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A verticalização partidária

o descompasso institucional numa democracia procedimentalista que transcenda aos aspectos conjunturais na permanente busca por segurança jurídica

A verticalização partidária: o descompasso institucional numa democracia procedimentalista que transcenda aos aspectos conjunturais na permanente busca por segurança jurídica

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"Minha vontade, ou poder de julgar, é livre e infinita; eu me engano quando a estendo a coisas que não entendo (...) A análise mostra o verdadeiro caminho pelo qual uma coisa foi metodicamente inventada e revela como os efeitos dependem das causas."(Descartes, Séc. XVI)

"Importa que nos mantenhamos longe do erro de que o que determina e limita o horizonte do presente é um acervo fixo de opiniões e valorações, e que face a isso a alteridade do passado se destaca como um fundamento sólido. Na verdade, o horizonte do presente está num processo de constante formação, na medida em que estamos obrigados a pôr à prova constantemente todos os nossos preconceitos." (Gadamer, Séc. XX)


SUMÁRIO: 01-Introdução; 02- A Diferenciação entre discursos de justificação e de aplicação para explicitar a função do Poder Judiciário como vértice central na arquitetura constitucional e a correspondência com as expectativas normativas; 03- Retrospecto da Incidência da verticalização no âmbito institucional contemporâneo e o argumento da segurança jurídica; 04- Os partidos políticos diante dos discursos eternizantes de fragilidade e a recorrente tutela pelo poder público; 05 – Conclusão: A Democracia como um processo de aprendizagem e a possibilidade de tropeços como constitutivos de uma modernidade sem fundamentos absolutos;

PALAVRAS-CHAVE: Reengenharia da Verticalização – Partidos Políticos – Natureza jurídica - Princípio da transcendência dos quadros partidários – Hermenêutica – Giro Lingüístico - Segurança Jurídica – Cláusula de barreira (‘Sperklaussel’)


01-INTRODUÇÃO

Em tempos de frenética busca por segurança jurídica, a lembrança de Descartes [01] é sempre importante para fins de resgatar os pressupostos de uma sociedade, diferente daquela, que não mais repousa na razão iluminista de verdades absolutas e métodos infalíveis capazes de nos livrar de ter que lidar com problemas crescentemente complexos.

Assim, pretendemos apontar as causas e conseqüências de tais circunstâncias, além de buscar indicar os pressupostos para uma postura constitucionalmente vinculada que leve a sério uma história institucional autoritária e o risco permanente da anomia social com a autonomização das instituições políticas. Dessa forma, analisamos a postura do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Congresso Nacional no tratamento dispensado à verticalização partidária, principalmente após o recuo do TSE no tocante à reengenharia radicalizada da verticalização com as ‘coligações puras’.


02- A DIFERENCIAÇÃO ENTRE DISCURSOS DE JUSTIFICAÇÃO E DE APLICAÇÃO PARA EXPLICITAR A FUNÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO COMO VÉRTICE CENTRAL DA ARQUITETURA CONSTITUCIONAL E A CORRESPONDÊNCIA COM AS EXPECTATIVAS NORMATIVAS

A modernidade, ao destroçar a sociedade de equilíbrio dimensionada pelas castas na Idade Antiga e Medieval, inaugurou o risco permanente como possibilidade de emancipação. Com a separação do direito (lícito/ilícito) de categorias como a política (governo/oposição), economia (dinheiro/não ter dinheiro), moral (certo/errado) e religião (credo/não credo), o surgimento do Estado de Direito foi o resultado desse incremento de complexidade na vivência humana.

Como primeira vertente do Estado de Direito, o Estado Liberal ou formal burguês (Séc. XVI/XIX) é caracterizado pela generalidade abstrata do direito privado como a essência de uma comunidade política egoísta, tendo a propriedade privada como fundamento dos direitos de primeira dimensão (individuais e políticos/civis). Por outro lado, esse Estado abstencionista possui funções limitadas a cunhagem de moeda e fiscalização de fronteiras, deixando à ‘mão invisível do mercado’ as demais tarefas de integração social (laissez faire). No âmbito da separação de poderes, a função preponderante era a legislativa, visto que a modernidade inaugura aquilo que viria ser uma tendência até nos dias atuais, qual seja, a possibilidade do direito passar a se conhecer mediante textos. Nesta perspectiva, a função judiciária era mera ‘adequação de meios a fins’, como lembra Gadamer, "...era coisa lógica e natural que a tarefa hermenêutica fosse a de adaptar o sentido do texto à situação concreta a que este fala." [02]A preocupação era mais com o direito (liberdade é fazer tudo que as leis não proíbam) e não com a justiça. Exemplo dessa fase é a formulação do Código Civil Francês aprovado em 21 de março de 1804, cujas reuniões da comissão foram algumas vezes presenciadas por Napoleão que, diante de discussões principalmente no que diz respeito ao direito de família, exigia prudência no sentido de formular uma lei hermeticamente insuscetível de falhas.

