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O registro de entidades sindicais

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25/04/2004 às 00:00
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I. Introdução

O registro de entidades sindicais constitui-se em tema da maior relevância, pois envolve os basilares princípios organizativos e o próprio sistema sindical brasileiro.

Inicialmente, a fim de bem caracterizar nossa própria organização sindical, há que se traçar um paralelo com os sistemas sindicais de outros países, mormente aqueles que nos serviram de inspiração. Ressalte-se que este estudo comparado tem o intuito não de buscar modelos, mas apenas de situar nossa posição frente ao cenário internacional.

Superada esta questão preliminar, devemos proceder à análise dos princípios constitucionais que criaram a nova organização sindical nacional a partir de 1988. A liberdade de associação, organização e administração dos sindicatos, bem como o sindicalismo de categorias que preserva a unicidade, servem de norte para presente estudo. Faz-se mister destrinçar o aparente antagonismo inscrito no art. 8º da Constituição Federal, entre a liberdade e a unicidade sindical.

Outrossim, a definição da natureza jurídica das entidades sindicais torna-se indispensável para a coerência do exame de mérito que a presente tese propõe.

Diante de tais premissas, estará aberto o caminho para a apreciação especifica da competência e da própria necessidade do registro de entidades sindicais.

Ao final, para que o presente estudo seja realmente profícuo, as propostas de reformas que serão encaminhadas ao Congresso Nacional pelo Fórum Nacional do Trabalho, as quais devem remontar nosso sistema sindical, sofrerão a pertinente análise crítica.


II. O Sistema e o Registro Sindical no Mundo

Os modernos sistemas sindicais constitucionais europeus, por volta da década de cinqüenta, acabaram com o corporativismo sindical estatal então vigente. Tal qual ocorreu no Brasil apenas em 1988, Itália, Espanha e Portugal adotam como direito fundamental o princípio da liberdade sindical.

II.A. Sindicalismo Italiano

O modelo sindical italiano é o que se pode designar como liberdade anárquica, pois além da autogestão, os sindicatos nascem por via espontânea, sem a necessidade de registro.

Não existe controle estatal que imponha condições para o nascimento de entidades sindicais. Exige-se apenas o registro cível em cartórios locais, os quais efetuam o registro das demais pessoas jurídicas de direito privado.

Dispõe o art. 39 da Constituição Italiana de 1948:

"art. 39 A organização sindical é livre. Aos sindicatos não pode ser imposta outra obrigação senão o seu registro junto a cartórios locais ou centrais, segundo as normas da lei."

A doutrina italiana consagra o artigo supra transcrito como a síntese do modelo sindical, princípio básico no qual repousam as demais normas.

As normas da lei a que se refere o indigitado dispositivo constitucional estão previstas pelo vigente Código Civil Italiano.

II.B. Sindicalismo Espanhol

A organização sindical espanhola assemelha-se ao modelo italiano. Após a queda do Franquismo, um novo sistema emergiu, sustentado nas Convenções Internacionais da OIT e elevando a liberdade sindical a princípio fundamental. Prevê o artigo 7º da Constituição Espanhola que

"art. 7º - Os sindicatos de trabalhadores e as associações empresariais contribuem para a defesa e promoção dos interesses econômicos e sociais que lhe são próprios. Sua criação e o exercício da atividade são livres dentro do respeito à Constituição e à lei. Sua estrutura interna e funcionamento deverão ser democráticos"

Ainda que a Carta Magna institua a livre criação de sindicatos, a legislação infraconstitucional estabelece critérios para a aferição do sindicato mais representativo, o qual será o único a exercer as prerrogativas privativas de sindicatos (poder de travar negociações coletivas).

Quanto ao registro, a Espanha adota o modelo de depósito dos Estatutos em órgão estatal específico, que o publica a fim de dar conhecimento aos interessados. Os interessados poderão impugná-lo ou ainda questionar sua legalidade, podendo inclusive levar a demanda ao judiciário.

