriminação, dentre outros direitos de natureza civil, política, social, econômica e cultural.

Em relação ao sistema de monitoramento, a Convenção Internacional sobre a Eliminação de todas as formas de Discriminação Racial foi o instrumento jurídico internacional precursor sobre direitos humanos, introduzindo como mecanismo próprio de supervisão o Comitê sobre a Eliminação da Discriminação Racial, que é competente para examinar as petições individuais, as comunicações interestatais e os relatórios encaminhados pelos Estados-partes. Ressalte-se que o direito de petição é previsto sob a forma de cláusula facultativa, por isso deve o Estado autorizar o Comitê a examinar as petições individuais.

Como no Protocolo Facultativo ao Pacto dos Direitos Civis e Políticos, os procedimentos para recebimento e análise das petições individuais pelo Comitê sobre a Eliminação da Discriminação Racial são bastante semelhantes. Sendo que a opinião ou a decisão do Comitê é igualmente destituída de força jurídica obrigatória ou vinculante, como ocorre com o Comitê de Direitos Humanos. Contudo, consta do relatório anual elaborado pelo Comitê que é, por sua vez, encaminhado à Assembléia Geral da ONU.

2.4.4.2 Convenção sobre a Eliminação de todas as formas de Discriminação contra a Mulher

As Nações Unidas aprovaram a Convenção sobre a Eliminação de todas as formas de Discriminação contra a Mulher, em 1979, cuja origem remanesce à proclamação de 1975 como Ano Internacional da Mulher e à realização da primeira Conferência Mundial sobre a Mulher. Até 1996, essa Convenção recebeu a ampla adesão dos Estados, contando com 154 ratificações; entretanto, este instrumento foi alvo do maior número de reservas formuladas pelos Estados, dentre os tratados internacionais de direitos humanos.

A Convenção tem como objetivos: eliminar a discriminação e assegurar a igualdade, propugnando que o princípio da igualdade seja uma obrigação vinculante. A discriminação contra a mulher reflete, nos termos de seu artigo 1º:

Toda distinção, exclusão ou restrição baseada no sexo e que tenha por objeto ou resultado prejudicar ou anular o reconhecimento, gozo, exercício pela mulher, independentemente de seu estado civil, com base na igualdade do homem e da mulher, dos direitos humanos e das liberdades fundamentais nos campos político, econômico, social, cultural e civil ou em qualquer outro campo [64].

A Convenção prevê a possibilidade aos Estados de invocar as "ações afirmativas", já referidas anteriormente, como importante medida para acelerar o processo de obtenção da igualdade, constituindo-se numa forma de compensação para remediar as desvantagens históricas, suavizando as condições resultantes de um passado discriminatório. Dessa forma, a Convenção busca, além de erradicar a discriminação contra a mulher e suas causas, estimular ações de promoção da igualdade.

Ressalta-se a preocupação com a urgência em se erradicar todas as formas de discriminação contra as mulheres, objetivando-se a garantia do pleno exercício de seus direitos civis e políticos, como também de seus direitos sociais, econômicos e culturais. Tem-se, assim, a obrigação internacional assumida pelo Estado que ratificou a Convenção. Em suma, a Convenção reflete a visão de que as mulheres são titulares de todos os direitos e oportunidades que os homens podem exercer, com o devido ajuste das habilidades e necessidades decorrentes das diferenças biológicas e sem eliminar a igualdade de direitos e oportunidades da titularidade das mulheres.

Há que se observar que a Convenção não ataca a problemática da violência contra a mulher de modo eficaz e explícito, todavia esta violência constitui-se em grave discriminação. A violência contra a mulher é concebida como um padrão de violência específico, baseado no gênero, que cause morte, dano ou sofrimento físico, sexual ou psicológico à mulher. Este preceito corrobora a tese de que, no tocante à proteção dos direitos humanos, a violação destes direitos não se reduz à esfera pública, mas também estende-se ao domínio privado.

A proteção internacional dos direitos humanos foi reforçada pela Declaração e Programa de Ação de Viena de 1993 e pela Declaração e Plataforma de Ação de Pequim de 1995, instrumentos esses que reiteraram que os direitos das mulheres são parte inalienável, integral e indivisível dos direitos humanos universais.

No que tange aos mecanismos de monitoramento, a Convenção estipula um Comitê próprio, que tem sua competência limitada à apreciação dos relatórios elaborados pelos Estados-partes. Os relatórios são o único mecanismo previsto pela Convenção; entretanto, existiram propostas para a introdução dos mecanismos de petição individual e de comunicação interestatal, mediante a elaboração de um Protocolo Facultativo.

Em 1999, concluiu-se o Protocolo Facultativo à Convenção sobre Eliminação de todas as formas de Discriminação contra a Mulher, que instituiu dois mecanismos de monitoramento: o mecanismo da petição, encaminhando denúncias de violação de direitos enunciados na Convenção para o Comitê; e, um procedimento investigatório, que habilita o Comitê a investigar a existência de grave e sistemática violação aos direitos humanos das mulheres.

2.4.4.3 Convenção contra a Tortura e outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanas ou Degradantes

Adotada pela ONU em 1984, a Convenção contra a Tortura e outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanas ou Degradantes merece importante destaque. A definição de "tortura", como consta de seu artigo 1º [65], envolve três elementos essenciais: a) a inflição deliberada de dor ou sofrimento físicos ou mentais; b) o objetivo do ato (obtenção de confissão, castigo, intimidação ou coação, ou outro motivo discriminatório); c) a vinculação do agente ou responsável, direta ou indiretamente, com Estado.

Dentre outros direitos, a Convenção consagra a proteção contra atos de tortura e outras formas de tratamento cruel, desumano ou degradante; o direito de não ser extraditado ou expulso para um Estado onde há risco significativo de sofrer tortura; o direito à indenização no caso de tortura; os direitos de que haja exame imparcial da denúncia sobre tortura e o direito de não ser torturado para obtenção de prova ilícita, como a confissão.

É fundamental referir que a Convenção estabelece a jurisdição compulsória e universal para os indivíduos suspeitos de praticar a tortura, uma vez que é um crime que viola o Direito Internacional, conforme o disposto nos artigos 5º a 8º [66]. Compulsória porque obriga os Estados-partes a punir os torturadores, independentemente da questão territorial da violação ou da nacionalidade dos envolvidos (torturador e torturado). Universal porque o Estado-parte, onde se encontre o suspeito, deverá processá-lo ou extraditá-lo para outro Estado a fim de que seja processado, independentemente de acordo prévio bilateral sobre extradição.

Quanto ao sistema de monitoramento, são previstos os três mecanismos já analisados anteriormente: as petições individuais, os relatórios e as comunicações interestatais. É mister referir que, embora as decisões do Comitê contra a Tortura não sejam legalmente vinculantes e obrigatórias, tais decisões têm efetivamente auxiliado o exercício dos direitos humanos reconhecidos no plano internacional.

Ao contrário dos demais Comitês referidos, o Comitê contra a Tortura detém a iniciativa para investigação própria, na hipótese de recebimento de informações contendo significativos indícios de que a prática da tortura seja sistemática em determinado Estado-parte.

2.4.4.4 Convenção sobre os Direitos da Criança

Trata-se de um tratado internacional de proteção de direitos humanos com o mais expressivo número de ratificações. Adotada pela ONU em 1989 e vigente desde 1990, a Convenção, nos termos de seu artigo 1º, define criança como "todo ser humano menor de 18 anos de idade, salvo se, em conformidade com a lei aplicável à criança, a maioridade seja alcançada antes" [67].

A Convenção concebe a criança como um verdadeiro sujeito de direito, reconhecendo a exigência de especial proteção e absoluta prioridade. Dentre os direitos previstos na Convenção, destacam-se: o direito à vida e à proteção contra a pena capital; o direito a ter uma nacionalidade; a proteção ante a separação dos pais; a proteção para não ser levada ilicitamente ao exterior; a proteção de seus interesses no caso de adoção; a liberdade de pensamento, consciência e religião; o direito ao acesso a serviços de saúde, devendo o Estado adotar políticas para a redução da mortalidade infantil e das práticas prejudiciais à saúde; o direito a um nível adequado de vida e segurança social; o direito à educação, devendo os Estados promoverem educação primária compulsória e gratuita, a proteção contra a exploração econômica e a proteção contra a exploração e o abuso sexual.

Os Estados-partes, ao ratificarem a Convenção, se comprometem a proteger a criança de todas as formas de discriminação, assegurando-lhe adequada assistência. Registre-se a especial preocupação da Declaração de Viena, ao insistir na ratificação universal e sem reservas dos tratados e protocolos de direitos humanos, especificamente no que tange à Convenção sobre os Direitos da Criança, propugnando pela sua efetiva implementação por todos os Estados-partes, mediante a adoção de todas as medidas legislativas, administrativas e políticas, bem como mediante a alocação de todos os recursos disponíveis.

No mesmo contexto, a Declaração de Viena insiste que é fundamental a cooperação e a solidariedade internacionais com vistas a apoiar a implementação da Convenção sobre os Direitos da Criança e os direitos da criança devem ser prioritários em toda as ações da ONU na área dos direitos humanos.

Em relação ao mecanismo de controle e fiscalização dos direitos enunciados na Convenção, há o Comitê sobre os Direitos da Criança, ao qual cabe monitorar a implementação desta Convenção, por meio do exame de relatórios periódicos encaminhados pelos Estados-partes. A partir do Protocolo Facultativo, passou-se a contar com outros mecanismos de monitoramento, como as petições individuais e as comunicações interestatais.

2.4.4.5 Tribunal Internacional Criminal Permanente e a Convenção para a Prevenção e Repressão do Crime de Genocídio

Inicialmente, acerca da Convenção para a Prevenção e Repressão do Crime de Genocídio, pode-se afirmar que se trata do primeiro tratado internacional de proteção dos direitos humanos aprovado pela ONU e adotado em 1948, que surgiu como resposta às atrocidades da Segunda Guerra Mundial, especialmente o genocídio que resultou na morte de 6 milhões de judeus. A Convenção enfoca o genocídio como um crime que viola o Direito Internacional, o qual os Estados comprometem-se a prevenir e a punir.

Por genocídio, nos termos do artigo 2º, a Convenção prevê:

(...) qualquer dos seguintes atos, cometidos com a intenção de destruir, no todo ou em parte, um grupo nacional, étnico, racial ou religioso, tal como: a) assassínio de membros do grupo; c) submissão intencional do grupo a condições de existência que lhe ocasionem a destruição física total ou parcial; d) medidas destinadas a impedir nascimentos no seio do grupo e e) transferência forçada de crianças de um grupo para outro grupo [68].

Dessa forma, as pessoas que tiverem cometido genocídio serão punidas, sejam governantes, funcionários ou particulares.

No que diz respeito ao julgamento do crime de genocídio, conforme o artigo 6º da Convenção:

As pessoas acusadas de genocídio ou de qualquer dos outros atos enumerados no art. III serão julgadas pelos tribunais competentes do Estado em cujo território foi o ato cometido ou pela corte penal internacional competente com relação às Partes Contratantes que lhe tiverem reconhecido a jurisdição [69].

Logo, constata-se que, desde 1948, havia a previsão da criação de uma corte penal internacional para o julgamento do crime de genocídio, uma vez que as instâncias nacionais mostravam-se incapazes de processar ou julgar por um crime que afrontava a ordem internacional.

Como precedentes históricos do surgimento da Corte Penal Internacional, destacam-se os Tribunais de Nuremberg e Tóquio, como também os recentes Tribunais ad hoc da Bósnia e da Ruanda, constituídos por resolução do Conselho de Segurança da ONU, respectivamente, em 1993 e 1994. Outrossim, o Programa de Ação de Viena de 1993 enfatizou a importância de um sistema internacional de justiça para apreciar as graves afrontas aos direitos humanos.

Em 1998, na Conferência de Roma, foi aprovado o Estatuto do Tribunal Internacional Criminal Permanente, de caráter permanente, independente e vinculado ao sistema das Nações Unidas, com sede em Haia, na Holanda. O Tribunal Internacional Criminal Permanente surge como aparato complementar às Cortes nacionais, com o intuito de garantir o fim da impunidade para os crimes internacionais mais graves.

Tem-se, assim, evidenciada a responsabilidade primária do Estado no que diz respeito ao julgamento de violações de direitos humanos, delegando-se à comunidade internacional a responsabilidade subsidiária. De acordo com o artigo 1º do Estatuto da Corte Penal Internacional, a jurisdição o Tribunal é adicional e complementar à do Estado, ficando condicionada à incapacidade ou à omissão do ordenamento interno.

O Tribunal tem competência para julgar os seguintes crimes: a) crime de genocídio; b) crimes contra humanidade, inclusive ataques generalizados e sistemáticos contra a população civil, sob a forma de assassinato, extermínio, escravidão, deportação, encarceramento, tortura, violência sexual, estupro, prostituição, gravidez e esterilização forçadas, desaparecimento forçado, crime de apartheid, dentre outros; c) crimes de guerra (violações ao Direito Internacional Humanitário, especialmente às Convenções de Genebra de 1949) e d) crimes de agressão (ainda não definido), conforme disposto no art. 5º do Estatuto [70].

O exercício da jurisdição do Tribunal é condicionado à adesão do Estado ao tratado, sendo necessário o reconhecimento expresso por meio da ratificação integral e sem ressalvas. Levando-se em conta que o Tribunal Internacional Criminal Permanente é complementar à jurisdição penal interna, existem requisitos de admissibilidade para o exercício da jurisdição internacional, no moldes do art. 17 [71] do Estatuto, tais como a indisposição do Estado-parte ou sua incapacidade para realizar a investigação e o julgamento do crime.

Em relação às penas, o Estatuto prevê a pena máxima de 30 (trinta) anos, como regra, e, em casos excepcionais, a prisão perpétua, se justificada pela extrema gravidade do crime e pelas circunstâncias pessoais do condenado. Poderá, outrossim, impor sanções de natureza civil, estabelecendo a reparação às vítimas e aos seus familiares.

Há que ressaltar que o Estatuto aplica-se de forma igualitária a todas as pessoas, independentemente de cargo ou posição social. Asseguram-se aos acusados as garantias de um tratamento justo em todas as fases do processo, conforme os parâmetros internacionais.

2.4.5 Convenção Americana de Direitos Humanos

O sistema regional de proteção busca internacionalizar os direitos humanos no plano regional, particularmente na Europa, América e África. De extrema relevância para o presente estudo monográfico é o sistema interamericano, uma vez que se aplica diretamente ao caso brasileiro, que tem como principal instrumento a Convenção Americana de Direitos Humanos de 1969 que, por sua vez, estabelece a Comissão Interamericana de Direitos Humanos e a Corte Interamericana.

Também denominada de Pacto de San José da Costa Rica, a Convenção entrou vigor somente em 1978, sendo que apenas os Estados membros da Organização dos Estados Americanos podem ser parte. O universo de direitos civis e políticos assegurados pela Convenção Americana é similar ao contido no Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, destacando-se: o direito à personalidade jurídica, o direto à vida, o direito a não ser submetido à escravidão, o direito à liberdade, o direito a um julgamento justo, o direito à compensação em caso de erro judiciário, o direito à privacidade, o direito à liberdade de consciência e religião, o direito à liberdade de pensamento e expressão, o direito à resposta, o direito à liberdade de associação, o direito ao nome, o direito à nacionalidade, o direito à igualdade perante a lei, o direito à proteção judicial, dentre outros.

A Convenção Americana não dispõe de modo expresso acerca dos direitos sociais, culturais e econômicos, limitando-se a determinar aos Estados que promovam ações neste sentido. Foi o Protocolo Adicional à Convenção, em 1988, que trouxe o reconhecimento dos direitos sociais, culturais e econômicos. Cada Estado-parte tem o dever de respeitar e assegurar o livre e pleno exercício dos direitos e liberdades constantes da Convenção Americana, sem qualquer discriminação, adotando as medidas adequadas para conferir-lhes efetividade.

A Convenção Americana apresenta uma sistemática de monitoramento e implementação dos direitos enunciados, formada pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos e pela Corte Interamericana.

2.4.5.1 Comissão Interamericana de Direitos Humanos

A Comissão Interamericana de Direitos Humanos tem sua competência estendida a todos os Estados-partes da Convenção Americana, no que diz respeito aos direitos humanos nesta consagrados. A competência estende-se ainda a todos os Estados-membros da Organização dos Estados Americanos no que tange aos direitos previstos na Declaração Americana de 1948.

Composta por sete membros de respeitada idoneidade moral e notável saber em matéria de direitos humanos, podendo ser nacionais de qualquer Estado-membro da Organização dos Estados Americanos, que são eleitos, a título pessoal, pela Assembléia Geral para um período de quatro anos, permitida uma reeleição.

A Comissão Interamericana de Direitos Humanos tem como principais finalidades a observância e a proteção dos direitos humanos na América, atuando por meio das recomendações aos governos dos Estados-partes, do preparo de estudos e relatórios, da solicitação de informações relacionadas às ações adotadas para a efetiva aplicação da Convenção e da elaboração do relatório anual para a Assembléia Geral da Organização dos Estados Americanos. Cabe, ainda, à Comissão examinar as comunicações encaminhadas por indivíduo ou grupo de indivíduos, ou ainda entidade não-governamental, contendo denúncia de violação a direitos previstos na Convenção.

Há requisitos de admissibilidade para as petições, devendo observar-se o prévio esgotamento dos recursos internos, salvo no caso de injustificada demora processual, ou no caso da legislação interna não respeitar o devido processo legal. Essa regra do esgotamento dos recursos de direito interno corrobora a interação entre o Direito Internacional e o Direito interno e da subsidiariedade do procedimento internacional. Outro importante requisito é a inexistência de litispendência internacional, isto é, a mesma questão não pode estar pendente em outra instância internacional.

A Comissão Interamericana, ao receber uma petição, primeiramente faz o juízo de admissibilidade da mesma, observados os requisitos enunciados no art. 46 [72] da Convenção. Admitida a petição, solicita informações ao Governo denunciado. Recebidas as informações do Governo, ou transcorrido o prazo sem as informações, a Comissão verifica se existem ou subsistem os motivos da petição. Em caso negativo, arquiva-se a denúncia; do contrário, a Comissão procederá à investigação dos fatos, com o conhecimento da partes.

Após o exame da matéria, buscar-se-á uma solução amistosa entre as partes: denunciante e Estado. Alcançada esta solução, a Comissão emitirá um informe, contendo um relatório acerca dos fatos e da solução, ao peticionário e aos Estados-partes da Convenção, comunicando-se também à Secretaria da Organização dos Estados Americanos para ser publicado. Todavia, não havendo solução amistosa, a Comissão emitirá um relatório, com os fatos e conclusões concernentes ao caso e, eventualmente, com recomendações ao Estado-parte, que terá três meses para conferir cumprimento a estas recomendações.