Na segunda vertente do Estado de Direito, o Estado Social ou Estado de Bem-Estar (Séc. XX) é caracterizado pela materialização do direito privado e uma crítica reformista da vertente anterior, contemplando ao Estado"...duas versões principais, sendo que a primeira lhe confere ingenuamente um grande espaço de ação e de intervenção política numa sociedade colocada à sua disposição" [03]. Ao quase eliminar a autonomia privada, o Estado ‘providência’, além de fazer uma releitura dos direitos de primeira dimensão (individuais e políticos/civis), agora não mais fundados na propriedade privada, mas na ‘igualdade jurídica’(v.g, o direito político ao voto de censitário passa a ser universal), tem-se o advento dos direitos de segunda dimensão (Sociais, econômicos e culturais). No contexto da separação dos poderes, a preponderância passa a ser da função executiva, tendo em vista a necessidade da efetivação de políticas públicas como saúde, habitação, previdência e educação para uma massa de clientes. Nesse período, o grande legado é a constatação kelseniana que, contrariamente ao paradigma liberal, entende que a lei, por ser geral e abstrata por definição, não tem como previr todas as hipóteses de sua aplicação como achava Napoleão, por isso elege a ciência como a garantia de manter a pureza do direito quando de sua densificação no caso concreto, descortinando que o texto, por si só, não dá conta da complexidade e riqueza da vida.

Importa destacar que é sob a égide do Estado Social, cujo ordenamento referencial é a Constituição alemã de Weimar (1919), no regime facista de Benito Mussolini, que surgem as medidas provisórias (‘provvedimenti provvisori’), com força de lei imediata, em reação ao fato de o parlamento ser lento no mundo inteiro. Sendo assim, o Poder Executivo necessitava de mecanismos mais ágeis para dar vazão à materialização das políticas públicas voltadas a essa ‘massa de clientes’.

Por fim, a terceira vertente do Estado de Direito, o Estado Democrático de Direito (‘Rechtstaat’), configurado a partir das décadas finais do Séc. XX, tem por característica a tensão permanente entre a autonomia pública e privada, não mais tidos como antagônicos, mas complementares, de reconhecimento mútuo, onde não se pode mais conceber o público como sinônimo de estatal e muito menos o privado como egoísmo, mas de dependência recíproca. Logo, só temos direito privado se houver reconhecimento de sua dimensão pública, bem como só podemos ter direito público se reconhecer as contingências da dimensão privada, de forma que a Constituição "... pode ser entendida como um projeto histórico que os cidadãos procuram cumprir a cada geração. No Estado Democrático de Direito, o exercício do poder político está duplamente codificado: é preciso que se possam entender tanto o processamento institucionalizado dos problemas que se apresentam quanto a mediação dos respectivos interesses, regrada segundo procedimentos claros, como efetivação de um sistema de direitos" [04]. Nesse paradigma, a função legislativa passa a ser ‘mera porta de entrada’ do ordenamento, ao tempo em que a função judiciária passa a ter um papel central no ordenamento jurídico.

A sustentação dessa pretensão está no retrospecto do instituto de verticalização, em que, não havendo modificação formal legislativa, o TSE interpreta a lei eleitoral dando novo significado ao texto. Exemplo disso é a Resolução n º 21.002/2002, quando o mesmo texto em vigor e aplicado ao pleito de 1998 teve seu entendimento alterado no pleito de 2002, sem sequer modificar uma única vírgula. Outro exemplo recente é a própria EC 52/06 que, depois de vigorar, passou pelo crivo do judiciário para sua conformação. Não se pode deixar de lembrar a recente Lei Federal n º 11.300/06, que modificou a LGE (9.504/97), proibindo algumas modalidades de propaganda, regulando limites de gastos e financiamentos de campanhas, marco da representação para fins da configuração da cláusula de barreira (‘Sperklaussel’): o TSE imediatamente deu a conformação do que seria aplicado para o pleito de 2006, à vista do princípio da anualidade eleitoral (art. 16), ao expedir, em 23 de maio de 2006, a Resolução n º 22.205/06. Importa salientar que não se pode condicionar o âmbito da aplicação exclusivamente ao Poder Judiciário, visto que todos somos aplicadores e intérpretes de nossas gramáticas de práticas sociais; no entanto, a interpretação judicial perfaz o critério do ‘non liquet’, ou seja, não se pode limitar o exercício hermenêutico apenas para os intérpretes autorizados (Peter Häberle), sob pena de se desaguar no decisionismo, seja kelseniano, seja schimitiano, do Estado Social.