Caso o sindicato não proceda ao registro formal de seus estatutos, ainda assim poderá funcionar livremente, todavia não gozará das prerrogativas exclusivas dos sindicatos legalmente reconhecidos.

Assim, tem-se que o modelo espanhol adota o sistema da livre associação. Entretanto, a criação de sindicatos, no estrito sentido do termo, possui alguns limites vislumbrados em critério definidos pelo Estado para a aferição da maior representatividade (critérios inscritos na Lei Orgânica de Liberdade Sindical).

II.B. Sindicalismo Português

A constituição portuguesa prescreve o princípio da liberdade sindical de modo bastante abrangente. Amauri Nascaro Nascimento resume com feliz simplicidade os princípios sindicais constitucionais portugueses.

"Assim, a liberdade sindical é declarada como liberdade de criação de associações sindicais, em todos os níveis: liberdade de inscrição, não podendo nenhum trabalhador ser obrigado a pagar contribuições para o sindicato em que não esteja inscrito; liberdade de organização e regulamentação interna das associações; direito de exercício de atividade sindical na empresa; e direito de tendência, nas formas estabelecidas pelos respectivos estatutos sindicais."

De outra parte, o modelo português estatui o registro obrigatório no Ministério do Trabalho. Mínimas formalidades são exigidas para o registro, sendo necessária apenas a juntada da ata de constituição. O Estatuto do Sindicato é publicado no Diário Oficial acompanhado de parecer sobre sua legalidade. O sistema confere ao Ministério Público a prerrogativa de ajuizar ação de extinção do sindicato com base em sua ilegalidade.


III. Princípios Constitucionais do Sistema Sindical Brasileiro

Ao contrário do que muitos afirmam, nossa organização sindical não se inspira no sistema corporativo da Carta Del Lavoro. Conforme bem assevera José Washington Coelho, nosso sistema é fiel ao modelo sindical italiano pós-corporativo.

O sistema sindical brasileiro, inaugurado com o advento da Constituição Federal de 1988, ao consagrar o princípio da liberdade sindical passou a comungar os mesmos princípios seguidos pelo sindicalismo europeu. Aliás, o controle do poder do Estado é a principal característica do constitucionalismo moderno.

O art. 8º da Carta Magna dispõe de forma inequívoca:

"art. 8º - É livre a associação profissional ou sindical, observado o seguinte: (...)

Nos termos do referido dispositivo constitucional, em que pese seja norma dominante, a liberdade sindical não é absolutamente livre, limites razoáveis lhe são impostos, conforme claramente se vislumbra da leitura dos seus incisos.

"(...)

I - a lei não poderá exigir autorização do Estado para a fundação de sindicato, ressalvado o registro no órgão competente, vedada aos Poder Público a interferência e a intervenção na organização sindical;

II – é vedada a criação de mais de uma organização sindical, em qualquer grau, representativa de categoria profissional ou econômica, na mesma base territorial, que será definida pelos trabalhadores ou empregadores interessados, não podendo ser inferior à área de um Município;

(...)

Do mesmo modo que o caput do art. 8º da Constituição Federal veda a autorização do Estado para a fundação de sindicatos, exige, através de ressalva, o registro no órgão competente.

Já o inciso II prevê a unicidade e o enquadramento por categorias como alicerces da organização sindical. Assim, não podem coexistir mais de um sindicato da mesma categoria, profissional ou econômica, dentro de uma idêntica base territorial.

Este aparente conflito, decorrente de algumas restrições impostas à liberdade sindical "livre" ou anárquica, é fruto das concessões mútuas que tornaram possível a criação deste novo sistema em 1988. José Washington Coelho narra, com a dramaticidade que lhe é peculiar, as negociações travadas por ocasião da Assembléia Constituinte.