Nesse período de três meses, o caso poderá ser solucionado pelas partes ou encaminhado à Corte Interamericana de Direitos Humanos, que é o órgão jurisdicional deste sistema regional. Não é prevista a legitimação do indivíduo para encaminhar o caso à Corte, exclusivamente a Comissão Interamericana e os Estados-partes podem fazê-lo, conforme disposição do art. 61 [73] da Convenção. Entretanto, a questão somente poderá ser submetida à Corte, havendo o reconhecimento pelo Estado-parte da competência da Corte em relação à interpretação e aplicação da Convenção.

O sistema das comunicações interestatais é previsto como cláusula facultativa, sendo necessária a declaração expressa dos Estados-partes reconhecendo a competência da Comissão para receber e examinar denúncia de um Estado em relação a outro, desconsiderando-se objetivos políticos e propósitos intervencionistas.

2.4.5.2 Corte Interamericana

A Corte é composta por sete juízes nacionais dos Estados-membros da Organização dos Estados Americanos, eleitos a título individual pelos Estados-partes da Convenção Americana. Apresenta atribuições de natureza consultiva e contenciosa; a primeira, refere-se à interpretação das disposições da Convenção Americana e dos tratados relativos à proteção dos direitos humanos nos Estados Americanos; a segunda, de caráter jurisdicional, diz com a solução de controvérsias decorrentes da interpretação ou da aplicação da própria Convenção.

Os membros da Organização dos Estados Americanos, sendo partes ou não da Convenção, podem solicitar parecer da Corte em relação à interpretação da Convenção ou de qualquer outro tratado relativo à proteção dos direitos humanos nos Estados americanos. A Corte pode também emitir opinião acerca da compatibilidade da legislação interna em face dos instrumentos internacionais.

Já no plano contencioso, a competência da Corte para o julgamento dos casos limita-se aos Estados-partes da Convenção que tenham reconhecido expressamente tal jurisdição. Reitera-se que não está prevista a legitimação do indivíduo para submeter um caso à Corte; exclusivamente a Comissão Interamericana e os Estados-partes é que detêm tal legitimidade.

A Corte tem jurisdição para examinar casos que envolvam a denúncia de que um Estado-parte violou direito amparado pela Convenção, podendo, inclusive, determinar a adoção de medidas necessárias à restauração do direito então violado, bem como condenar o Estado ao pagamento de justa compensação à vítima.

É de se ressaltar que as decisões da Corte têm força jurídica vinculante e obrigatória, devendo o Estado velar pela imediata observância. Todavia, faz-se necessário o reconhecimento pelo Estado da jurisdição da Corte. O Brasil somente veio a reconhecer a competência jurisdicional da Corte Interamericana em 1998, por meio do Decreto Legislativo nº 89, de 3 de dezembro de 1998.

Flávia Piovesan (2000) destaca que:

No plano da jurisdição contenciosa, referência obrigatória é o famoso caso ‘Velasquez Rodriguez’, atinente ao desaparecimento forçado de indivíduo no Estado de Honduras. Acolhendo comunicação encaminhada pela Comissão Interamericana, a Corte condenou o Estado de Honduras ao pagamento de indenização aos familiares do desaparecido, em decisão publicada em 21 de julho de 1989 [74].

A questão trata do desaparecimento de Angel Manfredo Velasquez Rodrigues, ocorrido em setembro de 1981, num período político conturbado, em que imperava a violência e a repressão. A denúncia revelou que esse indivíduo fora preso de modo violento e sem autorização judicial, por pessoas armadas e ligadas ao governo.

A petição denunciava que Velasquez Rodriguez fora vítima de tortura cruel e desaparecimento forçado, e afirmava que o Estado de Honduras havia incorrido na violação de vários direitos previstos na Convenção, devendo ser condenado ao pagamento de indenização aos familiares. Sendo que até 1986 a vítima continuava desaparecida, a Comissão Interamericana considerou que o Governo de Honduras não oferecera provas substanciais e convincentes para afastar a denúncia e, por conseguinte, encaminhou o caso ao exame da Corte Interamericana.

Após o procedimento investigatório e a produção de provas, a Corte fundamentou sua decisão nos seguintes termos:

O desaparecimento forçado de seres humanos é uma violação múltipla e contínua de muitos direitos constantes da Convenção, que os Estados-partes são obrigados a respeitar e garantir. Essa obrigação implica no dever dos Estados-partes de organizar um aparato governamental, no qual o poder público é exercido, capaz de juridicamente assegurar o livre e pleno exercício dos direitos humanos. Como conseqüência desta obrigação, os Estados devem prevenir, investigar e punir qualquer violação de direitos enunciados na Convenção e, além disso, se possível, devem buscar a restauração de direito violado, prevendo uma compensação em virtude dos danos resultantes da violação. (...) a falha de ação do aparato estatal, que está claramente provada, reflete a falha de Honduras em satisfazer as obrigações assumidas em face do art. 1º (I) da Convenção, que obriga a garantir a Manfredo Velasquez o livre e pleno exercício de seus direitos humanos [75].

Assim, em face da violação dos artigos 4º [76], 5º [77] e 7º [78] da Convenção, combinados com o artigo 1º (I) [79], por parte do Estado de Honduras, a Corte decidiu, de modo unânime, pela condenação ao pagamento de justa indenização aos familiares da vítima.

Vários casos já foram submetidos à apreciação da Corte. Destaca-se, ainda um caso submetido pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos, em que a Corte estabeleceu a adoção de medidas provisórias para proteger 14 membros de organizações de direitos humanos no Estado da Guatemala, com base no art. 63 (2) [80] da Convenção. Ressalta-se que a Convenção Americana de Direitos Humanos é o único tratado internacional de direitos humanos que dispõe acerca de medidas preliminares ou provisórias judicialmente aplicáveis.

Pelo exposto, é possível concluir que, ainda que recente a atuação da Corte Interamericana, o sistema interamericano vem se consolidando como uma importante e eficaz estratégia de proteção dos direitos humanos, quando o ordenamento interno e suas instituições revelam-se omissos ou falhos.

Estabelecidos os parâmetros vinculados à questão dos direitos humanos e sua implementação perante o sistema internacional, cumpre se fazer a análise da efetividade de implementação desta sistemática perante o sistema interno brasileiro. De fato, ao analisar este contexto, pretende-se estabelecer o real prestígio que goza a normatividade internacional nessa matéria no ordenamento doméstico, bem como a expressão comportamental dos Poderes Legislativo e Judiciário.


3 A proteção dos direitos humanos e a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988

A Carta Magna de 1988 demarca, no plano jurídico, o processo de democratização do Estado brasileiro, propondo avanços no tocante à institucionalização dos direitos e garantias fundamentais e na proteção de setores mais vulneráveis da sociedade, a partir da ruptura com o regime autoritário militar. É a partir dela que os direitos humanos ganham destaque no cenário jurídico, situando-se a Constituição Brasileira de 1988 como o documento mais abrangente e pormenorizado sobre os direitos humanos até então adotado no Brasil.

A consolidação das liberdades fundamentais e das instituições democráticas no país alterou, por sua vez, profundamente a política brasileira de direitos humanos, desencadeando um progresso significativo no reconhecimento de obrigações internacionais neste campo. As relevantes transformações internas do cenário brasileiro geraram repercussões na esfera internacional, o que significa dizer que o equacionamento dos direitos humanos no âmbito da ordem jurídica interna

figurou como estratégia de reforço para que a questão dos direitos humanos entrasse definitivamente na agenda internacional do país.

Tem-se que as repercussões decorrentes dessa nova agenda internacional causaram alterações no plano interno e no próprio ordenamento jurídico do país. Essas mudanças implicaram um novo constitucionalismo, bem como uma abertura à internacionalização da proteção dos direitos humanos.

3.1 A Institucionalização dos direitos e garantias fundamentais

A Constituição democrática ratificada em 1988 ampliou consideravelmente o campo dos direitos e garantias fundamentais, colocando-se dentre as Constituições mais avançadas da atualidade no que diz respeito à matéria. Desde o seu preâmbulo, a Carta de 1988 propugna pela consolidação do Estado Democrático de Direito, "destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias (...)" [81]. Em seus três primeiros artigos, o texto constitucional apresenta princípios que consagram os fundamentos e os objetivos do Estado Democrático de Direito.

Destacam-se, dentre os fundamentos que alicerçam o Estado Democrático de Direito brasileiro, a cidadania e dignidade da pessoa humana (artigo 1º, incisos II e III) [82]. Verifica-se aqui o encontro do princípio do Estado Democrático de Direito e dos direitos fundamentais, evidenciando que os direitos fundamentais constituem o elemento básico para a realização do princípio democrático, uma vez que exercem uma função democratizadora.

Por sua vez, construir uma sociedade livre, justa e solidária, garantir o desenvolvimento nacional, erradicar a pobreza e a marginalização, reduzir as desigualdades sociais e regionais e promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação, constituem os objetivos fundamentais do Estado, conforme consta do artigo 3º [83] da Constituição Brasileira. Tais objetivos visam à concretização da democracia econômica, social e cultural, implicando na efetivação da dignidade e do bem-estar da pessoa humana. É nesse contexto que o valor da dignidade da pessoa humana revela-se como núcleo básico e informador de todo o ordenamento, imprimindo-lhe uma feição particular.

Partindo-se da concepção de que o sistema jurídico apresenta, ao lado das normas legais, princípios que incorporam valores, este define-se como uma ordem axiológica ou teleológica de princípios jurídicos que possuem função ordenadora, na medida em que salvaguardam valores fundamentais. Portanto, a interpretação das normas constitucionais ocorre tendo-se por base critérios valorativos que emergem do próprio sistema constitucional. À luz dessas premissas, constata-se que o valor da dignidade da pessoa humana, bem como o valor dos direitos e garantias fundamentais, constituem os princípios constitucionais que incorporam as exigências de justiça e dos valores éticos, refletindo o suporte axiológico de todo o sistema jurídico brasileiro.

De fato, a busca do texto constitucional em resguardar o valor da dignidade humana é redimensionada na medida em que privilegia a temática dos direitos fundamentais, elevando-os, inclusive, à cláusula pétrea. Inova, ainda, a Carta de 1988, ao ampliar a dimensão dos direitos e garantias, incluindo no rol de direitos fundamentais, além dos direitos civis e políticos, os direitos sociais. Nesta ótica, o texto constitucional acolhe o princípio da indivisibilidade e interdependência dos direitos humanos, pelo qual o valor da liberdade se conjuga ao valor da igualdade, não sendo possível dissociar o elenco desses direitos.

Importante referir que a Carta de 1988 prevê, ao lado dos direitos individuais, os direitos coletivos, pertinentes a determinada classe ou categoria, e os direitos difusos, pertinentes a todos e a cada um. Assim, a Constituição Brasileira, ao mesmo tempo em que consolida a extensão de titularidade de direitos a novos sujeitos de direitos, também consolida o aumento da quantidade de bens merecedores de tutela, com a ampliação de direitos sociais, econômicos e culturais.

A Carta de 1988 concretiza, sobretudo, a concepção de que os direitos e garantias fundamentais são dotados de uma especial força expansiva, projetando-se no universo constitucional e servindo como parâmetro interpretativo de todas as normas do ordenamento jurídico.

Com o objetivo de reforçar a imperatividade das normas que traduzem direitos e garantias fundamentais, torna-se fundamental ressaltar que a Carta de 1988 instituiu o princípio da aplicabilidade imediata dessas normas, conforme disposição do parágrafo 1º do artigo 5º [84]. Este princípio realça a força normativa de todos os dispositivos constitucionais referentes a direitos, liberdades e garantias de cunho fundamental, cabendo ao Poder Público conferir-lhes eficácia máxima e imediata. Com efeito, este princípio tem a finalidade de assegurar a força dirigente e vinculante dos direitos e garantias fundamentais, tornando tais direitos prerrogativas diretamente aplicáveis pelos Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário.

Logo, é neste contexto que se deve analisar os dispositivos constitucionais referentes à proteção internacional dos direitos humanos.

3.2 O Princípio Constitucional da Prevalência dos Direitos Humanos

A Constituição Brasileira de 1988, em seu art. 4º [85], enumera os princípios constitucionais que regem as Relações Exteriores do Brasil.

Destaca-se o princípio da prevalência dos direitos humanos como um dos mais importantes do artigo 4º, uma vez que simboliza a reinserção do Brasil no cenário internacional. A referência a Direitos Humanos é tomada no sentido lato, isto é, não abrange apenas o tempo de paz, abarcando as chamadas três vertentes da Proteção Internacional dos Direitos Humanos: Direitos Humanos strictu sensu, Direito Internacional Humanitário e Direito Internacional dos Refugiados, uma vez que a visão compartimentalizada destas vertentes leva a uma proteção ineficaz do ser humano.

A interpretação do sentido do termo Direitos Humanos deve se dar de modo amplo, pois vincula a ação diplomática brasileira, devendo ser respeitado em quaisquer acordos ou atos unilaterais, uma vez que implica a necessidade de o governo brasileiro colaborar com qualquer órgão estabelecido para monitorar a situação dos Direitos Humanos em sistemas de que o Brasil faça parte.

A interpretação dada pelo Direito Internacional a este dispositivo leva a crer que qualquer decisão emanada de tribunais internacionais de que o Brasil aceite a jurisdição obrigatória, e que envolvam matérias de Direitos Humanos, deve ser respeitada no direito interno. Isto se aplica especialmente às decisões da Corte Interamericana de Direitos Humanos, cuja jurisdição o Brasil aceita desde 1998.

Obviamente todas estas obrigações decorrentes do princípio da prevalência dos Direitos Humanos já são estabelecidas no Direito Internacional; entretanto, o fato de se tratar de um princípio constitucional possibilita o controle destas obrigações pela via judicial no Brasil.

Em conjunto com o art. 7º do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, que dispõe: "O Brasil propugnará pela formação de um Tribunal Internacional dos Direitos Humanos"; este princípio favorece uma futura ratificação por parte do Brasil ao Estatuto de Roma, criando o Tribunal Penal Internacional, uma vez que uma ampla proteção dos Direitos Humanos não pode prescindir do princípio da responsabilização individual por crimes contra a humanidade.

A Carta de 1988, ao romper com a sistemática das Cartas anteriores, que se limitavam a assegurar os valores da independência e soberania do país, consagra, de forma inédita, o primado do respeito aos direitos humanos, como paradigma orientado para a ordem internacional. Este princípio inaugura a abertura da ordem jurídica interna ao sistema internacional de proteção dos direitos humanos. A prevalência dos direitos humanos, como princípio a reger o país no cenário internacional, não implica apenas o engajamento da Nação no processo de elaboração de regras vinculadas ao Direito Internacional dos Direitos Humanos, mas também implica a busca da plena integração dessas normas à ordem jurídica interna.

Ao fundamentar suas relações com base na prevalência dos direitos humanos, o Estado brasileiro reconhece a existência de limites e condicionamentos à idéia de soberania estatal. Ou seja, a soberania do Brasil fica submetida a normas jurídicas, tendo-se como parâmetro obrigatório a prevalência dos direitos humanos. Assim, rompe-se com a concepção tradicional de soberania estatal absoluta, relativizando-a em prol da proteção dos direitos humanos.

Com efeito, é necessário se interpretar os antigos conceitos de soberania estatal e não-intervenção conjuntamente aos princípios inovadores da ordem constitucional, como o princípio da prevalência dos direitos humanos. Estes são os novos valores incorporados pela Constituição de 1988 e que compõem a essência do constitucionalismo contemporâneo.

Outra questão relevante para o estudo das relações entre a Constituição Brasileira de 1988 e o Direito Internacional dos Direitos Humanos é o alcance do parágrafo 2º do artigo 5º da Carta Magna [86], ao determinar que os direitos e garantias expressos na Constituição não excluem outros decorrentes dos tratados internacionais de que o Brasil seja signatário. Comprova-se, assim, a interação entre a ordem jurídica interna e a ordem jurídica internacional dos direitos humanos.

3.3 A Constituição Federal e os Tratados Internacionais de Proteção dos Direitos Humanos

É notória e louvável a inovação trazida pela Carta de 1988 ao incluir, dentre os direitos constitucionalmente amparados, os direitos enunciados nos tratados internacionais em que o Brasil seja parte. Tal processo de inclusão acarreta a incorporação desses direitos pelo ordenamento constitucional. Assim, ao efetuar essa incorporação, a Constituição Brasileira delega aos direitos internacionais uma hierarquia de norma constitucional, por sua vez, diferenciada.

Tem-se, então, que os direitos que compõem os tratados de direitos humanos ratificados pelo Brasil, fazem parte do rol de direitos constitucionalmente consagrados. Esta conclusão é possível graças à interpretação sistemática e teleológica das normas, principalmente em face da força expansiva dos valores da dignidade humana e dos direitos fundamentais, tidos como critérios axiológicos e orientadores do fenômeno constitucional.

Nesse sentido, especial é a contribuição de Antonio Augusto Cançado Trindade:

Observe-se que os direitos se fazem acompanhar necessariamente das garantias. É alentador que as conquistas do direito internacional em favor da proteção do ser humano venham a projetar-se no direito constitucional, enriquecendo-o, e demonstrando que a busca de proteção cada vez mais eficaz da pessoa humana encontra guarida nas raízes do pensamento tanto internacionalista quanto constitucionalista. O disposto no artigo 5(2) da Constituição Brasileira de 1988 vem dar testemunho disso, além de inserir-se na nova tendência de recentes Constituições latino-americanas de conceder um tratamento especial ou diferenciado também no plano do direito interno aos direitos e garantias individuais internacionalmente consagrados [87].

Em reforço à natureza constitucional dos direitos enunciados em tratados internacionais, acrescenta-se a natureza materialmente constitucional dos direitos fundamentais, prevista de modo explícito no parágrafo 2º do artigo 5º da Carta de 1988. De fato, a Constituição assume expressamente o conteúdo constitucional dos direitos previstos nos tratados internacionais dos quais o Brasil é parte. Mesmo que tais direitos não estejam dispostos sob a forma de normas constitucionais, mas sob a forma de tratados internacionais, a Constituição delega-lhes o valor jurídico de norma constitucional, uma vez que complementam o rol de direitos fundamentais do ordenamento constitucional.

Sob essa ótica, pode-se afirmar que os direitos internacionais integram o chamado bloco de constitucionalidade, densificando a norma constitucional do parágrafo 2º do artigo 5º, tida como cláusula constitucional de caráter aberto. Ressalta-se que, ao estipular diretrizes e linhas básicas, revela-se a incompletude da Constituição, que, por sua vez, aponta à sua abertura, possibilitando a flexibilidade necessária ao contínuo aperfeiçoamento político.

Flávia Piovesan (2000) apresenta uma classificação dos direitos previstos pela Constituição, organizando-os em três grupos:

a) o dos direitos expressos na Constituição (por exemplo, os direitos elencados pelo texto nos incisos I a LXXVII do art. 5º); b) o dos direitos expressos em tratados internacionais de que o Brasil seja parte; e finalmente, c) o dos direitos implícitos (direitos que estão subentendidos nas regras de garantias, bem como os direitos decorrentes do regime e dos princípios adotados pela Constituição) [88].

