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A atuação do juiz, do Ministério Público e da defesa nas audiências de custódia

A atuação do juiz, do Ministério Público e da defesa nas audiências de custódia

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Examinam-se os regramentos internos e internacionais que recomendam a implementação da audiência de custódia no ordenamento jurídico brasileiro, ajustando-se o processo penal a normas internacionais de direitos humanos.

Sumário: 1 Introdução; 2 Previsão Normativa e Princípios Orientadores da Audiência de Custódia; 2.1 Previsão Normativa Internacional, Nacional e Jurisprudencial; 2.2 Princípios Fundamentais orientadores da Audiência de Custódia; 2.2.1 Princípio da Dignidade Humana; 2.2.2 Princípio do Devido Processo Penal; 2.2.3 Princípio da Ampla Defesa; 2.2.4 Princípio do Contraditório; 2.2.5 Princípio da Presunção de Inocência ou da Não Culpabilidade; 2.2.6 Demais Princípios Orientadores da Audiência de Custódia; 3 Audiência de Custódia e o Processo Penal Constitucional; 3.1 Objetivos e garantias asseguradas na Audiência de Custódia; 3.2 Prazo para a apresentação de preso em Audiência de Custódia; 3.3 Efeitos dos atos produzidos na Audiência e sua eficácia probatória no processo penal; 3.4 Entendimento das expressões - “sem demora” e “à presença de um juiz ou outra autoridade autorizada por lei a exercer funções judiciais” - previstas nos Tratados Internacionais de Direitos Humanos; 4 O papel dos sujeitos processuais nas Audiências de Custódia; 4.1 Atuação do Juiz; 4.2 Atuação do Ministério Público; 4.3 Atuação da Defesa Técnica e Autodefesa; 5 Conclusão.  Referências.  

RESUMO :O estudo tem por finalidade discorrer sobre os regramentos internos e internacionais que recomendam a implementação da Audiência de Custódia no ordenamento jurídico brasileiro, ajustando-se o processo penal a essas Normas Internacionais de Direitos Humanos, possibilitando, desse modo, a verificação das finalidades a serem alcançadas com a realização dessa audiência. Em termos bem esquemáticos, pode-se dizer que, a análise perpassou pela previsão normativa nacional e internacional, os princípios orientadores da Audiência de Custódia; o desenvolvimento da audiência em si, aplicado ao processo penal constitucional. Por fim, analisou-se e ressaltou-se o importantíssimo papel dos sujeitos processuais durante a realização dos atos pré-processuais nessa audiência. Segunda tal perspectiva, pode-se avaliar a importância que essa audiência proporciona à proteção da pessoa humana, objetivando assegurar direitos fundamentais e garantir a efetivação do direito à integridade da pessoa do preso privada de sua liberdade. Cabe salientar que não é nessa audiência que se verifica a culpabilidade do imputado, mas é a oportunidade de que dispõe de estar diante do Juiz e demais sujeitos processuais para ser ouvido sobre as circunstâncias que motivaram sua prisão, ocasião em que possam ser aplicadas outras medidas cautelares diversas da prisão. Essa audiência não tem a finalidade de produção de prova; porém, tem, essencialmente, o objetivo de proteger o direito à liberdade pessoal, permitindo ao Estado-Juiz outorgar proteção a outros direitos, como à vida e à integridade pessoal do imputado de ter cometido uma infração penal, para que não sejam violadas as regras mínimas de normas supralegais preestabelecidas. Na mesma direção, busca-se a efetividade e comprometimento dos sujeitos processuais como o Juiz, o Promotor e os Defensores de exercerem o seu papel com eficácia, a fim de que o sistema ius puniendi estatal seja mais justo e garanta a dignidade da pessoa humana.

Palavras-chave: Audiência de Custódia. Sujeitos Processuais. Cautelaridade. Garantias. Normas Internacionais e Internas.


1 INTRODUÇÃO

Tem-se assistido, no Brasil, nos últimos anos, avanços significativos na aplicação dos direitos fundamentais no processo penal, sobretudo quando o assunto é enfrentar o dilema entre a adoção de uma medida cautelar diversa da prisão, pena ou sanção e o status de inocência, que só pode ser revogado com o advento de uma sentença condenatória transitada em julgado. Assim, descortina-se, no âmbito do Sistema Processual Penal Constitucional, mais uma vez, um rico debate em razão da recomendação supralegal que instituiu as Audiências de Custódia no Brasil, as quais ingressam na fase pré-processual, sem, contudo, constituir-se em um complemento da persecução criminal destinada à elucidação de um fato criminoso, apesar da participação do Juiz, do Ministério Público e de um defensor constituído ou público. Essa questão se deu a partir de 1992, quando o Estado Brasileiro promulgou os decretos legislativos que incorporaram os Tratados Internacionais de Direitos Humanos, o Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos e a Convenção Americana de Direitos Humanos (CADH), essa mais conhecida como Pacto de São José da Costa Rica[2].

Ao contrário do que se possa dizer, tal procedimento não visa comprometer a resposta estatal ao delito ocorrido, promovendo a impunidade ou o desencarceramento. Ao submeter a pessoa sob custódia, com a maior brevidade, a uma análise integrada dos sujeitos processuais, o Juiz, o Ministério Público e o Defensor, quanto à medida cautelar mais adequada a ser aplicada ao contrário do desejado, deixar de submeter o preso a uma medida restritiva de liberdade, de pronto, quando diante da cessação de uma infração com a prisão em flagrante delito desse infrator, em razão de aparente convicção, quanto à materialidade e a autoria verificada no domínio da percepção visual dos fatos, quando o delito está sendo cometido ou acabou de sê-lo. Certamente, este é o senso comum[3] em favor da autopreservação e defesa da sociedade. Prisão em flagrante que é facultada a qualquer do povo, quando o fato ocorre de inopino e não exija ordem escrita de uma autoridade judiciária (Juiz), conforme disposto na Constituição Federal (Art. 5º, inciso, LXI)[4] e no Código de Processo Penal vigente (Art. 301)[5]. Assim, a Audiência de Custódia surge para garantir direitos da pessoa presa e para que o Juiz aplique a medida cautelar mais adequada. Ela torna-se também uma garantia e proteção ao Processo Penal, pois, esse também não pode ser colocado em risco, quando o que se deseja é alcançar a Justiça e oferecer uma resposta punitiva mais adequada.

É imperioso ainda citar que a implementação da Audiência de Custódia figura-se como sua determinação supralegal de aplicação sob uma linha de tensão vigente no direito processual penal, ao ficar entre dois polos; logo, dois eixos centrais. De um lado, a necessidade de um processo penal eficiente, com exigências e necessidades de oferecer respostas, seja quanto ao seu poder punitivo, seja quanto ao seu poder persecutório. Do outro, a importância da preservação dos Direitos Fundamentais da Pessoa Humana, direitos esses que são garantias individuais do acusado, consagrados na Constituição de 1988 e, após o ano de 1992, no regramento supralegal brasileiro.

Nesse sentido, a Audiência de Custódia passa a assegurar direitos inseridos em nosso ordenamento Constitucional, sobretudo, garantias essenciais afinadas ao piso vital básico da pessoa humana, desvelado pelo Princípio da Dignidade da Pessoa Humana (Art.1º, Inciso III, da CF/88). Ademais, asseguram-se garantias que revelam ter todo custodiado pelo Estado, antes de uma sentença condenatória transitada em julgado, o direito de ser apresentado, sem demora, a um Juiz ou a um Tribunal, a fim de que seja examinada a legalidade de sua prisão e o tratamento e as condições quanto à realização dessa custódia pelas autoridades policiais[6].[7] Além disso, e sobretudo, avaliar a necessidade da realização dessa prisão e se ela deve ser mantida, ao longo do processo, ou substituída por uma medida cautelar prisional ou não prisional, todas englobadas lato sensu, nos regramentos em compasso com os pressupostos gerais, a teor dos art. 282; 283; 304, §1; 309; 312; 316; 319; 321; 323; 324 do Código de Processo Penal[8].

Vale dizer que, do muito que tem sido feito em produção doutrinária no âmbito processual penal, mormente, no âmbito prático, as Audiências de Custódia representam um marco humanizatório e civilizatório do Sistema Processual Penal. Aliás, por mais pretensioso que seja o desejo de adequação e de avanços do processo penal, é importante salientar que após a vigência da Constituição de 1988, o processo penal vem galgando o seu ciclo de democratização e constitucionalização de maneira significativa.

Assim, vê-se que a partir do momento em que há uma construção supralegal fundada em Direitos Fundamentais e em Garantias Individuais, tem-se um desenho cada vez mais promissor para um Processo Penal Constitucional que possibilitará dialogar com um Estado Democrático de Direito que o recepcionou. É nesse sentido que as Audiências de Custódia passam a representar uma importante etapa da consolidação democrática do Processo Penal Brasileiro.

De fato, com o avançar da sociedade e historicamente, com o avançar da ciência do Direito, nota-se que o Processo Penal se encontra comprometido e possui um importante papel a cumprir no Estado Democrático de Direito. Portanto, o Processo Penal não pode ser compreendido apenas como um meio ou um instrumento da aplicação da lei material. Ele deve coadunar com outros objetivos muito mais nobres ao buscar direitos reconhecidos, a fim de elaborar teorias mais adequadas ao desenvolvimento de legislações cada vez mais amplas e com vistas a alcançar a justiça, focada e ancorada em bases de natureza constitucionais. Dessa forma, é possível possibilitar a máxima efetividade das Garantias Individuais e dos Direitos Fundamentais, afastando-se dos posicionamentos elaborados tão-somente consubstanciados no senso-comum jurídico, sociológico e político, mas sim centrados na busca da melhor reflexão doutrinária e da melhor construção técnica legislativa.

Esse é o papel do Processo Penal na contemporaneidade: assumir essa feição de garantia. Assim, a efetivação das Audiências de Custódia é um excepcional avanço nesse sentido, objetivando fazer valer a garantia da pessoa presa e também possibilitar que a autoridade judiciária (Juiz) adote medidas cautelares adequadas à situação com a maior brevidade e justiça.

O presente trabalho ter por finalidade estudar a relação jurídica processual da Audiência de Custódia, fixando seu conceito, suas características, sua estrutura e o papel dos sujeitos processuais distinguidos pela norma supralegal integrantes desse ato processual. Em linhas gerais, no contexto de um breve estudo, esta pesquisa buscará guiar-se, sob análise dos princípios norteadores da Audiência de Custódia, quanto à importância de sua realização e o papel de cada sujeito processual na busca da harmonia da melhor prestação jurisdicional, assegurando direitos individuais e garantias fundamentais do preso e, ao processo, a garantia dos fatores de justiça, acesso, estabilidade, legalidade e celeridade. 

Isto posto, é possível elaborar uma problematização, sem um maior aprofundamento, diante do tema:  a ausência de algum sujeito processual previsto em Lei, em uma Audiência de Custódia, invalida os atos nela praticados?

Depois de elaborada essa proposição, resumidamente, posicionando-se por meio de um incitamento ao estudo do problema proposto, buscar-se-ão critérios argumentativos em Tratados, Leis e doutrina jurídica que poderão trazer luz a essa dúvida.

Assinala-se como hipótese de resposta ao problema formulado, a qual poderá ser comprovada total ou parcialmente após o fluxo do estudo a ser produzido, a seguinte assertiva: É requisito essencial à realização da Audiência de Custódia que todos os sujeitos processuais estejam presentes: o Juiz, o Ministério Público e o Defensor constituído ou público, a fim de que os atos não sejam invalidados.

Por fim, de maneira palpável, o esforço desse estudo é entender a importância da realização dessa Audiência na promoção da Justiça e o papel exercido pelas partes integrantes desse ato pré-processual. Assim, nota-se que Jurisdição, Direitos Fundamentais, Sujeitos Processuais, Atos Procedimentais e Processo são saberes essenciais nessa construção jurídica.


2 PREVISÃO NORMATIVA E PRINCÍPIOS ORIENTADORES DA AUDIÊNCIA DE CUSTÓDIA  

No que tange à delimitação normativa do instituto da Audiência de Custódia, cabe salientar que ela já existe no Direito Internacional por muitos anos, tendo previsão em vários Tratados e Convenções, tais como, a Convenção Europeia dos Direitos Humanos e Liberdades Fundamentais (1950); o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos (1966) e a Convenção Americana sobre Direitos Humanos (1969). Com efeito, tem-se que a partir dessas normas internacionais surge normativamente o direito processual penal interno da Audiência de Custódia, o qual passa a se compatibilizar com a ordem jurídica internacional. Desta forma, vê-se que o ordenamento interno deve passar a comportar-se conforme proposto cumprir no Plano Internacional, quando da ratificação dos referidos Tratados e Convenções de Direitos Humanos[9]. 

2.1 Previsão Normativa Internacional, Nacional e Jurisprudencial

No contexto concernente da delimitação Normativa da implementação da Audiência de Custódia, conforme salienta Pires (2016, p.258), essa audiência tem como objetivo proteger os Direitos Humanos e as liberdades fundamentais, permitindo o controle judiciário e o respeito aos direitos individuais, inicialmente ratificado em Roma, em 1950, na Convenção Europeia. Isto significa dizer que foi estabelecida, nessa Convenção Internacional, a garantia de que “[...] qualquer pessoa presa ou detida deve ser apresentada imediatamente a um juiz ou outro magistrado habilitado pela lei para exercer funções judiciais [...]”, conforme estabelecido em seu artigo 5.3[10].

Em relação ao reconhecimento da dignidade da pessoa humana e aos seus direitos quanto a sua igualdade inalienável fundada na liberdade, justiça e paz no Mundo, o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos (PIDCP), aprovado em 1966 pela Assembleia Geral das Nações Unidas, deixa expresso, também, por sua vez, em seu art. 9.3, que  “Qualquer pessoa presa ou encarcerada em virtude de infração penal deverá ser conduzida, sem demora, à presença do juiz ou de outra autoridade habilitada por lei a exercer funções judiciais [...]”[11]. Acrescenta Pires (2016, p.4) que “[...] no ordenamento brasileiro a autoridade habilitada a exercer funções judiciais é somente o juiz, portanto, é ao magistrado que deverá ser apresentado à pessoa presa, para que seja analisada a legalidade ou não da prisão”.