"A história narrada por quem viu pode afirmar que o art. 8º da Carta Magna é a soma algébrica composta pela necessidade de alcançar equilíbrio de forças antagônicas por vezes inconciliáveis. Correntes vigorosas em choque dramático, pedindo demais e cedendo de menos, lutaram palavra por palavra, no declarado anseio de impor sua solução. O constituinte, pressionado e esprimido, compôs heterogêneo, muito próximo da técnica ‘uma no cravo, outra na ferradura’. Além disso, poucos dentre os constituintes, conheciam o sindicalismo. As decisões tornaram-se penosas e em momento algum surgiu apreciação sobre o conjunto da obra que estava sendo edificada".

A presente tese, nas palavras de Washington Coelho, através da costura hermenêutica, busca amontoar os retalhos a fim de "reduzir divergências, aproximar distantes, eliminar arestas e entalhar encaixes de modo a tornar unitário o que solto, é múltiplo."

A crítica meramente depreciativa feita por Amauri Mascaro Nascimento é despropositada, pois não há negar os interesses contemplados de ambos os lados, avanços inequívocos foram obtidos. O grande desafio era compor o modelo que, a exemplo de nossa miscigenação, é genuinamente brasileiro.

Segundo a Constituição Federal, nosso sistema contempla os princípios da liberdade de associação, organização e administração dos sindicatos. Tais princípios devem ser compreendidos de forma sistemática, considerando determinados limites específicos que são impostos.

Ao estabelecer a livre associação sindical, nossa Carta Magna vedou a ingerência do Estado nas entidades sindicais. Nem poderia ser diferente, visto que num Estado Democrático de Direito, as organizações de classe devem ter ampla e total liberdade de manifestação e reivindicação, a qual somente existirá sem qualquer interferência estatal. A intenção do constituinte foi clara e inequívoca, censurar o Poder Público em sua ânsia de controlar a sociedade, que tem nos sindicatos, uma das possibilidades mais contundentes de se fazer ouvir.

Assim, determinadas formalidades legais não podem diminuir as garantias e o direito das entidades sindicais de representar fielmente os interesses de sua categoria.

Os sindicatos devem ter autodeterminação, sendo norma básica e constitutiva seu Estatuto Social. Esta é inclusive a posição do Comitê de Liberdade Sindical da Organização Internacional do Trabalho sobre a livre organização sindical.

"A imposição, por lei, de um modelo obrigatório de estatutos sindicais, que os sindicatos devem acatar detalhadamente ou dele se utilizarem como marco de referência, viola os princípios que garantem a liberdade sindical. (...) É essencial que os trabalhadores e os empregadores possam exercer o direito de eleger livremente seus representantes, pois suas organizações dependem disso para poder atuar de uma forma efetiva e independente, e defender os interesses de seus filiados. Esse direito poderá ser plenamente afirmado se as autoridades públicas evitarem toda a ingerência que possa dificultar seu exercício ao determinar tanto as condições de elegibilidade dos dirigentes como procedimentos eleitorais."

Neste mesmo sentido, a livre administração sindical se revela através da não interferência na realização das assembléias gerais. No movimento sindical democrático, a assembléia geral é a voz da categoria, e portanto, deve ser absolutamente soberana, conforme determinam as regras da OIT.

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O conceito de Canotilho, citado na obra de Alexandre de Moraes, extrai o verdadeiro sentido da liberdade sindical prevista no sistema constitucional brasileiro:

"(...) é hoje mais que simples liberdade de associação perante o Estado. Verdadeiramente, o acento tônico coloca-se no direito á actividade sindical, perante o Estado e perante o patronato, o que implica, por um lado, o direito de não ser prejudicado pelo exercício de direitos sindicais e, por outro lado, o direito a condições de actividade sindical (direito de informação e de assembléia nos locais de trabalho, dispensa de trabalho para dirigentes e delegados sindicais). Finalmente, dada a sua natureza de organização de classe, os sindicatos possuem uma importante dimensão política que se alarga muito para além dos interesses profissionais dos sindicalizados, fazendo com que a liberdade sindical consista também no direito dos sindicatos a exercer determinadas funções políticas".