Fixada a posição do judiciário e dos demais intérpretes, mister que se demonstre a diferença entre os discursos de justificação, realizados no âmbito do legislador, e os discursos de aplicação, realizados no âmbito do judiciário. Com efeito, é insofismável que, toda vez que interpretamos, fazemos uma lei para o caso concreto, de forma que "...a vontade do legislador e os princípios do direito consuetudinário funcionarão como ponte entre a teoria geral e os direitos concretos. O juiz precisará estabelecer uma relação coerente entre a sua decisão (aplicação) e a teoria política geral (justificação) (...) Uma legislação que recria um determinado direito sem examinar a sua coerência com outros direitos, ou que persegue determinados objetivos políticos de modo a fazer acordos arbitrários que conduzem ao privilégio de uma posição jurídica, não trata a todos com igual consideração e respeito." [05]

Dessa maneira, se não trabalhar essas duas dimensões da norma (justificação/aplicação) respeitando seus pressupostos, mas, ao contrário, substituindo uma pela outra o tendo-as como equivalentes funcionais, corre-se o risco de perder a dimensão normativa e tratar princípios semelhantes a regras como o fazem a jurisprudência de valores (Robert Alexy).


03- RETROSPECTO DA INCIDÊNCIA DA VERTICALIZAÇÃO NO ÂMBITO INSTITUCIONAL CONTEMPORÂNEO E O ARGUMENTO DA SEGURANÇA JURÍDICA

É cediço que os partidos políticos, nos termos do art. 17, inciso I, da CR/88, possuem a natureza jurídica de pessoa jurídica de direito privado especial de caráter nacional. Isso implica que a leitura da Lei Orgânica dos Partidos Políticos (LOPP, Lei Federal n º 9.096/96) e principalmente o art. 6º da Lei das Eleições Gerais [06] (LEG, Lei Federal n º 9.504/97) buscam, na sua generalidade, consagrar a supremacia da Constituição nesta vertente.

Com a LEG vigorando no pleito de 1998, após um longo debate no sentido de viabilizá-la como uma legislação permanente, contrariamente aos casuísmos de outrora que ensejavam a elaboração de uma lei a cada eleição, não se aplicou qualquer vedação às alianças regionais pelo reflexo das coligações nacionais. No entanto, faltando poucos meses para o pleito de 2002, o TSE, em 26 de fevereiro de 2002, ao apreciar Consulta n º 715, Classe 5ª, formulou a Resolução n º 21.002, in verbis:

"Consulta. Coligações.Os partidos políticos que ajustarem coligação para eleição de Presidente da República não poderão formar coligações para eleição de Governador de Estado ou do Distrito Federal, Senador, Deputado Federal e Deputado Estadual ou Distrital com outros partidos políticos que tenham, isoladamente ou em aliança diversa, lançado candidato à eleição presidencial".

Diante da perplexidade que causou essa decisão, incontinenti, no dia 27 de fevereiro de 2002, ou seja, antes da publicação no Diário Oficial (15/03/2002), os Senadores propuseram o Projeto de Emenda Constitucional nº 548/2002, que altera a redação do parágrafo primeiro do art. 17, da Constituição Federal, extinguindo a verticalização, na redação do que viria a ser a EC 52/06. Não obtendo tramitação de urgência como inicialmente se previa, visto que queriam anular aquela regra ainda para o pleito de 2002, em junho de 2002, após 2 turnos de votação na Casa da Federação, foi a mesma encaminhada à Câmara dos Deputados. Com efeito, somente no dia 25 de janeiro do corrente ano, a Câmara dos Deputados aprovou o projeto em primeiro turno (343 votos a favor e 143 contra) e posteriormente em segundo turno (329 a 142). Saliente-se que, durante toda sua tramitação, não houve qualquer emenda ao projeto original.

Aprovado o projeto nas duas Casas, o Presidente do Congresso Nacional ficou em compasso de espera sobre iminente nova decisão do TSE, que estava sendo questionado se a interpretação de 2002, obrigando os partidos que se coligassem nacionalmente a reproduzir tal aliança nos Estados, impediria que tais partidos lançassem candidatos isolados ou se coligassem com outro partido que não possuísse candidato à Presidência. Assim deliberou o TSE, na Consulta n º 1.185:

"Consulta. Verticalização. Questionamento. Referência. Possibilidade. Partido político. Orientação. Resolução. Órgão. Nacional. Direção partidária. Publicação. Diário Oficial da União. Prazo. Limite. Cento e oitenta dias. Anterioridade. Eleições. Estabelecimento. Regras. Autorização. Coligação híbrida. Relativamente. Eleições. Estado. Dissociação. Coligação nacional. Interpretação. Art. 7º, § 1º, da Lei nº 9.504/97. Impossibilidade. Manutenção. Entendimento. TSE. Apreciação. Consulta nº 715. Segurança jurídica. Observância. Restrição. Filiação. Art. 18 da Lei nº 9.096/95.