Assim, se, por um lado, os direitos implícitos caracterizam-se pela imprecisão, vagueza e subjetividade, por outro lado, os direitos expressos na Constituição Brasileira e nos tratados internacionais de que o Brasil seja parte compõem um universo preciso de direitos.

Com efeito, todas as normas constitucionais são verdadeiras normas jurídicas e desempenham uma função útil no ordenamento; sendo assim, nenhuma norma constitucional é passível de interpretação que lhe diminua ou retire a razão de ser. Levando-se em conta os princípios da força normativa da Constituição e da ótima concretização da norma, à norma constitucional deve ser dado o sentido que maior eficácia lhe imprima, principalmente ao se tratar de norma instituidora de direitos e garantias fundamentais. Logo, prima-se pela máxima efetividade aos princípios constitucionais.

Importante enfatizar que os direitos enunciados em tratados internacionais de proteção dos direitos humanos têm hierarquia de norma constitucional, enquanto que os demais tratados internacionais possuem força hierárquica infra-constitucional. Essa hierarquia infra-constitucional é extraída do art. 102, III, "b" [89], da Constituição Federal, que atribui ao Supremo Tribunal Federal a competência para julgar, mediante recurso extraordinário, "as causas decididas em única ou última instância, quando a decisão recorrida declarar a inconstitucionalidade de tratado ou lei federal". Nessa diretriz, uma tendência da doutrina brasileira passou a acolher a tese de que os tratados internacionais e as leis federais apresentavam mesma hierarquia jurídica, inclinando-se pelo princípio "lei posterior revoga lei anterior que seja com ela incompatível".

No entanto, a orientação seguida no presente estudo prima pela atribuição de grau hierárquico constitucional aos tratados de direitos humanos, norteada pela aplicação do princípio da prevalência da norma mais favorável, em consonância com a ordem constitucional de 1988. Destarte, tem-se uma interpretação afinada com os valores prestigiados pelo atual sistema jurídico, em particular com o valor da dignidade humana, que é valor fundante do sistema constitucional.

Reitera-se que a teoria da paridade entre o tratado internacional e a legislação federal não é condizente com os tratados internacionais de direitos humanos, uma vez que a Carta de 1988 garante a estes um privilégio hierárquico, delegando-lhes natureza de norma constitucional. Enquanto os tratados internacionais comuns buscam o equilíbrio e a reciprocidade de relações entre Estados pactuantes, os tratados internacionais de direitos humanos transcendem os meros compromissos recíprocos entre os Estados-partes, pois visam à salvaguarda dos direitos do ser humano, assumindo obrigações em relação aos indivíduos, e não das prerrogativas do Estados.

Acrescenta-se ainda ao caráter especial dos tratados de proteção dos direitos humanos o argumento de que os tratados de direitos humanos apresentam superioridade hierárquica em relação aos demais ato internacionais, formando uma gama de princípios que possuem especial força obrigatória, chamada jus cogens. Tendo em vista que os direitos humanos mais essenciais fazem parte do jus cogens, pode-se admitir a hierarquia especial e privilegiada dos tratados internacionais de direitos humanos em relação aos demais [90].

Assim, a hierarquia constitucional dos tratados de proteção dos direitos humanos é conseqüência da previsão constitucional do parágrafo 2º do artigo 5º da Carta de 1988, graças a uma interpretação sistemática e teleológica da Constituição, especialmente da prioridade que atribui aos direitos fundamentais e ao princípio da dignidade da pessoa humana.

É importante levar-se em consideração que os direitos constantes nos tratados internacionais, bem como os demais direitos e garantias individuais consagrados pela Constituição, constituem cláusula pétrea, não podendo ser abolidos por meio de emenda, conforme disposto no artigo 60, parágrafo 4º [91], da Carta de 1988. Tem-se que as cláusulas pétreas protegem o núcleo material da Constituição, que compõem os valores fundamentais da ordem constitucional. Dessa forma, os direitos enunciados em tratados internacionais em que o Brasil seja parte incluem-se na cláusula pétrea "os direitos e garantias individuais", nos termos do art. 60, parágrafo 4º, inciso IV da Constituição Federal.

Contudo, ainda que os direitos internacionais constituam-se como cláusula pétrea, não sendo passíveis de exclusão por emenda constitucional, os tratados internacionais de direitos humanos estão sujeitos a denúncia por parte do Estado signatário. Os direitos internacionais poderão ser eliminados pelo mesmo Estado que os incorporou, em razão das peculiaridades do regime de direito internacional público, o que significa que cabe ao Estado-parte realizar o ato de ratificação do tratado, bem como o ato de denúncia, isto é, o ato de retirada do mesmo tratado. Enfatiza-se que a denúncia, no Direito brasileiro, é ato privativo do Poder Executivo, que não requer a participação do Legislativo.

3.4 O Conflito entre norma interna e norma internacional

O problema da incorporação dos tratados à ordem interna demonstra-se polêmico, possibilitando a identificação de duas correntes a saber: monista, para a qual não existem limites entre a ordem jurídica internacional e a ordem jurídica interna e, assim, uma vez celebrado o tratado, este obriga no plano interno; dualista, para a qual existe uma dualidade de ordens jurídicas, uma interna e outra externa, sendo então necessário e indispensável um ato de recepção para introduzir as regras constantes do tratado no âmbito do direito interno positivo.

Para os monistas, o Direito é concebido como uma unidade, em que as normas internacionais e internas são partes do mesmo ordenamento. Em caso de conflito entre a norma internacional e a norma nacional, a maioria dos monistas inclina-se pela prevalência do Direito Internacional. Já para os dualistas, o Direito interno e Direito Internacional são completamente independentes entre si, cada qual regulando matéria diversa. O Direito Internacional, nessa ótica, disciplinaria as relações entre Estados soberanos; o Direito interno, por sua vez, regularia os assuntos internos dos Estados, constituindo-se em sistemas mutuamente diferenciados e excludentes.

De fato, salvo na hipótese de tratados de direitos humanos, no texto constitucional não existe qualquer menção expressa acerca da questão da relação entre o Direito Internacional e o Direito interno e, conseqüentemente, não há referência sobre as correntes monista e dualista. A doutrina majoritária inclina-se pela corrente dualista, evidenciando duas ordens jurídicas diversas, em face do silêncio constitucional.

Dessa forma, para que o tratado ratificado surta efeitos no plano jurídico interno, é necessária a edição de ato normativo nacional com o objetivo de conferir execução e cumprimento ao tratado. Reitera-se que, para os tratados de direitos humanos há a previsão de aplicação imediata por força do artigo 5º, parágrafo 1º.

Para exemplificar uma situação de conflito entre direito internacionalmente garantido e dispositivo constitucional, destaca-se a questão relativa à prisão civil. Há previsão no artigo 11 do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos no sentido de que "ninguém poderá ser preso apenas por não poder cumprir com uma obrigação contratual" [92]. Semelhante disposição encontra-se no artigo 7º da Convenção Americana [93], que estabelece que ninguém deve ser detido por dívidas, acrescentando que este princípio não limita os mandados judiciais expedidos em virtude de inadimplemento de obrigação alimentar.

Houve ratificação, sem reservas, pelo Brasil nos referidos instrumentos internacionais em 1992. Contudo, a Constituição Federal determina, no artigo 5º, inciso LXVII, que "não haverá prisão civil por dívida, salvo a do responsável pelo inadimplemento voluntário e inescusável de obrigação alimentícia e a do depositário infiel". Tem-se, então, que a Carta de 1988 consagra o princípio da proibição da prisão civil por dívidas; entretanto, alude a duas exceções: a hipótese do inadimplemento de obrigação alimentícia e a do depositário infiel.

É nesse cenário que se questiona a possibilidade jurídica da prisão civil do depositário infiel, uma vez que o Brasil ratificou os instrumentos sem qualquer reserva. Portanto, ao se levar em consideração o critério da prevalência da norma mais favorável à vítima no plano da proteção dos direitos humanos, deduz-se que não caberia a possibilidade de prisão do depositário infiel, dada à primazia da norma do tratado [94].

Enfatiza-se que se a situação fosse inversa, no caso da norma constitucional ser mais benéfica do que a norma internacional, dar-se-ia lugar à norma constitucional, inobstante os aludidos tratados apresentarem hierarquia constitucional e terem sido ratificados após o advento da Constituição. De fato, os tratados internacionais de proteção aos direitos humanos possuem regras

interpretativas que levam a essa conclusão, ao disporem que os tratados internacionais só se aplicam se ampliarem o alcance da proteção nacional dos direitos humanos.

Atualmente existe uma tendência de abertura da ordem constitucional contemporânea à normação internacional, com a observância de princípios materiais de política e direito internacional informador do direito interno, uma vez que considera-se que as normas internacionais de direitos humanos, pelo fato de exprimirem de certa forma a consciência ética universal, estão acima do ordenamento jurídico de cada Estado.

3.4.1 Incorporação Automática e Incorporação Legislativa

Conforme abordado anteriormente, o artigo 5º da Constituição Federal, em seu parágrafo 1º, consagra o princípio da aplicabilidade imediata dos direitos e garantias fundamentais. Portanto, tendo-se que as normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais são de aplicação imediata, e que os tratados internacionais de direitos humanos possuem como objeto a definição de direitos e garantias, é possível concluir que estas normas demandam aplicação imediata.

Desse modo, os direitos fundamentais garantidos pelos tratados de proteção internacional dos direitos humanos em que o Brasil é parte, conforme os parágrafos 1º e 2º do artigo 5º, passam a fazer parte do rol dos direitos constitucionalmente consagrados direta e imediatamente exigíveis no âmbito do direito interno. Isso significa que é possível a invocação imediata de tratados e convenções de direitos humanos, tendo-se o Brasil como signatário, sem a necessidade de edição de ato com força de lei para dar vigência interna aos acordos internacionais.

Tem-se, assim, a incorporação automática do Direito Internacional dos Direitos Humanos pelo ordenamento jurídico interno, sendo desnecessário qualquer ato jurídico complementar para a sua exigibilidade e implementação. No entanto, há que se analisar as conseqüências advindas dessa incorporação automática. De um lado, permite ao indivíduo, de modo particular, a invocação direta dos direitos e liberdades assegurados no plano internacional e, por outro, proíbe condutas e atos violadores a tais direitos, sob pena de invalidação.

Nesse contexto, a partir da entrada em vigor do tratado internacional, toda norma preexistente que seja com ele incompatível perde imediatamente a vigência. Destarte, as decisões judiciais que violem as disposições do tratado passam a ser recorríveis; configurando-se aqui uma das sanções aplicáveis no caso de inobservância dos tratados. Inobstante, a Constituição Brasileira delega ao Poder Judiciário, consoante o artigo 105, III, "a" [95], competência para declarar inválida e antijurídica a conduta violadora a tratado internacional, podendo, se for o caso, impor sanções pecuniárias em favor da vítima que sofreu violação a seu direito fundamental.

Em relação à incorporação legislativa do Direito Internacional, importa referir que os enunciados dos tratados ratificados pelo Brasil não são incorporados de plano pelo direito interno, dependendo necessariamente de legislação para sua implementação, ao contrário do que se dá com a incorporação automática. Enfatiza-se que o ato legislativo que edita a lei como norma interna é um ato distinto do ato de ratificação do tratado internacional.

Fundamental é a contribuição de Flávia Piovesan acerca das questões que envolvem a incorporação automática e a incorporação legislativa do Direito Internacional:

Em suma, em face da sistemática da incorporação automática, o Estado reconhece a plena vigência do Direito Internacional na ordem interna, mediante uma cláusula geral de recepção automática plena. Com o ato da ratificação, a regra internacional passa a vigorar de imediato tanto na ordem jurídica internacional, como na ordem jurídica interna, sem a necessidade de uma norma de direito nacional que a integre ao sistema jurídico. Esta sistemática da incorporação automática reflete a concepção monista, pela qual o Direito Internacional e o Direito Interno compõem uma mesma unidade, uma única ordem jurídica, inexistindo qualquer limite entre a ordem jurídica internacional e a ordem interna. Por sua vez, na sistemática de incorporação legislativa, o Estado recusa a vigência imediata do Direito Internacional na ordem interna. Por isso, para que o conteúdo de uma norma internacional vigore na ordem interna, faz-se necessária a sua reprodução ou transformação por uma fonte interna. Neste sistema, o Direito Internacional e o Direito Interno são duas ordens jurídicas distintas, pelo que aquele só vigorará na ordem interna se e na medida em cada norma internacional for transformada em Direito Interno. Esta sistemática de incorporação não automática reflete a concepção dualista, pela qual há duas ordens jurídicas diversas, independentes e autônomas – a ordem nacional e a ordem internacional – que não apresentam qualquer contato e nem mesmo qualquer interferência [96].

Pode se concluir, assim, que o Direito brasileiro optou por um sistema misto, combinando regimes jurídicos diversos, que aplica aos tratados internacionais de proteção dos direitos humanos a sistemática de incorporação automática, e aos tratados tradicionais, a sistemática de incorporação legislativa, uma vez que exige um ato com força de lei, um decreto expedido pelo Executivo, para tornar obrigatório o tratado internacional no ordenamento interno. Portanto, infere-se que os tratados internacionais de proteção dos direitos humanos possuem hierarquia constitucional e aplicação imediata, consoante o artigo 5º, parágrafos 1º e 2º, da Constituição Brasileira, enquanto que os tratados tradicionais apresentam hierarquia infra-constitucional e aplicação não-imediata, nos termos do artigo 102, III, "b" [97] do referido diploma e da inexistência de norma legal que garanta a aplicação imediata.

A adoção da sistemática de incorporação automática em relação aos tratados internacionais de direitos humanos demonstra uma tendência das Constituições contemporâneas, tais como: a Constituição Portuguesa, a Lei Fundamental da República Federal da Alemanha, a Constituição espanhola, a Constituição holandesa e, ainda, o direito francês e o direito suíço.

3.4.2 O Impacto Jurídico do Direito Internacional dos Direitos Humanos no ordenamento brasileiro

Em relação ao impacto jurídico dos tratados internacionais de direitos humanos no Direito interno brasileiro, levando-se em conta a hierarquia constitucional desses tratados, pode-se visualizar três situações em que o direito enunciado no tratado: a) coincide com o direito assegurado na Constituição, reproduzindo-o; b) integra e complementa a gama de direitos previstos na Constituição; ou c) contraria disposição do ordenamento interno.

Está comprovado que a Constituição Brasileira contém inúmeros dispositivos que reproduzem fielmente as normas constantes dos tratados internacionais de direitos humanos, conforme se depreende do princípio de que "todos são iguais perante a lei", consagrado no artigo 5º da Carta de 1988, que também está previsto no art. VII da Declaração Universal [98], no art. 26 do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos [99] e no art. 24 da Convenção Americana [100]. Outro exemplo é o princípio da inocência presumida constante do artigo 5º, LVII [101], da Constituição Federal, que teve inspiração no Direito Internacional dos Direitos Humanos, nos termos do art. XI da Declaração Universal [102], art. 14 do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos [103] e artigo 8º da Convenção Americana [104].

A reprodução de normas de tratados internacionais de direitos humanos na ordem jurídica brasileira reflete, além do fato do legislador nacional buscar orientação e inspiração neste instrumental, a preocupação do legislador em ajustar o Direito interno, com consonância, às obrigações internacionalmente contraídas pelo Brasil. Neste contexto, os tratados internacionais de direitos humanos reforçam o valor jurídico de direitos constitucionalmente previstos, de modo que uma possível violação do direito acarretará responsabilização nacional e internacional.

Outro importante impacto jurídico decorrente da incorporação do Direito Internacional dos Direitos Humanos pelo ordenamento interno constitui-se na ampliação da gama de direitos nacionalmente assegurados. De fato, os tratados internacionais de direitos humanos reforçam a Carta de direitos prevista constitucionalmente, inovando-a e completando-a com a inserção de novos direitos.

Há inúmeros direitos elencados nos instrumentos internacionais ratificados pelo Brasil que, embora não previstos expressamente no Direito interno, passam a se incorporar à ordem jurídica interna brasileira, tais como: o direito das minorias étnicas, religiosas ou lingüísticas de ter sua própria vida cultural, professar e praticar sua própria religião e usar sua própria língua, conforme disposição do artigo 27 do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos [105] e do artigo 30 da Convenção sobre os Direitos da Criança [106]; o direito de não ser submetido a experiências médicas ou científicas sem consentimento do próprio indivíduo, nos termos do artigo 7º do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos [107]; vedação da utilização de meios destinados a obstar a comunicação e a circulação de idéias e opiniões, segundo o artigo 13 da Convenção Americana [108]; possibilidade de adoção pelos Estados de medidas temporárias e especiais que visem acelerar a igualdade de fato entre homens e mulheres, nos termos do artigo 4º da Convenção sobre a Eliminação de todas as formas de Discriminação contra as Mulheres [109], dentre tantos outros.

Constata-se, assim, a influência inovadora e expansiva do Direito Internacional dos Direitos Humanos sobre o universo dos direitos constitucionalmente assegurados, uma vez que os instrumentos internacionais de direitos humanos podem integrar e complementar dispositivos normativos do ordenamento interno, permitindo o reforço de direitos nacionalmente previstos.

A terceira situação resultante do impacto jurídico dos tratados internacionais de direitos humanos no Direito interno brasileiro diz com a hipótese de um eventual conflito entre o Direito Internacional dos Direitos Humanos e o Direito nacional. A solução para a situação em tela orienta-se para a escolha da norma mais favorável à vítima, ou seja, prevalecerá a norma mais benéfica ao indivíduo, titular do direito. Contudo, não há porque se reportar à questão da primazia do direito internacional ou do direito interno; importa, aqui, a primazia da norma que melhor proteja os direitos consagrados da pessoa, seja esta norma de direito internacional ou de direito interno. A primazia é, sobretudo, da pessoa humana.

Nesse cenário, os direitos internacionais constantes dos tratados de direitos humanos apenas vêm a aprimorar e fortalecer, jamais restringir ou enfraquecer, o grau de proteção dos direitos consagrados pela ordem normativa constitucional. Portanto, em caso de conflito entre o Direito Internacional dos Direitos Humanos e o Direito interno, propugna-se pela prevalência da norma mais favorável à vítima. Reitera-se que a escolha da norma mais benéfica ao indivíduo cabe fundamentalmente às cortes nacionais e a outros órgãos aplicadores do direito, no sentido de assegurar a melhor proteção possível ao ser humano.


4 A relação entre a proteção dos direitos humanos e o princípio da dignidade da pessoa humana

4.1 Dignidade da pessoa humana: alcance e significação

Partindo-se da premissa de que o ser humano é, ao mesmo tempo e integralmente, um ser social e individual, matéria e espírito, animal e racional, enfim, complexo, reconhece-se que a filosofia democrática coaduna-se com essa complexidade do ser humano. Por fundamentar-se na dignidade da pessoa humana, a filosofia democrática é a única capaz de inspirar um regime político verdadeiramente equilibrado, que concilie a dimensão individual com a dimensão social do ser humano, seus anseios de iniciativa criadora e as exigências sociais de Justiça, seus direitos de liberdade com os princípios da ordem da autoridade.

