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Doação eleitoral estimável em dinheiro e a prestação de serviços

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19/11/2013 às 08:43
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Em campanha eleitoral, a prestação de serviço gratuito é considerada doação estimável em dinheiro para fins de aplicação de multa?

DOAÇÃO ELEITORAL – ESTIMÁVEL EM DINHEIRO – PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS – LIMITES PREVISTOS NA LEGISLAÇÃO ELEITORAL – LEI DAS ELEIÇÕES (9.504/97) – IMPOSIÇÃO DE MULTA – INTERPRETAÇÃO DOS TRIBUNAIS REGIONAIS ELEITORAIS SOBRE O TEMA.

CONSULTA

Excelentíssimo Presidente do Diretório do Partido da República (PR) do Município de Bauru – Senhor José Fernando Casquel Monti, apresenta consulta e solicita elaboração de parecer jurídico referente à imposição de multa por doação acima do permitido pela legislação eleitoral (artigo 23, § 1º, inciso I da Lei 9.504/97) oriunda de pessoas físicas e jurídicas a candidatos.

Informa o consulente que diversas representações estão sendo interpostas pelo Ministério Público Eleitoral de Bauru em decorrência de doações eleitorais na campanha de 2012 (prefeito e vereador), em valores acima do permitido pela legislação, tendo como prova da acusação, informações de declaração de imposto de renda prestadas à Receita Federal.

Diz ainda que as pessoas intimadas nas representações eleitorais – via de regra – prestaram serviços gratuitos, ou seja, a título de doação estimável em dinheiro e estão sendo submetidas a processo para pagamento de multa no importe mínimo de 5 (cinco) vezes o valor doado acima do limite legal, bem como à pena de inelegibilidade pelo período de 8 (oito) anos.

Assim, faz o senhor Presidente do Diretório do Partido da República (PR) em Bauru as seguintes indagações:

a)Existe diferença entre doação eleitoral “em dinheiro” e “estimável em dinheiro” para fins de aplicação de multa?E qual o valor máximo para cada uma?

b)A prestação de serviço gratuito é considerada doação estimável em dinheiro para fins de aplicação de multa?

Passo ao respectivo parecer jurídico.


PARECER JURÍDICO

Excelentíssimo Senhor Presidente,

1.Submeto à elevada consideração de Vossa Excelência parecer jurídico decorrente de consulta para analisar os aspectosreferentes à aplicação de multa prevista na legislação eleitoral decorrente de prestação de serviços gratuitos a candidatos, informados nas prestações de contas como “doação estimável em dinheiro”, notadamente quando considerados em valores financeiros acima dos limites previstos, bem como na interpretação que os Tribunais Regionais Eleitorais vêm fazendo do texto legal.

2.Importante discorrer antes de adentrarmos ao tema específico da presente consulta, sobre a criação e desenvolvimento da Justiça Eleitoral em nosso país, que data dos idos de 1.932, fruto da revolução de 30 e das práticas da República Velha como voto de cabresto, currais eleitorais e os coronéis e seus jagunços, atoresque compunham o cenário contra o qual se pretendia por um ponto final – fatos que persistem até os dias de hoje nos rincões do Brasil e isoladamente em grandes centros.

3.Os trabalhos iniciados em 1.932 culminaram com a construção do conceito de voto individual(um indivíduo = um voto), tendo sido suspensos em 1.937, retornando à arena de discussão em 1.945, ocasião em que se empreendeu também o alistamento eleitoral, organização das eleições, apuração dos votos e proclamação dos eleitos[1].

4.A Justiça Eleitoral é um ramo especializado da Justiça Federal, amparada e recriada na redemocratização que culminou com a promulgação da Constituição Federal de 18 de setembro de 1.946 – artigos 109 a 121[2] – que previu ainda o voto secreto,universal epermitido aos maiores de 18 anos[3], tendo sido reafirmada na Constituição Federal de 1.988[4].

5.Em julho de 1.965 foi promulgado e sancionado o Código Eleitoral[5] que vige até os dias atuais[6], tendo como atribuição precípua a reorganização das eleições em razão das novas necessidades da ordem vigente e que completou agora no ano de 2013, 48 (quarenta e oito) anos de existência.

6.Como dito anteriormente, os fundamentos que nortearam o sistema eleitoralda sua criação até os dias atuais é o da equação “um homem = um voto”, com as regras eleitorais incluídas e interpretadas no ordenamento jurídico no sentido de quehaja a igualdade ou paridade de chances entre os candidatos, evitando-se, na medida do possível, o abuso do poder econômico, político e de autoridade.

7.A Constituição Federal de 1.988, no Título II – DOS DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS, Capítulo I, que trata dos DIREITOS E DEVERES INDIVIDUAIS E COLETIVOS previu em seu artigo 5º “caput” o princípio da igualdade,informando que todos são iguais perante a lei sem distinção de qualquer natureza, tendo homens e mulheres os mesmos direitos e obrigações[7].

8.Tratando dos DIREITOS POLÍTICOSdentro ainda do Título II, a Carta Magna foi expressa em reafirmar o princípio da igualdade e da equação “um homem = um voto”nas eleições, como um direito e garantia fundamental do cidadão, ao prever no artigo 14 que:

“A soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos, ...”