1. Embora reitere que a matéria deveria estar na exclusiva alçada dos partidos políticos, a partir do momento em que se aciona o mecanismo de consulta de que trata o inciso XII do art. 23 do Código Eleitoral, o Tribunal tem de se pronunciar e a questão passa a ser examinada exclusivamente sob o prisma jurídico.

2. Ainda que as coligações sejam objeto de deliberação nas convenções partidárias que se realizam no período de 10 a 30 de junho de ano eleitoral (art. 8º da Lei nº 9.504/97), quando entendo que efetivamente se inicia o processo eleitoral, é convir que a impossibilidade de mudança de partido em face do termo de um ano, de que cuida o art. 18 da Lei nº 9.096/95, impede que a eventual mudança – legislativa ou interpretativa – produza efeitos ou tenha eficácia retrooperante, ao arrepio de situações consolidadas pelo tempo.

3. Não tendo havido nenhuma mudança legislativa ou interpretativa até um ano antes da eleição, muitos cidadãos, ou mesmo detentores de mandato eletivo, tinham a real e efetiva expectativa de que a regra da verticalização estaria valendo para a eleição que se avizinha. "(...) Essa circunstância, indiscutivelmente, sensibiliza-me a votar pela manutenção do que se decidiu na Consulta nº 715 (...)".Consulta a que se responde negativamente.

Resolvem os ministros do Tribunal Superior Eleitoral, por maioria, vencidos os Ministros Relator e Cesar Asfor Rocha, responder negativamente à consulta, nos termos do voto do Ministro Caputo Bastos (...)Brasília, 3 de março de 2006."(Grifamos)

Diante da decisão de manutenção da verticalização, o Congresso Nacional, em 08 de março de 2006, promulga a EC 52/06, alterando o § 1º do art. 17 da CF, assegurando "...aos partidos políticos autonomia para definir sua estrutura interna, organização e funcionamento e para adotar os critérios de escolha e o regime de suas coligações eleitorais, sem obrigatoriedade de vinculação entre as candidaturas em âmbito nacional, estadual, distrital ou municipal, devendo seus estatutos estabelecer normas de disciplina e fidelidade partidária." (Grifamos). O agravante é que no art. 2º da Emenda consta que ele entraria em vigor "...na data de sua publicação, aplicando-se às eleições que ocorrerão no ano de 2002", exatamente por ter sido proposto o projeto antes do pleito de 2002. A EC 52/06 ensejou a propositura da Ação Direta de Inconstitucionalidade genérica n º 3685-8, com fincas no art. 102, I, "a", da CR/88, patrocinada pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, de forma que, pressionado pelo calendário eleitoral, o STF em 22.03.2006 decidiu:

"...por maioria, julgou procedente pedido formulado em ação direta ajuizada pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil para declarar a inconstitucionalidade do art. 2º da Emenda Constitucional 52/2006, que alterou a redação do art. 17, § 1º, da CF, para inserir em seu texto, no que se refere à disciplina relativa às coligações partidárias eleitorais, a regra da não-obrigatoriedade de vinculação entre as candidaturas em âmbito nacional, estadual, distrital ou municipal, e determinou a aplicação dos efeitos da referida Emenda "às eleições que ocorrerão no ano de 2002". Inicialmente, tendo em conta que a requerente demonstrara de forma suficiente como a inovação impugnada teria infringido a CF, afastou-se a preliminar da Advocacia-Geral da União quanto à ausência de fundamentação da pretensão exposta na inicial. Rejeitou-se, da mesma maneira, a alegação de que a regra inscrita no art. 2º da EC teria por objeto as eleições realizadas no ano de 2002, uma vez que, se essa fosse a finalidade da norma, certamente dela constaria a forma verbal pretérita. Também não se acolheu o argumento de que a aludida referência às eleições já consumadas em 2002 serviria para contornar a imposição disposta no art. 16 da CF, visto que, se a alteração tivesse valido nas eleições passadas, não haveria razão para se analisar a ocorrência do lapso de um ano entre a data da vigência dessa inovação normativa e as próximas eleições (CF: "Art. 16. A lei que alterar o processo eleitoral entrará em vigor na data de sua publicação, não se aplicando à eleição que ocorra até um ano da data de sua vigência.").