Para que essa garantia fosse alcançada, também, no âmbito do Plano Regional de Direito Internacional, no ano de 1969, foi celebrada a Convenção Americana sobre Direitos Humanos (CADH), popularmente conhecida como Pacto de São José da Costa Rica. Trata-se de uma Convenção firmada pelos integrantes da Organização de Estados Americanos (OEA), e que, de maneira geral

[...] tem como objetivo estabelecer os direitos fundamentais da pessoa humana, como o direito à vida, à liberdade, à dignidade, à integridade pessoal e moral, à educação, entre outros similares. A convenção proíbe a escravidão e a servidão humana, trata das garantias judiciais, da liberdade de consciência e religião, de pensamento e expressão, bem como da liberdade de associação e da proteção à família. O objetivo da constituição deste tratado internacional é a busca da consolidação entre os países americanos de um regime de liberdade pessoal e de justiça social, fundado no respeito aos direitos humanos essenciais, independentemente do país onde a pessoa viva ou tenha nascido. O pacto tem influência marcante da Declaração Universal dos Direitos Humanos, que compreende o ideal do ser humano livre, isento do temor e da miséria e sob condições que lhe permitam gozar dos seus direitos econômicos, sociais e culturais, bem como dos seus direitos civis e políticos (PIRES, 2016, p. 4).

Dessa forma, pode-se constatar que o instituto da Audiência de Custódia, ao passar a vigorar no direito processual penal brasileiro, com base nas previsões normativas estabelecidas nos Tratados e Convenções Internacionais de Direitos Humanos, o faz a partir da promulgação dessas normas no plano legislativo interno em 1992, por via dos Decretos Legislativos nº 592, de 06 de junho de 1992 e o Decreto nº 678, de 06 de novembro de 1992, respectivamente.

Este instituto (Audiência de Custódia), frise-se, deve compatibilizar-se com a operabilidade de seus atos, pressupostos e procedimentos em face dos vigentes no plano interno, de acordo com os ditames conferidos em normas firmadas no plano internacional. Ressalta-se, porém, que essas normas internacionais, ratificadas pelo Estado Brasileiro, não impuseram que internamente fosse adotado e aplicado esse instituto, de maneira unilateral e, sim, que no Brasil, por ocasião do seu comprometimento, por meio dos Decretos Legislativos editados, o instituto deverá ser aplicado no Sistema Processual Penal interno.

Todavia, a partir da Emenda Constitucional nº 45/04, que inseriu na Constituição Federal o Art, 5º, §3º, os aludidos Tratados obtiveram o status de norma “supralegal”, posicionando-se em nível superior à legislação nacional e inferior à Constituição[12]. Demonstrou-se assim que, por possuírem status supralegal, seus regramentos devem ser observados e aplicados no plano interno.

Faz-se importante destacar que no julgamento da ADI 5240, de 2015 pelo Supremo Tribunal Federal (STF), o artigo 7º, item 5, da Convenção Americana de Direitos Humanos, ao dispor que “toda pessoa presa, detida ou retida deve ser conduzida, sem demora, à presença de um juiz”, faz com que os efeitos de toda a legislação ordinária conflitante com esse preceito convencional sejam sustados, conforme entendimento do julgado da referida ADI, ao ser mencionada em voto a questão da prisão civil do depositário infiel em face dos Tratados Internacionais de Direitos Humanos, ao se reafirmar que essa normas internacionais possuem precedente de validade supralegal. Confira-se:

PRISÃO CIVIL DO DEPOSITÁRIO INFIEL EM FACE DOS TRATADOS INTERNACIONAIS DE DIREITOS HUMANOS. INTERPRETAÇÃO DA PARTE FINAL DO INCISO LXVII DO ART. 5º DA CONSTITUIÇÃO BRASILEIRA DE 1988. PRECEDENTES - PLAUSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO - CONFIGURAÇÃO DO “PERICULUM IN MORA” - MEDIDA CAUTELAR DEFERIDA.” (ADI 4.015 MC, Rel. Min. Celso de Mello, Pleno, DJe de 06/12/2014). [...] O rito procedimental do   habeas corpus segundo a Constituição Federal, a Convenção Americana de Direitos Humanos e o Código de Processo Penal. [...] Isso se deve ao caráter supralegal que os tratados sobre direitos humanos possuem no ordenamento jurídico brasileiro, como ficou assentado pelo Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 349.703, relator para acórdão o Min. GILMAR MENDES, Pleno, DJe de 05/06/2009: POSIÇÃO HIERÁRQUICO-NORMATIVA DOS TRATADOS INTERNACIONAIS DE DIREITOS HUMANOS NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO. Desde a adesão do Brasil, sem qualquer reserva, ao Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos (art. 11) e à Convenção Americana sobre Direitos Humanos - Pacto de San José da Costa Rica (art. 7º, 7), ambos no ano de 1992, não há mais base legal para prisão civil do depositário infiel, pois o caráter especial desses diplomas internacionais sobre direitos humanos lhes reserva lugar específico no ordenamento jurídico, estando abaixo da Constituição, porém acima da legislação interna. O status normativo supralegal dos tratados internacionais de direitos humanos subscritos pelo Brasil torna inaplicável a legislação infraconstitucional com ele conflitante, seja ela anterior ou posterior ao ato de adesão (BRASIL. Supremo Tribunal Federal, ADI 5240,2015).

Entretanto, apesar da posição hierarquicamente superior dos Tratados que versam matérias sobre Direitos Humanos posicionarem-se no ordenamento jurídico interno em patamar superior ao Código de Processo Penal, nota-se que o instituto da Audiência de Custódia não se encontra regulamentado na legislação interna e, consequentemente, não especifica o regramento da matéria.  Em que pese, adverte o professor Paiva (2015. p. 34) pode-se abstrair que os procedimentos previstos pela Audiência de Custódia, em outros países, há muito são uma situação corriqueira, o que no Brasil, somente após 1992 passou a ser um tema aplicado pelo Sistema Processual Penal, porém, ainda, por demais debatido e controvertido.

Diante disso, verifica-se que pouco a pouco, no Brasil, a liberdade foi se consolidando como um direito essencial à dignidade humana, respaldada no ordenamento constitucional e na normatividade internacional. Por liberdade, a Comissão Nacional da Verdade (CNV) compreende, de acordo com a jurisprudência das cortes internacionais, como sendo o poder de escolher livremente as opções e circunstâncias que conferem sentido à sua existência, conforme suas próprias convicções. Segundo o Relatório da Comissão, tais direitos impõem “[...] limites expressos à atuação do Estado e de seus agentes, especialmente quando são aplicadas medidas de coerção aos cidadãos. Qualquer forma de privação ilegal e arbitrária da liberdade dos indivíduos deve ser considerada proibida. Trata-se de uma proibição de caráter imperativo, imposta a todos os Estados (norma de jus cogens)” (BRASIL, 2014, Cap.VII. p. 280).

Fatos recentes no Brasil demonstram que medidas buscando evitar violações de direitos, com a privação de liberdade abusiva, propiciaram e contribuíram para o surgimento da Audiência de Custódia, objetivando tentar reduzir arbitrariedades, sobretudo, quanto ao encarceramento desnecessário. O Brasil, como signatário dos Tratados e Convenções Internacionais de Direitos Humanos citados, se obrigou a instituir a Audiência de Custódia. Apesar disto, apenas no ano de 2011 foi apresentada uma proposta de Projeto de Lei no Senado Federal (PLS) nº 554/2011, visando modificar o Art. 306 do CPP[13], acrescentando-se os seguintes pressupostos:

§ 1º No prazo máximo de vinte e quatro horas após a prisão em flagrante, o preso será conduzido à presença do Juiz para ser ouvido, com vistas às medidas previstas no art. 310 e para que se verifique se estão sendo respeitados seus direitos fundamentais, devendo a autoridade judicial tomar as medidas cabíveis para preservá-los e para apurar eventual violação.  § 2º Na audiência de custódia de que trata o parágrafo 1º, o Juiz ouvirá o Ministério Público, que poderá, caso entenda necessária, requerer a prisão preventiva ou outra medida cautelar alternativa à prisão, em seguida ouvirá o preso e, após manifestação da defesa técnica, decidirá fundamentadamente, nos termos do art. 310. § 3º A oitiva a que se refere o parágrafo anterior será registrada em autos apartados, não poderá ser utilizada como meio de prova contra o depoente e versará, exclusivamente, sobre a legalidade e necessidade da prisão; a prevenção da ocorrência de tortura ou de maus-tratos; e os direitos assegurados ao preso e ao acusado.  § 4º A apresentação do preso em juízo deverá ser acompanhada do auto de prisão em flagrante e da nota de culpa que lhe foi entregue, mediante recibo, assinada pelo Delegado de Polícia, com o motivo da prisão, o nome do condutor e os nomes das testemunhas.  § 5º A oitiva do preso em juízo sempre se dará na presença de seu advogado, ou, se não o tiver ou não o indicar, na de Defensor Público, e na do membro do Ministério Público, que poderá inquirir o preso sobre os temas previstos no parágrafo 3º, bem como se manifestar previamente à decisão judicial de que trata o art. 310 deste Código (BRASIL, 2011, PLS nº 554).

Por outro lado, Pires (2016, p.7) salienta que, diante da inércia do Poder Legislativo Federal em votar o PLS 554/11, bem como as superlotações dos presídios brasileiros, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), pretendendo implantar a Audiência de Custódia, com a maior brevidade possível, impôs diretrizes e regulamentou todos os procedimentos, iniciando-se por alguns Tribunais Criminais de São Paulo (capital), incentivando o início dos trabalhos, a título de projeto piloto.

Ao abordar esse cenário, a implementação da Audiência de Custódia, sublinha Pires (2016, p.7) que o “[...] referido projeto foi implantado através do Provimento Conjunto 3/2015, da presidência do Tribunal de Justiça do estado, em conjunto com o Conselho Nacional de Justiça e do Ministério da Justiça”.

Subjacente a esta proposta da implementação do Provimento Conjunto 03/2015, do CNJ[14], como afirma Pires (2016, p. 7) “o Estado do Maranhão foi o primeiro a regulamentar a prática das audiências de custódia no Brasil, antes mesmo do projeto piloto instituído pelo CNJ em São Paulo, no dia 10 de novembro de 2014, quando o Tribunal de Justiça do Maranhão, por meio do Provimento nº 14/201412 da Corregedoria”[15]. Tal medida, que foi adotada por outros Estados, e em 14/10/2015, pelo Distrito Federal (DF) fecha o ciclo de implantação do projeto em todas as unidades da Federação.

Contrário a isso, Pires (2016, p.9) acrescenta que, no estado de São Paulo, membros do Ministério Público paulista se mostraram contrários à implantação da Audiência de Custódia. A Associação Paulista do Ministério Público (APMP), que representa os membros do órgão no estado, tentou suspender a implantação dessas audiências, por meio da alegação de que a medida é "um remédio errado para uma doença evidente"[16]. Para a APMP, discorre Luchete (2015), apenas uma lei federal poderia ter determinado esse modelo. Como o Tribunal de Justiça de São Paulo criou a medida por um provimento, a Associação alega que a corte quis legislar por conta própria, fixando regras para a polícia e para o Ministério Público. Tal pleito foi rejeitado pelo desembargador relator do Tribunal de Justiça de São Paulo ao concluir que essa não era a via adequada para manejar Mandado de Segurança em face da implantação do referido projeto, denegando liminar em Ação de Mandado de Segurança.

E a esse respeito, ainda, a Associação dos Delegados de Polícia do Brasil – ADEPOL/BRASIL, ajuizou ação direta de inconstitucionalidade junto ao Supremo Tribunal Federal, como anteriormente mencionado, ADI 5240, com pedido de medida cautelar, arguindo a inconstitucionalidade da totalidade dos dispositivos do Provimento Conjunto 03/2015, da Presidência do Tribunal de Justiça e da Corregedoria-Geral de Justiça do Estado de São Paulo (TJSP), que disciplinou as audiências de custódia no âmbito daquele tribunal, nos seguintes termos:

[...] alega a autora que é entidade de classe de âmbito nacional, atuando na defesa das prerrogativas, interesses e direitos de Delegados de Polícia, civis e federais, em mais de nove Estados da Federação, de modo que teria legitimidade para ajuizar a presente ação direta de inconstitucionalidade, com base no artigo 103, inciso IX, da Constituição Federal. Também sustentou a pertinência temática da ação, uma vez que a norma impugnada instituiria deveres funcionais para os Delegados de Polícia de São Paulo, bem como o seu cabimento para a impugnação de ato normativo regulamentar, uma vez que, no seu entender, o provimento impugnado teria caráter inovador na ordem jurídica e não meramente regulamentar, sendo possível, assim, o seu controle de constitucionalidade pela via direta. No mérito, arguiu que o regramento da audiência de custódia, por ter natureza jurídica de norma processual, dependeria da edição de lei federal, por força dos artigos 22, inciso I, e 5º, inciso II, da Constituição Federal, havendo, inclusive, projetos de lei em tramitação na Câmara dos Deputados e no Senado tratando do assunto (projetos de lei nº 7.871/2014 e 554/2011, respectivamente). Dessa forma, o provimento do TJSP estaria suprindo lacuna legal e extrapolando de forma inconstitucional o poder regulamentar daquele tribunal. Prossegue a autora aduzindo que a Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de San José da Costa Rica) tampouco poderia servir de fundamento para a edição do provimento atacado, visto que, segundo entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Recurso Extraordinário 466.343, tratados internacionais sobre direitos humanos ratificados pelo Brasil ingressariam no ordenamento jurídico nacional com status supralegal, de modo que, na sua ótica, não seria possível a sua regulamentação direta através da espécie normativa empregada pelo Tribunal de Justiça de São Paulo. Por fim, apontou a inconstitucionalidade da norma impugnada à luz do princípio da proibição do excesso e a existência de dificuldades operacionais na execução das audiências de custódia, requerendo, liminarmente, a suspensão da eficácia do Provimento Conjunto 03/2015 e, no mérito, a declaração da sua inconstitucionalidade integral (BRASIL. Supremo Tribunal Federal, ADI 5240, 2015).

A esse respeito, o Supremo Tribunal Federal, ao finalizar a análise de cada um dos dispositivos arguidos do provimento 03/2015, salientou que esses limitaram-se, tão somente, a regulamentar previsões legais e convencionais já referidas, sem, contudo, extrapolar ou contrariar o conteúdo de tais normas. Portanto, o provimento explicitou de maneira esparsa dispositivos da Convenção Americana sobre Direitos do Homem e do Código de Processo Penal, oportunizando uma melhor compreensão, de maneira mais clara e sistemática, indispensável ao cumprimento das normas legais e convencionais vigentes sobre a matéria. Porém, tal compreensão não possibilita a promoção de um controle de sua constitucionalidade, a fim de obstar ou resolver possível inconformismo entre esse regulamento e a lei. Assim, o STF deixa de conhecer a ação direta de inconstitucionalidade quanto aos artigos arguidos do Provimento Conjunto 03/2015 do TJSP.