9.Referida previsão pode e deve ser considerada cláusula pétrea[8], sendo expressa no texto constitucionala impossibilidade de proposta de emenda à Constituição tendente a abolir o voto direto, secreto, universal e periódico, bem como aos direitos e garantias individuais[9], havendo na doutrina e na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal posicionamento pacífico de que “esses direitos e garantias individuais protegidos são os enumerados no artigo 5ª da Constituição e em outros dispositivos da Carta[10]”.

10.A partir então da promulgação da Constituição da República Federativa do Brasil no ano de 1.988 diversas leis foram sancionadas e deram entrada no ordenamento jurídico pátrio visando regulamentar o sistema eleitoral, com regras de maior transparência dos atos, evitando o abuso de poder econômico e político, punindo a captação ilícita de votos,sempre com o objetivo de impedir a desigualdade nos pleitos eleitorais, citando-se como importantes as leis complementares n. 64/90[11] e n. 135/2010[12], lei dos partidos políticos[13] e a lei das eleições[14].

11.Ao realizar cotejo analítico de todos os textos infraconstitucionais vigentes sobre o sistema eleitoral no Brasil, temos que o princípio da igualdade na disputa eleitoral é preceito maior na órbita do Direito Eleitoral, eis que, para garantir a legitimidade do processo eleitoral, é necessário que a diferença de poder econômico e político dos candidatos não preponderem como fator determinante para o resultado das eleições, uma vez que o eleitor deve ser convencido pelas propostas e ideologias, lembrando que o Tribunal Superior Eleitoral busca em suas decisões uma interpretação lógica que enalteça o objetivo da legislação eleitoral de coibir o desequilíbrio entre candidatos que disputam cargos eletivos[15].

12.Frisemos assim, a rigorosa centralidade do sistema eleitoral e da ordem jurídico-constitucional vigente para aplicação do princípio da igualdade do voto, no sentido de que a manifestação político-eleitoral de um cidadão ou cidadã não pode ter um peso superior à manifestação político eleitoral de outra pessoa, evitando-se assim confronto aberto com o referido princípio da igualdade do voto[16].

13.Como máxima aplicação do princípio da igualdade na disputa eleitoral, podemos citar a regulação da propaganda eleitoral e o uso indevido dos meios de comunicação social, a proibição de certas condutas dos agentes públicos em períodos eleitorais, o abuso do podereconômico e político, bem como o controle do financiamento das campanhas eleitorais.

14.A legislação eleitoral infraconstitucional reflete, portanto, um ordenamento jurídico capacitado de ferramentas que visam combater os ilícitos eleitorais, preservando a igualdade de condições na disputa entre candidatos, libertando o sistema de influências nocivas, tanto da parte financeira como dos meios de comunicação, tendo a Justiça Eleitoral procurado dar efetividade ao texto da lei com decisões rápidas, atendendo ao direito constitucional da duração razoável do processoartigo 5º, LXXVIII da Constituição Federal[17].

15.É cediço que o Tribunal Superior Eleitoral(TSE)[18] é ágil no julgamento de processos eleitorais, impondo prazos exíguos para interposição de recursos[19], análise de julgamentos de registro de candidaturas até a data das eleições[20], bem como no julgamento de recursos que visam cassação do diploma[21], muitas vezes com a necessidade de realização de novas eleições nos municípios[22].

16.Ao mesmo tempo em que as regras e a efetividade da Justiça Eleitoral aumentam, cresce a influência do poder econômico nas eleições, acentuando a disparidade entre candidatos e distinguindo-os entre as categorias dos que conseguem financiamento e dos que não o alcançam, estes então com pequenas chances de sucesso nas urnas.

17.Por isto a necessidade de se fazer um rígido controle na arrecadação e gastos das campanhas eleitorais – com a imposição de uma efetiva prestação de contas – determinando-se a abertura de conta bancária[23], obrigatoriedade de depósitos em cheque nominais cruzados, emissão de recibos eleitorais e identificação dos doadores financeiros[24], tudo sujeito ao controle da Justiça Eleitoral e da Receita Federal, que vêm cruzando dados e informações para fiscalização.

18.Apesar do controle de gastos feito, os legisladores, através de reformas no texto eleitoral, acabaram por mitigar essa rigidez ao modificar o texto legal[25],prevendo que a mera desaprovação das contasnão impede a quitação eleitoral, bastando a sua apresentação à Justiça Eleitoral[26], possibilitando, assim,a participação de candidatos em campanhas com contasrejeitadas,impondo à Procuradoria-Geral da República(PGR) ingressar com uma Ação Declaratória de Inconstitucionalidade (ADI) no Supremo Tribunal Federal (STF) com o objetivo de impedir que candidatos com contas rejeitadas recebam quitação eleitoral e participem das próximas eleições[27].

19.Desta forma, primando pela igualdade de chances, paridade de armas e pela equação “um homem = um voto” é que ao longo do tempo procurou-se regular e fiscalizar ainda mais o financiamento das campanhas.

20.Mesmo com todas as previsões legais que visam regular o sistema eleitoral, as campanhas têm ficado cada vez mais caras, com índices de doação financeira atingindo a casa dos bilhões, conforme reportagem de Rodrigo Haidar para o sítio Consultor Jurídico, abaixo transcrita[28].