Quanto ao mérito, afirmou-se, de início, que o princípio da anterioridade eleitoral, extraído da norma inscrita no art. 16 da CF, consubstancia garantia individual do cidadão-eleitor — detentor originário do poder exercido por seus representantes eleitos (CF, art. 1º, parágrafo único) — e protege o processo eleitoral. Asseverou-se que esse princípio contém elementos que o caracterizam como uma garantia fundamental oponível inclusive à atividade do legislador constituinte derivado (CF, artigos 5º, § 2º, e 60, § 4º, IV), e que sua transgressão viola os direitos individuais da segurança jurídica (CF, art. 5º, caput) e do devido processo legal (CF, art. 5º, LIV). Com base nisso, salientando-se que a temática das coligações está ligada ao processo eleitoral e que a alteração a ela concernente interfere na correlação das forças políticas e no equilíbrio das posições de partidos e candidatos e, portanto, da própria competição, entendeu-se que a norma impugnada afronta o art. 60, § 4º, IV, c/c art. 5º, LIV e § 2º, todos da CF. Por essa razão, deu-se interpretação conforme à Constituição, no sentido de que o § 1º do art. 17 da CF, com a redação dada pela EC 52/2006, não se aplica às eleições de 2006, remanescendo aplicável a estas a redação original do mesmo artigo. Vencidos, nessa parte, os Ministros Marco Aurélio e Sepúlveda Pertence que julgavam o pedido improcedente, sendo que o Min. Marco Aurélio entendeu prejudicada a ação, no que diz respeito à segunda parte do art. 2º, da referida Emenda, quanto à expressão "aplicando-se às eleições que ocorrerão no ano de 2002" [07] (Sem grifos no original)

Entendendo por definitiva, pelo menos para o pleito de 2006, a configuração da verticalização, no dia 06 de junho de 2006, o TSE consegue novamente surpreender a todos quando, ao responder uma Consulta do Partido Liberal, veio a proibir por 6x1 que, no pleito de 2006, legendas sem candidatos à Presidência da República se coligassem, no âmbito dos Estados, com siglas que tivessem candidatos ao Planalto. Mais surpreendente ainda foi que, em menos de 48 horas depois, deu-se uma guinada de 180 graus, revertendo esta mesma decisão por unanimidade (7x0). Esse aparente atabalhoamento, ao invés de nos causar estranheza, serve para demonstrar os riscos aos quais estamos submetidos e a necessidade da adoção de posturas mais adequadas na leitura dessa história institucional que a todo tempo reinventamos.

O mais interessante que em tempos de coisa julgada inconstitucional (art. 5º, inciso XXXVI, CR/88) que busca problematizar uma segurança jurídica monolítica que afasta da tutela jurisdicional a capacidade de compor as partes como integrantes de uma comunidade política que eles mesmos fundaram (unidade x diferença). Desta forma, não vale a máxima de que ‘manda quem pode e obedece quem tem juízo’, porque a decisão foi produzida por um ‘soberano’ como nos primórdios do paradigma liberal e social [08]. Agora, as partes têm que sentir que suas pretensões foram levadas a sério – ou seja, que, do discurso de justificação (norma geral e abstrata produzida pelo legislativo) ao discurso de aplicação, o julgador considerou todas as especificidades do caso concreto (discurso de aplicação).

Isso só pode acontecer com uma mudança de mentalidade: demonstrar que nos concebemos como processo, as decisões não são mais com fundamento na autoridade (‘argumento da força’), por si só, mas na capacidade desta mesma autoridade conseguir fundamentar suas ações e torná-las plausíveis para os afetados (‘força do argumento’).

Com efeito, as críticas endereçadas à reengenharia da verticalização (pura) feita pelo TSE em 06.06.06 e sua retomada inversa (branda como no pleito de 2002) em menos de 48 horas depois demonstram que a sociedade em que vivemos é uma sociedade sem fundamentos absolutos, como se entendia outrora (Gustav Radbrusch), onde a segurança jurídica é não ter segurança jurídica, insólita e indiferente com o processo histórico de uma sociedade em constante mutação.


04- OS PARTIDOS POLÍTICOS DIANTE DOS DISCURSOS ETERNIZANTES DE FRAGILIDADE E A RECORRENTE TUTELA PELO PODER PÚBLICO

Pode-se conceituar partido político como um segmento da sociedade que busca alcançar o poder por meio de um projeto político. Sua origem moderna está intimamente ligada ao constitucionalismo inglês, mais especificamente, no período de 1678 a 1681, com a crise do exclusion bill (1680), que visou a retirar o herdeiro católico James (Duque de York) do trono [09].