Nesse amplo contexto de discussões, com mais uma provocação da Suprema Corte, por ocasião, favorável à adoção da Audiência de Custódia, registra-se que o Partido Socialismo e Liberdade – PSOL buscou, por meio da arguição de descumprimento de preceito fundamental (ADPF) – ADPF 347/15, com pedido de medida liminar, que fosse reconhecida a figura do “estado de coisas inconstitucionais” relativamente ao sistema penitenciário brasileiro e à adoção de providências estruturais em face de lesões a preceitos fundamentais dos presos, que, naquela oportunidade, alegava-se decorrerem de ações e omissões dos Poderes Públicos da União, dos Estados e do Distrito Federal[17].

De maneira breve pode-se citar, também, a título de contribuição ao estudo, que, a referida ADPF 347/2015, sustentou na argumentação e debates questões sobre o cenário acerca da violação de diversos preceitos fundamentais da Constituição de 1988: o princípio da dignidade da pessoa humana (artigo 1º, inciso III), a proibição da tortura, do tratamento desumano ou degradante (artigo 5º, inciso III) e das sanções cruéis (artigo 5º, inciso XLVII, alínea “e”), assim como o dispositivo que impõe o cumprimento da pena em estabelecimentos distintos, de acordo com a natureza do delito, a idade e sexo do apenado (artigo 5º, inciso XLVIII), o que assegura aos presos o respeito à integridade física e moral (artigo 5º, inciso XLIX) e o que prevê a presunção de não culpabilidade (artigo 5º, inciso LVII), os direitos fundamentais à saúde, à educação, à alimentação apropriada e o acesso à Justiça[18].

Após o julgamento dessa ADPF, em diferentes medidas, assevera Oliveira (2016, p.327) que a Lei nº 12.403/11, anteriormente introduziu alterações no texto legal do Código de Processo Penal; porém, ainda representava modesta contribuição que não foi ao encontro do arguido pela ADPF 347/15. A propósito, diz Oliveira “[...] a origem da Audiência de Custódia está fulcrada em pactos internacionais de Direitos Humanos dos quais o Brasil é signatário e a sua finalidade foi estabelecer no Sistema Processual brasileiro, evolução essa a qual não pode deixar de acompanhar” (OLIVEIRA, 2016, p.327), pois, percebe-se que foi o ponto central da ADPF 347/15.

Por certo, é impossível comparar realidades, mas até aqui percebeu-se que a evolução processual foi por demais importante para delinear os contornos da proposta do procedimento pré-processual da Audiência de Custódia. Todavia, há vários momentos de relevante importância nessa evolução; citá-los até aqui enriquece a reflexão. Mas, na verdade, é imprescindível destacar a ação do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) diante do passo decisivo para a regulamentação, sistematização e implementação desse instituto no Brasil, a partir da Edição da Resolução 213/15, a qual procurou uniformizar os procedimentos da realização dessa Audiência, com base no uso das atribuições legais e regimentais do seu Presidente. Essa Resolução trouxe luz a questões que ainda serão percorridas e discutidas nesse estudo.

2.2 Princípios Constitucionais e Processuais que norteiam a Audiência de Custódia 

Ao ser estudada em termos de preservação de garantias individuais, a adoção da Audiência de Custódia resguarda direitos fundamentais do cidadão perante o poder persecutório do Estado, conforme alude Pires (2016, p.258), ao dizer que o instituto reduz a prática do encarceramento e a possibilidade de o Poder Judiciário aplicar outras medidas cautelares. Essas garantias são inspiradas em Princípios Constitucionais e Processuais que orientam a implementação do instituto.

2.2.1 Princípio da Dignidade da Pessoa Humana 

 Cabe ressaltar ser inquestionável que um dos princípios mais relevantes na aplicação dos Direitos Humanos, e o de maior influência de todo o sistema jurídico, principalmente à implementação da Audiência de Custódia, perpassa o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana, expresso no Art. 1º, Inciso III da Constituição Federal.[19]Tendo em vista a aplicação do princípio da dignidade da pessoa humana, verifica-se que o processo penal deixa de servir apenas como instrumento de imposição de pena a qualquer custo; pelo contrário, como afirma Silveira (s.d., p.6)*.

passa ter a ideia de ser ele um instrumento investigatório, desenvolvido com fiel observância ao devido processo legal, em diversos aspectos, que visa a apurar as circunstâncias em que um determinado fato com relevância criminal ocorreu, com vistas a apontar ou não a responsabilidade penal do acusado, sem comportar práticas que exponham o homem a situações degradantes, de vexame ou de tortura (SILVEIRA, s.d., p.6).

É possível avaliar que, contando com quase trinta anos da vigência da Constituição Federal e passados mais de vinte da possibilidade de o preso ser entrevistado por uma autoridade judiciária quando de sua prisão, impõe-se que o Estado brasileiro assegure a eficácia dos mandamentos supralegais firmados ao cumprir esse direito sob o risco de desrespeitar a dignidade das pessoas presas. Assim sendo, o tema também é debatido por Silveira (s.d., p. 6) ao reafirmar que

Garantido o contato pessoal com a autoridade judiciária, o preso poderá expor a sua situação social, familiar e profissional, podendo neste momento demonstrar que faz jus ao direito da liberdade provisória ou mesmo à substituição da prisão cautelar por outra medida menos gravosa, como as inseridas no sistema através da Lei 12.403/2011(SILVEIRA, s.d., p.6).

2.2.2 Princípio do Devido Processo Penal

É imperioso considerar que o devido processo legal ingressa no ordenamento jurídico a ideia da elaboração de um procedimento legal. Isso se dá em razão de que é por meio dele que o preso pode deduzir sua ampla defesa e o seu contraditório. Tal princípio encontra-se previsto no art. 5º, Inciso LIV, da CR[20]. Todavia, assim como a Audiência de Custódia, mesmo com a regulamentação proposta pelo CNJ para a sua procedimentação, esse instituto decorre da normatização de normas internacionais, as quais não descrevem um rito próprio para a sua realização. Assim, não haverá afronta ao Princípio do Devido Processo Legal a partir do momento em que se observem as garantias e os direitos fundamentais do preso e o seu recolhimento e condução sem demora à presença de uma autoridade judiciária para a adoção das medidas previstas nas normas supralegais. Cumpre salientar que, quando da normatização, em âmbito do ordenamento jurídico processual penal pátrio, será possível com mais nitidez ver a configuração desse princípio nas Audiências de Custódia promovidas[21].

2.2.3 Princípio da Ampla Defesa

Não é despiciendo citar que o Princípio da Ampla Defesa assegura o mais legítimo dos direitos do homem, a sua defesa. Para Pires (2016, p.10), esse é o princípio que assegura a defesa mais ampla possível ao preso. É o princípio que garante a defesa no âmbito mais abrangente possível. Está previsto no art. 5º, LV, da CR[22], sendo comportados por esse princípio manejar todas e quaisquer modalidades de provas legítimas no ordenamento jurídico, ou seja, a ampla defesa será assegurada “com os meios e recursos a ela inerentes”   Pires (2016, p.10). Neste contexto, diz Pires (2016):

[a] ampla defesa é cláusula de garantia individual instituída precisamente no interesse do acusado.  A Audiência de Custódia tem como uma de suas finalidades a oitiva do acusado pelo magistrado possibilitando, assim, o contraditório e a ampla defesa e, não levando em consideração apenas o auto de prisão em flagrante lavrado pela autoridade policial (PIRES, 2016, p. 10).

Distingue-se no processo penal duas formas de ampla defesa: uma considerada técnica, que será prestada por um advogado; e a outra, pelo próprio preso, denominada de autodefesa. Esta última, segundo Silveira (s.d., p. 8)

[...] no nosso sistema processual penal tem lugar principalmente no ato de interrogatório, oportunidade que o acusado tem o direito de não se autoincriminar (nemo tenetur se detegere) e também o de se entrevistar diretamente com o seu julgador, expondo-lhe a sua versão dos fatos e os motivos que geraram aquela prática (SILVEIRA, s.d., p.8). 

2.2.4 Princípio do Contraditório

Expressamente previstos no art. 5°, inc. LV, da CR, “aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e a ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes” [23]. No CPP, especificamente, no art. 310, não há previsão de entrevista do preso com a autoridade judiciária (Juiz) e com os demais sujeitos processuais (membro do Ministério Público e o Defensor).

É importante salientar que, com a previsão da Audiência de Custódia esse contraditório deve ser garantido. Logo, em reforço a essa posição Silveira (s.d., p. 9) salienta que “eventuais provas produzidas nessa audiência estarão acobertadas pelo manto do contraditório e poderão ser utilizadas na formação do livre convencimento do futuro juiz da causa, com efeitos similares à produção antecipada de provas” [24].

Cita Pires (2016, p.11) que “durante a realização da audiência de custódia o autuado poderá exercer seu direito de conhecer e contradizer os fatos descritos no auto de prisão em flagrante”. Entretanto, a produção antecipada de provas para instruir futura ação penal não constitui objeto da Audiência de Custódia, pois suas finalidades dizem respeito ao cumprimento da pauta de direitos humanos do preso em flagrante delito, seja em respeito à sua dignidade, seja quanto à avaliação de fundamentos para a ratificação da custódia cautelar com a consequente conversão em prisão preventiva, a teor das normas supralegais e do Regulamento estabelecido pelo CNJ. Todavia, segundo Pires (2016, p. 11) a observância do princípio do contraditório ajuda a compreender a realização da Audiência de Custódia. Esse princípio é aplicado em fase pré-processual com o status de direito de audiência, ou seja, conforme previsto no art. 306 do CPP -, direito de ouvir o preso. Da mesma maneira, deve-se observar a aplicação do art. 282, §3º, quando o contraditório permeia a adoção de qualquer aplicação de medida cautelar.

2.2.5 Princípio da Presunção de Inocência ou da Não Culpabilidade

No que concerne ao Princípio da Presunção de Inocência, previsto na Constituição Federal, no art. 5º, inciso LVII, o caráter desse princípio é dialogar com três dimensões, como nos permite refletir Pires (2016, p.11), sobretudo, na Audiência de Custódia. A primeira é a dimensão probatória, na qual estabelece o ônus da prova subjetiva (acusação) e o ônus da prova objetiva (defesa) -, regra conforme o brocardo “in dubio pro reo”. A segunda é a dimensão de garantia, ocasião em que o Estado deve envidar esforços para observar o estado de inocência do preso, sem antecipar a culpa, tratando a pessoa do preso como inocente. A terceira e última é a regra do próprio tratamento em audiência de custódia, a qual veda qualquer tipo de prejulgamento antecipando culpa ao preso; esse deve ser tratado como inocente.

2.2.6 Demais princípios orientadores da Audiência de Custódia

O princípio do nemo tenetur se detegere, desenvolvido a partir da dignidade da pessoa humana, segundo Silveira (s.d., p.11) traz a premissa de que não se pode exigir que a pessoa acusada de um crime, e sujeita a ser punida por isso, seja obrigada a fornecer elementos que colaborem na demonstração de sua culpa. A CR/88 incorporou o princípio em tela, dispondo em seu art. 5°, LXIII que “o preso será informado de seus direitos, dentre os quais o de permanecer calado[...]”[25], garantindo desta forma o direito de não se autoincriminar. Especificamente no que toca à audiência de custódia, o sucesso dela, enquanto medida de implementação dos direitos humanos ao sujeito preso em flagrante delito, passa necessariamente pelo cumprimento dos postulados extraídos da vedação à imposição ou sugestão de autoacusação, o que pressupõe uma especial atenção à advertência clara e específica do direito de manter-se calado e de não se autoincriminar, no primeiro momento de contato do preso com a autoridade judiciária que estiver presidindo o ato[26].

            Explicadas essas questões quanto à não incriminação, é possível tratar do princípio da razoável duração do processo. Esse princípio, como afirma Silveira (s.d., p. 11)

 no que diz respeito ao processo penal, a questão é de suma importância, pois a não observância da celeridade importa em negar à Sociedade uma resposta à sua pretensão de ver o réu julgado pela conduta antissocial que lhe é imputada. Por outro lado, o acusado tem o direito de não sofrer com as consequências do processo penal além do tempo necessário, submetendo-se por largo lapso temporal aos notórios efeitos decorrentes da condição de réu em um processo penal, o que já constitui um drama para o indivíduo, com reflexos em sua dignidade (SILVEIRA, s.d., p.11)*.

Por outro lado, a audiência de custódia deve observar o princípio da simplicidade, evitando atos desnecessários e burocráticos, de modo a garantir que não seja prejudicada por equivocadas alegações de ela se constituir em mais um obstáculo de celeridade ao processo.

Para Silveira (s.d., p.12), na forma como se vem instituindo a Audiência de Custódia, é preciso atentar para o princípio da individualização da prisão ou das cautelares. Esse princípio impõe ao juiz concretamente a necessidade de individualizar qual o tipo de medida cautelar a ser adotada, pois essa pode vir a privar direitos da pessoa do preso. O juiz precisa fundamentar qual o perigo processual observando o periculum libertatis, a fim de aplicar uma medida compatível[27].

Além disso, extrai-se dos artigos 9º e 10º da Resolução do CNJ, número 213 de 2015 que regulamentou a apresentação da pessoa presa em Audiência de Custódia, o princípio da provisoriedade. Sumamente este princípio impõe que as medidas adotadas não podem ir além do que for julgado necessário, devendo ser observados os prazos de cumprimento das medidas e sua reavaliação periódica[28]. Sua inspiração também se baseia no art. 7º, item 5, da Convenção Americana de Direitos Humanos.

  É possível destacar ainda os princípios da proporcionalidade e da homogeneidade na realização da Audiência de Custódia, ou seja, o juiz deve, na Audiência, avaliar qual a medida cautelar mais adequada. Talvez o aprisionamento não seja a melhor opção, por isso, adota-se outra, que será levada ao processo posteriormente. Já este estabelece uma homogeneidade entre o caso e a medida cautelar aplicada. Esse é um exercício que deve ser feito pelo juiz com aspecto prospectivo[29].


3. AUDIÊNCIA DE CUSTÓDIA E O PROCESSO PENAL CONSTITUCIONAL

Atualmente o ordenamento processual penal assume um contexto de aperfeiçoamento, sobretudo, à luz das normas internacionais que passam a ser aplicadas no ordenamento jurídico interno. Por óbvio, a muito o que ser feito; porém, com a observância do direito à audiência pré-processual é possível ver avanços quanto aos direitos humanos da pessoa presa. Assim, pode-se dizer que o processo penal brasileiro passa a aplicar normas supralegais, e essas referências possibilitarão a elaboração de norma processual penal com nitidez constitucional ao serem aprovadas nas casas legislativas propostas já elaboradas.