Atualmente, o próprio conceito de democracia é indissociável do conceito de direitos da pessoa humana, pois não há constituição democrática que não pressuponha a existência de indivíduos singulares, detentores de direitos enquanto tais. Esses direitos são invioláveis, demonstrando, ainda que axiologicamente, a superioridade do ser humano em relação à sociedade da qual é integrante. Surge, nesse cenário, o dogma da dignidade da pessoa humana como valor eminente, isto é, em virtude de sua imensa dignidade, a pessoa humana é titular de um conjunto de direitos fundamentais anteriores e superiores ao próprio Estado [110].

Em relação ao significado e ao conteúdo do princípio da dignidade da pessoa humana, há que se dizer que não parece ser possível traçar uma definição clara e absoluta do que seja efetivamente esta dignidade, pois trata-se de conceito de contornos vagos e imprecisos. Ainda assim, sabe-se que a dignidade é algo real, facilmente identificada em situações em que sofre agressão. Neste contexto, atenta-se para a circunstância de que o princípio da dignidade da pessoa humana constitui uma categoria axiológica aberta, que abriga uma diversidade de valores presentes nas sociedades democráticas contemporâneas.

A dignidade, como um valor espiritual e moral inerente à pessoa, manifesta-se especificamente na autodeterminação consciente e responsável da própria vida, portando em si a pretensão ao respeito por parte das demais pessoas e constituindo-se um mínimo invulnerável que todo estatuto jurídico deve assegurar, de modo que, somente excepcionalmente, possam ser feitas limitações ao exercício dos direitos fundamentais, mas sempre sem menosprezar a necessária estima que merecem todas as pessoas enquanto seres humanos.

Salienta-se que a dignidade, como qualidade inerente à pessoa humana, é algo que simplesmente existe, sendo irrenunciável e inalienável, na medida em que constitui elemento que qualifica o ser humano e dele não pode ser retirado. Trata-se de valor próprio, da natureza do ser humano, que independe das circunstâncias concretas e que é intrínseca a toda e qualquer pessoa humana, independente de sua condição. Tal entendimento está em consonância com o artigo 1º da Declaração Universal da ONU [111], uma vez que esta reconhece a dignidade como inerente a todos os membros da família humana e como fundamento da liberdade, da justiça e da paz no mundo.

Na visão de Dalmo de Abreu Dallari,

Existe uma dignidade inerente à condição humana, e a preservação dessa dignidade faz parte dos direitos humanos. O respeito pela dignidade da pessoa humana deve existir sempre, em todos os lugares e de maneira igual para todos. O crescimento econômico e o progresso material de um povo têm valor negativo se forem conseguidos à custa de ofensas à dignidade de seres humanos [112].

Nesse cenário, é conveniente, a título de ilustração, a decisão proferida pelo Tribunal Constitucional da Espanha, em 1985, no sentido de que "a dignidade é um valor espiritual e moral inerente à pessoa, que se manifesta singularmente na autodeterminação consciente e responsável da própria vida e que leva consigo a pretensão ao respeito por parte dos demais" [113].

À luz do que dispõe a Declaração Universal da ONU e da doutrina majoritária, o entendimento acerca do elemento nuclear da dignidade da pessoa humana reside primordialmente na autonomia e no direito de autodeterminação de cada pessoa. De outra sorte, há posicionamentos que se inclinam em considerar que a dignidade da pessoa humana não deve ser considerada exclusivamente como algo inerente à natureza do homem, na medida em que a dignidade apresenta também um sentido cultural, sendo fruto do trabalho de diversas gerações e da humanidade em seu todo.

No que respeita à clarificação do sentido da dignidade da pessoa humana, é necessário ponderar que apenas a dignidade de determinada pessoa, tomada em sua concretude, é passível de ser desrespeitada, inexistindo atentados contra a dignidade da pessoa humana em abstrato. Logo, não é lícito confundir as noções de dignidade da pessoa humana e dignidade humana, uma vez que esta diz com a humanidade, de modo genérico. Todavia, pode-se falar numa dimensão comunitária ou social da dignidade da pessoa humana, uma vez que todos são iguais em dignidade e como tais convivem em determinada comunidade.

Ante o exposto, verifica-se que não é tarefa fácil delimitar o conteúdo da dignidade da pessoa humana, salvo a análise no caso concreto. Em citação do Professor Ingo Wolfgang Sarlet [114], é válido referenciar a fórmula desenvolvida por G. Dürig, constitucionalista alemão, que afirma:

(...) a dignidade da pessoa poderia ser considerada atingida sempre que a pessoa concreta (o indivíduo) fosse rebaixada a objeto, a mero instrumento, tratada como uma coisa, em outras palavras, na descaracterização da pessoa humana como sujeito de direitos.

Desse modo, é possível verificar a existência de uma efetiva agressão contra a dignidade da pessoa humana atendo-se ao caso concreto.

Como bem assevera Cármen Lúcia Antunes Rocha, a dignidade da pessoa humana é um conceito diverso dos demais conceitos conhecidos no âmbito jurídico. A autora afirma que

a dignidade distingue-se de outros elementos conceituais de que compõem o Direito (...) a dignidade não é partida, partilhada ou compartilhada em seu conceito e em sua experimentação. Mostra-se no olhar que o homem volta a si mesmo, no trato que a si confere e no cuidado que ao outro despende [115].

Aduz ainda que:

Dignidade é o pressuposto da idéia de justiça humana, porque ela é que dita a condição superior do homem como ser de razão e sentimento. Por isso é que a dignidade humana independe de merecimento pessoal ou social. Não se há de ser mister ter de fazer por merecê-la, pois ela é inerente à vida e, nessa contingência, é um direito pré-estatal [116].

Há que se consignar que a dignidade da pessoa humana envolve necessariamente o respeito e a proteção da integridade física e corporal do indivíduo, do que decorrem, por exemplo, a proibição da pena de morte, da tortura, das penas de natureza corporal, da utilização da pessoa humana como experimento científico, limitações aos meios de prova (utilização de detector de mentiras), normas relativas a transplantes, etc. Outra dimensão associada ao valor da dignidade da pessoa humana diz com a garantia de condições justas e adequadas de vida para o indivíduo e sua família, dando-se ênfase especial aos direitos sociais ao trabalho e à seguridade social.

Outrossim, como pressuposto fundamental para o respeito da dignidade da pessoa humana está a garantia da isonomia de todos os seres humanos, que não podem sofrer tratamento discriminatório e arbitrário, razão pela qual são intoleráveis a escravidão, a discriminação racial, perseguições de cunho religioso, etc. Reitera-se também a garantia da identidade pessoal do indivíduo, tomada como autonomia e integridade psíquica e intelectual, como uma das principais expressões do princípio da dignidade da pessoa humana, que concretiza, dentre inúmeros aspectos, a liberdade de consciência, de pensamento, de culto, a proteção da intimidade, da honra e de tudo que se associe ao livre desenvolvimento da personalidade, bem como ao direito de autodeterminação sobre os assuntos concernentes à sua esfera privada.

Constata-se, após essas considerações, que, onde não houver respeito pela vida e pela integridade física do ser humano, onde as condições mínimas para uma existência digna não forem asseguradas, onde a intimidade e a identidade do indivíduo sofrerem ingerências indevidas, onde sua igualdade em relação aos demais não estiver assegurada, bem como onde não houver limitação do poder, não haverá espaço para a dignidade da pessoa humana, e esta revelar-se-á mero objeto de arbítrio e injustiças. Essa idéia de "homem-objeto" configura justamente a antítese da noção da dignidade da pessoa humana [117].

Jorge Miranda, partindo do fato de que os homens são dotados de razão e de consciência, leciona que a caracterização da dignidade respeita algumas diretrizes básicas, a saber:

a) A dignidade da pessoa humana reporta-se a todas e a cada uma das pessoas e é a dignidade da pessoa individual e concreta; b) A dignidade da pessoa humana refere-se à pessoa desde a concepção, e não só desde o nascimento; c) A dignidade é da pessoa enquanto homem e enquanto mulher; d) Cada pessoa vive em relação comunitária, o que implica o reconhecimento por cada pessoa da igual dignidade das demais pessoas; e) Cada pessoa vive em relação comunitária, mas a dignidade que possui é dela mesma, e não da situação em si; f) O primado da pessoa é o do ser, não o do ter; a liberdade prevalece sobre a propriedade; g) Só a dignidade justifica a procura da qualidade de vida; h) A protecção da dignidade das pessoas está para além da cidadania portuguesa e postula uma visão universalista da atribuição de direitos; i) A dignidade da pessoa pressupõe a autonomia vital da pessoa, a sua autodeterminação relativamente ao Estado, às demais entidades públicas e às outras pessoas [118].

Por fim, como proposta de conceituação jurídica da dignidade da pessoa humana, o Professor Ingo Wolfgang Sarlet dispõe que se trata da

qualidade intrínseca e distintiva de cada ser humano que o faz merecedor do mesmo respeito e consideração por parte do Estado e da comunidade, implicando, neste sentido, um complexo de direitos e deveres fundamentais que assegurem a pessoa tanto contra todo e qualquer ato de cunho degradante e desumano, como venham a lhe garantir as condições existenciais mínimas para uma vida saudável, além de propiciar e promover sua participação ativa e co-responsável nos destinos da própria existência e da vida em comunhão com os demais seres humanos [119].

4.2 O princípio da dignidade da pessoa humana e os direitos fundamentais

Partindo-se do pressuposto de que os direitos fundamentais guardam estreita vinculação com os princípios constitucionais, pode-se afirmar que o direito à vida e os direitos de liberdade e de igualdade correspondem diretamente às exigências mais elementares da dignidade da pessoa humana. Igualmente, os direitos políticos, como o sufrágio, o voto e a possibilidade de concorrer a cargos públicos eletivos, são manifestações do princípio democrático e da soberania popular. Da mesma forma, grande parte dos direitos sociais (saúde, educação, etc.) radica tanto no princípio da dignidade da pessoa humana, quanto nos princípios que consagram o Estado Social de Direito.

É possível se identificar os direitos fundamentais por seu conteúdo comum baseado no princípio da dignidade da pessoa humana, que é concretizado pelo reconhecimento e positivação de direitos e garantias fundamentais. Nesse sentido, o princípio da dignidade da pessoa humana, expressamente enunciado pelo artigo 1º, inciso III, da Carta de 1988, além de constituir o valor unificador de todos os direitos fundamentais, que, na verdade, são uma concretização daquele princípio, também cumpre função legitimatória do reconhecimento de direitos fundamentais implícitos, decorrentes ou previstos em tratados internacionais.

Em relação ao íntimo entrelaçamento entre o princípio fundamental da dignidade da pessoa humana e os direitos e garantias fundamentais, salienta-se que o princípio da dignidade da pessoa humana é considerado o fundamento de todo o sistema dos direitos fundamentais, dando-lhes unidade e coerência, no sentido de que estes constituem exigências, concretizações e desdobramentos da dignidade da pessoa humana e assim devem ser interpretados. Relevantes também as noções de liberdade e de igualdade, indissociáveis da dignidade de cada pessoa humana, justificando o reconhecimento de direitos fundamentais estreitamente vinculados à proteção das liberdades pessoais e da isonomia.

A vinculação entre o princípio da dignidade da pessoa humana e os direitos fundamentais abrange outros direitos fundamentais, ainda que alheios ao Título II da Carta de 1988. Sob este aspecto, outros princípios fundamentais podem ser considerados como exigências da dignidade do indivíduo, tais como o princípio democrático (artigo 1º, caput), o da soberania popular (artigo 1º, parágrafo único) [120], o do pluralismo político (artigo 1º, inciso V) [121], bem como o princípio do Estado de Direito (artigo 1º, caput), por sua vez concretizados em outras normas constitucionais. No âmbito dos direitos e garantias fundamentais, traz-se a título de ilustração os exemplos do direito de sufrágio, de voto, o direito de portar a nacionalidade brasileira, de ser titular de direitos políticos, a inafastabilidade do controle judiciário, as garantias processuais, etc.

Nesse contexto, também correspondem a explicitações, em maior ou menor graus, do princípio da dignidade da pessoa humana, os princípio ligados aos valores sociais do trabalho e da iniciativa privada (artigo 1º, inciso IV) [122] e os objetivos fundamentais da construção de uma sociedade justa, livre e solidária (artigo 3º, inciso I) [123] e da erradicação da pobreza e da marginalização (artigo 3º, inciso III) [124], que consagram a concepção do Estado social e a garantia de uma vida digna, com liberdade e igualdade reais.

4.3 O PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E A ORDEM CONSTITUCIONAL

É dever do Estado, que tem por objetivo a realização do bem comum, o respeito e a proteção do bem comum. O direito surge, assim, como um instrumento de auxílio para a consecução deste fim. A exemplo do Estado, o direito também é uma decorrência da natureza humana e existe para o ser humano; a pessoa constitui o princípio e o fim do direito.

A pessoa humana adquire personalidade jurídica, sendo indispensável firmar-lhe direitos fundamentais para o pleno desenvolvimento de sua personalidade, seja na esfera do direito público ou do direito privado. É nesse sentido que a maioria dos ordenamentos e, sobretudo, aqueles dos Estados que almejam concretizar a democracia, preocupam-se com a dignidade da pessoa humana e sua proteção.

Torna-se indispensável a compreensão prévia do significado e do conteúdo do princípio da dignidade da pessoa humana, bem como de sua eficácia jurídica, à luz do ordenamento constitucional brasileiro. É sabido que a Constituição de 1988 foi a primeira na história das Constituições Brasileiras a prever um título destinado aos princípios fundamentais, tidos como normas embasadoras e informativas de toda a ordem constitucional, inclusive dos direitos fundamentais, que também integram o chamado núcleo essencial da Constituição material.

Outra relevante inovação, no âmbito do direito positivo, foi a consagração do princípio fundamental da dignidade da pessoa humana. Acrescente-se que o valor da dignidade da pessoa humana transita em vários planos da Carta de 1988, como na ordem econômica, ao assegurar a todos uma existência digna (artigo 170, caput) [125], na ordem social, fundando o planejamento familiar no princípios da pessoa humana e da paternidade responsável (artigo 226, caput) [126], além de assegurar à criança e ao adolescente o direito à dignidade (artigo 227, caput). [127]

Interessa consignar que a positivação do princípio da dignidade da pessoa humana é relativamente recente, passando a constar expressamente das Constituições, de modo especial após ter sido consagrado pela Declaração Universal da ONU de 1948. Ainda assim, muitos Estados integrantes da comunidade internacional não chegaram a inserir o princípio da dignidade da pessoa humana em seus textos constitucionais. Para exemplificar algumas Constituições que consagraram expressa ou indiretamente o princípio da dignidade da pessoa humana, destacam-se os seguintes países: Alemanha, Espanha, Grécia, Portugal, Irlanda, Paraguai, Cuba, Venezuela, Peru, Guatemala, dentre outros.

De suma importância é a contribuição do Professor Ingo Wolfgang Sarlet acerca do estudo do princípio da dignidade da pessoa humana ao tecer:

Com o reconhecimento expresso, no título dos princípios fundamentais, da dignidade da pessoa humana como um dos fundamentos do nosso Estado democrático (e social) de Direito (art. 1º, inc. III, da CF), o Constituinte de 1987/88, além de ter tomado uma decisão fundamental a respeito do sentido, da finalidade e da justificação do exercício do poder estatal e do próprio Estado, reconheceu expressamente que é o Estado que existe em função da pessoa humana, e não o contrário, já que o homem constitui a finalidade precípua, e não meio da atividade estatal [128].

O princípio fundamental consagrado pela Carta de 1988 da dignidade da pessoa humana apresenta-se em uma dupla concepção. Primeiramente, prevê um direito individual protetivo, seja em relação ao próprio Estado, seja em relação aos demais indivíduos. Em segundo lugar, estabelece verdadeiro dever fundamental de tratamento igualitário dos próprios semelhantes. Esse dever configura-se pela exigência do indivíduo respeitar a dignidade de seu semelhante tal qual a Constituição Federal exige que lhe respeitem a própria. Daí, inferir-se que a dignidade da pessoa humana é ao mesmo tempo limite e tarefa dos poderes estatais.

De acordo com Alexandre de Moraes, a concepção de dever fundamental resume-se a três princípios do direito romano: honestere vivere (viver honestamente), alterum non laedere (não prejudique ninguém) e suum cuique tribuere (dê a cada um o que lhe é devido) [129].

Em relação à posição ocupada pelo princípio da dignidade da pessoa humana na Lei Maior Brasileira, há que se referir que o Constituinte de 1987/88 preferiu não incluir a dignidade da pessoa humana no rol dos direitos e garantias fundamentais, delegando-lhe o tratamento, até então inédito, de princípio fundamental do ordenamento constitucional, nos termos do artigo 1º, inciso III. Destarte, do princípio fundamental da dignidade da pessoa humana podem ser deduzidas posições jurídico-fundamentais não-expressas, inclusive de natureza subjetiva, o que, aliás, foi considerado em relação aos direitos decorrentes do regime e dos princípios, bem como os constantes em tratados internacionais.

No mesmo contexto, não se pode olvidar que os direitos fundamentais são concretizações das exigências do princípio da dignidade da pessoa humana. A qualificação da dignidade da pessoa humana como princípio fundamental, além de conter uma declaração de conteúdo ético e moral, constitui norma jurídico-positiva, com status constitucional, dotada de eficácia. Portanto a dignidade da pessoa humana, na condição de princípio fundamental, constitui valor-guia não apenas dos direitos fundamentais, mas de toda a ordem constitucional, razão pela qual se justifica plenamente sua caracterização como princípio constitucional de maior hierarquia axiológica-valorativa.

Partindo-se da premissa de que todas as normas constitucionais, inclusive as que expressam princípios, são dotadas de alguma eficácia jurídica, pode-se constatar que toda a atividade estatal e todos os órgãos públicos se encontram vinculados pelo princípio da dignidade da pessoa humana, impondo-se, assim, um dever de respeito e proteção, que se exprime tanto na obrigação por parte do Estado de se abster de ingerências na esfera individual que sejam contrárias à dignidade pessoal, quanto no dever de protegê-la contra agressões alheias.

Nesse sentido, o princípio da dignidade da pessoa humana identifica-se não apenas com o dever de abstenção e respeito, mas também em relação a condutas positivas tendentes a efetivar e proteger a dignidade do indivíduo. Com efeito, sustenta-se que a concretização do programa normativo do princípio da dignidade da pessoa humana incumbe aos órgãos estatais, especialmente ao legislador, encarregado de edificar uma ordem jurídica que corresponda às exigências do princípio.