O princípio da liberdade sindical não pode ser visto como paradigma na dicotomia pluralidade e unicidade sindical, como faz crer Amauri Mascaro Nascimento. Esta confusão é comum, pois muito difundida pelos defensores da pluralidade sindical, que visam injustamente vincular a unicidade sindical ao sindicalismo corporativo do Estado paternal.

Em verdade, o legislador constituinte agiu com prudência no que pertine à matéria sindical, expurgando apenas o mal que a afligia, ou seja, seu atrelamento ao Estado. De outra parte, inteligentemente, preservou a organização até então vigente, calcada no sistema de unicidade categorial.

Novamente nos socorremos de Washington Coelho, que com extrema facilidade apresenta os valores básicos do sistema sindical constitucional brasileiro:

"São eles a liberdade como porta-estandarte, a unicidade como base estrutural, a compulsoriedade da contribuição como lastro para sustentação financeira e o sistema confederativo como telhado e conto de amarração."

Portanto, conforme já afirmado, tem-se que o conflito entre unicidade e liberdade sindical é apenas aparente. Não havendo qualquer interferência estatal na criação, administração e organização dos sindicatos, nada impede a vigência livre do sistema de unicidade sindical por categorias.


IV. A Natureza Jurídica das Entidades Sindicais

A discussão sobre o registro de entidades sindicais há que ser precedida por matéria das mais tormentosas, qual seja, a definição da natureza jurídica dos sindicatos.

A natureza jurídica dos sindicatos depende do sistema sindical em que estão inseridos, sendo classificados frente a três teorias principais.

A primeira define o sindicato como ente de direito privado, pois se trata de uma associação de pessoas para a defesa de seus interesses pessoais. Segundo esta corrente, os sindicatos seriam disciplinados pelas regras gerais pertinentes a esse setor do direito. Esta teoria conta com muitos defensores na doutrina nacional, dentre os quais, Russomano, Catharino, Waldemar Ferreira, Segadas Vianna, Délio Maranhão, Orlando Gomes e Élson Gottschalk.

Para a segunda, o sindicato é ente de direito público, sendo praticamente um apêndice do Estado. Por esta teoria, os interesses do sindicato confundem-se com os próprios interesses peculiares do Estado. Conforme ensina Amauri Nascaro, após a inscrição do princípio da liberdade sindical na Carta Magna de 1988, restaram poucos adeptos a esta teoria na doutrina nacional. Em geral, o sindicato tem a natureza de pessoa jurídica de direito público apenas nos regimes totalitários.

Por fim, a terceira posição é a do sindicato como pessoa jurídica de direito social. Um de seus grandes expoentes na doutrina nacional é Cesarino Júnior, para quem o sindicato é um ente que não se pode classificar exatamente nem entre as pessoas jurídicas de direito privado nem entre pessoas jurídicas de direito público.

Filiamo-nos a terceira corrente, pois compartilhamos o entendimento de Cesarino Júnior face ao caráter sui generis dos sindicatos.

Enquadrando os sindicatos no gênero pessoa jurídica de direito privado, necessariamente deveríamos classificá-los como associações civis. Com todo o respeito aos que comungam desta posição, não há como confundir os sindicatos com tais entidades. A principal e fundamental diferença entre sindicatos e associações civis é que essas representam apenas seus associados, enquanto aqueles representam toda a categoria, independente de associação.

Outro aspecto relevante para a caracterização da distinção é a receita do sindicato, que através da contribuição sindical, é compulsória.

Recentemente o Ministério do Trabalho e Emprego, ao editar a Portaria nº 1.277, reforçou o entendimento de que entre sindicatos e associações existe uma oceânica distinção.