“Os gastos de candidatos e partidos políticos com campanhas eleitorais no Brasil saltaram de R$ 798 milhões nas eleições presidenciais de 2002 para R$ 4,6 bilhões em 2012, as últimas eleições municipais. O crescimento é de 471%, enquanto a inflação, no mesmo período, foi de 78%. Nas últimas eleições, apenas uma construtora doou para diversos candidatos brasileiros o montante de R$ 50 milhões. O valor é praticamente todo o dinheiro gasto na França com campanhas políticas nas eleições presidenciais e legislativas daquele país, feitas no ano passado. Os franceses gastaram US$ 30 milhões.”

“Ao longo dos anos, também diminuiu substancialmente a quantidade de doações feitas por cidadãos para campanhas eleitorais. Enquanto em 2004, 27% das doações eram feitas por eleitores, no ano passado apenas 4,9% do total de doações veio de pessoas físicas. Ou seja, as empresas, hoje, financiam 95% do custo das campanhas eleitorais. ‘Diante deste quadro, não estamos falando de liberdade de expressão. Estamos falando de investimento. É disso que se trata’, afirmou o pesquisador Geraldo Tadeu Monteiro, do Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro (IUPERJ)”.

21.Referidos fatos fizeram com que a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) – através de seu Conselho Federal – ingressasse com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) no Supremo Tribunal Federal com o objetivo de acabar com as doações de pessoas jurídicas, sob o argumento de que “tal situação cria um ambiente em que as desigualdades econômicas da sociedade sejam convertidas, de forma institucionalizada, em desigualdade política”[29], lembrando que os dez maiores doadores eleitorais no Brasil são construtoras e bancos.

22.Este intróito apresenta a necessidade efetiva de regular e fiscalizar as doações eleitorais – principalmente as doações em dinheiro – levando o legislador e o intérprete dos textos legais a refletirem sobre limitações de gastos e os meios de financiamento das campanhas, bem como do próprio eleitor em fazer questionamentos das fontes de recursos de seus candidatos.

23.Levando a efeito que presidente da república, deputados, senadores, vereadores e prefeitos municipais são legítimos representantes do povo[30], nada mais justo do que saber quais os interesses financeiros de seus doadores de campanha, ainda mais quando oriundos de pessoas jurídicas – que não têm direito a voto.

24.Hoje, a regulação do sistema de doação eleitoral está prevista nosartigos 23e 81 da Lei das Eleições, bem como naResoluçãoTSEn. 23.376/2012[31], expedida para vigorar nas últimas eleições (vereadores e prefeitos), norteando o embasamento legal para as representações interpostas pelo Ministério Público Eleitoral, com o intuito de aplicação de multa e, eventualmente, de inelegibilidade do doador.

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25.Prescreve o artigo 23 da Lei das Eleições, alterado pela Lei n. 12.034/09:

Art. 23.  Pessoas físicas poderão fazer doações em dinheiro ou estimáveis em dinheiro para campanhas eleitorais, obedecido o disposto nesta Lei.

§ 1º As doações e contribuições de que trata este artigo ficam limitadas:

I - no caso de pessoa física, a dez por cento dos rendimentos brutos auferidos no ano anterior à eleição;

II - no caso em que o candidato utilize recursos próprios, ao valor máximo de gastos estabelecido pelo seu partido, na forma desta Lei.

26.A antiga redação do artigo 23 informava que as doações para campanhas eleitorais poderiam ser feitas por pessoas físicas a partir do registro dos comitês financeiros[32], mas com a nova redação está claro que as doações eleitorais podem ser feitas a qualquer momento para os partidos políticos tendo em vista que as contas em instituições financeiras dos candidatos são abertas somente após a respectiva escolha em convenção partidária[33].

27.No mesmo sentido o artigo 81da Lei das Eleições ao prever doação por pessoa jurídica[34], mas em valor limitado a2% do faturamento bruto, tendo ambas as disposiçõesa mesma penalidade quando a doação for feita acima dos limites legais, consistente em aplicação de multa no valor de cinco a dez vezes a quantia doada em excesso[35].

28.Diferentemente das doações em dinheiro, que transitam pelas contas bancárias abertas com este único propósito, doações“estimáveis em dinheiro” sãorecursos recebidos diretamente pelos candidatos e partidos de bens ou serviços, mensuráveis em dinheiro, mas que por sua naturezanão transitam em conta bancária e nãogeram desembolso financeiro, podendo ser provenientes de simples doações de terceiros ou do próprio patrimônio docandidato[36].

29.As duas espécies de doações – em dinheiro ou estimável em dinheiro – devem ser obrigatoriamente contabilizadas, ainda que a doação estimável não transite em conta bancária, com a obrigatoriedade de emissão dos respectivos recibos eleitorais, para correta identificação dos doadores e dos limites fixados em lei, a fim de que se verifiquea compatibilização dos gastos que foram informados pelo candidato na convenção partidária que o escolheu para participar do pleito[37], evitando abuso de poder econômico tendente a afetar a igualdade das eleições.