A exemplo disto, a Audiência de Custódia constitui-se em um avanço significativo rumo à evolução contemporânea de constitucional do processo penal brasileiro, apesar das críticas que ainda persistem, as quais são injustas e infundadas. Senão, vejamos: se o preso não obtivesse essa oportunidade de “sem demora” estar diante da autoridade judiciária (Juiz), a fim de que seus direitos fundamentais fossem garantidos quanto às condições da prisão e acerca de sua integridade física, isso somente se efetivaria ao final da instrução processual, por meio da audiência de interrogatório, certamente, meses após a prisão. Daí esse iria, diante do juiz, narrar sua versão sobre a ocasião de sua prisão, eventuais arbitrariedades ou ilegalidades sofridas, sua situação societária e demonstração de que não oferece risco em responder o processo sem a necessidade de aprisionamento. Entre os objetivos da Audiência de Custódia, tem-se a aferição de garantias de direitos os quais serão sinteticamente discutidos.

3.1         Objetivos e garantias asseguradas na Audiência de Custódia 

A Audiência de Custódia, segundo Paiva (2015, p.3*) surge para contribuir e ajustar o processo penal brasileiro aos Tratados Internacionais de Direitos Humanos[30]. De igual modo, Oliveira (2016, p.317) ressalta que o objetivo da realização dessa audiência tem de ser regra adotadas pelos Tribunais “[...] para que sejam cumpridas as normas de direitos humanos dando maior valor às garantias constitucionais, em relação à pessoa presa” (OLIVEIRA, 2015, p. 317).

 Oliveira (2016, p.317) afirma, ainda, tratar-se da oportunidade da “apresentação do autuado preso em flagrante delito perante um juiz, permitindo-lhes o contato pessoal, de modo a assegurar o respeito aos direitos fundamentais da pessoa submetida à prisão”. Já Paiva (2015, p.3-4) lembra que outro e fundamental objetivo relaciona-se com a prevenção da prática de tortura policial, ao assegurar a efetivação do direito à integridade pessoal das pessoas presas. Assim, segundo o autor “prevê o Art. 5.2 da CADH “Ninguém deve ser submetido a torturas, nem a penas ou tratos cruéis, desumanos ou degradantes. Toda pessoa privada de liberdade deve ser tratada com o respeito devido à dignidade inerente ao ser humano” (PAIVA, 2015, p.3-4)[31].

Por meio da realização dessa audiência, busca-se, também, fazer valer a regra dos Princípios Constitucionais e Processuais Penais, já mencionados, citando, a título de exemplo, o princípio da Excepcionalidade, que dialoga com o princípio da Presunção de Inocência, pelo qual a prisão cautelar deve ser tratada como uma cautelaridade máxima, ou seja, como a última punição atribuível ao caso. Isso será evidenciado, quando da realização da Audiência de Custódia, ao evitar prisões ilegais. De acordo com Bernieri (2015) deve ser de fundamental importância a minuciosa análise da prisão realizada pelo magistrado

[...] para que não haja constrangimentos desnecessários ao cidadão. Ora, fica mais difícil interpretar a legalidade da mesma baseado apenas no auto de prisão em flagrante, o qual possui somente a interpretação do caso feita pela acusação (delegado de polícia), não possuindo, portanto, a manifestação da defesa. Claro que, há o interrogatório do preso, porém este não pode ser visto como uma defesa real, em virtude de que muitas vezes o sujeito prefere silenciar. Além disso, com a apresentação do sujeito ao juiz, a análise poderá ser melhor, visto que o réu terá a chance de defender-se pessoalmente e na presença de seu defensor, dando sentido ao Princípio da Paridade das Armas, pelo qual ambas as partes devem possuir a mesma chance de ataque e contra-ataque. Ainda, também será observado o Princípio da Excepcionalidade da Prisão Cautelar, que deverá ser a última opção a caber ao caso concreto, já que a prisão deve ser tratada como ultima ratio (BERNIERI, 2015, p.5).

Neste sentido, Bernieri (2015) lembra que outra grande contribuição é diminuir a hiperlotação nas entidades prisionais. Para essa autora,

Hoje, segundo dados do Conselho Nacional de Justiça, o Brasil possui mais 563.526 pessoas presas, entre as quais 42% seriam de pessoas presas provisoriamente, sendo que entre 1990 e 2013, o crescimento da população carcerária no Brasil foi de 507 %, a segunda maior taxa de crescimento prisional do mundo, havendo um déficit de 206.307 vagas no sistema carcerário. (BERNIERI, 2015, p. 5-6)

Ora, perante estes dados e a pura realidade prática, Bernieri (2015, p. 5-6) ressalta a urgente necessidade de o Estado providenciar mudanças no sistema carcerário do país:

Por isso, a Audiência de Custódia busca, também, diminuir a hiperlotação nos presídios nacionais, que só vem aumentando nos últimos tempos. Ademais, só será posto em liberdade quem seria vítima de um encarceramento ilegal, pois se a prisão for necessária, o sujeito será mantido preso. Ou seja, o juiz verificará a legalidade da prisão e só manterá preso quando esta for a medida mais adequada, valendo-se na prisão como ultima ratio e respeitando a regra de que todos são inocentes até que haja uma sentença penal condenatória” (BERNIERI, 2015, p. 5-6).

Não é por acaso que Oliveira afirma que outro objetivo pretendido com a implementação da Audiência de Custódia é

a apreciação mais adequada e apropriada da prisão que se impôs, considerando a presença física do autuado em flagrante, a garantia do contraditório e a prévia entrevista pelo juiz da pessoa presa. Permite que o juiz, o membro do ministério público e da defesa técnica conheçam de possíveis casos que inviabilize a prisão e tomem as providências. Previne o ciclo da violência e da criminalidade, quando possibilita ao juiz analisar se está diante da prisão de um criminoso ocasional, contumaz ou daqueles envolvidos com facções penitenciárias (OLIVEIRA, 2016, p.317-318).

3.2               Prazo para a apresentação de preso em Audiência de Custódia

O prazo da apresentação do preso em Audiência de Custódia, vê-se que a concepção que se tem é que, há no direito processual penal brasileiro uma referência temporal relativa ao prazo, adotando-a para o caso da apresentação do preso em Audiência de Custódia, no Brasil, correspondente à lavratura do Auto de Prisão em Flagrante (APF), como estatuído no art. 306, §1º do Código de Processo Penal vigente. Da mesma forma, esse prazo é previsto na regulamentação constante do art. 1º, da Resolução nº 213/15, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) que traz esse mesmo prazo de vinte e quatro horas. Sob essa perspectiva, observar-se que adota-se esse lapso temporal entre a prisão e a apresentação do preso ao Juiz de custódia preservando os contornos de cautelaridade e salvaguardando ao processo penal e a aplicação da pena, de outra maneira, implicará na restrição do direito de ir e vir de um cidadão presumidamente inocente. Assim sendo via de regra, como consequência, reafirma Paiva apud Bernieri (2015) que:

o imputado deverá ser apresentado em, no máximo, vinte e quatro horas ao juiz, que fará sua oitiva na presença do Ministério Público e da Defesa (defensoria pública ou advogado particular), analisando a legalidade de sua prisão, bem como possíveis tratamentos desumanos ou degradantes (tortura) que o indivíduo possa ter sofrido, e, ainda, analisará se estão lhes sendo assegurados todos os demais direitos que a lei lhe garante (PAIVA apud BERNIERI, 2015, p. 3)[32].

Esse prazo garante o direito de audiência, porém, a despeito disto diz Forte (2016, p.1*) que o exercício nos casos de prisão encontra-se expressamente previstos nos artigos 7, item 5 da Convenção Americana de Direitos Humanos (CADH), e 9, item 3 do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos (PIDCP) que expressam que “toda pessoa presa, detida ou retida deve ser conduzida, sem demora, à presença de um juiz” [33].

E, além disso, a Convenção Europeia dos Direitos do Homem (CEDH), em seu art. 5, item 3, faz a previsão da expressão “imediatamente”[34]. É bem verdade que nem o PIDCP, nem a CADH, nem a CEDH fizeram expressa previsão de um prazo que se ajusta a expressão “sem demora” ou “imediatamente”. Semanticamente, temos que a expressão “sem demora” pode significar imediatamente, depressa, ato contínuo, logo após etc. Porém, não há como se precisar um lapso temporal[35]. Não por acaso, a Resolução do CNJ, nº 213/15 dispõe em seu art. 1º que a Audiência de Custódia deverá ser realizada em até 24 horas da comunicação do flagrante, à autoridade judicial competente[36]. Atualmente, essa comunicação da prisão em flagrante à autoridade judiciária competente é feita com a remessa dos autos do Auto de Prisão em Flagrante (APF), o que deve ocorrer como estabelecido no Código de Processo Penal no prazo de até vinte e quatro horas, contatos da voz de prisão em flagrante[37].

Oliveira (2016, p.322) sugere que o prazo para a Audiência de Custódia possa chegar a quarenta e oito horas, contados do momento em que o preso é capturado e recebe a voz de prisão em flagrante, levando-se em conta que:

A autoridade de polícia judiciária terá até vinte e quatro horas para finalizar e entregar o APF ao juízo competente, a contar da voz de prisão em flagrante do suspeito. Após a entrega dos autos do APF na distribuição ou protocolo judiciário, a autoridade judiciária terá até vinte e quatro horas para realizar a audiência de custódia” (OLIVEIRA, 2016, p.322).

Diante do exposto, é possível considerar, como discorre Cardoso (2016):

 No âmbito global, o Comitê de Direitos Humanos da ONU já se manifestou que ‘um prazo de 48 horas é normalmente suficiente para trasladar a pessoa e preparar para a audiência judicial; todo prazo superior a 48 horas deverá obedecer a circunstâncias excepcionais e estar justificado por elas’, completando, ainda, que ‘no caso de menores deverá aplicar-se um prazo especialmente restrito, por exemplo de 24 horas (CARDOSO, 2016, p.2).

Neste sentido, alega Cardoso (2016):

Da mesma forma, também caminhou a Resolução n. 213 do CNJ que fixou o prazo de 24 horas para ocorrer o encaminhamento do preso. Ainda que o nosso Código de Processo Penal, o PIDCP e a CADH silenciem a respeito de um prazo máximo que se ajuste a expressão “sem demora”, a solução dada pela doutrina amparada nas decisões da Corte Interamericana também nos parece razoável respeitando o direito fundamental do detido. Porém, assim como a própria Corte Europeia de Direitos do Homem já decidiu que a depender do caso, o prazo máximo pode ser flexibilizado em alguns casos especiais, entendemos que essa relativização também possa ocorrer em nosso país, no entanto, como nossa cultura (e legislação) possui um viés autoritário, toda e qualquer relativização deve estar prevista em lei e com necessária justificação empírica a fim impedir que a exceção se torne regra (CARDOSO, 2016, p. 3).

Especificamente no tocante a exceções quanto à dilação do prazo de apresentação do preso em Audiência de Custódia, a Corte Europeia de Direitos do Homem decidiu que a depender do caso, o prazo máximo pode ser flexibilizado em alguns casos especiais. Entende-se, assim, que essa relativização também possa ocorrer em nosso país; no entanto, como nossa cultura (e legislação) possui um viés autoritário, toda e qualquer relativização deve estar prevista em lei e com a necessária justificação empírica, a fim impedir que a exceção se torne regra[38]. Nesse sentido, nas situações excepcionais previstas no art. 1º. § 4º da Resolução nº 213, também deveria o CNJ ter fixado um prazo máximo para as referidas situações excepcionais, visando evitar descumprimentos e arbitrariedades. 

3.3 Efeitos dos atos produzidos na Audiência e sua eficácia probatória no Processo Penal

Para ilustrar o presente tema, faz-se necessário delinear, segundo Oliveira (2015, p.678), que cada modalidade de procedimento deve cumprir o seu papel e suas exigências de bem permitirem a adequada atuação jurisdicional. Em outras palavras, os procedimentos não podem perder de vista a perspectiva do devido processo legal, instituído com o objetivo de garantir, o quanto possível, a realização da justiça penal e da garantia de direitos. Daí, no que se refere à Audiência de Custódia, trata-se de um procedimento e não de um processo. Portanto, sua finalidade e escopo é de garantir direitos, avaliar condições que levaram à restrição de liberdade de uma pessoa presa e verificar a possibilidade de aplicar uma medida cautelar diversa da prisão pena.

Uma das primeiras e constantes preocupações é se nessa audiência, estando presente todos os sujeitos processuais (Juiz, Ministério Público, Defesa e Acusado) uma sentença pode ser prolatada, seja ela absolutória ou condenatória. Diante de tudo que foi estudado, a resposta por certo é um sonoro não. Porém, é preciso reafirmar que essa Audiência de Custódia promove apenas atos pré-processuais, portanto, não se configura em processo judicial. Essa audiência não tem a função de apuração dos elementos que possam avaliar, ou seja, julgar o mérito de futura imputação. Nessa audiência proporciona-se apenas um ato pré-processual para que o preso seja indagado sobre as circunstâncias de sua prisão e da forma como foi tratado, até então, pelas autoridades autoras da sua custódia, ou seja, sua prisão.

A audiência de custódia não é uma audiência para fins de colheita de prova. É o espaço democrático em que a oralidade é garantida. Assim, segundo Lopes Jr. e Rosa (2015) o objeto dessa audiência

[...] é restrito, ou seja, não há interrogatório, nem produção antecipada de provas. Há uma prisão decorrente do flagrante e a necessidade de controle jurisdicional. O ato que era praticado exclusivamente pelo magistrado, sem participação dos jogadores processuais (Ministério Público e Defesa), agora muda completamente sua morfologia. Com isso, se dá também efetividade ao disposto no art. 282, § 3º, do CPP, no sentido de que o contraditório legitima o ato decisório, uma vez que pode acolher e rejeitar os argumentos, conta com a efetiva participação dos agentes processuais” (LOPES JR. e ROSA, 2015, p.8)[39].

Cumpre salientar que não é uma audiência de mérito. Portanto, seu rito é sumaríssimo, podendo ser reduzido a termo, ou, preferencialmente registrado em mídia, nesse caso dispensada a formalização de termo de manifestação da pessoa presa ou do conteúdo das postulações das partes. Esses atos não terão eficácia probatória no processo penal. De tão simples serem os atos é que, diante disto, preservam-se o direito de o preso nada dizer ou dizer apenas sobre os fatos que permitirão ao juiz aplicar uma medida cautelar e avaliar como a prisão foi constituída. Nada há de causar perplexidade ao mencionar que na Audiência de Custódia deve imperar a oralidade e a imediatidade dos atos.