Por outro lado, enfatiza-se a função integradora e hermenêutica do princípio, uma vez que este configura um parâmetro para a aplicação, interpretação e integração de todo o ordenamento jurídico, imprimindo à Carta de 1988 a condição de "Constituição da pessoa humana por excelência". [130] Assim sendo, afirma-se que o exercício do poder e a ordem estatal em seu todo serão legítimos caso observarem o respeito e a proteção da dignidade da pessoa humana, verdadeiro pressuposto da democracia.

Tem-se que o princípio da dignidade da pessoa humana constitui o reduto intangível de cada indivíduo, sendo, portanto, a última fronteira contra quaisquer ingerências externas; entretanto, isso não significa a impossibilidade de se estabelecer restrições aos direitos e garantias fundamentais, mas, sim, que as restrições efetivadas não ultrapassem o limite intangível imposto pela dignidade da pessoa humana.

A positivação da dignidade da pessoa humana torna cristalina sua condição de valor jurídico, e a sua constitucionalização na forma de norma, de princípio, expresso no primeiro artigo da Constituição Federal, atrelado diretamente à definição mesma do Estado do Brasil, um Estado Democrático de Direito, simplesmente corrobora que a pessoa humana é o fim maior do direito e do Estado.

Resta demonstrado, por sua vez, que tudo que consta no texto constitucional pode ser reconduzido, ainda que de modo indireto, ao valor da dignidade da pessoa humana. Reitera-se que o princípio da dignidade da pessoa humana pode, com efeito, ser tido como critério basilar, mas não exclusivo, para a construção de um conceito material de direitos fundamentais.

Diante do exposto, é possível concluir-se que a dignidade da pessoa humana é valor jurídico, fundamento e fim do Estado brasileiro, princípio constitucional e, como tal, norma jurídica. Trata-se de um princípio absoluto, porém aberto em seu conteúdo, que tem função de legitimação material da Constituição, serve de parâmetro de constitucionalidade das demais normas do ordenamento, possui superioridade interpretativa e projeção normativa e que é norma de conduta que vincula tanto os poderes públicos como os cidadãos [131].

4.4 A influência da proteção dos direitos humanos na construção da dignidade da pessoa humana

A noção de direitos humanos implica que se trata de direitos atribuíveis a cada ser humano enquanto tal, que esses direitos são vinculados à qualidade de ser humano, não fazendo distinção entre eles e não se estendendo a mais além. A pessoa possui uma dignidade que lhe é própria e merece respeito enquanto sujeito moral, livre e responsável, e cabe ao direito protegê-la.

Nesse sentido, leciona Chaïm Perelman:

Com efeito, se é o respeito pela dignidade humana a condição para uma concepção jurídica dos direitos humanos, se trata de garantir esse respeito de modo que se ultrapasse o campo do que é efetivamente protegido, cumpre admitir, como corolário, a existência de um sistema de direito com um poder de coação. Nesse sistema, o respeito pelos direitos humanos imporá, a um só tempo, a cada ser humano – tanto no que concerne a si próprio quanto no que concerne aos outros homens – e ao poder incumbido de proteger tais direitos a obrigação de respeitar a dignidade da pessoa. Com efeito, corre-se o risco, se não se impuser esse respeito ao próprio poder, de este, a pretexto de proteger os direitos humanos, tornar-se tirânico e arbitrário. Para evitar esse arbítrio, é, portanto, indispensável limitar os poderes de toda autoridade incumbida de proteger o respeito pela dignidade das pessoas, o que supõe um Estado de direito e a independência do poder judiciário. Uma doutrina dos direitos humanos que ultrapasse o estádio moral ou religioso é, pois, correlativa de um Estado de direito [132].

Levando-se em conta que o respeito pela dignidade da pessoa fundamenta uma doutrina jurídica dos direitos humanos, esta pode igualmente, ser considerada uma doutrina das obrigações humanas, pois cada indivíduo tem a obrigação de respeitar o outro e de se fazer respeitar. Assim também o Estado, incumbido de proteger esses direitos e de fazer que se respeitem as obrigações correlativas, além de ser obrigado a se abster de ofender esses direitos, deve, outrossim, propugnar pela manutenção da ordem. Ele também tem a obrigação de criar as condições favoráveis ao respeito à pessoa por parte de todos os que dependem de sua soberania.

O respeito pela dignidade da pessoa é tido como um princípio geral de direito comum a todos os povos civilizados. Entretanto, esse acordo geral apenas diz respeito a noções abstratas, cujo caráter vago e impreciso, aparecerá imediatamente quando se tratar de passar do acordo sobre o princípio para as aplicações particulares. Com efeito, como os diferentes direitos humanos não estão hierarquizados nas declarações que os enunciam, os textos não apresentam soluções para os conflitos que podem surgir, tanto entre os diversos direitos humanos, como entre estes e os direitos do Estado.

Diante do exposto, compreende-se que a aplicação de textos atinentes aos direitos humanos só pode ser delegada a um tribunal que detenha a confiança dos jurisdicionados. Daí o caráter essencial, ao lado de diversas declarações universais que só podem ter uma importância programática, de pactos regionais que não só proclamam os direitos que devem ser respeitados, mas estabelecem cortes de justiça que propugnem pela aplicação de uma ideologia relativamente uniforme e comum aos Estados signatários.

Ressalta-se que, diante das divergências sobre a própria idéia da pessoa humana e sobre as obrigações impostas pelo respeito à sua dignidade, pode parecer utópico, a até mesmo perigoso, acreditar-se que exista uma verdade absoluta nessa questão, uma vez que essa tese autorizaria os detentores do poder a impor suas ideologias, suprimindo, por conseguinte, toda opinião contrária. Todavia, se, no plano filosófico puramente teórico, divergências são normais e inevitáveis, impõe-se, para a salvaguarda prática dos direitos humanos, que não somente textos os proclamem, mas que instituições, normas procedimentais e homens, animados pela tradição e pela cultura, sejam incumbidos de aplicá-los e protegê-los.

No que tange aos direitos humanos, não há critério objetivo que permita definir a fronteira de equilíbrio entre os direitos de uns e de outros. A tradicional distinção entre as concepções liberal e socialista dos direitos humanos, correlativa de uma obrigação passiva que é abster-se, e de obrigações ativas, quais sejam as de propiciar meios efetivos que favoreçam o desenvolvimento da pessoa, não é uma distinção de natureza, e sim de grau.

De fato, o mais elementar dos direitos humanos, o direito à vida, por si só implica a constituição de um aparato que proteja a ordem pública, e, portanto, gerando para o Estado a obrigação de se dotar de meios que lhe permitam cumprir seu papel de guardião. Isso acarreta ao Estado um aumento de encargos e, portanto, as obrigações impostas pelo Estado a todos os que dependem de sua soberania. Aumentando dessa forma o papel e o poder do Estado, aumenta-se consideravelmente o risco de abuso e se favorece a proliferação de uma burocracia, tanto menos controlável por invadir mais setores.

Para se combater o perigo que o Estado moderno pode causar a liberdade, Chaïm Perelman defende uma descentralização crescente do poder [133], a fim de evitar os abusos de um Estado tentacular. Nesse cenário, para combater a arbitrariedade, é indispensável dar preeminência a um poder judiciário independente que, zelando por impedir os descaminhos do poder, poderá fazer uma interpretação extensiva ao princípio da igualdade perante a lei, impedindo-se, assim, qualquer discriminação injustificada.

O respeito ao princípio da igualdade, por todos os detentores do poder, teria como efeito impedir uma limitação arbitrária da liberdade de uns em proveito dos outros. Ao aplicar o princípio da justiça formal que exige o tratamento igual de situações essencialmente semelhantes, os tribunais superiores, na medida em que controlam a constitucionalidade das leis, zelarão por que as distinções estabelecidas em lei não sejam desarrazoadas, e sim justificadas pelos objetivos perseguidos.

Ainda que não exista critério objetivo e impessoal para determinar com precisão o limite entre o que é razoável e o que não o é, este limite não é, todavia, puramente subjetivo, uma vez que está atrelado às concepções e às reações do meio. Por isso, somente numa comunidade suficientemente homogênea, em que exista um consenso suficiente sobre o que é razoável ou desarrazoado, é que pode funcionar de forma satisfatória um sistema de direito democrático.

Daí inferir-se que, na ausência de um consenso sobre as questões essenciais apresentadas à comunidade, o sistema de direito e seus órgãos respectivos carecerão da autoridade necessária para se impor de outro modo que não seja por meio da força. Por isso, parece utópico a existência de uma ordem jurídica internacional, pois não há comunidade internacional suficientemente homogênea do ponto de vista cultural e moral.

É por essa razão que um sistema de direito positivo, que proteja os direitos do homem no plano internacional, impor-se-á, inicialmente, na esfera regional entre parceiros que estão de acordo sobre o essencial nessa área. Tal visão conduz, na melhor das hipóteses, a uma descentralização entre unidades de maior ou menor homogeneidade, acompanhada, num âmbito federal, de um pluralismo e de uma tolerância mútua entre sistemas políticos com ideologia diferente. É essa conclusão que se impõe na construção de um sistema de direito internacional legítimo, ou seja, que fundamentaria sua autoridade sem recorrer ao uso da força.

A determinação e a salvaguarda dos direitos do homem supõe um sistema de direito positivo, com suas normas e seus juízes, eis que a proliferação de regras gera crescente e constante conflito. A fim de evitá-lo ou dirimi-lo, cumpriria uma legislação complexa para dar precisão e hierarquia aos diversos direitos, redundando, por sua vez, numa intervenção crescente do Estado na esfera privada e na instauração de uma burocracia que desempenhe papel de guia, guardião e árbitro.

Evidentes os numerosos abusos que daí podem decorrer e a necessidade de submeter os poderes legislativo e o executivo ao controle do poder judiciário, que teria de zelar para que o poderes se exerçam no âmbito de um conjunto de valores e de princípios que desfrute um consenso suficiente da comunidade.

Para se alcançar um consenso conforme o descrito é preciso um longo processo educativo, tal como se realiza numa comunidade que apresente, além de um passado comum, valores e aspirações comuns, arraigados numa mesma tradição religiosa ou ideológica. Na medida em que a salvaguarda dos direitos humanos se realiza melhor no seio de uma comunidade nacional, com o poder de autodeterminação, capaz de defender sua autonomia e sua independência, ocorre uma passagem natural da doutrina dos direitos do homem para a doutrina dos direitos das comunidades. Dessa forma, o respeito pela dignidade do homem conduz ao respeito pelas entidades nacionais de que ele faz parte.

A proteção dos direitos humanos, na visão de Chaïm Perelman [134], originou-se da proteção e do respeito pela atividade filosófica, pois esta sempre buscou, por meio da verdade e da razão, a emancipação do pensamento como forma de oposição à autoridade e à tradição impostas pelo poder.

Sob o fundamento da consciência ética coletiva, convicção largamente estabelecida na comunidade, encontra-se a razão para a vigência dos direitos humanos além da organização estatal, uma vez que a dignidade da condição humana exige o respeito a certos bens ou valores em qualquer circunstância [135].

Daí que a Constituição, instrumento do Estado, ao elencar e proteger os direitos fundamentais (individuais, sociais e políticos), transforma-os em direitos do cidadão, e, além disso, ao incorporar os títulos que tratam da ordem econômica e social: põe-se em busca de justiça social. É nesse sentido que se objetiva a construção da civilização da cidadania mundial, com o respeito integral aos direitos humanos, segundo o princípio da solidariedade ética e os ditames da justiça social.

Fundamentais os papéis da publicidade dos casos de violações de direitos humanos e da pressão internacional, quando as violações são submetidas à arena internacional, à medida em que colaboram diretamente para compelir determinado Estado a se justificar, evidenciando uma tendência a alterações na própria prática do Estado relativamente aos direitos humanos e, por conseguinte, proporcionando um significativo avanço no modo pelo qual estes direitos são nacionalmente respeitados e implementados.

Logo, verifica-se que a ação internacional constitui uma importante estratégia para o fortalecimento da sistemática de implementação dos direitos humanos, proporcionando que o Direito Internacional dos Direitos Humanos estimule a redefinição do conceito de cidadania no plano interno. Dessa forma, amplia-se o conceito de cidadania uma vez que prevê não somente os direitos previstos no ordenamento nacional, como também os direitos internacionalmente enunciados.

O relacionamento entre os direitos humanos, de matriz internacional, e os direitos fundamentais constitucionais, que são concretizações positivadas das exigências do princípio da dignidade da pessoa humana, levam à constatação de este princípio converteu-se no coração do patrimônio jurídico-moral da pessoa humana, estampado nos direitos fundamentais acolhidos e assegurados na forma posta no sistema constitucional [136].

Por derradeiro, colaciona-se a importante contribuição de Cármem Lúcia Antunes Rocha a fim de corroborar os argumentos expostos ao longo deste estudo:

De se observar que aquele princípio é conjugado com o da cidadania, o que evita que o individualismo seja tomado de maneira exacerbada, conduzindo a uma condição social na qual se infirmem os interesses e bens de toda a coletividade. A afirmação da cidadania ao lado do princípio da dignidade da pessoa humana impede que se pense o sistema como uma ilusão perigosa no sentido de ser embaraço à liberdade política democrática que há de ser estendida ao todo e não apenas a uma parcela da sociedade. De outra parte, também impõe que os caprichos individuais não segreguem grupos ou pessoas e que os grandes debates não percam a dimensão da humanidade que está em cada um como representação do todo [137].

Contra todas as formas de desumano tratamento, em detrimento do princípio da dignidade da pessoa humana, pela inclusão no direito e pelo direito de todos os homens, é que o milênio que se aproxima volta-se ao humanismo ético procurando a realização do ser humano integral, aquele que integra o homem ao todo e propõe a crença no homem, certo de que o homem supera-se sempre e em todos os sentidos [138].


CONCLUSÃO

É inegável que muito se avançou no domínio da proteção dos direitos humanos, sobretudo na jurisdicionalização destes direitos, por meio do Direito Internacional dos Direitos Humanos. Por certo, muito há que se promover a respeito da concretização da chamada "ratificação universal", e sem reservas, dos tratados de direitos humanos, com o intuito de se assegurar que a universalidade dos direitos humanos prevaleça nos planos conceitual e operacional dos ordenamentos internos.

Busca-se, com este estudo, trazer ao debate a importância da consolidação e da defesa dos direitos humanos, associados ao valor da absoluta prevalência da dignidade humana, com o que se pretende contribuir para o desenvolvimento da ciência jurídica contemporânea e para a construção de uma cultura universal de observância dos direitos humanos, sintonizada com o constante aprimoramento do sistema internacional de proteção destes.

Na esteira dos intensos movimentos constitucionais pós-modernos, o Brasil veio promulgar, em 1988, uma Constituição Federal, de caráter nitidamente intervencionista, garantindo à dignidade da pessoa humana o papel nuclear do fundamento da República e vínculo básico e informador do ordenamento jurídico, com o que se configurou um crescente alinhamento do Estado brasileiro à sistemática internacional de proteção dos direitos humanos.

Assim que, a Constituição Federal de 1988 assegura a incorporação automática dos tratados internacionais de direitos humanos ratificados pelo Brasil, conferindo-lhes aplicação imediata no âmbito nacional. Logo, ao serem ratificados, estes tratados internacionais produzem efeitos de plano e asseguram direitos imediatamente exigíveis no plano do direito interno.

Nessa conformidade, compete ao Poder Judiciário e aos demais Poderes Públicos assegurarem a implementação no âmbito nacional das normas internacionais de proteção dos direitos humanos ratificadas pelo Estado brasileiro. As normas internacionais que consagram direitos e garantias fundamentais são passíveis de vindicação e pronta aplicação ou execução ante o Poder Judiciário, na medida em que são diretamente aplicáveis. Assim, os indivíduos, sujeitos de direitos tanto em nível nacional quanto internacional, tornam-se beneficiários diretos de instrumentos internacionais voltados à proteção dos direitos humanos.

Contudo, cumpre enfatizar a necessidade de se considerar que os direitos humanos constituem exigências imprescindíveis, em relação às quais as reivindicações, ainda que numerosas, devem ser atendidas e preservadas integralmente, observando-se a legítima supremacia do Estado de Direito contra arbitrariedades e injustiças em todos os lugares do mundo.

Esta é a tônica do Programa de Ação adotado em 25 de junho de 1993 pelo Plenário da II Conferência Mundial dos Direitos Humanos, realizada em Viena, Áustria, oportunidade em que se reduziu a importância da discriminação dos direitos em quatro dimensões ou gerações, para se proclamar a alta relevância do princípio global da internacionalização e da universalização dos Direitos Humanos, abraçando-se, com fonte de todos os valores, os direitos civis, sociais, políticos, culturais e econômicos, que se destinam a resguardar e a proteger a pessoa humana.

Daí, se conclui que a proteção dos direitos humanos tem grande influência sobre a consagração do princípio constitucional da dignidade da pessoa humana, segundo os ditames da justiça social, graças à formação de uma consciência de solidariedade ética, voltada à implementação dos direitos de cidadania e à preocupação com a responsabilidade de reduzir as desigualdades que afligem, impiedosamente, pessoas de todos os continentes.

Hodiernamente, é possível vislumbrar que o amplo e efetivo exercício dos direitos humanos de âmbito nacional e internacional contribui para a plena realização dos direitos de cidadania e dos ideais democráticos, gerando maior segurança nas relações sociais. Nesse sentido, pressupõe-se a implementação de mecanismos destinados a assegurar a concretização dos direitos humanos.

Por fim, impõe-se uma releitura do Direito Internacional dos Direitos Humanos e do Direito Constitucional Internacional, levando sempre em conta a emancipação da pessoa humana, fim último do trabalho do jurista.


NOTAS

01 Ingo Wolfgang. A Eficácia dos Direitos Fundamentais. Porto Alegre, Livraria do Advogado, 2001, p. 72.

02. Soares, Guido Fernando Silva. Curso de Direito Internacional Público. V. 1 São Paulo: Atlas S.A., 2002, p.24.

03. COMPARATO, Fábio Konder. A Afirmação Histórica dos Direitos Humanos. 2 ed. São Paulo: Saraiva, 2001, p. 19.

04. COMPARATO, Fábio Konder. Obra Citada. p. 19.

05. COMPARATO, Fábio Konder. Obra Citada. p. 24.

06. Art. 2 - Brasil. Novo Código Civil. Lei nº 10.406, de 10.01.2002. São Paulo: Atlas S.A., 2002.

07. COMPARATO, Fábio Konder. Obra Citada. p. 46.

08. Ibidem. p. 47.

09. Ibidem. p. 47.

10. Art. 1º - Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789.

11. LEAL, Rogério Gesta. Perspectivas Hermenêuticas dos Direitos Humanos e Fundamentais no Brasil. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2000, p. 37.

12. Leal, Rogério Gesta. Obra Citada. p. 38.

13. LAFER, Celso. A reconstrução dos direitos humanos: um diálogo com o pensamento de Hannah Arendt. São Paulo: Companhia das Letras, 1988, p. 118.