Dispõe o art. 2º da indigitada Portaria que:

"art. 2º As entidades sindicais registradas no Ministério do Trabalho e Emprego não estão obrigadas a promover em seus estatutos as adaptações a que se refere o art. 2.031 da Lei nº 10.406 de 2002" (Novo Código Civil ).

Assim, mais uma distinção salta-nos aos olhos, pois as regras destinadas às associações civis não se aplicam aos sindicatos, os quais têm diplomas legais específicos (CLT, Convenções OIT, Constituição Federal).

Frise-se que dentre as considerações que motivaram a edição da supra citada Portaria, o MTE expressamente prescreveu:

"Considerando a existência na legislação trabalhista de normas específicas concernentes à organização sindical, dispostas no Título V do Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943 (CLT).

Considerando, finalmente a singularidade do sindicato como ente associativo (...)"

De outra parte, ante à inequívoca vigência do princípio da liberdade, defender a natureza pública do sindicato é apelar ao nonsense.


V. Da Competência para o Registro de Entidades Sindicais

Superada a celeuma da natureza jurídica das entidades sindicais, passamos a examinar a necessidade de registro, e, em caso positivo, a competência para tanto.

Conforme bem assevera Washington Coelho, o costume jurídico brasileiro é o registro. Diferentemente das pessoas físicas, não basta o puro nascimento de fato, a sociedade deve tomar conhecimento para que, a partir da existência de direito, as pessoas jurídicas possam constituir direitos e obrigações.

Esta tradição se traduz claramente no art. 45 do Novo Código Civil.

"art. Começa a existência legal das pessoas jurídicas de direito privado com a inscrição do ato constitutivo no respectivo registro, precedida, quando necessário, de autorização ou aprovação do Poder Executivo, averbando-se no registro todas as alterações por que passar o ato constitutivo"

Ainda que tal artigo destine-se exclusivamente às pessoas jurídicas de direito privado, sem dúvida ele nos revela com fidedignidade nossa tradição.

Não há divergência sobre a necessidade de registro de entidades sindicais.

No entanto, quanto à competência para o registro de entidades sindicais, doutrina e jurisprudência apresentam três correntes sobre a correta interpretação do inciso I do art. 8 da Constituição Federal de 1988, o qual institui a liberdade sindical.

A primeira corrente sustenta a suficiência do registro da entidade sindical no Registro Civil das Pessoas Jurídicas, a segunda entende que basta o registro junto ao Ministério do Trabalho, e a última exige o duplo registro.

Filiamo-nos a segunda corrente, pois não há qualquer razão jurídica que possa sustentar a necessidade de registro de sindicatos perante o Serviço de Registro Civil das Pessoas Jurídicas.

Consoante já visto, os sindicatos são associações sui generis, que não podem simplesmente enquadrar-se como pessoas jurídicas de direito privado.

Não se aplica aos sindicatos o art. 45 do Novo Código Civil, o qual dispõe que as pessoas jurídicas de direito privado passam a existir a partir da inscrição do ato constitutivo no respectivo registro. Tal norma destina-se apenas às pessoas jurídicas listadas no art. 44, quais sejam, associações, sociedades e fundações. Esta é inclusive a posição do MTE, externada no art. 2º da já citada Portaria nº 1.277.

Ademais, entendemos que não existe a distinção, difundida por alguns doutrinadores, entre a aquisição da personalidade jurídica e personalidade sindical. Nos termos das regras que regem o sindicalismo nacional, o nascedouro da entidade sindical deve ser o mesmo tanto para o exercício das prerrogativas privativas previstas no art. 513 da CLT, bem como para o exercício de todos os demais atos da vida civil

De outra parte, no sistema sindical brasileiro o registro de sindicatos é imprescindível para a plena vigência da regra da unicidade, elevada a cânone constitucional em 1988. O registro de sindicatos é o meio necessário para efetivação da unicidade sindical, conforme ensina Washington Coelho.