 Ocorre que, tudo que a pessoa do preso disser não pode ser usado em seu desfavor em audiência de interrogatório, que será promovida por ocasião do processo em outra fase. Aliás, tudo que tenha sido formalizado em audiência ficará arquivado na unidade responsável pela Audiência de Custódia, conforme estabelecido em Resolução do CNJ nº 213/15, Art. 8º, §2º e 3º. Apesar de não ser fácil isolar a análise do mérito da adoção da cautelaridade, essa é a essência da implementação da Audiência de Custódia.

Por fim, reafirma-se que aquilo que o preso disser na Audiência de Custódia não tem valor probatório, mesmo que esse venha a confessar o cometimento do delito. Os atos produzidos nessa audiência não se prestam a eficácia probandi. Impõe-se acrescentar que sequer o juiz poderá emprestar possíveis provas produzidas nessa audiência para o processo, pois nada que a pessoa do preso diga em seu desfavor poderá ser fundamento de uma futura condenação. Acontece que pelo que se propõe a realização da Audiência de Custódia, o que for dito pelo preso somente presta-se para que o juiz decida sobre qual cautela deverá ser aplicada, ou seja, dará lastro apenas a uma medida cautelar adequada.

3.4 Entendimento das expressões - “sem demora” e “à presença de um juiz ou outra autoridade autorizada por lei a exercer funções judiciais” - previstas nos Tratados Internacionais de Direitos Humanos        

Na alusão que o dispositivo da Convenção Americana de Direitos Humanos, “artigo 7º - Direito à liberdade pessoal. 5. Toda pessoa presa, detida ou retida deve ser conduzida, sem demora, (grifo nosso) à presença de um juiz ou outra autoridade autorizada por lei a exercer funções judiciais [...]”; inclui-se também o artigo 9.3 do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos (PIDCP) que também expressa que “toda a pessoa presa, detida ou retida deve ser conduzida, sem demora, (grifo nosso), à presença de um juiz”. Pode-se aferir desse sistema normativo que a expressão “sem demora” é ampla e muito vaga. Porém, no exame desse sistema, essas são normas supralegais, o que sugere que, em razão de atender a diversos países que ratificaram esses mesmos Tratados e Convenção, tornam-se silentes a respeito de um prazo que se ajuste a essa expressão e possa amoldar-se a todos, indistintamente.

A solução dada pela doutrina no direito interno parece ser mais razoável ao ter por base e como regra geral a aplicação do prazo previsto no ordenamento jurídico interno equiparado ao prazo da lavratura do Auto de Prisão em Flagrante, conforme o Código de Processo Penal, a teor do Art. 306, §1º que refere-se que “A prisão de qualquer pessoa e o local onde se encontre serão comunicados imediatamente ao juiz competente, ao Ministério Público e à família do preso ou à pessoa por ele indicada”, devendo-se “em até 24 (vinte e quatro) horas após a realização da prisão, ser encaminhado ao juiz competente o auto de prisão em flagrante [...]”, modificação promovida  pela Lei nº 12.403, de 2011, ao Código de Processo Penal Vigente.

Assim, o preso deve ser encaminhado à presença da autoridade judicial no mesmo prazo do encaminhamento do auto de prisão, ou seja, 24 horas. Caso a autoridade policial não encaminhe o preso nesse prazo, a prisão deverá automaticamente ser relaxada, pois essa passa a ser ilegal. Consoante a essa assertiva, vê-se que a Resolução nº 213/15 do CNJ adotou o mesmo prazo como uma obrigatoriedade a ser cumprida, conforme o seu art. 1º “Determinar que toda pessoa presa em flagrante delito independentemente da motivação ou natureza do ato, seja obrigatoriamente apresentada, em até 24 horas da comunicação do flagrante, à autoridade judicial competente, e ouvida sobre as circunstâncias em que se realizou sua prisão ou apreensão” [40].

            Alerta Nicolitt (apud Cardoso, 2016, p. 1)  que “a expressão ‘sem demora’ é mais um dos inúmeros conceitos vagos indeterminados que transitam no ordenamento pátrio e internacional. A vagueza e indeterminação não podem significar motivo para se desrespeitar a garantia fundamental”. Daí no âmbito regional americano, a Corte Interamericana possuir diversos precedentes identificando prazos que violam a proporcionalidade do lapso temporal contida na expressão “sem demora”.

A referida Corte já se pronunciou no sentido de que o encaminhamento do preso à autoridade judicial após quase cinco dias depois de sua detenção caracteriza excesso violador da CADH. Como aborda Cardoso (2016, p.3), exceção feita à situação em que o preso esteja enfermo, a Resolução nº 213/15, em seu art. 4º, §1 excepcionou o prazo para esta situação. Todavia, deveria ter previsto um prazo máximo para que o detido seja encaminhado a autoridade judiciária, sob pena de nulidade da prisão, além do prazo de 24 horas, o prazo mais razoável e condizente com a realidade de diversos países, o qual é perfeitamente aplicável em nossa própria realidade, são 48 horas.

Da mesma maneira, busca-se o entendimento da controvérsia da expressão “à presença de um juiz ou outra autoridade autorizada por lei a exercer funções judiciais”[41] (grifo nosso). Cabe registrar que à luz do art.7, item 5 da Convenção Americana de Direitos Humanos (CADH), surgem dúvidas quanto a “outra autoridade autorizada por lei a exercer funções judiciais”. O questionamento é quanto à possibilidade dessa autoridade ser o delegado. Pode-se dizer que no modelo brasileiro, o delegado não exerce uma função judicial.

O Delegado de Polícia executa uma atividade administrativa, conforme frisa Lopes Jr.e Rosa (2015, p.5), portanto, despida de poder jurisdicional ou função judicial. A propósito a própria Convenção Americana de Direitos Humanos (CADH) já proferiu diversas decisões ao constar que essa expressão deve ser entendida e interpretada conjugada com o disposto no art. 8.1 da CADH que expressa as

Garantias judiciais. 1. Toda pessoa terá o direito de ser ouvida, com as devidas garantias e dentro de um prazo razoável, por um juiz ou Tribunal competente, independente e imparcial, estabelecido anteriormente por lei, na apuração de qualquer acusação penal formulada contra ela, ou na determinação de seus direitos e obrigações de caráter civil, trabalhista, fiscal ou de qualquer outra natureza.  (LOPES JR; ROSA, 2015, p.5*)[42]

Lembram Lopes Jr e Rosa (2015, p.5) que o dispositivo supralegal previsto na Convenção Americana de Direitos Humanos, em reforço a essa perspectiva de interpretação determina que “toda pessoa terá o direito de ser ouvida, com as devidas garantias e dentro de um prazo razoável por um juiz ou tribunal competente, independente e imparcial” (Lopes Jr. e Rosa, 2015. Com isso, descarta-se, de vez, a suficiência convencional da atuação do Delegado de Polícia no Brasil.

Todavia, atualmente, suscita-se que a autoridade de polícia judiciária já exerceria essa atividade. Portanto, argumenta-se que não seria necessário o juiz promover uma audiência com a mesma finalidade, a de analisar as circunstâncias que motivaram a prisão em flagrante, posto que em uma audiência distinta daquela promovida para o interrogatório tenha que avaliar as condições da prisão, sua legalidade e a possibilidade ou não do preso ser alcançado por uma medida cautelar. Isso porque o próprio delegado, ao verificar a necessidade da adoção de uma medida cautelar, a requereria ao juiz.

Ademais, essa autoridade de polícia judiciária (delegado) de tudo lavra-se o pertinente Auto de Prisão em Flagrante, o qual, no prazo de 24 horas, o encaminha à autoridade judiciária para apreciá-lo quanto a questões de legalidade e demais medidas, anteriormente analisadas pela autoridade de polícia judiciária. Da mesma maneira, essa autoridade de polícia judiciária está incumbida de exercer outra função, além da administrativa, que é a de garantia. Ele, por ocasião da prisão, estabelece a controlabilidade, no sentido de atender à proteção e fiscalização da pessoa do preso. Ele pode arbitrar fiança em crime com pena até quatro anos; pode relaxar prisão ao não ratificar o flagrante; adotar medidas de liberdade provisória; pode solicitar exames de Corpo de Delito, entre outras atividades.

Essa visão dogmática de que o delegado cumpre essa função, sendo desnecessária a realização de uma audiência para avaliar a adoção de medidas cautelares ou manutenção da prisão tendo a presença de um juiz, é uma visão respeitável. Mas entende-se que a autoridade competente para cumprir os ditames estabelecidos em normas internacionais e em Resolução estatuída pelo CNJ, nº 213/15, é o juiz. Assim, o regramento estabelecido pela Convenção Americana de Direitos Humanos, no art. 7.5, ao se conjugar com o art. 8.1, verifica-se que a autoridade de polícia judiciária (delegado) não se enquadra no comando normativo supralegal a ser aplicado no Sistema Processual Penal interno.

4 O PAPEL DOS SUJEITOS PROCESSUAIS NAS AUDIÊNCIAS DE CUSTÓDIA

É clássica a lição de que no processo penal a relação jurídica processual possui como protagonistas o juiz, o Ministério Público e a parte passiva, que é o acusado com seu defensor. Portanto, nessa relação jurídica, os sujeitos processuais se relacionam mutuamente, seguindo a tramitação regrada pelo Código de Processo Penal. Afirmam Alencar e Távora apud Tourinho Filho (2012, p.519-520) que os “sujeitos processuais são todas as pessoas que atuam no processo: juiz, partes, auxiliares da Justiça, testemunhas, dentre outros”.

Com a implementação do instituto da Audiência de Custódia, verifica-se um momento considerado pré-processual. Daí a Resolução nº 213/15, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) estabelecer e regulamentar a realização dessa audiência, no âmbito da Justiça brasileira. Assim sendo, estabeleceu-se que devem estar presentes o Juiz[43], que, como sublinha Paiva (2015), exerce o controle judicial imediato e busca evitar a arbitrariedade ou ilegalidade das prisões, cabendo-lhe garantir os direitos do preso, autorizar a adoção de medidas cautelares estritamente necessárias, e procurar em geral, que o imputado seja tratado de maneira coerente com a presunção de inocência[44], bem como o Ministério Público e o Defensor Público ou constituído pelo preso (art. 4º)[45]. Procedimentalmente é inquestionável a viabilidade da Resolução 213/15, do CNJ, pois, nela foi bem delineado o papel de cada sujeito processual durante a realização dessa audiência.

4.1 Atuação do juiz

Não é possível dissociar medidas que visam aprimorar o sistema de garantias legais sem pensar no imprescindível papel que o Juiz assume na Audiência de Custódia. Esse papel é de protagonista, impondo-lhe um dever de agir que, contudo, deve ser exercido nos limites fixados pela Lei. A despeito disso, é fato que o juiz antes apenas avaliava a prisão em flagrante e verificava a alternativa de convertê-la ou não em uma prisão provisória. Valia-se tão-somente de uma provável relação de causa e efeito para propor essa alternativa fundamentada em Autos de Prisão em Flagrante e elaborada pela autoridade de polícia judiciária (delegado).

Esse cenário começou a mudar por meio da ação do Conselho Nacional de Justiça ao editar a Resolução nº 66, de 27 de janeiro de 2009[46]. Na ocasião, estabeleceu-se a obrigatoriedade de o juiz justificar a decisão que mantinha a prisão em flagrante ou sua conversão em uma prisão preventiva, bem como analisava eventual cabimento de liberdade provisória ou relaxamento da prisão ilegal. Porém, a Resolução de nº 87, do CNJ, de 15 de setembro de 2009, dá nova redação ao art. 1º da Resolução nº 66/2009, ao estabelecer que

 Ao receber o auto de prisão em flagrante, o juiz deverá, imediatamente, ouvido o Ministério Público nas hipóteses legais, fundamentar sobre: I - a concessão de liberdade provisória, com ou sem fiança, quando a lei admitir; II - a manutenção da prisão, quando presentes os pressupostos da prisão preventiva, sempre por decisão fundamentada e observada a legislação pertinente; ou III - o relaxamento da prisão ilegal. (BRASIL, CNJ, 2009).

Bonatti, Brunacci e Silva (2014, p. 30) alegam que, duas décadas depois, novo rito procedimental foi encampado pelo ordenamento jurídico com a promulgação da Lei 12.403, de 04 de maio de 2011[47]: “Entre outras considerações, não só impôs ao juiz a obrigatoriedade de justificar a necessidade de conversão da prisão em flagrante em preventiva, como também previu amplo rol de medidas substitutivas à prisão” (Bonatti, Brunacci e Silva, 2014, p.30). Passadas outras seis décadas, ainda se discute a implantação da Audiência de Custódia e o papel do juiz realçado pela sua fundamental importância diante desse contexto.

De maneira breve, pode-se reafirmar, que no prazo de vinte e quatro horas, o juiz, ao receber a pessoa presa, por ocasião da realização da Audiência de Custódia, e o respectivo Auto de Prisão em Flagrante (APF), lavrado pela autoridade de polícia judiciária (delegado),  deve ouvir pessoalmente o detido e valorar todas as explicações que este lhe proporcionar, para decidir acerca da liberação ou manutenção da privação da liberdade sob pena. De acordo com Lopes Jr. e Rosa (2015*)[48], deve “despojar de toda efetividade o controle judicial disposto no artigo 7, item 5 da Convenção”. E a partir daí o juiz presta os esclarecimentos ao preso sobre do que tratará essa audiência, ressaltando as questões que serão analisadas naquela oportunidade (art.8º, I, Res. 213/15, CNJ). Assegurará que o preso não esteja algemado, a menos que haja hipótese de resistência ou fundado receio de que possa ocorrer tentativa de fuga ou indícios de perigo à integridade física do imputado ou a outrem; do que tudo deverá ser justificado por escrito por essa autoridade judiciária (art. 8º, II, Res. 213/15, CNJ).

Por não se tratar de uma audiência de investigação, ocasião em que, não importa se o preso é autor ou não do fato que lhe é imputado, o juiz lhe dará ciência sobre seu direito de permanecer em silêncio (art. 8º, III, Res. 213/15, CNJ). Esse é um momento que se assemelha a de um interrogatório; todavia, é uma entrevista realizada com o preso com a finalidade pro libertatis, sem acarretar nenhum ônus probandi do que ele disser ou lhe for perguntado. Da mesma maneira, o juiz consulta-lhe se a esse foi assegurado a oportunidade do exercício de seus direitos constitucionais inerentes à sua condição, particularmente o direito de consultar-se com um advogado constituído ou defensor público, se foi atendido por um médico e se obteve a possibilidade de comunicar-se com um seu familiar (art.8º, IV, Res. 213/15, CNJ).