14. SARLET, Ingo Wolfgang. Obra Citada. p. 33.

15. LEAL, Rogério Gesta. Obra Citada. p. 54.

16. SARLET, Ingo Wolfgang. Obra Citada. p. 47-48.

17. BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 10 ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2000, p. 516.

18. BONAVIDES, Paulo. Obra Citada. p. 519.

19. Ibidem. p. 522.

20. BONAVIDES, Paulo. Obra Citada. p. 523.

20. SARLET, Ingo Wolfgang. Obra citada. p. 52.

21. BONAVIDES, Paulo. Obra Citada. p. 524.

22. BONAVIDES, Paulo. Obra Citada. p. 525.

23. Bobbio, Norberto. A era dos direitos. Rio de Janeiro: Campus, 1992, p. 30.

24. Trindade, Antônio Augusto Cançado. A Proteção Internacional dos Direitos Humanos: Fundamentos Jurídicos e Instrumentos Básicos. São Paulo: Saraiva, 1991, p. 623.

25. Ibidem. p. 624.

26. Art. 4º A República Federativa do Brasil rege-se nas suas relações internacionais pelos seguintes princípios: (...) II - prevalência dos direitos humanos. BRASIL, Constituição. Brasília: Senado Federal, 1988.

27. Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: (...) III - a dignidade da pessoa humana. BRASIL, Constituição. Brasília: Senado Federal, 1988.

28. Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...) § 2º - Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte. BRASIL, Constituição. Brasília: Senado Federal, 1988.

29. Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...) § 1º - As normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata. BRASIL, Constituição. Brasília: Senado Federal, 1988.

30. MELLO, Celso D. de Albuquerque. Direito Constitucional Internacional. 2. ed rev. Rio de Janeiro: Renovar, 2000, p. 6.

31. Ibidem. p. 36.

32. Galindo, George Rodrigo Bandeira. Tratados Internacionais de Direitos Humanos e Constituição Brasileira. Belo Horizonte: Del Rey, 2002, p. 77.

33. Galindo, George Rodrigo Bandeira. Obra citada, p. 77-78.

34. Art. 38 1º A Corte, cuja função é decidir de acordo com o direito internacional as controvérsias que lhe forem submetidas, aplicará: a) as convenções internacionais, quer gerais, quer especiais, que estabeleçam regras expressamente reconhecidas pelos Estados litigantes; b) o costume internacional, como prova de uma prática geral aceita como sendo o direito; c) os princípios gerais de direito, reconhecidos pelas nações civilizadas; d) sob ressalva da disposição do art. 59, as decisões judiciárias e a doutrina dos juristas mais qualificados das diferentes nações, como meio auxiliar para a determinação das regras de direito. 2º - A presente disposição não prejudicará a faculdade da Corte de decidir uma questão ex aequo et bono, se as partes com isto concordarem. MELLO, Celso D. de Albuquerque. Direito Internacional Público. Tratados e Convenções. 5 ed. Rio de Janeiro: Renovar, 1997. p. 1119.

35. PIOVESAN, Flávia. Direitos Humanos e o Direito Constitucional Internacional. 2 ed. São Paulo: Max Limonad, 2000, p. 134-135.

36. Art. 7º 1º Ficam estabelecidos como órgãos especiais das Nações Unidas: uma Assembléia-Geral, um Conselho de Segurança, um Conselho Econômico e Social, um Conselho de Tutela, uma Corte Internacional de Justiça e um Secretariado. 2º Serão estabelecidos, de acordo com a presente Carta, os órgãos subsidiários considerados de necessidade. MELLO, Celso D. de Albuquerque. Obra Citada. p. 1084

37. PIOVESAN, Flávia. Obra Citada, p. 138.

38. Art. 1º Os propósitos das Nações Unidas são: 1º Manter a paz e a segurança internacionais e, para esse fim: tomar, coletivamente, medidas efetivas para evitar ameaças à paz e reprimir os atos de agressão ou outra qualquer ruptura da paz e chegar, por meios pacíficos e de conformidade com os princípios da justiça e do direito internacional, a um ajuste ou solução das controvérsias ou situações que possam levar a uma perturbação da paz; 2º Desenvolver relações amistosas entre as nações, baseadas no respeito ao princípio de igualdade de direito e de autodeterminação dos povos e tomar outras medidas apropriadas ao fortalecimento da paz universal; 3º Conseguir uma cooperação internacional para resolver os problemas internacionais de caráter econômico, social, cultural ou humanitário e para promover e estimular o respeito aos direitos humanos e às liberdades fundamentais para todos, sem distinção de raça, sexo, língua ou religião; e 4º Ser um centro destinado a harmonizar a ação das nações para a consecução desses objetivos comuns. MELLO, Celso D. de Albuquerque. Obra Citada. p. 1082.

39. Mello, Celso D. de Albuquerque. Obra Citada. p. 319.

40. PIOVESAN, Flávia. Obra Citada. p. 143.

41. SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 16 ed. São Paulo: Malheiros Editores, 1999, p. 169-169.

42. Trindade, Antônio Augusto Cançado Tratado de Direito Internacional dos Direitos Humanos. V. I Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1999, p. 17.

43. Trindade, Antônio Augusto Cançado. Obra Citada. p. 20.

44. Trindade, Antônio Augusto Cançado. Obra Citada. p. 24.

45. PIOVESAN, Flávia. Obra citada. p. 159

46. PIOVESAN, Flávia. Direitos Humanos, Globalização Econômica e Integração Regional. São Paulo: Max Limonad, 2002, p. 163.

47. Art. 29 – 1) Os membros do Comitê serão eleitos em votação secreta dentre uma lista de pessoas que preencham os requisitos previstos no artigo 28 e indicadas, com esse objetivo, pelos Estados-Partes do presente Pacto. 2) Cada Estado-Parte no presente Pacto poderá indicar duas pessoas. Essas pessoas deverão ser nacionais do Estado que as indicou. 3) A mesma pessoa poderá ser indicada mais de uma vez. Mello, Celso D. de Albuquerque. Obra Citada. p. 572.

48. Art. 41 – 1) Com base no presente Artigo, todo Estado Parte do presente Pacto poderá declarar, a qualquer momento, que reconhece a competência do Comitê para receber e examinar as comunicações em que um Estado Parte alegue que outro Estado Parte não vem cumprindo as obrigações que lhe impõe o presente Pacto. As referidas comunicações só serão recebidas examinadas nos termos do presente artigo no caso de serem apresentadas por um Estado Parte que houver feito uma declaração em que reconheça, com relação a si próprio, a competência do Comitê. O Comitê não recebera competência alguma relativa a um Estado Parte que não houver feito uma declaração dessa natureza. As comunicações recebidas em virtude do presente artigo estarão sujeitas ao procedimento que segue: a) se um Estado Parte no presente Pacto considerar que outro Estado Parte não vem cumprindo as disposições do presente Posto poderá, mediante comunicação escrita, levar a questão ao conhecimento desse Estado Parte. Dentro do prazo de três meses, a contar da data do recebimento da comunicação, o Estado destinatário fornecerá ao Estado que enviou a comunicação explicações ou quaisquer outras declarações por escrito que esclareçam a questão, as quais deverão fazer referência, até onde seja possível e pertinente, aos procedimentos nacionais e aos recursos jurídicos adotados, em trâmite ou disponíveis sobre a questão; b) Se, dentro do prazo de seis meses, a contar da data do recebimento da comunicação original pelo Estado destinatário, a questão não estiver dirimida satisfatoriamente para ambos os Estados Partes interessados, tanto um como o outro terão o direito de submetê-la ao Comitê, mediante notificação interessada ao Comitê ou ao outro Estado interessado; c) O Comitê tratará de todas as questão que se lhe submetem em virtude do presente artigo, somente após ter-se assegurado de que todos os recursos jurídicos internos disponíveis tenham sido utilizados e esgotados, em conformidade com os princípios do Direito Internacional geralmente reconhecidos. Não se aplicará essa regra quando a aplicação dos mencionados recursos prolongar-se injustificadamente; d) O Comitê realizará reuniões confidenciais quando estiver examinando as comunicações previstas no presente artigo; e) Sem prejuízo das disposições da alínea c), o Comitê colocará seus bons ofícios à disposição dos Estados Partes interessados, no intuito de alcançar uma solução amistosa para a questão, baseada no respeito aos direitos humanos e liberdades fundamentais reconhecidos no presente Pacto; f) Em todas as questões que se lhe submetam em virtude do presente artigo, o Comitê poderá solicitar aos Estados Partes interessados, a que se faz referência na alínea b), que lhe forneçam quaisquer informações pertinentes; g) os Estados Partes interessados, a que se fez referência na alínea b), terão o direito de fazer-se representar, quando as questões forem examinadas no Comitê, e de apresentar suas observações verbalmente e/ou por escrito; h) O Comitê, dentro dos doze meses seguintes à data do recebimento da notificação mencionada na alínea b), apresentará relatório em que: (i) se houver sido alcançada uma solução nos termos da alínea e), o Comitê restringir-se-á, em seu relatório, a uma breve exposição dos fatos e da solução alcançada; (ii) se não houver sido alcançada solução alguma nos termos da alínea e), o Comitê se restringir-se-á, em seu relatório, a uma breve exposição dos fatos; serão anexados ao relatório, o textos das observações escritas e das atas das observações orais apresentadas pelos Estados Partes interessados. Para cada questão, o relatório será encaminhado aos Estados Partes interessados. 2) As disposições do presente artigo entrarão em vigor a partir do momento em que dez Estados Partes no presente Pacto houverem feito as declarações mencionadas no parágrafo 1º deste artigo. As referidas declarações serão declaradas pelos Estados Partes junto ao Secretário Geral da Organização das Nações Unidas, que enviará cópias das mesmas aos demais Estados Partes. Toda declaração poderá ser retirada, a qualquer momento, mediante notificação endereçada ao Secretário-Geral. Far-se-á essa retirada sem prejuízo do exame de quaisquer questões que constituam objeto de uma comunicação já transmitida nos termos deste artigo; em virtude do presente artigo, não se receberá qualquer nova comunicação de um Estado Parte, quando o Secretário-Geral houver recebido a notificação sobre a retirada da declaração, a menos que o Estado Parte interessado haja feito nova declaração. MELLO, Celso D. de Albuquerque. Obra citada. p. 575-576.

49. Art. 14 - 1. Todas as pessoas são iguais perante os tribunais e as cortes de justiça. Toda pessoa terá o direito de ser ouvida publicamente e com as devidas garantias por um tribunal competente, independente e imparcial, estabelecido por lei, na apuração de qualquer acusação de caráter penal formulada contra ela ou na determinação de seus direitos e obrigações de caráter civil. A imprensa e o público poderão ser excluídos de parte ou de totalidade de um julgamento, quer por motivo de moral pública, de ordem pública ou de segurança nacional em uma sociedade democrática, quer quando o interesse da vida privada das Partes o exija, que na medida em que isso seja estritamente necessário na opinião da justiça, em circunstâncias específicas, nas quais a publicidade venha a prejudicar os interesses da justiça; entretanto, qualquer sentença proferida em matéria penal ou civil deverá tornar-se pública, a menos que o interesse de menores exija procedimento oposto, ou o processo diga respeito a controvérsias matrimoniais ou à tutela de menores. 2. Toda pessoa acusada de um delito terá direito a que se presuma sua inocência enquanto não for legalmente comprovada sua culpa. 3. Toda pessoa acusada de um delito terá direito, em plena igualdade, pelo menos, às seguintes garantias: a) De ser informado, sem demora, numa língua que compreenda e de forma minuciosa, da natureza e dos motivos da acusação contra ela formulada; b) De dispor do tempo e dos meios necessários à preparação de sua defesa e a comunicar-se com defensor de sua escolha; c) De ser julgado sem dilações indevidas; d) De estar presente no julgamento e de defender-se pessoalmente ou por intermédio de defensor de sua escolha; de ser informado, caso não tenha defensor, do direito que lhe assiste de tê-lo sempre que o interesse da justiça assim exija, de ter um defensor designado ex officio gratuitamente, se não tiver meios para renumerá-lo; e) De interrogar ou fazer interrogar as testemunhas de acusação e de obter o comparecimento e o interrogatório das testemunhas de defesa nas mesmas condições de que dispõem as de acusação; f) De ser assistida gratuitamente por um intérprete, caso não compreenda ou não fale a língua empregada durante o julgamento; g) De não ser obrigada a depor contra si mesma, nem a confessar-se culpada. 4. O processo aplicável a jovens que não sejam maiores nos termos da legislação penal levará em conta a idade dos mesmos e a importância de promover sua reintegração social. 5. Toda pessoa declarada culpada por um delito terá o direito de decorrer da sentença condenatória e da pena a uma instância superior, em conformidade com a lei. 6. Se uma sentença condenatória passada em julgado for posteriormente anulada ou se um indulto for concedido, pela ocorrência a descoberta de fatos novos que provem cabalmente a existência de erro judicial, a pessoa que sofreu a pena decorrente dessa condenação deverá ser indenizada, de acordo com a lei, a menos que fique provado que se pode imputar, total ou parcialmente, a não-revelação dos fatos reconhecidos em tempo útil. 7. Ninguém poderá ser processado ou punido por um delito pelo qual já foi absolvido ou condenado por sentença passada em julgado, em conformidade com a lei e os procedimentos penais de cada país. MELLO, Celso D. de Albuquerque. Obra Citada. p. 567–568.

50. Art. 15 - 1. Ninguém poderá ser condenado por atos ou omissões que não constituam delito de acordo com o direito nacional ou internacional, no momento em que foram cometidos. Tampouco poder-se-á impor pena mais grave do que a aplicável no momento da ocorrência do delito. Se, depois

de perpetrado o delito, a lei estipular a imposição de pena mais leve, o delinqüente deverá dela beneficiar-se. 2. Nenhuma disposição do presente Pacto impedirá o julgamento ou condenação de qualquer indivíduo por atos ou omissões que, no momento a que foram cometidos, eram considerados delituosos de acordo com os princípios gerais de direito reconhecidos pela comunidade das nações. MELLO, Celso D. de Albuquerque. Obra Citada. p. 568.

51. Art. 4º - 1. Quando situações excepcionais ameacem a existência da nação e sejam proclamadas oficialmente, os Estados Partes do presente Pacto podem adotar, na estrita medida exigida pela situação, medidas que suspendam as obrigações decorrentes do presente Pacto, desde que tais medidas não sejam incompatíveis com as demais obrigações que lhes sejam impostas pelo Direito Internacional e não acarretem discriminação alguma apenas por motivo de raça, cor, sexo, língua, religião ou origem social. 2. A disposição precedente não autoriza qualquer suspensão dos artigos 6, 7, 8 (parágrafos 1 e 2), 11, 15, 16 e 18. 3. Os Estados Partes do presente Pacto que fizerem uso do direito de suspensão devem comunicar imediatamente aos outros Estados Partes do presente Pacto, por intermédio do Secretário-Geral da Organização das Nações Unidas, as disposições que tenham suspenso, bem como os motivos de tal suspensão. Os Estados partes deverão fazer uma nova Comunicação igualmente por intermédio do Secretário-Geral da Organização das Nações Unidas, na data em que terminar tal suspensão. MELLO, Celso D. de Albuquerque. Obra Citada. p. 563-564.

52. Art. 21 - O direito de reunião pacífica será reconhecido. O exercício desse direito estará sujeito apenas restrições previstas em lei e que se façam necessárias, em uma sociedade democrática, no interesse da segurança nacional, da segurança ou da ordem públicas, ou para proteger a saúde ou a moral públicas ou os direitos e as liberdades das demais pessoas. MELLO, Celso D. de Albuquerque. Obra Citada. p. 570.

53. Art. 22 - 1. Toda pessoa terá o direito de associar-se livremente a outras, inclusive o direito de constituir sindicatos e de a eles filiar-se, para a proteção de seus interesses. 2. O exercício desse direito estará sujeito apenas às restrições previstas em lei e que se façam necessárias, em uma sociedade democrática, no interesse da segurança nacional, da segurança e da ordem pública, ou para proteger a saúde ou a moral públicas ou os direitos e liberdades das demais pessoas. O presente artigo não impedirá que se submeta a restrições legais o exercício desse direito por membros das forças armadas e da polícia. 3. Nenhuma das disposições do presente artigo permitirá que Estados Partes da Convenção de 1949 da Organização Internacional do Trabalho, relativa à liberdade sindical e à proteção do direito sindical, venham a adotar medidas legislativas que restrinjam - ou aplicar a lei de maneira a restringir - as garantias previstas na referida Convenção. MELLO, Celso D. de Albuquerque. Obra Citada. p 570.

54. LEAL, Rogério Costa. Perspectivas Hermenêuticas dos Direitos Humanos e Fundamentais no Brasil. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2000, p. 109.

55. PIOVESAN, Flávia. Obra citada, p. 174.

56. Art. 2º - Parágrafo 1º - Cada Estado Parte do presente Pacto compromete-se a adotar medidas, tanto por esforço próprio como pela assistência e cooperação internacionais, principalmente nos planos econômico e técnico, até o máximo de seus recursos disponíveis, que visem a assegurar, progressivamente, por todos os meios apropriados, o pleno exercício dos direitos reconhecidos no presente Pacto, incluindo, em particular, a adoção de medidas legislativas. MELLO, Celso D. de Albuquerque. Obra Citada. p. 552.

57. PIOVESAN, Flávia. Obra citada. p. 177.

58. PIOVESAN, Flávia. Obra citada. p.181.

59. Bobbio, Norberto. Obra Citada. p. 68-69.

60. Os Estados-Partes na presente Convenção; Considerando que a Carta das Nações Unidas baseia-se em princípios de dignidade e igualdade inerentes a todos os seres humanos, e que todos os Estados-Membros comprometeram-se a tomar medidas separadas e conjuntas, em cooperação com a Organização, para a consecução de um dos propósitos das Nações Unidas, que é promover e encorajar o respeito universal e a observância dos direitos humanos e liberdades fundamentais para todos, sem discriminação de raça, sexo, idioma ou religião; Considerando que a Declaração Universal dos Direitos do Homem proclama que todos os homens nascem livres e iguais em dignidade e direitos e que todo homem tem todos os direitos estabelecidos na mesma, sem distinção de qualquer espécie e principalmente de raça, cor ou origem nacional; Considerando que todos os homens são iguais perante a lei e têm direito a igual proteção contra qualquer discriminação e contra qualquer incitamento à discriminação; Considerando que as Nações Unidas têm condenando o colonialismo e todas as práticas de segregação e discriminação a ele associadas, em quaisquer forma e onde quer que existam, e que a Declaração sobre a Concessão de Independência a Países e Povos Coloniais de 14 de dezembro de 1960 (Resolução 1.514 (XV) da Assembléia-Geral) afirmou e proclamou solenemente a necessidade de levá-las a um fim rápido e incondicional; Considerando que a Declaração das Nações Unidas sobre a eliminação de todas as formas de Discriminação Racial de 20 de novembro de 1963 (Resolução 1.904 (XVI) da Assembléia-Geral) afirma solenemente a necessidade de eliminar rapidamente a discriminação racial através do mundo em todas as suas formas e manifestações e de assegurar a compreensão e o respeito à dignidade da pessoa humana; Convencidos de que qualquer doutrina de superioridade baseada em diferenças raciais é cientificamente falsa, moralmente condenável, socialmente injusta e perigosa, e que não existe justificação para a discriminação racial, em teoria ou na prática, em lugar algum; Reafirmando que a discriminação entre os homens por motivos de raça, cor ou origem étnica é um obstáculo a relações amistosas e pacíficas entre as Nações e é capaz de disturbar a paz e a segurança entre povos e a harmonia de pessoas vivendo lado a lado até dentro de um mesmo Estado; Convencidos de que a existência de barreiras raciais repugna os ideais de qualquer sociedade humana; Alarmados por manifestações de discriminação racial ainda em evidência em algumas áreas do mundo e por políticas governamentais baseadas em superioridade racial ou ódio, como as políticas de "apartheid", segregação ou separação; Resolvidos a adotar todas as medidas necessárias para eliminar rapidamente a discriminação racial em todas as suas formas e manifestações, e a prevenir e combater doutrinas e práticas racistas com o objetivo de promover o entendimento entre as raças e construir uma comunidade internacional livre de todas as formas de segregação racial e discriminação racial; (...). MELLO, Celso D. de Albuquerque. Obra Citada. p. 585-586.