Aqui, é importante esclarecer que coisa absolutamente diversa da ingerência estatal é o controle da unicidade sindical exercido pelos próprios sindicatos, através do Ministério do Trabalho.

Instituída a unicidade sindical, mister se faz que alguém fiscalize a criação de sindicatos, sob pena de total desobediência ao sistema.

Neste diapasão, a Portaria nº 343/00 do MTE, com as modificações incluídas pela Portaria nº 376/00, estabelece as regras e procedimentos para a efetivação do Registro Sindical.

Dispõe o artigo 4º da indigitada Portaria que o pedido de registro sindical deve ser publicado no Diário Oficial da União. Assim o fazendo, o MTE dá publicidade a todas as demais entidades sindicais já registradas.

"art. 4º A Secretaria de Relações do Trabalho terá o prazo de sessenta dias, a contar da data de protocolo do pedido, para verificar a instrução do processo e publicar o pedido de registro no Diário Oficial da União ou notificar o requerente, mediante Aviso de Recebimento, a cumprir eventuais exigências."

Havendo conflito de representação, a mesma portaria, em seu art.5º, autoriza a apresentação de impugnação, em prazo determinado (30 dias a partir da publicação do pedido), por parte de eventual entidade prejudicada. Dependendo da apreciação da impugnação pelo MTE, constatado ou não o conflito de representação, o registro poderá ser sustado ou conferido.

"art. 5º A entidade sindical de mesmo grau, cuja representatividade coincida, no todo ou em parte, com a do requerente, terá o prazo de trinta dias para apresentar impugnação, contado da data da publicação de que trata o caput do artigo anterior.

art. 6º Findo o prazo a que se refere o art. 5º, a Secretaria de Relações do Trabalho terá quinze dias para proceder ao exame de admissibilidade das impugnações apresentadas e submeter ao Ministro de Estado a proposta de decisão.

Parágrafo único: O exame de admissibilidade de impugnação restringir-se-á à tempestividade do pedido, à representatividade do impugnante, nos 7termos do caput do art. 5º, à comprovação de Registro no Ministério do Trabalho e Emprego e de recolhimento do valor relativo ao custo da publicação, não cabendo a este Ministério analisar ou intervir sobre a conveniência ou oportunidade do desmembramento, desfiliação, dissociação ou situações assemelhadas". (grifos nossos)

A decisão do MTE deve ser proferida nos limites da sua competência constitucional, garantindo a unicidade sem ofender a liberdade sindical.

Desta forma, o registro perante o MTE não se configura em interferência estatal. O Estado apenas autoriza os próprios sindicatos a defender eventual violação à unicidade sindical.

Consagrando nossas posições aqui expostas, a mais alta corte do país entende, de forma uníssona, que o MTE é o órgão competente para proceder ao registro de entidades sindicais. A defesa da unicidade sindical é o argumento no qual sustentam-se as decisões proferidas pelo Supremo Tribunal Federal.

Ao editar a súmula nº 677 de sua jurisprudência majoritária, o Colendo STF praticamente encerrou a discussão:

"677 - Até que lei venha a dispor a respeito, incumbe ao Ministério do Trabalho proceder ao registro das entidades sindicais e zelar pela observância do princípio da unicidade."

Neste mesmo sentido, dispôs o MTE na Portaria nº 1.277/03 em seu art. 1º que "a personalidade jurídica sindical decorre de registro no Ministério do Trabalho e Emprego".

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Sobre o autor
Eduardo Caringi Raupp

advogado trabalhista e sindical no Rio Grande do Sul, pós-graduado em Direito Processual e Constituição pela UFRGS, integrante da Flávio Obino Filho Advogados Associados

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

RAUPP, Eduardo Caringi. O registro de entidades sindicais. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 9, n. 292, 25 abr. 2004. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/5127. Acesso em: 28 mar. 2024.

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