Importante é mostrar o impacto da presença física do réu perante o juiz na avaliação da necessidade de custódia cautelar. Em outras palavras, a legalidade e necessidade de custódia cautelar são avaliadas de forma plena sobre os institutos e garantias do processo penal, e proporciona à parte mais vulnerável do processo, ao preso, segurança; isso permite ir ao encontro das garantias previstas pela Constituição Federal e Normas Internacionais de Direitos Humanos. Assim, é possível observar ainda, quando da apresentação do preso nessa audiência, que será oportunizado ao juiz verificar se esse foi submetido a exame de corpo de delito. Por outro lado, se não realizado ou demonstrados registros insuficientes em laudo ou mediante alegação do preso de que houve algum tipo de tortura ou maus tratos no momento posterior à realização desse exame, ou que, esse exame tenha sido realizado na presença de agentes policiais, o juiz prontamente determinará que o preso seja submetido a novo exame, assegurando a legalidade do ato (art.8º, VII, Res. 213/15, CNJ).

É evidenciado ainda que cabe ao juiz indagar da pessoa do preso sobre o tratamento recebido, estando sobre a custódia das autoridades policiais, antes de sua apresentação na audiência, questionando-o sobre possíveis violência ou constrangimentos havidos, que, se constatados, haverá a adoção das providências cabíveis (art.8º, VII, Res. 213/15, CNJ). É de todo importante salientar que no momento da entrevista do juiz com a pessoa presa, sem reserva, verificam-se os limites cognitivos da Audiência de Custódia, ou seja, o cuidado com o conteúdo das perguntas que devem ser dirigidas ao preso. Salienta-se que não é uma audiência de interrogatório; portanto, não pode ser a pessoa do preso indagada quanto a qual crime praticou, nem tampouco se ele se considera inocente ou culpado quanto ao fato praticado, entre outros detalhes de mérito.

A partir desse reparo, Vasconcellos (2016), surpreendentemente, ao revés do que se pode supor, afirma que uma das principais questões diz respeito a esses limites cognitivos durante a audiência, especialmente observando-se os objetivos e finalidades das possíveis perguntas formuladas ao preso. Para esse autor, o momento se materializa fundamentalmente a partir da realização, pelo juiz, de uma ‘entrevista’ com a pessoa presa. Assim o preso, por não ser réu, nessa oportunidade, deverá ser entrevistado sobre o motivo de sua prisão, nada mais, tendo as indagações que se circunscreverem na medida do possível às circunstâncias da prisão e às condições de como essa se deu (art. 8º, V, Res.213/15, CNJ).

Sabe-se que isolar essas questões na entrevista com o preso não é tarefa fácil. Tal restrição caracteriza limitação cognitiva aos elementos a serem analisados na Audiência de Custódia[49]. Tem-se de verificar e analisar se presentes a existência do fumus comissi delicti (indícios da autoria e prova da materialidade – art. 312, CPP) [50] e periculum libertatis (art. 8º. VIII, Res. 213/15, CNJ). Daí faz-se importante frisar que “qualquer outra consideração implicaria em indevida antecipação de elementos de convicção sobre o mérito, e, dessa forma, acarretaria na contaminação psicológica do julgador, o qual se tornaria debilitado em equidistância, imparcialidade e equilíbrio para apreciar o caso em momentos futuros de maior espaço cognitivo”(AMARAL apud VASCONCELLOS, 2016).

Contudo, em alguns casos, essa entrevista vai situar-se numa tênue distinção entre forma e conteúdo. O problema surge quando o preso alegar a falta de fumus commissi delicti, ou seja, negar autoria ou existência do fato (inclusive atipicidade). Nesse caso, postulam Lopes Jr e Rosa (2015) a cautela que deve ter o juiz para não invadir questões reservadas para o julgamento. Eventuais contradições entre a versão apresentada pelo preso nessa audiência e a que futuramente venha utilizar no interrogatório processual não devam ser utilizadas em seu prejuízo. Em outras palavras, o ideal é que essa entrevista sequer fosse inserida nos autos do processo, para evitar possível errônea (des)valoração.

Nesse passo, cabe ao juiz também adotar providências com o fim de sanar possíveis irregularidades detectadas na audiência (art. 8º, IX, Res. 213/15, CNJ) e verificar, por meio visual ou questionamentos dirigidos ao preso, hipóteses de gravidez, existência de filhos ou dependentes sob cuidados da pessoa presa, histórico de doença grave, incluídos os transtornos mentais e a dependência química, objetivando em viabilizar a adoção de encaminhamentos assistenciais e a possível concessão da liberdade provisória, sem ou com  a imposição de medida cautelar (art.8º, X, Res. 213/15, CNJ).

Salienta-se, ainda, que, o que for dito na audiência presta apenas para fundamentar decisões a serem adotadas pelo juiz, quanto da adoção de cautelares, como, por exemplo, converter o Auto de Prisão em Flagrante em Prisão Preventiva. Essa decisão, portanto, pode estar fundamentada em informações fornecidas pelo próprio preso. Dessa forma, o que for dito pelo preso na audiência possui valor de prova, somente para dar lastro à adoção de uma medida cautelar. De fato, uma possível confissão do preso valerá apenas para formação da convicção do julgador para fins da cautelaridade. Para uma possível condenação, é inconcebível qualquer entendimento nesse sentido. Essa é uma situação considerada de “proibição relativa”. Não é uma inadmissibilidade absoluta e, sim, relativa[51] durante a audiência.

Ocorre que, antes da decisão a ser tomada após a oitiva da pessoa presa, o Juiz deferirá ao Ministério Público e à defesa técnica, nessa ordem, para que formulem perguntas ao preso. Salienta-se que o Juiz interferirá quando forem formulados questionamentos que sejam considerados de mérito dos fatos que possam constituir em eventual imputação, permitindo-lhes, em seguida, ao MP e, na sequência à defesa técnica, requerer as medidas cautelares previstas no art.8º, §1º, da Resolução nº 213, do CNJ[52]. Ressalte-se, também, que o juiz deverá registrar em ata a fundamentação da deliberação tomada quanto à legalidade e manutenção da prisão, cabimento de liberdade provisória sem ou com a imposição de medidas cautelares diversas da prisão, sob o risco de ofender o princípio da presunção de inocência. Ainda, considerar-se-á o pedido de cada parte, como também se adotará providências, em caso da constatação de indícios de tortura e maus tratos, determinando a instauração de instrumento apuratório dos fatos alegados (art.8º,§3º e art. 11, Res. 213/15, CNJ).

Por fim, é importante ressaltar que o juiz, ao optar pela adoção de alguma medida cautelar, essa terá o caráter de decisão interlocutória simples, uma vez que as características dessa decisão em Audiência de Custódia, como ensina Oliveira (2015, p. 640) “[...] resolvem questões processuais e não extinguem o processo”, mesmo porque trata-se de ato pré-processual. Também, ao juiz caberá ainda buscar garantir às pessoas presas em flagrante delito o direito à atenção médica e psicossocial eventualmente necessária (art.9º,§3º, Res.213/15, CNJ). Note-se que essas questões, ao serem analisadas pelo juiz, são da maior relevância, quando da aplicação de uma prisão provisória, se necessária. É nesse âmbito da Audiência de Custódia que se faz pertinente demonstrar que o juiz, em tema de prisão temporária, uma questão relevantíssima.  Adverte Oliveira (2015, p. 544) que essa prisão tem a finalidade de acautelamento das investigações do inquérito policial, do que se extrai do art. 1º, I, da Lei nº 7.960/89.

Ainda nas palavras de Oliveira (2015, p. 544-545), de maneira interessante, esse autor diz que, na verdade essa prisão temporária:

“[...]se destina à proteção das investigações policiais, cujo destinatário é o Ministério Público, o legislador lembrou-se de que a nossa ordem constitucional de 1988 impõe um modelo de feições acusatórias, na qual não se reserva ao magistrado o papel de acusador e muito menos de investigador. Assim, corretamente, não contemplou a possibilidade de decretação ex offício da prisão temporária, somente permitindo-a ‘em face da representação da autoridade policial ou mediante requerimento do Ministério Público” (OLIVEIRA, 2015, p. 544-545).

Deve-se ver também que é vedado ao juiz a decretação prima facie da prisão preventiva ex offício, tendo em vista como acrescenta Oliveira (2015, p.568) “[...] que referida prisão temporária presta-se a tutelar tão somente a investigação criminal. Ora, se assim é, parece irrecusável [...] de que o juiz deve manter-se afastado da fase investigatória [...]”, decretando essa prisão cautelar somente mediante requerimento do Ministério Público ou representação da autoridade de polícia judiciária, por ocasião da Audiência de Custódia.

Assim, diante das questões apresentadas acerca do papel do Juiz, vê-se ser inevitável deduzir que no contexto da Audiência de Custódia, o Juiz, reveste-se tanto de qualidades, quanto de obrigações. Por isto, o Juiz acercar-se de propósitos latentes no desempenho dessa missão, tais como, imparcialidade e competência jurisdicional, permitindo concluir e por óbvio, não pairar dúvida, quanto à impossibilidade dessa autoridade ser substituída nessa audiência por qualquer agente administrativo, seja pelo delegado ou pelo promotor de justiça, tendo em vista que o papel do Juiz, por força de ordenamento supralegal é uno, indivisível e indecomponível na avaliação de direitos e garantias fundamentais da pessoa do preso durante a realização desse ato.

4.2 Atuação do Ministério Público

O Ministério Público é titular da ação penal pública, nos termos do art. 129, I, da Constituição Federal. Todavia, essa atribuição não o impede de, mesmo como parte, agir como fiscal da lei (custos legis). Daí apesar de não haver previsão expressa nas Normas Internacionais de Direitos Humanos determinando a participação do Ministério Público na Audiência de Custódia, nada obsta sua presença. É importante ressaltar que é com o fim de fiscal da lei que o membro do Ministério Público se faz presente. Mesmo porque, essa audiência é pré-processual e como salienta Oliveira (2015, p.545) o contato com todo o material probatório destina-se inicialmente ao Ministério Público, a fim de que sustentem-se as razões de constrição cautelar durante a Audiência de Custódia.

Com esse fim, o Ministério Público, após a entrevista do preso com o Juiz, fará perguntas, se desejar. Se os questionamentos formulados ao preso pelo Ministério Público não observarem os limites cognitivos (perguntas incompatíveis com a natureza do ato e que tenham relação com o mérito dos fatos, os quais possam constituir eventual imputação à pessoa presa) esses serão indeferidos pelo Juiz. Espera-se que o Ministério Público faça perguntas que complementem a entrevista promovida pelo Juiz com a pessoa presa, cabendo-lhe indagar, sobre apenas as circunstâncias de sua prisão e a forma como foi tratado pelas autoridades policiais, até a lavratura do Auto de Prisão em Flagrante, ou deixar de formular qualquer tipo de pergunta, dando-se por satisfeito com as indagações já formuladas pelo Juiz.  Logo após as considerações da Defesa, o Juiz emite a decisão. Havendo o relaxamento da prisão, pode, o Ministério Público, discordar e requerer prisão preventiva, temporária ou a aplicação de outra medida cautelar. Ao Ministério Público é assegurado, nesse momento, requerer as medidas cautelares previstas no art.8º, §1º, da Resolução nº 213, do CNJ. Se não houver requerimento do Ministério Público, o Juiz não pode decretar prisão temporária ou preventiva de ofício, já que não existe processo a teor do art. 311, do Código de Processo Penal.

Doutro lado, poderá o Ministério Público pelos argumentos apresentados em audiência, por seu entendimento, requer a liberdade do preso com ou sem fiança baseado nas informações obtidas nessa entrevista promovida pela audiência. Reafirma-se não se tratar de uma audiência de interrogatório com produção de provas e sim de uma audiência de cautelaridade. Concluída a Audiência de Custódia, cópia de sua ata será entregue ao promotor. Por fim, a teor do art. 4º, da Resolução 213/15, interpreta-se que a ausência do Ministério Público na Audiência de Custódia impediria a concessão de qualquer medida cautelar.

4.3 Atuação da Defesa Técnica e da Autodefesa

Segundo as previsões da Convenção Americana sobre os Direitos Humanos, o acusado tem o direito de se “defender pessoalmente ou de ser assistido por um defensor de sua escolha e de comunicar-se, livremente e em particular, com seu defensor” (art. 8º, 2, d) [53]. No entanto, seguindo o estudo de Weis (2011, p.19) “conjugando-se tal norma com o direito interno brasileiro, é evidente a obrigatoriedade de que a oitiva judicial seja acompanhada de defensor tecnicamente habilitado, público ou privado [...]”. Assim, a incidência dos incisos LIV e LV do artigo 5º da Constituição da República, cominado com o artigo (art. 8º, 2, d) da Convenção Americana sobre os Direitos Humanos, impõem a presença de defesa técnica no ato de oitiva judicial do preso, o que deve se amoldar à entrevista promovida pelo juiz em Audiência de Custódia.

Assim, quando da remessa do Auto de Prisão em Flagrante (APF) e o autuado à Audiência de Custódia, é feita a transcrição digitalizada do APF e juntada de certidão de antecedentes criminais, com liberação para consulta pelas partes em audiência. Vasconcellos (2016) sublinha que se proporciona, antes, o contato, ou seja, uma audiência prévia do autuado com seu Advogado ou Defensor Público, conforme previsto na Convenção Americana de Direitos Humanos. Nesse momento, a pessoa presa é orientada sobre o que será tratado, e que tudo que disser apenas subsidiará a decisão do juiz quanto a adoção de alguma medida cautelar, ocasião em que são enumeradas algumas circunstâncias que devem ser observadas na entrevista com o juiz, sobretudo, aspectos objetivos da prisão e subjetivos (sobre ele). Ao mesmo tempo, será assegurado pelo defensor o direito do preso de permanecer calado (nemo tenetur se ipsum accusare), nos termos da Constituição Federal, artigo 5º, inciso LXIII. Para Lopes Jr e Rosa (2015, p.8) não há interrogatório, nem produção antecipada de provas que possam constituir-se em formação ato probatório em desfavor do preso, seja pelo juiz, quando de sua entrevista com ele (preso) ou pelo membro do Ministério Público.

Durante a Audiência de Custódia, o Defensor - como defesa técnica se manifesta, após o Ministério Público e somente, então, o magistrado proferirá decisão. Na Audiência de Custódia, como se pode ver na doutrina, Brandalise (2016, p.74) “[...] no chamado sistema acusatório, a acusação e a defesa atuam em igualdade, com evidente separação de funções entre quem acusa, quem julga e quem defende (o chamado actum trium personarum). Está ele (juiz) atrelado a considerações que decorrem do contraditório, da oralidade e da publicidade”[54]. Nesse contexto o defensor permanece atento quanto a qualquer abordagem feita na audiência sobre questões que possam referir-se ao mérito, e a instrumentalidade da prisão do imputado.