61. PIOVESAN, Flávia. Obra Citada. p. 380.

62. Art. 1º - Parágrafo 4º - Não serão consideradas discriminação racial as medidas especiais tomadas com o único objetivo de assegurar progresso adequado de certos grupos raciais ou étnicos ou de indivíduos que necessitem da proteção que possa ser necessária para proporcionar a tais grupos ou indivíduos igual gozo ou exercício de direitos humanos e liberdades fundamentais, contanto que tais medidas não conduzam, em conseqüência, à manutenção de direitos separados para diferentes grupos raciais e não prossigam após terem sido alcançados os seus objetivos. MELLO, Celso D. de Albuquerque. Obra Citada. p. 587.

63. PIOVESAN, Flávia. Obra Citada. p. 188.

64. Art. 1º - Para fins da presente Convenção, o termo "tortura" designa qualquer ato pelo qual dores ou sofrimentos agudos, físicos ou mentais, são infligidos intencionalmente a uma pessoa a fim de obter, dela ou de terceira pessoa, informações ou confissões; de castigá-la por ato que ela ou terceira pessoa tenha cometido ou seja suspeita de ter cometido; de intimidar ou coagir esta pessoa ou outras pessoas; ou por qualquer motivo baseado em discriminação de qualquer natureza; quando tais dores ou sofrimentos são infligidos por um funcionário público ou outra pessoa no exercício de funções públicas, ou por sua instigação, ou com o seu consentimento ou aquiescência. Não se considerará como tortura as dores ou sofrimentos que sejam conseqüência unicamente de sanções legítimas, ou que sejam inerentes a tais sanções ou delas decorram. PIOVESAN, Flávia. Obra citada. p. 358.

65. Art. 5º - 1) Cada Estado-parte tornará as medidas necessárias para estabelecer sua jurisdição sobre os crimes previstos no artigo 4º, nos seguintes casos: a) quando os crimes tenham sido cometidos em qualquer território sob sua jurisdição ou a bordo de navio ou aeronave registrada no Estado em questão; b) quando o suposto autor for nacional do Estado em questão: c) quando a vítima for nacional do Estado em questão e este o considerar apropriado; 2) Cada Estado-parte tomará também as medidas necessárias para estabelecer sua jurisdição sobre tais crimes, nos casos em que o suposto autor se encontre em qualquer território sob sua jurisdição e o Estado não o extradite, de acordo com o artigo 8o para qualquer dos Estados mencionados no parágrafo 1º do presente artigo. 3) Esta Convenção não exclui qualquer jurisdição criminal exercida de acordo com o direito interno.

Art. 6º - 1) Todo Estado-parte em cujo território se encontre uma pessoa suspeita de ter cometido qualquer dos crimes mencionados no artigo 4°, se considerar, após o exame das informações de que dispõe, que as circunstâncias o justificam, procederá à detenção de tal pessoa ou tomará outras medidas legais para assegurar sua presença. A detenção e outras medidas legais serão tomadas de acordo com a lei do Estado, mas vigorarão apenas pelo tempo necessário ao início do processo penal ou de extradição. 2) O Estado em questão procederá imediatamente a uma investigação preliminar dos fatos. 3) Qualquer pessoa detida de acordo com o parágrafo 1° terá asseguradas facilidades para comunicar-se imediatamente com o representante mais próximo do Estado de que é nacional ou, se for apátrida, com o representante de sua residência habitual. 4) Quando o Estado, em virtude deste artigo, houver detido uma pessoa, notificará imediatamente os Estados mencionados no artigo 5º, parágrafo 1º, sobre tal detenção e sobre as circunstâncias que a,justificam. O Estado que proceder à investigação preliminar, a que se refere o parágrafo 2º do presente artigo, comunicará sem demora os resultados aos Estados antes mencionados e indicará se pretende exercer sua jurisdição.

Art. 7º - 1. O Estado-parte no território sob a jurisdição do qual o suposto autor de qualquer dos crimes mencionados no artigo 4º for encontrado, se não o extraditar, abrigar-se-á, nos casos contemplados no artigo 5°, a submeter o caso às suas autoridades competentes para o fim de ser o mesmo processado. 2. As referidas autoridades tomarão sua decisão de acordo com as mesmas normas aplicáveis a qualquer crime de natureza grave, conforme a legislação do referido Estado. Nos casos previstos no parágrafo 2º do artigo 5º, as regras sobre prova para fins de processo e condenação não poderão de modo algum ser menos rigorosas do que as que se aplicarem aos casos previstos no parágrafo 1° do artigo 5º. 3. Qualquer pessoa processada por qualquer dos crimes previstos no artigo 4° receberá garantias de tratamento justo em todas as fases do processo.

Art. 8° - 1. Os crimes a que se refere o artigo 4º serão considerados como extraditáveis em qualquer tratado de extradição existente entre os Estados-partes. Os Estados-partes obrigar-se-ão a incluir tais crimes como extraditáveis em todo tratado de extradição que vierem a concluir entre si. 2. Se um Estado-parte, que condiciona a extradição à existência de tratado, receber um pedido de extradição por parte de outro Estado-parte com o qual não mantém tratado de extradição, poderá considerar a presente Convenção como base legal para a extradição com respeito a tais crimes. A extradição sujeitar-se-á às outras condições estabelecidas pela lei do Estado que receber a solicitação. 3. Os Estados-partes; que não se condicionam a extradição à existência de um tratado reconhecerão, entre si, tais crimes como extraditáveis, dentro das condições estabelecidas pela lei no Estado que receber a solicitação. 4. O crime será considerado, para o fim de extradição entre os Estados-partes, como se tivesse ocorrido não apenas no lugar em que ocorreu, mas também nos territórios dos

Estados chamados a estabelecerem sua jurisdição, de acordo com o parágrafo 1º do art. 5º. PIOVESAN, Flávia. Obra citada. p. 358-359.

66. Mello, Celso D. de Albuquerque. Obra Citada. p. 621.

67. Rangel, Vicente Marotta. Direito e Relações Internacionais. 7 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002, p. 664-665.

  1. Rangel, Vicente Marotta. Obra Citada. p. 665.
  2. Disponível em: <www.un.org>. Acesso em: 01/03/2003, 19h00.
  3. Disponível em: <www.un.org>. Acesso em: 01/03/2003, 19h00.

71. Art 46 – 1º Para que uma petição ou comunicação apresentada de acordo com os arts. 44 ou 45 seja admitida pela Comissão, será necessário: a) que hajam sido interpostos e esgotados os recursos da jurisdição interna, de acordo com os princípios de direito internacional geralmente reconhecidos; b) que seja apresentada dentro do prazo de seis meses, a partir da data em que o presumido prejudicado em seus direitos tenha sido notificado da decisão definitiva; c) que a matéria da petição ou comunicação não esteja pendente de outro processo de solução internacional; e d) que, no caso do art. 44, a petição contenha o nome, a nacionalidade, a profissão, o domicílio e a assinatura da pessoa ou pessoas ou do representante legal da entidade que submeter a petição ou comunicação. 2º As disposições das alíneas a e b do parágrafo 1º deste artigo não se aplicarão quando: a) não existir, na legislação interna do Estado de que se tratar, o devido processo legal para a proteção do direito ou direitos que se alegue tenham sido violados; b) não se houver permitido ao presumido prejudicado em seus direitos o acesso aos recursos da jurisdição interna, ou houver sido ele impedido

de esgotá-los; e c) houver demora injustificada na decisão sobre os mencionados recursos. MELLO, Celso D. de Albuquerque. Obra Citada. p. 610-611.

72. Art. 61- 1º Somente os Estados-Partes e a Comissão têm direito de submeter caso à decisão da Corte. 2º Para que a Corte possa conhecer de qualquer caso, é necessário que sejam esgotados os processos previstos nos arts. 48 a 51. MELLO, Celso D. de Albuquerque. Obra Citada. p. 614.

73. PIOVESAN, Flávia. Obra citada. p. 223

74. PIOVESAN, Flávia. Obra Citada. p. 225.

75. Art. 4º - Direto à Vida - § 1º Toda pessoa tem o direito de que se respeite sua vida. Esse direito deve ser protegido pela lei e, em geral, desde o momento da concepção. Ninguém pode ser privado da vida arbitrariamente. § 2º Nos paises que não houverem abolido a pena de morte, esta só poderá ser imposta pelos delitos mais graves, em cumprimento de sentença final de tribunal competente e em conformidade com lei que estabeleça tal pena, promulgada antes de haver o delito sido cometido. Tampouco se estenderá sua aplicação a delitos aos quais não se aplique atualmente. § 3º Não se pode restabelecer a pena de morte nos Estados que a hajam abolido. § 4º Em nenhum caso pode a pena de morte ser aplicada por delitos políticos, nem por delitos comuns conexos com delitos políticos. § 5º Não se deve impor a pena de morte que, no momento de perpetração do delito, for menos de dezoito anos, ou maior de setenta, nem aplicá-la à mulher em estado de gravidez. § 6º Toda pessoa condenada à morte tem direito a solicitar anistia, indulto ou comutação da pena, os quais podem ser concedidos em todos os casos. Não se pode executar a pena de morte enquanto o pedido estiver pendente de decisão ante a autoridade competente. MELLO, Celso D. de Albuquerque. Obra Citada. p. 599.

76. Art. 5º - Direito à integridade pessoal - § 1o Toda pessoa tem o direito de que se respeite sua integridade física, psíquica e moral. § 2º Ninguém deve ser submetido à torturas, nem a penas ou tratos cruéis, desumanos ou degradantes. Toda pessoa privada da liberdade deve ser tratada com respeito devido à dignidade inerente ao ser humano. § 3o A pena não pode passar da pessoa do delinqüente. § 4º Os processados devem ficar separados, dos condenados, salvo em circunstancias excepcionais, e ser submetidos a tratamento adequado à sua condição de pessoas não condenadas. § 5o Os menores, quando puderem ser processados, devem ser separados dos adultos e conduzidos a tribunal especializado, com a maior rapidez possível, para seu tratamento. § 6o As penas privativas da liberdade devem ter por finalidade essencial a reforma e readaptação social dos condenados. MELLO, Celso D. de Albuquerque. Obra Citada. p. 599.

77. Art. 7º - Direito à liberdade pessoal. § 1° Toda pessoa tem direito à liberdade e à segurança pessoais. § 2º Ninguém pode ser privado de sua liberdade física, salvo pelas causas e nas condições previamente fixadas pelas constituições políticas dos Estados-Partes ou pelas leis de acordo com elas promulgadas. § 3º Ninguém pode ser submetido a detenção ou encarceramento arbitrários. § 4º Toda pessoa detida ou retida deve ser informada das razões de sua detenção e notificada, sem demora, da acusação ou acusações formuladas contra ela. § 5º Toda pessoa detida ou retida deve ser conduzida, sem demora, à presença de um juiz ou outra autoridade autorizada pela lei a exercer funções judiciais e tem direito a ser julgada dentro de um prazo razoável ou a ser posta em liberdade, sem prejuízo de que prossiga o processo. Sua liberdade pode ser condicionada a garantias que assegurem o seu comparecimento em juízo. § 6º Toda pessoa privada da liberdade tem direito a recorrer a um juiz ou tribunal competente, a fim de que este decida, sem demora, sobre a legalidade de sua prisão ou detenção e ordene sua soltura se a prisão ou a detenção forem ilegais. Nos Estados-Partes cujas leis prevêem que toda pessoa que se vir ameaçada de ser privada de sua liberdade tem direito a recorrer a um juiz ou tribunal competente a fim de que este decida sobre a legalidade de tal ameaça, tal recurso não pode ser restringido nem abolido. O recurso pode ser interposto pela própria pessoa ou por outra pessoa. § 7º Ninguém deverá ser detido por dívidas. Este princípio não limita os mandados de autoridade judiciária competente expedidos em virtude de inadimplemento de obrigação alimentar. MELLO, Celso D. de Albuquerque. Obra Citada. p. 600-601.

78. Art. 1º - Obrigação de respeitar os direitos: 1º Os Estados-Partes nesta Convenção comprometem-se a respeitar os direitos e liberdades nela reconhecidos e a garantir seu livre e pleno exercício a toda pessoa que esteja sujeito à sua jurisdição, sem discriminação alguma por motivo de raça, cor, sexo, idioma, religião, opiniões públicas ou de qualquer outra natureza, origem nacional ou social, posição econômica, nascimento ou qualquer outra condição social. MELLO, Celso D. de Albuquerque. Obra Citada. p. 598.

79. Art. 63 – (...) Parágrafo 2º - Quando decidir que houve violação de um direito ou liberdade protegidos nesta Convenção, a Corte determinará que se assegure ao prejudicado o gozo do seu direito ou liberdade violados. Determinará também, se isso for procedente, que sejam reparadas as conseqüências da medida ou situação que haja configurado a violação desses direitos, bem como o pagamento de indenização justa à parte lesada. MELLO, Celso D. de Albuquerque. Obra citada, p. 615.

80. Preâmbulo - Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembléia Nacional Constituinte para instituir um Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias, promulgamos, sob a proteção de Deus, a seguinte CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL. BRASIL, Constituição. Brasília: Senado Federal, 1988.

81. Art. 1º - A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: (...) II - a cidadania; III - a dignidade da pessoa humana. (...). BRASIL, Constituição. Brasília: Senado Federal, 1988.

82. Art. 3º - BRASIL, Constituição. Brasília: Senado Federal, 1988.

83. Art. 5º - Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...) § 1º - As normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata. BRASIL, Constituição. Brasília: Senado Federal, 1988.

84. Art. 4º - A República Federativa do Brasil rege-se nas suas relações internacionais pelos seguintes princípios: I – independência nacional; II – prevalência dos direitos humanos; III – autodeterminação dos povos; IV – não-intervenção; V – igualdade entre os Estados; VI – defesa da paz; VII – solução pacífica dos conflitos; VIII – repúdio ao terrorismo e ao racismo; IX – cooperação entre os povos para o progresso da humanidade; X - concessão de asilo político. Parágrafo único. A República Federativa do Brasil buscará a integração econômica, política, social e cultural dos povos da América Latina, visando à formação de uma comunidade latino-americana de nações. BRASIL, Constituição. Brasília: Senado Federal, 1988.

85. Art. 5º - Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...) § 2º - Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte. BRASIL, Constituição. Brasília: Senado Federal, 1988.

86. Trindade, Antonio Augusto Cançado. Obra Citada. p. 631.

87. PIOVESAN, Flávia. Obra Citada. p. 79.

88. Art. 102 - Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe: (...) III - julgar, mediante recurso extraordinário, as causas decididas em única ou última instância, quando a decisão recorrida: (...) b) declarar a inconstitucionalidade de tratado ou lei federal; BRASIL, Constituição. Brasília: Senado Federal, 1988.

89. Pode-se definir uma norma de jus cogens como uma norma imperativa de Direito Internacional geral, aceita e reconhecida pela comunidade internacional dos Estados, em seu conjunto, não admitindo acordo em contrário e podendo somente ser modificada por norma posterior que tenha o mesmo status. PIOVESAN, Flávia. Obra Citada. p. 88.

90. Art. 60. A Constituição poderá ser emendada mediante proposta:(...) § 4º - Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir: I - a forma federativa de Estado; II - o voto direto, secreto, universal e periódico; III - a separação dos Poderes; IV - os direitos e garantias individuais. BRASIL, Constituição. Brasília: Senado Federal, 1988.

91. MELLO, Celso D. de Albuquerque. Obra citada. p. 566.

92. Art. 7° - Direito à liberdade pessoal - § 1º Toda pessoa tem direito à liberdade e à segurança pessoais. § 2º Ninguém pode ser privado de sua liberdade física, salvo pelas causas e nas condições previamente fixadas pelas Constituições políticas dos Estados-partes ou pelas leis de acordo com elas promulgadas. § 3º Ninguém pode ser submetido a detenção ou encarceramento arbitrários. § 4º Toda pessoa detida ou retida deve ser informada das razões da detenção e notificada, sem demora, da acusação ou das acusações formuladas contra ela. § 5º Toda pessoa detida ou retida deve ser conduzida, sem demora, à presença de um juiz ou outra autoridade autorizada por lei a exercer funções judiciais e tem o direito de ser julgada em prazo razoável ou de ser posta em liberdade, sem prejuízo de que prossiga o processo. Sua liberdade pode ser condicionada a garantias que assegurem o seu comparecimento em juízo. § 6º Toda pessoa privada da liberdade tem direito a recorrer a um juiz ou tribunal competente, a fim de que este decida, sem demora, sobre a legalidade de sua prisão ou detenção e ordene sua soltura, se a prisão ou a detenção forem ilegais. Nos Estados-partes cujas leis prevêem que toda pessoa que se vir ameaçada de ser privada de sua liberdade tem direito a recorrer a um juiz ou tribunal competente, a fim de que este decida sobre a legalidade de tal ameaça, tal recurso não pode ser restringido nem abolido. O recurso pode ser interposto pela própria pessoa ou por outra pessoa. § 7º Ninguém deve ser detido por dívidas. Este

princípio não limita os mandados de autoridade judiciária competente expedidos em virtude de inadimplemento de obrigação alimentar. MELLO, Celso D. de Albuquerque. Obra citada, p. 600-601.