30.Ponto pacífico na doutrina e jurisprudência é que, tanto pessoa física como jurídica podem fazer “doações estimáveis em dinheiro” – que não transitam em conta bancária – com a ressalva de que no caso de pessoa jurídica o objeto da doaçãoestimável em dinheiro deve ser fruto da atividade econômica da empresa.

31.Assim, uma empresa gráfica somente pode doar “santinhos” e demais “materiais gráficos”, como jornais informativos e adesivos, uma empresa de combustívelpode fazer doação de litros de etanol, diesel e gasolina e uma empresa locadora de veículos somente dos automóveis de sua frota, sendo irregular qualquer outro tipo de doação estimável em dinheiro que não seja o objeto da prestação dos serviços destas respectivas empresas citadas como exemplo.

32.O artigo 26 da Lei das Eleições informa textualmente quais gastos são considerados eleitorais para fins de registro e verificação dos limites impostos aos doadores e aos candidatos[38].

Art. 26.  São considerados gastos eleitorais, sujeitos a registro e aos limites fixados nesta Lei:

I – confecção de material impresso de qualquer natureza e tamanho;

II – propaganda e publicidade direta ou indireta, por qualquer meio de divulgação, destinada a conquistar votos;

III – aluguel de locais para a promoção de atos de campanha eleitoral;

IV – despesas com transporte ou deslocamento de candidato e de pessoal a serviço das candidaturas;

V – correspondência e despesas postais;

VI – despesas de instalação, organização e funcionamento de Comitês e serviços necessários às eleições;

VII – remuneração ou gratificação de qualquer espécie a pessoal que preste serviços às candidaturas ou aos comitês eleitorais;

VIII – montagem e operação de carros de som, de propaganda e assemelhados;

IX – a realização de comícios ou eventos destinados à promoção de candidatura;

X – produção de programas de rádio, televisão ou vídeo, inclusive os destinados à propaganda gratuita;

XI – (Revogado pela Lei nº 11.300, de 2006)

XII – realização de pesquisas ou testes pré-eleitorais;

XIII – (Revogado pela Lei nº 11.300, de 2006)

XIV – aluguel de bens particulares para veiculação, por qualquer meio, de propaganda eleitoral;

XV – custos com a criação e inclusão de sítios na Internet;

XVI – multas aplicadas aos partidos ou candidatos por infração do disposto na legislação eleitoral.

XVII – produção de jingles, vinhetas e slogans para propaganda eleitoral.

33.O artigo elenca uma série de atividades que usualmente são empregadas na realização de propaganda eleitoral e cujas despesas correspondentes são consideradas como gastos de campanha, ficando sujeitas a prestação de contas e aos limites previstos nas candidaturas, devendo o rol previsto nos incisos do artigo 26 ser considerado meramente exemplificativo[39].

34.Há que se considerar, entretanto, que a própria legislação prevê exceção à regra no que se refere aos gastos que devam ser considerados para fins de registro, sendo o primeiro previsto no artigo 27 da Lei das Eleiçõesao dispor:

“Qualquer eleitor poderá realizar gastos, em apoio a candidato de sua preferência, até a quantia equivalente a um mil UFIR, não sujeitos a contabilização, desde que não reembolsados[40].”

35.Fato é que justiça eleitoral enfrentava o tema dando interpretação restritiva às doações eleitorais, verificando a subsunção da norma ao fato concreto, sem possibilidade de exceção ou ampliação interpretativa da norma eleitoral, passando a aplicar diversas penalidades de multa quando da infringência dos artigos 23 e 81 da Lei das Eleições, não havendo àquela época um controle rígido por parte da Receita Federal no cruzamento de dados entre valores doados e as informações prestadas no IRPF ou IRPJ.

36.Desta forma,após diversos embates jurídicos sobre o tema, no ano de 2009, o legislador, verificando os problemas que ocorriam com a interpretação literal do artigo 23, § 1º, inciso I, teve por bem incluir o § 7º no mencionado artigo quando da chamadaminirreforma eleitoral[41], com a seguinte redação:

“§ 7ºO limite previsto no inciso I do § 1º não se aplica a doações estimáveis em dinheiro relativas à utilização de bens móveis ou imóveis de propriedade do doador, desde que o valor da doação não ultrapasse R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais)”.

37.Passou-se a prever assim, somentepara asdoações estimáveis em dinheiro, uma exceção aos limites fixados na ordem de 10% dos rendimentos auferidos no ano anterior às eleições para as pessoas físicas e 2% do faturamento bruto para as pessoas jurídicas, desde que relativas ao uso de bens móveis (como veículos) e imóveis (utilizados como comitê de campanha) de propriedade do doador, mantendo os limites de gastos de doações em dinheiro.

38.Ainda que o doador declare valores em seu imposto de renda que não permitam a doação em dinheiro no valor de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais), está autorizado a fazer doação estimável em dinheiro acima dos 10% ou 2% (pessoa física ou jurídica), sem aplicação de qualquer penalidade pecuniária, quando realizada nos moldes do artigo 23, § 7º da Lei n. 9.504/97.

39.Como exceção à regra, também podemos citar o artigo 25, inciso Ie III, artigo 26e artigo 30, § 10,todos da Resolução TSE n. 23.376/2012, expedida para vigorar no pleito de vereadores e prefeitos de 2012.