Da mesma forma, quanto a questões ligadas às violações havidas à incolumidade e à segurança pessoal do flagranteado, se porventura pairarem qualquer tipo de indício de maus-tratos ou risco de morte sobre a pessoa presa e nenhum despacho for deferido pelo juiz para que sejam apurados os fatos, o defensor fará intervenção, a fim de que essas providências não sejam negligenciadas. Também, por ocasião da realização dessa audiência, o Defensor acompanhará a todos os atos promovidos, avaliando o cabimento ou não das medidas adotadas.

 Nunca é demasiado mencionar que o ato da adoção de medidas cautelares era anteriormente praticado somente pelo magistrado, sem a participação dos atores processuais (Ministério Público e Defesa); agora é obrigatória a participação desses, a teor da interpretação do art. 4º, da Resolução 213/15, do CNJ, dando efetividade ao art. 282, §3º, do CPP, no sentido de que o contraditório promovido com a participação desses sujeitos processuais legitimará o ato decisório. No que tange aos atos promovidos nessa audiência, qualquer argumento pode ser acolhido ou rejeitado, desde que tenha finalidade de atender aos objetivos da cautelaridade. Com efeito, Lopes Jr e Rosa (2015, p.8) acrescenta que “A defesa se manifesta sobre os pedidos formulados pelo Ministério Público. Se não houve pedido por parte do Ministério Público, o juiz não pode decretar de ofício, prisões temporária ou preventiva, já que não existe processo”. Não por outra razão, segundo o autor,

Uma vez ouvido o preso, o juiz dará a palavra ao advogado ou ao defensor público para manifestação, e decidirá, na audiência fundamentadamente, nos termos do artigo 310 do CPP, acerca da homologação do flagrante ou relaxamento da prisão e, após, sobre eventual pedido de prisão preventiva ou medida cautelar diversa. Aqui é importante sublinhar, uma vez mais, que a prisão preventiva somente poderá ser decretada mediante pedido do Ministério Público (presente na audiência de custódia), jamais de ofício pelo juiz (até por vedação expressa do artigo 311 do CPP. A tal ‘conversão de ofício’ da prisão em flagrante em preventiva é uma burla de etiquetas, uma fraude processual, que viola frontalmente o artigo 311 do CPP (e tudo o que se sabe sobre sistema acusatório e imparcialidade), e aqui acaba sendo (felizmente) sepultada, na medida em que o Ministério Público está na audiência. Se ele não requerer a prisão preventiva, jamais poderá o juiz decretá-la de ofício, por elementar (LOPES Jr; ROSA, 2015, p.6*)[55].

É certo que, como afirma Brandalise (2016, p.74) ao serem atribuídas responsabilidades delitivas a um suspeito, direitos e garantias processuais devem ser-lhes concedidas conferindo ao preso a possibilidade de defesa perante aos órgãos estatais responsáveis pela persecução e pelo julgamento – pois, no processo penal, afiguram-se o desejo verdadeiro da sociedade, representados que são por todos os sujeitos que atuam nessa audiência.

Portanto, objetivando proteger a pessoa do preso da melhor forma que lhe aprouver, e, assim, refutar questões que podem redundar em prejuízo maior nos casos de prisão (ao ser decretada a conversão da prisão em flagrante em temporária ou preventiva), ao defensor cabe manejar uma ação autônoma que vise impugnar essa decisão, por meio do habeas corpus e  no caso da aplicação das demais medidas cautelares diversa da prisão, a teor do art. 319, do Código de Processo Penal caberá a impetração do mandado de segurança. Porém, de acordo com Fernandes, Gomes Filho e Grinover (2005) diversas interpretações e inferências podem ser feitas com base na dinâmica dessa decisão judicial, que sugere-se ser uma decisão interlocutória simples.

Para os autores, “é que as decisões interlocutórias simples, na tendência do moderno direito processual, deveriam ser irrecorríveis e em regra o são” (FERNANDES, GOMES FILHO e GRINOVER, 2005, p. 62). Sem a intenção de esgotar o tema, inclui-se a discussão promovida por Oliveira (2015) ao dizer :

a regra é [...] as decisões interlocutórias simples sejam irrecorríveis, não ocorrendo, precisamente por isso, preclusão das vias impugnativas [...], razão pela qual elas poderão ser rediscutidas por ocasião do recurso de apelação. Dependendo de suas consequências jurídicas, poderão ser objeto até mesmo de ações autônomas como o habeas corpus e o mandado de segurança [...] (OLIVEIRA, 2015, p. 639).

Assim, para esses autores, dadas as características dessa decisão em Audiência de Custódia em sendo convertida a prisão em flagrante em prisão preventiva ou temporária, cabe a proposição pela defesa de Habeas Corpus ou Mandado de Segurança, se a cautelar for diversa da prisão, tendo em vista ser qualquer das decisões do Juiz consideradas interlocutória simples.

            Assim, por fim, o preso, que é o destinatário das garantias asseguradas pela promoção da Audiência de Custódia aqui analisadas, ao ser entrevistado pelo Juiz e demais sujeitos processuais, tem assegurado como tratado na doutrina processual penal, momento de sua autodefesa. Nessa situação, após ter sido orientado sobre o que será tratado em audiência, poderá falar sobre os fatos havidos, confessar ou ficar em silêncio. A autodefesa compreende o momento em que o preso livremente manifesta-se ao dizer sobre os fatos havidos diretamente com o Juiz, oportunidade em que ele se defende, argumenta e contra-argumenta sobre os fatos alegados e lhe imputados.  Lado outro, ocasião em que pode usufruir-se do direito ao silêncio, que é a marca maior do respeito à liberdade de determinação daquele que está na condição de imputado de ter cometido uma infração penal, já que dizer algo ou nada, antes da acusação, constitui oportunidade de defesa que está ao seu alcance. 


5 CONCLUSÃO

O presente trabalho possui como pano de fundo a inserção da Audiência de Custódia no Ordenamento Jurídico brasileiro e, essa medida, segundo o que se pode aferir nesse estudo, tem por objetivo aplicar mecanismos de prevenção e combate à tortura e um efetivo controle judicial nas prisões indiscriminadas. Por óbvio que muitas adequações hão de ser feitas e, por certo, se darão a longo prazo, produzindo benefícios que serão notados pela sociedade. Isso, porém, reforça a necessidade e a importância de melhorar os regramentos normativos e a destinação de investimentos, por meio de pessoal e estrutura, para que o judiciário possa instrumentalizar-se melhor, a fim de realizar esse trabalho, atingindo os objetivos esperados.

De tudo que foi estudado, reafirma-se a convicção da certeza quanto à importância da aplicação, no âmbito do processo penal constitucional, dessa audiência. Do que, sem a intenção de esgotar o tema, em tratando-se de interessante discussão sobre o papel dos sujeitos processuais durante a realização dessa audiência, vale reafirmar a importância que o debate proporcionado pelas partes assume na implementação desse instituto. A participação do Juiz, do Ministério Público e do Defensor (constituído ou nomeado), na estrutura e na implementação da Audiência de Custódia, é a materialização de ato pré-processual por meio da aplicação essencial dos princípios da ampla defesa e do contraditório sob o pálio da presunção de inocência, ao assegurar garantias fundamentais da pessoa humana de quem esteja flagranteado. Portanto, o papel primordial desses sujeitos processuais evita equívocos e possíveis deturpações na avaliação de questões importantíssimas que lidam com a possibilidade da restrição da liberdade.

Assim sendo, conclui-se que a ausência de algum desses sujeitos previsto em Lei, quando da realização da Audiência de Custódia, pode não apresentar os resultados esperados por ocasião da produção dos atos nela praticados. Dessa forma, esse modelo de audiência inicia um ciclo processual, que contribuirá para o surgimento de uma nova cultura nos juízos criminais ao agir por meio de diretrizes que contemplem valores ético-sociais mais humanizadores e limitadores de comportamentos desvaliosos no exercício do ius puniendi estatal ao tratar dos limites de liberdade do indivíduo antes da existência de um processo. A implementação dessa audiência significa um novo ciclo, no qual a prisão deixa de ser regra – se desnecessária – passando a ser exceção. E por fim, a avaliação das restrições de liberdade deixam de perpassar apenas por um ato burocratizado e protocolar, mas alcança um patamar mais humanizado e necessário, visando sua decretação ou a adoção de outra medida cautelar diversa da prisão.  Portanto, é primordial que nessa audiência estejam o Juiz, o MP e o Defensor para que o devido processo legal com o contraditório e a ampla defesa sejam alcançados, o que afasta a possibilidade de produção de qualquer ato que possa macular a defesa do imputado, e extirpa possíveis violações de direitos da pessoa presa.

Vê-se que no caminho de aperfeiçoamento do sistema processual penal, a realização dessa audiência insere a possibilidade da antecipação de uma pessoa presa ser entrevistada por um Juiz competente quando de sua prisão. Esse momento, até então, era previsto somente ao final da instrução processual, após a oitiva das testemunhas, já como acusado, esse exerce sua defesa. Esse momento trata-se do interrogatório do réu, na fase processual, com a finalidade probandi (produção de atos probatórios) quando esse manifesta-se sobre todas as provas produzidas contra si, num verdadeiro exercício de autodefesa. Com o advento da Audiência de Custódia, sem demora, exige-se no ordenamento jurídico brasileiro, que em vinte e quatro horas o preso seja apresentado diante do Juiz, do Ministério Público e de um seu Defensor, em audiência, para uma ‘entrevista’ sobre os fatos que deram fundamento à sua prisão antes da possibilidade da restrição de seu direito de liberdade.

Assim, após entrevistado pelo Juiz, pelo Ministério Público e pelo seu Defensor, respectivamente, pode ser convertida a prisão em flagrante pelo Juiz, a requerimento do Ministério Público, em prisão temporária ou preventiva, lastreada em critérios escorreitos e fundamentados. Reafirma-se, como visto anteriormente, que o Juiz, ao decretar essa prisão provisória, por se tratar de uma decisão interlocutória simples, caberá ao Defensor manejar a ação de impugnação autônoma, o Habeas Corpus, a fim de garantir o direito de liberdade do preso. Do contrário, sendo uma medida cautelar diversa da prisão, mas que, da mesma maneira, restrinjam direitos, poderá ser impetrado Mandado de Segurança.

Além do mais, espera-se, diante de toda essa análise, que o pensamento seja de ir ao encontro do modelo desejado pelo constituinte quando da promulgação de nossa Constituição Democrática e Cidadã: eliminar injustiças, ilegalidades e abusos contra a pessoa humana. Esse alinhamento e sincronismo de propósito influenciarão o cenário de desempenho da realização das Audiências de Custódia, a fim de aplicar as Normas Internacionais de Direitos Humanos que ingressaram no ordenamento brasileiro, como regramento normativo supralegal, visando eliminar prisões desnecessárias, torturas, maus-tratos e quaisquer outras violações de direito do preso.


REFERÊNCIAS

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Notas

[2] OLIVEIRA, Maurício José de. Da Prisão em Flagrante à Audiência de Custódia. Teoria e Prática. Belo Horizonte: Diplomata Livros, 2016. p. 316. O Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos foi promulgado no Brasil pelo Decreto nº592, de 06 de junho de 1992. O Pacto de São José da Costa Rica, pelo Decreto nº 678, de 06 de novembro de 1992.

[3] Para Martins (1998), na filosofia, o senso comum (ou conhecimento vulgar) é a primeira suposta compreensão do mundo resultante da herança de um grupo social e das experiências atuais que continuam sendo efetuadas. O senso comum descreve as crenças e proposições que aparecem como normais, sem depender de uma investigação detalhada para alcançar verdades mais profundas, como as científicas. É um tipo de conhecimento que se acumula no nosso cotidiano[...], baseado na tentativa e no erro. [...] permite sentir uma realidade menos detalhada, menos profunda e imediata e vai do hábito de realizar um comportamento até a tradição que, quando instalada, passa de geração para geração. Portanto, mais do que uma coleção de significados compartilhados, “o senso comum decorre da partilha, entre atores, de um mesmo método de produção de significados. Portanto, os significados são reinventados continuamente ao invés de serem continuamente copiados” (GARFINKEL,1967 apud MARTINS, 1998, p. 4).

[4] BRASIL, Constituição. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 30/04/17. Art.5º, Inciso - LXI - ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos casos de transgressão militar ou crime propriamente militar, definidos em lei.

[5] BRASIL, Código de Processo Penal, 1942 Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del3689.htm. Acesso: 01/04/17. Art. 301 - Qualquer do povo poderá e as autoridades policiais e seus agentes deverão prender quem quer que seja encontrado em flagrante delito.

[6] ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. Resolução 2200 A (XXI) da Assembleia Geral das Nações Unidas em 16 de Dezembro de 1966. Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1990-1994/d0592.htm. Acesso: 21/04/2017.

[7] ORGANIZAÇÃO DOS ESTADOS AMERICANOS. Convenção Americana Sobre Direitos Humanos de 22 de novembro de 1969 (Pacto de São José da Costa Rica). Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/d0678.htm. Acesso: 21/04/2017.

[8] ALENCAR, Rosmar Rodrigues; TÁVORA, Nestor. Curso de Direito Processual Penal. Salvador. BA. Editora JusPodivm. 2012.p.642-648.

[9] PIRES, Diovaner Menezes. Audiência de Custódia.http://nippromove.hospedagemdesites.ws/anais_simposio/arquivos_up/documentos/artigos/c0b16a253d382a58bb0fd6aeef3b2965.pdf

[10] CONSELHO DA EUROPA. Convenção Europeia De Direitos Humanos (Considerando a Declaração Universal dos Direitos do Homem proclamada pela Assembleia Geral das Nações Unidas em 10 de dezembro de 1948). Disponível em: http://www.oas.org/es/cidh/expresion/showarticle.asp?artID=536&lID=4. Acesso em: 21/04/17.

[11] ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. Resolução 2200 A (XXI) da Assembleia Geral das Nações Unidas em 16 de Dezembro de 1966. Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1990-1994/d0592.htm. Acesso: 21/04/2017.

[12] BRASIL, Constituição. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Alude o § 3º do Art. 5º da Constituição: “Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais”.

[13] BRASIL. Projeto de Lei do Senado nº 554 de 2011. Altera o § 1º do art. 306 do Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941 (Código de Processo Penal), para dispor que no prazo máximo de vinte e quatro horas após a realização da prisão, o preso deverá ser conduzido à presença do juiz competente, juntamente com o auto de prisão em flagrante, acompanhado das oitivas colhidas e, caso o autuado não informe o nome de seu advogado, cópia integral para a Defensoria Pública. Disponível em https://www25.senado.leg.br/web/atividade/materias/-/materia/102115. Acesso em: 26/04/2017.