93. A título de ilustração colaciona-se o Recurso em Habeas Corpus nº 79.785/RJ, Relator: Ministro Sepúlveda Pertence, cuja ementa segue em destaque: "I - Duplo grau de jurisdição no Direito brasileiro, à luz da Constituição e da Convenção Americana de Direitos Humanos. l. Para corresponder à eficácia instrumental que lhe costuma ser atribuída, o duplo grau de jurisdição há que ser concedido à.moda clássica, com seus dois caracteres específicos: a possibilidade de um reexame integral da sentença de primeiro grau e que este reexame seja confiado à órgão diverso do que a proferiu e de hierarquia superior na ordem judiciária. 2. Com esse sentido próprio - sem concessões arte o desnaturem - não é possível, sob as sucessivas Constituições da República, erigir o duplo grau em princípio e garantia constitucional, tantas são as previsões, na própria Lei Fundamental, do julgamento de única instância ordinária, já na área cível, já, particularmente na área penal. A situação não se com a incorporação ao Direito brasileiro da Convenção Americana de Direitos Humanos (Pacto de São José), na qual, efetivamente, o art. 8°, 2, h, consagrou, como garantia, ao menos na esfera processual penal, o duplo grau de jurisdição, em sua acepção mais própria: o direito de "toda pessoa acusada de delito", durante o processo "de recorrer da sentença para juiz ou tribunal superior". 4. Prevalência da Constituição, no Direito brasileiro, sobre quaisquer convenções internacionais, incluídas as de proteção aos direitos humanos, que impede, no caso, a pretendida aplicação da norma do Pacto de São José: motivação. II - Constituição do Brasil e as convenções internacionais de proteção aos direitos humanos: prevalência da Constituição que afasta a aplicabilidade das cláusulas convencionais antinômicas. l. Quando a questão - no estágio ainda primitivo de centralização e efetividade da ordem jurídica internacional - é de ser resolvida sob a perspectiva do juiz nacional - que, órgão do Estado, deriva da Constituição sua própria autoridade jurisdicional – não pode ele buscar, senão nessa Constituição mesma, o critério da solução de eventuais antinomias entre normas internas e normas internacionais, o que é bastante a firmar a supremacia sobre as últimas da Constituição, ainda quando esta eventualmente atribua aos tratados a prevalência no conflito: mesmo nessa hipótese, a primazia derivará da Constituição e não de uma apriorística força intrínseca da convenção internacional. 2. Assim como não o afirma em relação às leis, a Constituição não precisou dizer-se sobreposta aos tratados: a hierarquia está ínsita em preceitos inequívocos seus, como os que submetem a aprovação e promulgação das convenções ao processo legislativo ditado pela Constituição e menos exigente que o das emendas a ela e aquele que em conseqüência, explicitamente admite o controle da constitucionalidade dos tratados (CF, art. 102,III, b). 3. Alinhar-se ao consenso em torno da estrutura infraconstitucional, na ordem positiva brasileira, dos tratados a ela incorporados, não implica assumir compromisso de logo com o com o entendimento – majoritário em recente decisão do STF (ADInMC 1.480) - que, mesmo em relação às convenções internacionais de proteção de direitos fundamentais, preserva a jurisprudência que a todos equipara hierarquicamente às leis ordinárias. 4. Em relação ao ordenamento pátrio de qualquer sorte para dar a. eficácia pretendida à cláusula do Pacto de São José, de garantia do duplo grau de jurisdição, não bastaria sequer lhe conceder o poder de ditar a Constituição, acrescentando-lhe limitação oponível à lei como é a tendência do relator: mais que isso, seria necessário emprestar a norma convencional força ab-rogante da Constituição mesma, quando não dinamitadoras do seu sistema, o que não é de admitir. III – Competência originária dos Tribunais e duplo grau de jurisdição. l. Toda vez que a Constituição prescreveu para determinada causa a competência. Originária de um Tribunal, que ela mesma não criou, de duas uma: ou também previu recurso ordinário de sua decisão (CF, arts. 102, II, art. 105, II, a e b; 121, § 4°, III, IV e V) ou, não o tendo estabelecido, é que o proibiu. 2. Em tais hipóteses, o recurso ordinário contra decisões do tribunal, que ela mestria não criou, a Constituição não admite que o institua o direito infraconstitucional, seja lei ordinária seja convenção internacional: é que, afora os casos da Justiça do Trabalho - que não estão em causa - e da Justiça Militar - na qual o STM não se superpõe a outros Tribunais e Juízos do País, também as competências recursais dos outros Tribunais Superiores - o STJ e o TSE - estão enumeradas taxativamente na Constituição, e só a emenda constitucional poderá ampliar. 3. À falta de órgãos jurisdicionais ad qua, no sistema constitucional, indispensáveis a viabilizar. a aplicação do princípio da duplo grau de jurisdição aos processos de competência originária dos Tribunais, segue-se a incompatibilidade com a Constituição da aplicação no caso da norma internacional de outorga da garantia invocada". BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus nº 79.785/RJ. Relator: Min. Sepúlveda Pertence. Disponível em: <http://www.stf.gov.br>. Acesso em: 31/01/2003. 19h00.

Art. 105. Compete ao Superior Tribunal de Justiça: (...) III – julgar, em recurso especial, as causas decididas, em única instância ou última instância, pelos Tribunais Regionais Federais ou pelos Tribunais dos Estados, do Distrito Federal e Territórios, quando a decisão recorrida: a) contrariar tratado ou lei federal, ou negar-lhes vigência. BRASIL, Constituição. Brasília: Senado Federal, 1988.

Piovesan, Flávia. Obra Citada. p. 97/98.

Art. 102 - Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe: (...) III - julgar, mediante recurso extraordinário, as causas decididas em única ou última instância, quando a decisão recorrida: (...) b) declarar a inconstitucionalidade de tratado ou lei federal; BRASIL, Constituição. Brasília: Senado Federal, 1988.

Art. VII - Todos são iguais perante a lei e têm direito, sem qualquer distinção, a igual proteção da lei. Todos têm direito a igual proteção contra qualquer discriminação que viole a presente Declaração e contra qualquer incitamento a tal discriminação. MELLO, Celso D. de Albuquerque. Obra Citada. p. 547.

Art. 26 - Todas as pessoas são iguais perante a lei e têm direito, sem discriminação alguma, a igual proteção da Lei, A este respeito, a lei deverá proibir qualquer forma de discriminação e garantir a todas as pessoas proteção igual e eficaz contra qualquer discriminação por motivo de raça, cor, sexo, língua, religião, opinião política ou de outra natureza, origem nacional ou social, situação econômica, nascimento ou qualquer outra situação. MELLO, Celso D. de Albuquerque. Obra Citada. p. 571.

Art. 24 - Igualdade perante a lei. Todas as pessoas são iguais perante a lei. Por conseguinte, têm direito, sem discriminação, a igual proteção da lei. MELLO, Celso D. de Albuquerque. Obra Citada. p. 605.

Art 5º - Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...) LVII – Ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória. Brasil, Constituição. Brasília: Senado Federal, 1988.

Art. XI – 1º Todo homem acusado de um ato delituoso tem o direito de ser presumido inocente até que a sua culpabilidade tenha sido provada de acordo com a lei, em julgamento público no qual lhe tenham sido asseguradas todas as garantias necessárias a sua defesa. 2º Ninguém poderá ser culpado por qualquer ação ou omissão que, no momento, não constituam delito perante o direito nacional ou internacional. Também não será imposta pena mais forte do que aquela que no momento da prática era aplicável ao ato delituoso. MELLO, Celso D. de Albuquerque. Obra Citada. p. 547.

94. Art. 14 – 1) Todas as pessoas são iguais perante os tribunais e as cortes de justiça. Toda pessoa terá o direito de ser ouvida publicamente e com as devidas garantias por um tribunal competente, independente e imparcial, estabelecido por lei, na apuração de qualquer acusação de caráter penal formulada contra ela ou na determinação de seus direitos e obrigações de caráter civil. A imprensa e o público poderão ser excluídos de parte ou de totalidade de um julgamento, quer por motivo de moral pública, de ordem pública ou de segurança nacional em uma sociedade democrática, quer quando o interesse da vida privada das Partes o exija, que na medida em que isso seja estritamente necessário na opinião da justiça, em circunstâncias específicas, nas quais a publicidade venha a prejudicar os interesses da justiça; entretanto, qualquer sentença o proferida em matéria penal ou civil deverá tornar-se pública, a menos que o interesse de menores exija procedimento oposto, ou o processo diga respeito a controvérsias matrimoniais ou à tutela de menores. 2) Toda pessoa acusada de um delito terá direito a que se presuma sua inocência enquanto não for legalmente comprovada sua culpa. 3) Toda pessoa acusada de um delito terá direito a que se presuma sua inocência enquanto não for legalmente comprovada sua culpa. 3) Toda pessoa acusada de um delito terá direito, em plena igualdade, pelo menos, às seguintes garantias: a) De ser informado, sem demora, numa língua que compreenda e de forma minuciosa, da natureza e dos motivos da acusação contra ela formulada ; b) De dispor do tempo e dos meios necessários à preparação de sua defesa e a comunicar-se com defensor de sua escolha; c) De ser julgado sem dilações indevidas; d) De estar presente no julgamento e de defender-se pessoalmente ou por intermédio de defensor de sua escolha; de ser informado, caso não tenha defensor, do direito que lhe assiste de tê-lo sempre que o interesse da justiça assim exija, de ter um defensor designado ex officio gratuitamente, se não tiver meios para remunerá-lo; e) De interrogar ou fazer interrogar as testemunhas de acusação e de obter o comparecimento e o interrogatório das testemunhas de defesa nas mesmas condições de que dispõe as de acusação ; f) De ser assistida gratuitamente por um intérprete, caso não compreenda ou não fale a língua empregada durante o julgamento; g) De não ser obrigada a depor contra si mesma, nem a confessar-se culpada. 4) O processo aplicável a jovens que não sejam maiores nos termos da legislação penal levará em conta a idade dos mesmos e a importância de promover sua reintegração social; 5) Toda pessoa declarada culpada por um delito terá o direito de decorrer da sentença condenatória e da pena a uma instância superior, em conformidade com a lei; 6) Se uma sentença condenatória passada em julgado for posteriormente anulada ou se um indulto for concedido, pela ocorrência, a descoberta de fatos novos que provem cabalmente a existência de erro judicial, a pessoa que sofreu a pena decorrente dessa condenação deverá ser indenizada, de acordo com a lei, a menos que fique provado que se pode imputar, total ou parcialmente, a não-revelação dos fatos reconhecidos em tempo útil; 7) Ninguém poderá ser processado ou punido por um delito pelo qual já foi absolvido ou condenado por sentença passada em julgado, em conformidade com a lei e os procedimentos penais de cada país. MELLO, Celso D. de Albuquerque. Obra Citada. p. 567-568.

95. Art. 8º - Garantias judiciais - 1. Toda pessoa terá o direito de ser ouvida, com as devidas garantias e dentro de um prazo razoável, por um juiz ou Tribunal competente, independente e imparcial, estabelecido anteriormente por lei, na apuração de qualquer acusação penal formulada contra ela, ou na determinação de seus direitos e obrigações de caráter civil, trabalhista, fiscal ou de qualquer outra natureza. 2. Toda pessoa acusada de um delito tem direito a que se presuma sua inocência, enquanto não for legalmente comprovada sua culpa. Durante o processo, toda pessoa tem direito, em plena igualdade, às seguintes garantias mínimas: a) direito do acusado de ser assistido gratuitamente por um tradutor ou intérprete, caso não compreenda ou não fale a língua do juízo ou tribunal; b) comunicação prévia e pormenorizada ao acusado da acusação formulada; c) concessão ao acusado do tempo e dos meios necessários à preparação de sua defesa; d) direito do acusado de defender-se pessoalmente ou de ser assistido por um defensor de sua escolha e de comunicar-se, livremente e em particular, com seu defensor; e) direito irrenunciável de ser assistido por um defensor proporcionado pelo Estado, remunerado ou não, segundo a legislação interna, se u acusado não se defender ele próprio, nem nomear defensor dentro do prazo estabelecido pela lei; f) direito da defesa de inquirir as testemunhas presentes no Tribunal e de obter o comparecimento, como testemunhas ou peritos, de outras pessoas que possam lançar luz sobre os fatos; g) direito de não ser obrigada a depor contra si mesma, nem a confessar-se culpada; e h) direito de recorrer da sentença a juiz ou tribunal superior. 3. A confissão do acusado só é válida se feita sem coação de nenhuma natureza. 4. O acusado absolvido por sentença transitada em julgado não poderá ser submetido a novo processo pelos mesmos fatos. 5. O processo penal deve ser público, salvo no que for necessário para preservar os interesses da justiça. MELLO, Celso D. de Albuquerque. Obra Citada. p. 601.

96. Art. 27 – Nos Estados em que haja minorias étnicas, religiosas ou lingüísticas, as pessoas pertencentes a essas minorias não poderão ser privadas do direito de ter, conjuntamente com outros membros de seu grupo, sua própria vida cultural, de professar e praticar sua própria religião e usar sua própria língua. MELLO, Celso D. de Albuquerque. Obra Citada. p. 571.

97. Art. 30 – Nos Estados-partes onde existiam minorias étnicas, religiosas ou lingüísticas, ou pessoas de origem indígena, não será negado a uma criança que pertence a tais minorias, ou que seja indígena, o direito de, em comunidade com os demais membros de seu grupo, ter sua própria cultura, professor e praticar sua própria religião ou utilizar seu próprio idioma. MELLO, Celso D. de Albuquerque. Obra Citada. p. 629-630.

98. Art. 7º - Ninguém poderá ser submetido a tortura, nem a penas ou tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes. Será proibido, sobretudo, submeter uma pessoa, sem seu livre consentimento, a experiências médicas ou científicas. MELLO, Celso D. de Albuquerque. Obra citada, p. 565.

99. Art. 13 - Liberdade de pensamento e de expressão – 1) Toda pessoa tem o direito à liberdade de pensamento e de expressão. Esse direito inclui a liberdade de procurar, receber e difundir informações e idéias de qualquer natureza, sem considerações de fronteiras, verbalmente ou por escrito, ou em forma impressa ou artística, ou por qualquer meio de sua escolha. 2) O exercício do direito previsto no inciso precedente não pode estar sujeito à censura prévia, mas a responsabilidades ulteriores, que devem ser expressamente previstas em lei e que se façam necessárias para assegurar: a) o respeito dos direitos e da reputação das demais pessoas; b) a proteção a segurança nacional, da ordem pública ou da saúde ou da moral públicas. 3) Não se pode restringir o direito de expressão por vias e meios indiretos, tais como o abuso de menores oficiais ou particulares de papel de imprensa, de freqüências radioelétricas ou de equipamentos e aparelhos usados na difusão de informação, nem por quaisquer outros meios destinados a obstar a comunicação e a circulação de idéias e opiniões. 4) A lei pode submeter os espetáculos públicos a censura prévia, com o objetivo exclusivo de regular o acesso a eles, para proteção moral da infância e da adolescência, sem prejuízo do disposto no inciso 2. 5) A lei deve proibir toda propaganda a favor da guerra, bem como toda apologia ao ódio nacional, racial ou religioso que constitua incitamento à discriminação, à hostilidade, ao crime ou à violência. MELLO, Celso D. de Albuquerque. Obra citada, p. 602-603.

100. Art. 4º - 1) A adoção pelos Estados-partes de medidas especiais de caráter temporâneo destinadas a acelerar a igualdade de fato entre o homem e a mulher não se considerará discriminação na forma definida nesta Convenção, mas de nenhuma maneira implicará, como conseqüência, a manutenção de normas desiguais ou separadas; essas medidas cessarão quando os objetivos de igualdade de oportunidade e tratamento houverem sido alcançados. 2) A adoção pelos Estados-partes de medidas especiais, inclusive as contidas na presente Convenção, destinadas a proteger a maternidade, não se considerará discriminatória. PIOVESAN, Flávia. Obra citada, p. 71.

101. Matte, Luiza. A Dignidade da Pessoa Humana em abstrato, sua positivação e sua influência na prática jurídica. Porto Alegre: PUCRS, 2000. 183 p. Dissertação (Mestrado em Direito), Faculdade de Direito, Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, 2000. p. 61-62.

102. Art. 1º - Todas os homens nascem livres e iguais em dignidade e direitos. São dotados de razão e consciência e devem agir em relação uns aos outros com espírito de fraternidade. MELLO, Celso D. de Albuquerque. Obra Citada. p. 546.

103. Dallari, Dalmo de Abreu. Direitos Humanos e Cidadania. São Paulo: Moderna, 1998, p. 9

104. SARLET, Ingo Wolfgang. Obra Citada. p. 104.

105. SARLET, Ingo Wolfgang. Obra Citada. p. 107.

106. ROCHA, Cármen Lúcia Antunes. O princípio da dignidade humana e a exclusão social. In: Interesse Público Ano 1, nº 4, São Paulo: Notadez,1999, p.27.

107. ROCHA, Cármen Lúcia Antunes. Obra Citada. p. 26.

108. SARLET, Ingo Wolfgang. Obra Citada. p. 109.

109. MIRANDA, Jorge. Manual de Direito Constitucional. Direitos Fundamentais. 3 ed Tomo IV. Coimbra: Coimbra Editora, 2000, p. 168-169.

110. SARLET, Ingo Wolfgang. Obra Citada. p. 60.

111. Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: (...) Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição. BRASIL, Constituição. Brasília: Senado Federal, 1988.

112. Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: (...) V - o pluralismo político. BRASIL, Constituição. Brasília: Senado Federal, 1988.

113. Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: (...) IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa. BRASIL, Constituição. Brasília: Senado Federal, 1988.

114. Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: I - construir uma sociedade livre, justa e solidária. BRASIL, Constituição. Brasília: Senado Federal, 1988.

115. Art. 3º - Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: (...) III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais. BRASIL, Constituição. Brasília: Senado Federal, 1988.

116. Art. 170 A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: (...). BRASIL, Constituição. Brasília: Senado Federal, 1988.

117. Art. 226 A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado. BRASIL, Constituição. Brasília: Senado Federal, 1988.

118. Art. 227 É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. BRASIL, Constituição. Brasília: Senado Federal, 1988.

119. SARLET, Ingo Wolfgang. Obra Citada. p.100.

120. MORAES, Alexandre. Direitos Humanos Fundamentais – Comentários Doutrinários e Jurisprudenciais aos arts. 1º a 5º. 3 ed. São Paulo: Atlas S.A, 2000, p. 61.

121. SARLET, Ingo Wolfgang. Obra Citada. p.111.

122. Matte, Luiza. Obra Citada. p. 102.

123. Perelman, Chaïm. Ética e Direito. São Paulo: Martins Fontes, 1996, p. 400-401.

124. Perelman, Chaïm. Obra Citada. p. 404.

125. Perelman, Chaïm. Obra Citada. p. 408.

126. COMPARATO, Fábio Konder. Obra Citada. p. 57.

127. ROCHA, Cármem Lúcia Antunes. Obra Citada. p. 32.

128. Ibidem. p.34.

129. ROCHA, Cármem Lúcia Antunes. Obra Citada. p. 47.


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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MORAES, Mabel Cristiane. A proteção dos direitos humanos e sua interação diante do princípio da dignidade da pessoa humana. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 8, n. 157, 10 dez. 2003. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/4607. Acesso em: 19 abr. 2024.