“... a 10% dos rendimentos brutos auferidos por pessoa física, no ano-calendário anterior à eleição, declarados à Receita Federal do Brasil, excetuando-se as doações estimáveis em dinheiro relativas à utilização de bens móveis ou imóveis de propriedade do doador, desde que o valor da doação não ultrapasse R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais), apurados conforme o valor de mercado, bem como a atividade voluntária, pessoal e direta do eleitor em apoio à candidatura ou partido político de sua preferência”.

“ao valor máximo do limite de gastos estabelecido na forma do art. 3º desta resolução, caso o candidato utilize recursos próprios[42]”.

“As doações entre candidatos, comitês financeiros e partidos políticos deverão ser realizadas mediante recibo eleitoral e não estão sujeitas aos limites fixados nos incisos I e II do art. 25 desta resolução[43]”.

“A atividade voluntária, pessoal e direta do eleitor em apoio à candidatura ou a partido político de sua preferência não será objeto de contabilidade das doações à campanha, sem prejuízo da apuração e punição de eventuais condutas indevidas e excessos que configurem abuso do poder econômico ou qualquer outra infração a lei”.

40.Visando dar efetividade no controle da arrecadação de receitas para as campanhas eleitorais, referida resolução expedida pelo Tribunal Superior Eleitoralpreviu dentre as exceções acima mencionadas, uma importante regra administrativa de controle, ao prever um cruzamento de dados financeiros entre a receita federal e a justiça eleitoral em seu artigo 25, § 4º.

“A verificação dos limites de doação, após a consolidação pela Justiça Eleitoral dos valores doados, será realizada mediante o encaminhamento das informações à Receita Federal do Brasil que, se apurar excesso, fará a devida comunicação à Justiça Eleitoral, resguardado o respectivo sigilo dos rendimentos da pessoa física e do faturamento da pessoa jurídica.”

41.Importante frisar que,para fins de doação eleitoral não se deve levar em conta para caracterização do que é bem móvel e imóvel, o que preceitua o Código Civil[44], uma vez que as definições ali trazidas não se aplicam ao campo do direito eleitoral, por total ausência de correlação, uma vez que não se pode considerar como doação eleitoral o direito à sucessão aberta ou mesmo os direitos reais sobre objetos móveis.

42.No que se refere a doações eleitorais estimáveis em dinheiro de bens móveis ou imóveis de propriedade do doador, mesmo que feita acima do limite previsto no artigo 23, § 1º, inciso I, mas de acordo com a exceção contida no § 7º do mesmo artigo não há dúvidas ou interpretações divergentes na jurisprudência dos Tribunais Regionais Eleitorais[45].

43. A dúvida gerada nos dias atuaisestá no que se refere à prestação de serviços declarados como estimáveis em dinheiro por parte de doadores em valores acima do permitido pelo artigo 23, § 1º, inciso I (10% dos rendimentos declarados por pessoa física) e artigo 81 (2% do faturamento bruto por parte de pessoas jurídicas) da Lei das Eleições, mas dentro do limite previsto na exceção do § 7º do artigo 23 (valor máximo de R$ 50.000,00).

44.Impõe notar que os gastos eleitorais previstos no artigo 26 da Lei das Eleições para fins de registro podem ser doações estimáveis em dinheiro[46], bens móveis, imóveis e prestados em serviço, o que, em tese, deveria incidir a norma do § 7º do artigo 23, notadamente quando fruto da atividade econômica do doador ou seu engajamento político junto a um partido ou candidato.

45.A título exemplificativosabemos o quão comum nas eleições são as “doações estimáveis em dinheiro” consistentes em materiais gráficos(santinhos e jornais), imóveis para comitês, combustível para veículos destinados à locomoção dos candidatos ou cabos eleitorais, criação e locução de programas veiculados na TV e nas rádios, pesquisas, jingles e slogans de candidatos.

46.Referidas doações, estimáveis em dinheiro, são também prestações de serviço dos doadores, bens móveis de sua propriedade, fruto da atividade econômica desenvolvida no meio social, não se negando o caráter móvel do intelecto de alguns serviços que são prestados (serviços advocatícios, produção de programas e criação de jingles).

47.Ainda que se encontrem julgados em sentido contrário[47],fato é que ajurisprudênciados Tribunais Regionais Eleitorais do país, ao analisar a norma contida como exceção ao limite das doações eleitorais, unicamente quando referente a“doação estimável em dinheiro”, introduzida no ordenamento jurídico no ano de 2009 pela minirreforma eleitoral, inclina-se no sentido de abarcar também as hipóteses de prestação de serviços.

“... É cediço que para a caracterização de recursos estimáveis em dinheiro a doação deve derivar de cessão temporária de bens e/ou serviços, mensuráveis em dinheiro, mas, que por sua natureza, não transitam em conta bancária e não geram desembolso financeiro do recebedor. Tais bens e/ou serviços estimáveis em dinheiro, quando doados por pessoas físicas, devem constituirproduto de suas atividades econômicas e, no caso dos bens permanentes, deverão integrar o patrimônio do doador”. (TRE/GO Recurso Eleitoral n. 268-16.2011.6.09.0000 – j. 30.07.2012No mesmo sentido: Recurso Eleitoral n. 45791 – j. 27.08.2012).