Com o advento da democracia representativa e os diversos matizes do Estado de Direito, o indivíduo tem buscado influenciar na vontade de sua comunidade política, sendo que, atualmente, não mais numa relação sujeito/objeto, mas após o giro lingüístico (linguist turn) passou a ser uma relação sujeito/sujeito, no sentido de que "...a linguagem, entendida historicamente como uma terceira coisa interposta entre um sujeito e um objeto, recebe o ‘status’ de condição de possibilidade de todo o processo compreensivo. Torna-se possível, assim, superar o pensamento metafísico que atravessou dois milênios, isto porque se no paradigma da metafísica moderna na mente (consciência de si do pensamento pensante «como em Descartes»), na guinada pós-metafisica ‘o sentido passa a se dar na e pela linguagem." [10] Por sua vez, por serem consideradas associações privadas com funções constitucionais (Canotilho), criadas nos termos da lei civil (Pessoa jurídica de direito privado) e registrada no TSE (especial), conforme determina o art. 17, § 2º, da CR/88, essas associações têm perdido sua dimensão institucional, devido à grande fragmentação do centro do poder em tempos de globalização.

No entanto, ao invés de formar o ‘coro das carpideiras’, ao constatar que ‘ os condutores da vida partidária no Império eram homens afeiçoados à mesma pequenez que corrompe a face política da atualidade republicana. O culto dos interesses materiais, por contingência da época, era incompreensivelmente menor (...) não se ergueram partidos que fossem a essência legítima da vontade nacional..." [11], mister que se avance dessa postura que, ao explicar, acaba por justificar e assim eternizar um discurso idealizante que, na verdade, é uma construção social passível de uma nova postura na real atividade política (dialética do real/ideal). Nesse sentido:

"Eles se justificam pela luta pelo poder. Tão logo acumulam parcelas do poder, ainda que ínfimas, voltam-se para si mesmos, investem seus esforços e suas estruturas no cumprimento desta tarefa. Em seguida, parlamentarizam-se e burocratizam-se. Fincam raízes no rés-do-chão, no encantamento do mundo oficial, aproximando-se cada vez mais do andar superior, do sótão, onde a festa prossegue indefinidamente. Logo abandonam os que sustentam a casa e lhes propõem - quando não lhes impõem - formas cada vez mais comportadas de exercício da luta pela democracia. Os partidos não são muito compatíveis com "um governo do povo, pelo povo e para o povo", a não ser enquanto formas abstratas de discurso político. É preciso repensá-los.

Entretanto, não se pode prescindir dos partidos. Enquanto sobreviverem as classes sociais - e provavelmente ainda por muito tempo após - os partidos serão atores da história. Eles são instrumento no processo de evolução humana e, ao mesmo tempo, um fardo que se arrasta pela história. Repito, os partidos políticos se justificam pela luta pelo poder, contudo, quando chegam ao poder logo abandonam o exercício da luta de idéias, abandonam aqueles que os sustentavam; e aderem ao andar superior.

A antológica sentença de Marx, jogando com as expressões arma da crítica e crítica das armas, correspondeu a um momento histórico preciso. A prática da vida dos homens demonstrou que se tratava de uma verdade que teve um longo curso na história humana. Mas como "toda verdade não dura muito", tanto quanto "tudo que é sólido desmancha no ar", ela tornou-se eterna como previa Espinosa; antes de tornar-se eterna desapareceu do convívio dos homens. Para que ela se torne eterna é preciso virá-la de cabeça para baixo, invertendo-lhe os termos; pois a arma da crítica é o único instrumento capaz de silenciar definitivamente o "barulho das armas". E então, a frase de Marx expõe sua eternidade, permitindo compreender que na realidade "é inútil tentar substituir a arma da crítica pela crítica das armas"; embora os dois termos desta polaridade, como observava Espinosa, sejam uma unidade tão eterna quanto qualquer outra verdade." [12]

É dessa postura de fragilidade institucional dos partidos que temos recorrentes ´reformas políticas’ que não chegam a lugar nenhum. A mudança, repetimos, tem que ser da postura de como encarar a atividade política, onde não mais exista ‘nós o povo´ e ´eles os políticos´ (relação sujeito/objeto), mas somente ‘nós’ (relação sujeito/sujeito). Dessa forma, pode-se lidar com o constante risco de aproximação das agremiações políticas com a estatização ou a privatização egoística do espaço púbico, como na ordem jurídica anterior (Lei 5.682/71) que atribuía aos partidos políticos a natureza de pessoa jurídica de direito público interno.

Mais interessante ainda é a relação ‘interna corporis’ entre os filiados (eficácia horizontal partidária) e a relação entre o partido e os atos exteriores de seus membros. É no paradigma do Estado Democrático de Direito que temos o ‘princípio da transcendência dos quadros partidários’, que consiste no fato de que, quando o membro do partido atua, não é sua pessoa que está em destaque, mas a instituição orgânica partidária. Essa leitura somente é possível quando se busca construir instituições políticas representativas de determinado segmento ideológico e programa plausível para uma sociedade que se sabe cindida, e não mais em indivíduos-candidatos.