[14] CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. Provimento Conjunto nº 03/2015, da Presidência do Tribunal de Justiça e Corregedoria-Geral de Justiça, publicação oficial do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo – Lei Federal nº 11.419/06, art. 4º, de 27 de janeiro de 2015. Disponível em: https://s.conjur.com.br/dl/regulamentacao-audiencia-custodia.pdf. Acesso em: 26/04/17

[15] _____________. Audiência de custódia no Maranhão recebe reconhecimento internacional. Disponível em: http://cnj.jusbrasil.com.br/noticias/179815981/audiencia-de-custodia-nomaranhao-recebe-reconhecimento-internacional. Acesso em: 28/04/17.

[16]  LUCHETE, Felipe. Membros do MP-SP entram com ação contra audiências de custódia. Disponível em: http://www.conjur.com.br/2015-fev-25/membros-mp-sp-entram-acao-audiencias-custodia. Acesso em: 28/04/17.

[17] BRASIL. Supremo Tribunal Federal, ADPF 347,2015. Disponível em:http://s.conjur.com.br/dl/adpf-situacao-sistema-carcerario-voto.pdf. Acesso: 28/04/17.

[18] BRASIL. Supremo Tribunal Federal, ADPF 347,2015. Disponível em:http://s.conjur.com.br/dl/adpf-situacao-sistema-carcerario-voto.pdf. Acesso: 28/04/17.

[19] *SILVEIRA, Fábio José Ribeiro. A Implementação das Audiências de Custódia Frente ao Ordenamento Jurídico Pátrio. (Sem Data). Disponível em: http://nippromove.hospedagemdesites.ws/anais_simposio/arquivos_up/documentos/artigos/1fa1d7bafd930d23ed90b26acebd46bb.pdf. Acesso: 29/04/17.

[20] BRASIL, Constituição. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 30/04/17.

[21] SILVEIRA, Fábio José Ribeiro. A Implementação das Audiências de Custódia Frente ao Ordenamento Jurídico Pátrio. (Sem Data). Disponível em: http://nippromove.hospedagemdesites.ws/anais_simposio/arquivos_up/documentos/artigos/1fa1d7bafd930d23ed90b26acebd46bb.pdf. Acesso: 29/04/17.

[22] BRASIL, Constituição. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 30/04/17.

[23] BRASIL, Constituição. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 30/04/17.

[24] SILVEIRA, Fábio José Ribeiro. A Implementação das Audiências de Custódia Frente ao Ordenamento Jurídico Pátrio. (Sem Data). Disponível em:http://nippromove.hospedagemdesites.ws/anais_simposio/arquivos_up/documentos/artigos/1fa1d7bafd930d23ed90b26acebd46bb.pdf. Acesso: 29/04/17.

[25] BRASIL, Constituição. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 30/04/17.

[26] *SILVEIRA, Fábio José Ribeiro. A Implementação das Audiências de Custódia Frente ao Ordenamento Jurídico Pátrio. (Sem Data). Disponível em:http://nippromove.hospedagemdesites.ws/anais_simposio/arquivos_up/documentos/artigos/1fa1d7bafd930d23ed90b26acebd46bb.pdf. Acesso: 29/04/17.

[27] Idem.

[28] BRASIL, Conselho Nacional de Justiça. Resolução nº 213, de 15 de dezembro de 2015. Dispõe sobre a apresentação de toda pessoa presa à autoridade judicial no prazo de 24 horas. Brasília, DF, 2015. Disponível em: http://www.cnj.jus.br/files/atos_administrativos/resoluo-n213-15-12-2015-presidncia.pdf. Acesso: 29/04/17.

[29] SILVEIRA, Fábio José Ribeiro. A Implementação das Audiências de Custódia Frente ao Ordenamento Jurídico Pátrio. (Sem Data). Disponível em:http://nippromove.hospedagemdesites.ws/anais_simposio/arquivos_up/documentos/artigos/1fa1d7bafd930d23ed90b26acebd46bb.pdf. Acesso: 29/04/17.

[30] PAIVA, Caio. Audiência de Custódia: conceito, previsão normativa e finalidades. 2015. Disponível:http://justificando.cartacapital.com.br/2015/03/03/na-serie-audiencia-de-custodia-conceito-previsao-normativa-e-finalidades/. Acesso: 28/04/17.

[31] Idem.

[32] BERNIERI, Natali. Audiência de Custódia no Processo Penal Brasileiro. Disponível em: http://soac.imed.edu.br/index.php/mic/ixmic/paper/viewFile/193/27. Acesso: 27/04/17.

[33] FORTE, Gustavo Neves. Implantação das Audiências de Custódia constitui inegável avanço. 2016. Disponível em: http://www.conjur.com.br/2016-mar-28/gustavo-forte-audiencia-decustodiaconstitui-inegavel-avanco-social, Acesso: 25/04/17.

[34] CONSELHO DA EUROPA. Convenção Europeia De Direitos Humanos (Considerando a Declaração Universal dos Direitos do Homem proclamada pela Assembleia Geral das Nações Unidas em 10 de dezembro de 1948). Disponível em: http://www.oas.org/es/cidh/expresion/showarticle.asp?artID=536&lID=4. Acesso em: 21/04/17.

[35] CARDOSO, Magnum Roberto. Audiência de custódia e a expressão “sem demora”. 2016. Disponível em: http://emporiododireito.com.br/audiencia-de-custodia-e-a-expressao-sem-demora-por-magnum-roberto-cardoso-2/. Acesso: 01/04/17.

[36] BRASIL, Conselho Nacional de Justiça. Resolução nº 213, de 15 de dezembro de 2015. Dispõe sobre a apresentação de toda pessoa presa à autoridade judicial no prazo de 24 horas. Brasília, DF, 2015. Art. 1º Determinar que toda pessoa presa em flagrante delito, independentemente da motivação ou natureza do ato, seja obrigatoriamente apresentada, em até 24 horas da comunicação do flagrante, à autoridade judicial competente, e ouvida sobre as circunstâncias em que se realizou sua prisão ou apreensão. Disponível em: http://www.cnj.jus.br/files/atos_administrativos/resoluo-n213-15-12-2015-presidncia.pdf. Acesso: 29/04/17.

[37] BRASIL, Código de Processo Penal. 1942. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del3689.htm. Acesso: 01/04/17. Art. 306.  A prisão de qualquer pessoa e o local onde se encontre serão comunicados imediatamente ao juiz competente, ao Ministério Público e à família do preso ou à pessoa por ele indicada. § 1o  Em até 24 (vinte e quatro) horas após a realização da prisão, será encaminhado ao juiz competente o auto de prisão em flagrante e, caso o autuado não informe o nome de seu advogado, cópia integral para a Defensoria Pública.

[38] CARDOSO, Magnum Roberto. Audiência de custódia e a expressão “sem demora”. 2016. Disponível em: http://emporiododireito.com.br/audiencia-de-custodia-e-a-expressao-sem-demora-por-magnum-roberto-cardoso-2/. Acesso: 01/04/17.

[39] LOPES JR, Aury; ROSA, Alexandre Morais da. O difícil caminho da Audiência de Custódia. 2015. Disponível em: http://emporiododireito.com.br/o-dificil-caminho-da-audiencia-de-custodia-por-aury-lopes-jr-e-alexandre-morais-da-rosa/. Acesso:01/04/17.

[40] BRASIL, Conselho Nacional de Justiça. Resolução nº 213, de 15 de dezembro de 2015. Dispõe sobre a apresentação de toda pessoa presa à autoridade judicial no prazo de 24 horas. Brasília, DF, 2015. Disponível em: http://www.cnj.jus.br/files/atos_administrativos/resoluo-n213-15-12-2015-presidncia.pdf. Acesso: 29/04/17.

[41] ORGANIZAÇÃO DOS ESTADOS AMERICANOS. Convenção Americana Sobre Direitos Humanos de 22 de novembro de 1969 (Pacto de São José da Costa Rica). Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/d0678.htm. Acesso: 21/04/2017.

[42] LOPES JR, Aury; ROSA, Alexandre Morais da. O difícil caminho da Audiência de Custódia. 2015. Disponível em: http://emporiododireito.com.br/o-dificil-caminho-da-audiencia-de-custodia-por-aury-lopes-jr-e-alexandre-morais-da-rosa/. Acesso:01/04/17.

[43 ]BRASIL, Conselho Nacional de Justiça. Resolução nº 213, de 15 de dezembro de 2015. Dispõe sobre a apresentação de toda pessoa presa à autoridade judicial no prazo de 24 horas. Brasília, DF, 2015. Disponível em: http://www.cnj.jus.br/files/atos_administrativos/resoluo-n213-15-12-2015-presidncia.pdf. Acesso: 29/04/17. Art. 1º Determinar que toda pessoa presa em flagrante delito, independentemente da motivação ou natureza do ato, seja obrigatoriamente apresentada, em até 24 horas da comunicação do flagrante, à autoridade judicial competente, e ouvida sobre as circunstâncias em que se realizou sua prisão ou apreensão. §2º Entende-se por autoridade judicial competente aquela assim disposta pelas leis de organização judiciária locais, ou, salvo omissão, definida por ato normativo do Tribunal de Justiça ou Tribunal Federal local que instituir as audiências de apresentação, incluído o juiz plantonista.

[44] PAIVA, Caio. Audiência de Custódia: conceito, previsão normativa e finalidades. 2015. Disponível:http://justificando.cartacapital.com.br/2015/03/03/na-serie-audiencia-de-custodia-conceito-previsao-normativa-e-finalidades/. Acesso: 28/04/17.

[45] BRASIL, Conselho Nacional de Justiça. Resolução nº 213, de 15 de dezembro de 2015. Dispõe sobre a apresentação de toda pessoa presa à autoridade judicial no prazo de 24 horas. Brasília, DF, 2015. Disponível em: http://www.cnj.jus.br/files/atos_administrativos/resoluo-n213-15-12-2015-presidncia.pdf. Acesso: 29/04/17. Art. 4º A audiência de custódia será realizada na presença do Ministério Público e da Defensoria Pública, caso a pessoa detida não possua defensor constituído no momento da lavratura do flagrante.

[46] BRASIL, Conselho Nacional de Justiça. Resolução nº 66, de 27 de janeiro de 2009. Cria mecanismo de controle estatístico e disciplina o acompanhamento, pelos juízes e Tribunais, dos procedimentos relacionados à decretação e ao controle dos casos de prisão provisória. Brasília, DF, 2015. Disponível em: http://www.cnj.jus.br/images/stories/docs_cnj/resolucao/rescnj_66.pdf. Acesso: 05/05/17.

[47]

[48] LOPES JR, Aury; ROSA, Alexandre Morais da. O difícil caminho da Audiência de Custódia. 2015. Disponível em: http://emporiododireito.com.br/o-dificil-caminho-da-audiencia-de-custodia-por-aury-lopes-jr-e-alexandre-morais-da-rosa/. Acesso:01/04/17.

[49] VASCONCELLOS, Vinicius Gomes. AUDIÊNCIA DE CUSTÓDIA NO PROCESSO PENAL: Limites cognitivos e regra de exclusão probatória. Instituto Brasileiro de Ciências Criminais – Boletim – Ano 24. Nº 283 – Junho/2016 – ISSN 1676-366. Disponível em: https://www.academia.edu/25895367/Audi%C3%AAncia_de_cust%C3%B3dia_no_processo_penal_limites_cognitivos_e_regra_de_exclus%C3%A3o_probat%C3%B3ria. Acesso: 06/05/17.

[50] ALENCAR, Rosmar Rodrigues; TÁVORA, Nestor. CURSO DE DIREITO PROCESSUAL PENAL. Salvador.BA. Editora JusPodivm. 2012. p.586.

[51] VASCONCELLOS, Vinicius Gomes. AUDIÊNCIA DE CUSTÓDIA NO PROCESSO PENAL: Limites cognitivos e regra de exclusão probatória. Instituto Brasileiro de Ciências Criminais – Boletim – Ano 24. Nº 283 – Junho/2016 – ISSN 1676-366. Disponível em: https://www.academia.edu/25895367/Audi%C3%AAncia_de_cust%C3%B3dia_no_processo_penal_limites_cognitivos_e_regra_de_exclus%C3%A3o_probat%C3%B3ria. Acesso: 06/05/17.

[52] BRASIL, Conselho Nacional de Justiça. Resolução nº 213, de 15 de dezembro de 2015. Dispõe sobre a apresentação de toda pessoa presa à autoridade judicial no prazo de 24 horas. Brasília, DF, 2015. “art. 8º, § 1º: I – o relaxamento da prisão em flagrante; II – a concessão da liberdade provisória sem ou com aplicação de medida cautelar diversa da prisão; III – a decretação de prisão preventiva e IV – a adoção de outras medidas necessárias à preservação de direitos da pessoa presa Disponível em: http://www.cnj.jus.br/files/atos_administrativos/resoluo-n213-15-12-2015-presidncia.pdf. Acesso: 29/04/17.

[53] ORGANIZAÇÃO DOS ESTADOS AMERICANOS. Convenção Americana Sobre Direitos Humanos de 22 de novembro de 1969 (Pacto de São José da Costa Rica). Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/d0678.htm. Acesso: 21/04/2017.

[54] ANDRADE, Mauro Fonseca; ALFLEN, Pablo Rodrigo. Audiência de Custódia da Boa Intenção à Boa Técnica. In: BRANDALISE, Rodrigo da Silva (Org.). Sobre o aproveitamento das declarações autoincriminatórias do flagrado em Audiência de Custódia. Porto Alegre: Fundação Escola Superior do Ministério Público (FMP), 2016, p.74.

[55] LOPES JR, Aury; ROSA, Alexandre Morais da. O difícil caminho da Audiência de Custódia. 2015. Disponível em: http://emporiododireito.com.br/o-dificil-caminho-da-audiencia-de-custodia-por-aury-lopes-jr-e-alexandre-morais-da-rosa/. Acesso:01/04/17.


Autor

  • Alberto Luiz Alves

    da Reserva da Polícia Militar de Minas Gerais. Especialista em Segurança Pública pela Escola de Governo de Minas Gerais. Especialista em Gestão Estratégica em Segurança Pública pela Escola de Governo de Minas Gerais. Especialista em Comunicação Social pela Universidade Newton Paiva. Bacharel em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC-MINAS). Especialista em Direito Processual pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC-MINAS). Professor de Direito Penal e Processo Penal Comum e Militar. Professor de Direitos Humanos e Direito Constitucional. Professor de Comunicação Social.

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