ELEIÇÕES 2012. REPRESENTAÇÃO. PESSOA FÍSICA. DOAÇÃO EM EXCESSO. ALEGAÇÃO DE VIOLAÇÃO AO ART. 23, § 1º, I, DA LEI N. 9.504/97. DOAÇÃO ESTIMÁVEL EM DINHEIRO. PRESTAÇÃO DE SERVIÇO. APLICABILIDADE DO ART. 23, § 7º, DA LEI N. 9.504/97. DOAÇÕES LIMITADAS A R$ 50.000,00. LIBERALIDADE QUE OBSERVOU ESTE LIMITE. REPRESENTAÇÃO JULGADA IMPROCEDENTE. DECISÃO UNÂNIME.

1. A doação realizada por pessoa física à campanha eleitoral, relativa à prestação de serviços, com valor estimável em dinheiro inferior a R$ 50.000,00, é permitida nos termos do § 7º do art. 23 da Lei n. 9.504/97.

2. Existindo provas de que a liberalidade em favor de candidato encontra-se dentro do limite legal permitido, julga-se improcedente a representação. (TRE/AL 836-94.2011.6.02.0000, j. 09.06.2011 – No mesmo sentido: Representação n. 835-42, j. 30.11.2011[48]).

RECURSO ELEITORAL. DOAÇÃO ACIMA DO LIMITE LEGAL. BENS ESTIMÁVEIS EM DINHEIRO. PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. VALOR SUPERIOR A 10% DA RENDA DO DOADOR. INTELIGÊNCIA DO ART. 23, § 7º DA LEI N. 9.504/97. DOAÇÃO AQUÉM DO LIMITE MÁXIMO PERMITIDO. LICITUDE. PROVIMENTO.

1. Em se tratando de doações estimáveis em dinheiro, na forma de prestação de serviços, a jurisprudência pátria vem caminhando no sentido de atribuir interpretação extensiva ao art. 23, § 7º da Lei n. 9.504/97.

2. Dessa forma, o limite para este tipo de doação é de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais).

3. Doação abaixo do limite máximo previsto na legislação eleitoral.

4. Recurso provido.

(TRE/PA – Recurso Eleitoral n. 918-25.2011.6.14.0000. j. 31.01.2013).

48.No Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo(TRE/SP) o tema vem sendo enfrentado também com algumas contradições, não se podendo afirmar categoricamente que o tema está pacificado – apesar de alguns julgados informarem que está –, não havendo ainda totalsegurançajurídica sobre a questão ora debatida neste parecer.

49.Entretanto, colaciono aqui algumas decisões exaradas pelo Tribunal Eleitoral Bandeirante no sentido de prestigiar o reconhecimento da prestação de serviços como bem móvel “estimável em dinheiro”, permitido até o valor de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais), nos termos do artigo 23, § 7º da Lei das Eleições, impedindo a aplicação de multa eleitoral.

50.Em regra, o fundamento dos julgados para incluir a prestação de serviço do próprio doador como estimável em dinheiro é o fato de que os serviços profissionais, quando oriundos de sua própria atividade empresarial, não interferem em seus rendimentos brutos, descaracterizando o limite do artigo 23, § 1º, inciso I e artigo 81 da Lei n. 9.504/97.

RECURSO ELEITORAL - DOAÇÃO - AVENTADO EXCESSO AO LIMITE LEGAL (ART. 23 DA LEI 9.504/97) - DECADÊNCIA - AFASTADA – MÉRITO. DOAÇÃO CONSISTENTE EM PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS GRATUITOS À CAMPANHA - POSSIBILIDADE - ENGAJAMENTO POLÍTICO NÃO DEVE SER CONFUNDIDO COM EXCESSO DE DOAÇÃO - DOAÇÃO DE BENS ESTIMÁVEIS EM DINHEIRO - BENS DE PROPRIEDADE DO DOADOR - REDUÇÃO DA MULTA - RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.

No corpo do Acórdão temos:

(...)

“Parte da doação, estimada no valor de R$ 3.600,00, é referente à prestação de serviços "para campanha" (fls. 37). Portanto, não houve efetiva transferência de seu patrimônio para o do candidato”.

(...)

“Este E. Tribunal já firmou entendimento no sentido de que tal espécie de doação não gera o excesso previsto no art. 23, §3°, da Lei n° 9.504/97, ...”[49]

RECURSO ELEITORAL. DOAÇÃO ACIMA DO LIMITE LEGAL. PESSOA FÍSICA. ART. 23, § 1º, I, DA LEI N. 9.504/97. ELEIÇÕES 2010. (...) MÉRITO: ALEGAÇÃO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇO VOLUNTÁRIO E DOAÇÃO DE BENS MÓVEIS, ESTIMÁVEIS EM DINHEIRO (EXCEÇÃO PREVISTA NO § 7º, DO ART. 23, DA LEI 9.504/97). A ESPÉCIE DE DOAÇÃO (SERVIÇO VOLUNTÁRIO) NÃO ESTÁ SUJEITO AO LIMITE DE DOAÇÃO PREVISTO EM LEI. (...) RECURSO PROVIDO PARA JULGAR IMPROCEDENTE A REPRESENTAÇÃO[50].