Os partidos políticos, por mais risco que se tenha de caminharem para organizações autoritárias, antidemocráticas ou instâncias autonômicas, são o retrato da própria atividade política numa sociedade que se alimenta de crises e que possui fundamento em conflitos permanentes. Enquanto não se assumir a postura de que o direito já trabalha com a possibilidade de seu descumprimento, ou seja, o uso já pressupõe o abuso, estaremos idealizando ‘irmandades’ num contexto em que o ideal é real bem como a realidade está permeada de idealidades.


05 – CONCLUSÃO: A DEMOCRACIA COMO UM PROCESSO DE APRENDIZAGEM E A POSSIBILIDADE DE TROPEÇOS COMO CONSTITUTIVOS DE UMA MODERNIDADE SEM FUNDAMENTOS ABSOLUTOS

Ao passo que a política é constitutiva da vida, de forma que os atos cotidianos mais simples são afetos às decisões dos seres que entabulam as regras para sua convivência em comum, temos que "é assim a política, é assim a vida: ao mesmo tempo oprime e liberta, ao mesmo tempo muda e não muda, ao mesmo tempo faz sofrer e faz feliz (...) o acúmulo de modificações parciais, acréscimos infinitamente pequenos, constrói a base da mudança. É nos porões da história, nos subterrâneos das relações de interferência, onde estão mergulhados os pequenos atos do cotidiano, as relações interpessoais, as formas ideológicas do comportamento, as emoções, os sentimentos, as relações de trabalho, a intermediação entre as microestruturas da vida social, as relações de troca, a resistência das minorias a todas as formas de monomorfismo, as lutas contra as formas de opressão nas relações pessoais, familiares, sociais, etc, as formas de convivência, enfim, um número infinito de atos, hábitos, comportamentos e relações; é nos porões que se processa a grande atividade de mudança, onde tudo se agita em permanência, move-se e muda, e nada permanece o que era. É aí que se forja o novo, onde se imprime a velocidade do tempo, onde o tempo é irreversível, o que faz da história um espetáculo descontínuo e nunca um tempo circular." [13]

A democracia não pode mais ser concebida sob o pano de fundo (background) de uma base material, mas de acordo com a natureza de seu processo político de formação da vontade e opinião pública. As gramáticas de práticas sociais da modernidade vêm inaugurar uma realidade complexa no constitucionalismo, de modo que os diferentes possam conviver mediante uma racionalidade diferente do paradigma pré-moderno, no qual a grande dificuldade era como reger uma sociedade que não podia ter pluralismo, quando a sociedade era um espaço de identidade consensual onde se exigia comunhão (ethos compartilhado). A invenção moderna do direito separado da política inova com mecanismos de convivência que buscam pensar instituições que acreditam criar novos problemas para esconder os problemas anteriores, menos complexos. A possibilidade de se estender os momentos de democracia surge com a necessidade do respeito às diferenças ao incorporar contrafactualmente o contrário e não apenas instrumentalizar meios a fins mediante uma ‘ditadura da maioria’.

Neste contexto, a opção pela teoria crítica da sociedade moderna vem incorporar tanto suas falhas como suas realizações positivas com o objetivo único de entender a potencialidade dessa sociedade em construir uma vida humana coletiva.

O paradigma da linguagem e da racionalidade comunicativa vem indicar que somente através da linguagem, sob condições de argumentação racional que os atores sociais podem coordenar suas ações em torno de uma orientação para a compreensão coletivizada. Assim, desenvolve sua teoria sobre o enfoque de dois níveis: o ‘mundo da vida’ [14] e do ‘sistema’, este como complemento daquele. O mundo da vida é como um lugar transcendental em que falante e ouvinte se movem, onde eles podem levantar reciprocamente as pretensões que seus pronunciamentos possam se ajustar ao mundo objetivo, social e subjetivo, onde eles criticam ou confirmam essas pretensões de validade, suportam o seu discenso e podem obter um acordo.

A incidência da ação sobre o ‘mundo da vida’ se dá pelos seguintes componentes: cultura, sociedade e personalização. As ações comunicativas não são somente processos culturais de interpretação. Na verdade, trabalham paralelamente em processos de integração social e de socialização, numa interconexão complexa dos três processos de reprodução. Neste sentido, uma das patologias nas sociedades contemporâneas refere-se à colonização do mundo da vida pelo mundo sistêmico através do atual processo de positivação ou juridicização (Verrechtlichung) dos espaços estruturados de ação comunicativa.

Dessa forma, o constitucionalismo no paradigma do Estado Democrático de Direito vem incrementar as exigências relativas ao aplicador da lei, tendo a atividade de interpretação jurídica como a idéia central, dentro de práticas sociais organizadas, buscando a verdade ou levantando uma pretensão de verdade (Ronald Dworkin). Ao invés de pensar da previsibilidade e certeza do direito [15](segurança jurídica), busca-se uma visão diferente sobre a finalidade ou o objetivo das leis: a integridade da regência, onde a comunidade seja regida por princípios, e não apenas por regras que possam ser incoerentes com os princípios.