“(...) Em relação ao mérito, importa reconhecer-se que a doação realizada pela recorrente consistiu em serviços gratuitos (atividade voluntária, conforme recibo eleitoral a folhas 34), e, assim, não tem relação com o critério considerado, pela lei eleitoral para a aferição do limite de liberalidades a partidos e candidatos em campanhas eleitorais, qual seja, o rendimento bruto auferido no ano anterior ao pleito. (...)”[51]

“REPRESENTAÇÃO ELEITORAL – DOAÇÃOPESSOA FÍSICA – AVENTADO EXCESSO AO LIMITE LEGAL (ARTS. 23, §§ 1º E 3º, DA LEI 9.504/97) – DOAÇÃO CONSISTENTE EM PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS GRATUITOS À CAMPANHA – POSSIBILIDADE – ENGAJAMENTO POLÍTICO NÃO DEVE SER CONFUNDIDO COM EXCESSO DE DOAÇÃO – RECURSO PROVIDO PARA JULGAR IMPROCEDENTE[52]”.

51.No recurso eleitoral n. 1192-53.2011.6.26.0000 – Relator Juiz EncinasManfré – ficou assentado o entendimento de que doação estimável em dinheiro consistente na prestação de serviços profissionais do doador que não interferem nos rendimentos brutos por ele declarados à Receita Federal devem ser enquadrados no § 7º, do artigo 23 da Lei n. 9.504/97[53].

52.Finalizando a questão trago ao conhecimento de Vossa Excelência trechos de didático acórdão proferido em julgamento do TRE/SP[54] da lavra do eminente Juiz Flávio Yarshellque informa o motivo pelo qual a doação estimável em dinheiro consistente em prestação de serviços gratuitos em campanha eleitoral deve estar submetida à regra do § 7º do artigo 23 da Lei das Eleições.

Sendo o contrato de natureza gratuita e não implicando em qualquer trânsito efetivo de recursos, não se pode impor ao demandado uma sanção lastreada em exigência de estimação que se justifica e se dirige essencialmente ao candidato, por força da exigência de sua prestação de contas. Sob a ótica desse último, de fato houve um recebimento estimável em dinheiro — daí a necessidade de declarar o valor. Mas, sob a ótica do requerido, não houve nenhuma transferência — direta ou mesmo indireta — de valores. Por outras palavras, seus rendimentos permaneceram intactos e aí parece residir ser o critério justo e jurídico a ser considerado nas doações estimadas em dinheiro: é preciso saber se de alguma forma elas diminuem os rendimentos do doador (ou, no caso de pessoa jurídica, de seu faturamento). Se a resposta é negativa, então não é caso de se impor a sanção, com a devida vênia de entendimento contrário.

(...)

“Finalmente, tenho que reputar engajamento de pessoa física em campanha como doação sujeita a penalização é instaurar insegurança nas relações que são próprias e corriqueiras no período eleitoral. Não se pode de forma razoável esperar que aquele que dispõe a trabalhar voluntária e gratuitamente numa campanha considere o valor estimado de seu trabalho no confronto com seus rendimentos. Tal raciocínio instauraria um subjetivismo incompatível, como dito, com a segurança jurídica e desestimularia algo que é saudável para o convívio democrático, que é a participação gratuita e voluntária das pessoas em campanhas. Pior ainda, vincular renda da pessoa física ao trabalho voluntário em campanha é gerar o risco de discriminação incompatível com o convívio democrático, pela indevida exclusão daqueles que, embora se dispondo a participar, não tenham rendimento compatível com o valor estimado do trabalho. Portanto, tratando-se de sanção, o tipo legal há que ser interpretado de forma estrita e não havendo doação — ainda que indireta — que interfira com a renda do réu (pessoa física), não há como se cogitar de irregularidade”.

53.Certo é que o ensinamento acima proferido dispensa maiores comentários acerca do tema, o que deveria fazer com que o entendimento pacífico e norteador das decisões proferidas nos julgamentos de casos eleitorais em casos análogos fossem tratados sempre da mesma forma, o que ainda não é a realidade.

54.Recentemente, o juízo da 23ª Zona Eleitoral do município de Bauru, ao julgar um caso de prestação de serviço gratuito em campanha eleitoral e informado na prestação de contas do candidato como doação estimável em dinheiro, consistente na locução de programa de rádio e TV, fruto da atividade empresarial do doador, houve por bem multá-lo no importe de R$ 28.000,00 (vinte e oito mil reais) por considerar que sua doação não estava submetida à exceção prevista na Lei das Eleições[55].

55.Há que se notar que o caso tratado em primeiro grau é emblemático no sentido da ausência de pacificação jurisprudencial sobre a questão, tendo em vista que o doador prestou serviços gratuitos e ainda foi multado, sendo incongruente o fato de que nada recebeu para trabalhar em razão de seu engajamento político, mas foi condenado a desembolsar muito mais à Justiça Eleitoral, com afetação de seu patrimônio financeiro.

56.O consulente pode verificar que as jurisprudências colacionadas são extremamente recentes, uma vez que a norma de exceção foi inserida no sistema eleitoral no ano de 2009, tendo sua primeira aplicação nas eleições de 2010 (presidente da república, senador, deputado federal, governador e deputado estadual), não tendo ainda o TSE se manifestado expressa e reiteradamente num processo judicial sobre o tema da prestação de serviços gratuitos em campanha.

57.No entanto, as decisões que submetem a prestação de serviços estimáveis em dinheiro à regra de exceção prevista no artigo 23, § 7º da Lei das Eleições parecem vir ao encontro do que futuramente poderá ser pacificado, até mesmo pelo fato de que o TSE, através da Resolução n. 23.376/2012 informou que “A atividade voluntária, pessoal e direta do eleitor em apoio à candidatura ou a partido político de sua preferência não será objeto de contabilidade das doações à campanha, sem prejuízo da apuração e punição de eventuais condutas indevidas e excessos que configurem abuso do poder econômico ou qualquer outra infração a lei”.

58.O Tribunal Superior Eleitoral sinaliza, assim, que a prestação de serviços gratuitos, estimáveis em dinheiro, deverá ser considerada como atividade voluntária do doador, não estando submetido aoslimites do artigo 23, § 1º, inciso I e artigo 81 da Lei das Eleições.

59.Se a atividade voluntária em campanha eleitoral sequer necessita ser objeto de contabilidade, motivo não existe para que a prestação de serviços gratuitos, informados como doação estimável em dinheiro, seja submetida aos limites legais de 10% dos rendimentos anuais do ano anterior às eleições para pessoas físicas e 2% do faturamento bruto para as pessoas jurídicas, passíveis ainda de multa, devendo estar submetida à regra que prevê o limite de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais).

60.Assim, em tese, doadores que prestam serviço sem fins econômicos, sem transferência de ativos financeiros entre contas abertas em instituições financeiras e sem destaque de seu patrimônio financeiro declarado à Receita Federal, não devem ser multados, conforme melhor orientação jurisprudencial.

61.A título ainda de esclarecimentos complementares informo que nos termos da orientação – esta pacificada – do TSE, o prazo para a interposição de representações eleitorais visando aplicação de multa em razão de doações acima do permitido pela legislação é de 180 dias da diplomação dos eleitos[56], devendo as informações prestadas pela Receita Federal aos juízes eleitorais serem determinadas por ordem judicial e não por mera requisição do Ministério Público Eleitoral, pena de violação ao disposto no artigo 5º, X da Constituição Federal[57].

62.No mais, a cumulação de aplicação de multa com a penalidade de inelegibilidade pelo prazo mínimo de 8 (oito) anos, deve ser devidamente analisada e imposta sob o prisma da proporcionalidade e razoabilidade.

63.A observância dos princípios acima, preceitos básicos do sistema legal vigente, é necessária em decorrência de se evitar penalizações demasiadas e alijamento do cidadão do processo eleitoral democrático, lembrando que o princípio da proporcionalidade integra uma exigência ínsita ao Estado Democrático de Direito, que impõe proteção ao indivíduo contra intervenções estatais desnecessárias, excessivas ou que causem aos cidadãos danos mais graves que o indispensável para a proteção dos interesses públicos em jogo.

64.DIANTE DE TUDO O QUE FOI EXPOSTO, passo à respostadas questões que foram, a mim, submetidas pelo Senhor Presidente do Diretório Municipal do Partido da República de Bauru:

Sobre o item (a),Existe diferença entre doação eleitoral “em dinheiro” e “estimável em dinheiro” para fins de aplicação de multa?E qual o valor máximo para cada uma?

Sim, existe diferença entre as doações eleitorais.

A doação “em dinheiro” transita pelas contas bancárias dos comitês e dos partidos políticos, tendo seus limites definidos em porcentagem de rendimentos declarados à Receita Federal, conforme se verifica no artigo 23, § 1º, I e 81 da Lei das Eleições devendo sempre ser contabilizada para fins de prestação das contas.

Enquanto isso, a doação“estimável em dinheiro” pode se dar através da prestação de serviços gratuitos, engajamento político, cessão de bens móveis e imóveis, em alguns casos com a desnecessidade de sua contabilização, não transitando por conta bancária e por fim tendolimites diferentes das “em dinheiro”, nos termos do artigo 23 e seu § 7º, que fixa o valor deste tipo de doação no importe de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais), sendo indiferente ser o doador pessoa física ou jurídica.

Sobre o item (b), A prestação de serviço gratuito é considerada doação “estimável em dinheiro” para fins de aplicação da multa?

A jurisprudência pátria ainda vacila sobre a questão, não havendo um entendimento pacífico sobre o tema, mas a corrente majoritária aceita a prestação de serviços gratuitos como “estimável em dinheiro”, dentro do limite de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais) e fruto da atividade econômica empresarial do doador.

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Sobre o autor
Rafael de Almeida Ribeiro

Advogado - Coordenador da comissão de direito eleitoral da OAB BAURU - Assessor de assuntos jurídicos do prefeito de Bauru.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

RIBEIRO, Rafael Almeida. Doação eleitoral estimável em dinheiro e a prestação de serviços. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3793, 19 nov. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/pareceres/25881. Acesso em: 19 abr. 2024.

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