As implicações normativas desta concepção têm grande utilidade para a compreensão do tratamento institucional dado à verticalização partidária. Por mais desgaste que o TSE possa ter sofrido, isso não abala os pressupostos de sua fundamentação, principalmente após abandonar a reengenharia da verticalização pura. Saudável constatar que, contrário à modernidade cartesiana da segurança jurídica de outrora, o método não é mais a garantia da verdade absoluta capaz de ‘exorcizar’ a dúvida (Gadamer) e muito menos a democracia é ‘ditadura de maioria’ ou identidade ‘governante/governado’ schimitiana. Aprendemos que a dúvida e o conflito não necessitam mais serem eliminados pois são eles o o ‘motor’ (Chantal Mouffe) desta sociedade cindida por definição, seja nas instituições partidárias refletidas na formação de corporações parlamentares e composição de governos, seja nos juízos e tribunais. Abandonemos nossa certeza de que a ‘regra é clara’, ao constatarmos que além do discurso de justificação (instância legislativa), na perspectiva do Estado Democrático de Direito a prova se dá pelo intérprete no discurso de aplicação, quando efetivamente mergulhamos de forma a transcender nossos preconceitos artificialmente construídos num dado momento histórico, gerando assim vínculos comprometidos com o futuro enquanto respeito aos percalços pedagógicos do passado.


Notas

01 DESCARTES, René. Discurso do método: Para bem conduzir a própria razão e procurar a verdade nas ciências. Tradução: J.Guinsburg e Bento Prado Júnior, 5ª ed., São Paulo: Editora Nova Cultural, 1991;

02 GADAMER, Hans-Georg. Verdade e método: Traços fundamentais de uma hermenêutica filosófica. Trad. Flávio Paulo Meurer, 3ª ed., Petrópolis: Editora Vozes, 1999, pp. 460.

03 HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia:Entre facticidade e validade. Vol. II, Trad. Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1997, pp. 144.

04 HABERMAS, Jürgen. ‘A luta por reconhecimento no Estado Democrático de Direito". In: A inclusão do outro: Estudos de teoria política. Trad. George Sperber e Paulo Astor Soethe. São Paulo: Edições Loyola, 2002, pp. 230.

05 GÜNTER, Klaus. Teoria da argumentação do direito e da moral: justificação e aplicação. Trad. Cláudio Molz. São Paulo: Landy Editora, 2004, pp. 405-406;

06 "É facultado aos partidos políticos, dentro da mesma circunscrição, celebrar coligações para eleição majoritária, proporcional, ou para ambas, podendo, neste último caso, formar-se mais de uma coligação para a eleição proporcional dentre os partidos que integram a coligação para o pleito majoritário."

7 Informativo/STF n º 420.

08 "O juiz, na nova decisão, não altera o julgado anterior, mas, exatamente para atender a ele, adapta-o ao estado de fato superveniente." DINAMARCO, Cândido Rangel. Fundamentos do Processo Civil Moderno. 2ª Ed., Tomo I, página 1044.

09 FRANCO, Afonso Arinos de Melo. História e teoria do partido político no direito constitucional. Rio de Janeiro, 1948;

10 STRECK, Lenio Luiz. "A hermenêutica filosófica e as possibilidades de superação do positivismo pelo (Neo)Constitucionalismo". In: SAMPAIO, José Adércio Leite. Constituição e crise política. Belo Horizonte: Del Rey, 2006, p. 274.

11 BONAVIDES, Paulo. Teoria do Estado. 5ª ed., São Paulo: Melheiros Editores, 2004, pp. 201-203;

12 Waldo Silva. DISCURSO DA POLÍTICA. Originalmente, este texto é parte de um trabalho escrito em 1987, que procurava servir às eleições municipais de 1988. Foi publicado na íntegra em 1992; e revisto em abril de 2006 para publicação ainda no prelo.

13 SILVA, Waldo. Como foi que o famoso ‘zé das couve’ chutou o pau da barraca e mudou o destino. Lagoa Santa: LS Editora, 2006, pp. 42.

14 Termo cunhado por Edmund Husserl.

15 Visão ontológica de que o Direito existe apenas na forma de decisões explícitas do passado, tomadas por autoridades políticas.


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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SANTOS, Abraão Soares dos. A verticalização partidária: o descompasso institucional numa democracia procedimentalista que transcenda aos aspectos conjunturais na permanente busca por segurança jurídica. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 11, n. 1110, 16 jul. 2006. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/8631. Acesso em: 19 maio 2024.