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A questão da preferência das micro e pequenas empresas no pregão

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02/02/2009 às 00:00
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O trabalho estuda o tratamento diferenciado em favor das microempresas e empresas de pequeno porte, especialmente no que se refere às licitações desenvolvidas pela modalidade pregão.

De acordo com o inc. IX do art. 170. da Constituição da República, a concessão de "tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sua sede e administração no País" constitui um dos princípios a orientar a ordem econômica nacional.

O próprio texto constitucional assegura, para a efetivação desse princípio, que:

Art. 179 A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios dispensarão às microempresas e às empresas de pequeno porte, assim definidas em lei, tratamento jurídico diferenciado, visando a incentivá-las pela simplificação de suas obrigações administrativas, tributárias, previdenciárias e creditícias, ou pela eliminação ou redução destas por meio de lei.

Visando à implementação desses preceitos na ordem infraconstitucional, foi sancionada, em 14.12.2006, a Lei Complementar nº 123, que estabelece normas gerais relativas ao tratamento diferenciado e favorecido a ser dispensado às microempresas e empresas de pequeno porte.

De acordo com os incs. I e II de seu art. 1º, essa Lei Complementar prevê normas gerais relativas à apuração e recolhimento de impostos e contribuições de todos os entes da Federação mediante regime único de arrecadação (inc. I) e ao cumprimento de obrigações trabalhistas e previdenciárias (inc. II). Até aí nenhuma novidade, pois as Leis nºs 9.317/96 e 9.841/99 já estabeleciam tratamento jurídico diferenciado, simplificado e favorecido às microempresas e empresas de pequeno porte nesses assuntos.

A novidade fica por conta da previsão contida no inc. III desse artigo, segundo a qual a Lei Complementar nº 123/06 também disciplina normas gerais sobre o "acesso a crédito e ao mercado, inclusive quanto à preferência nas aquisições de bens e serviços pelos Poderes Públicos" e outras regras de inclusão.

O objetivo do presente trabalho é discorrer acerca de aspectos relacionados com o tratamento diferenciado e favorecido estabelecido pela Lei Complementar nº 123/06 em favor das microempresas e empresas de pequeno porte, especialmente no que se refere à aplicabilidade de seus arts. 44. e 45 nas licitações desenvolvidas pela modalidade pregão.

Portanto, não serão tecidas considerações a respeito da edição de normas gerais sobre licitações e contratos administrativos por meio de lei complementar ou mesmo cogitações acerca de inconstitucionalidades que possam eivar de vício as disposições contidas no referido diploma legal, sobretudo em seus arts. 42. a 49. Nesse momento, inclina-se pelo entendimento de que as discriminações legais estabelecidas revestem-se de plena constitucionalidade, havendo de aguardar eventual manifestação do Supremo Tribunal Federal em sentido contrário.1


APLICAÇÃO DA PREVISÃO CONTIDA NOS ARTS. 44. E 45, INC. I, DA LEI COMPLEMENTAR Nº 123/06, NAS LICITAÇÕES PROCESSADAS PELA MODALIDADE PREGÃO

O art. 44. da Lei Complementar nº 123/06 prevê que:

Art. 44 Nas licitações será assegurada, como critério de desempate, preferência de contratação para as microempresas e empresas de pequeno porte.

Essa disposição, por si só, não representa nenhuma inovação, pois a Lei de Licitações já prevê, em seu art. 3º, § 2º e art. 45, § 2º, critérios de preferência para desigualar propostas empatadas. A inovação fica por conta da definição de empate, contida nos §§ 1º e 2º desse mesmo art. 44.

Via de regra, são consideradas empatadas propostas equivalentes, ou seja, propostas que além de atenderem aos requisitos técnicos fixados pelo instrumento convocatório da licitação consignem preços idênticos. No entanto, de acordo com o novo critério legal, entende-se por empatadas aquelas propostas apresentadas por microempresas e empresas de pequeno porte cujos preços sejam iguais ou até 10% superiores ao preço da proposta mais bem classificada (art. 44, § 1º). No caso de a modalidade empregada ser o pregão, a diferença de preço poderá ser de até 5% superior ao melhor preço (art. 44, § 2º).

Obviamente que para serem atingidas pelo critério de equalização de preços que empata as propostas, as ofertas apresentadas pelas microempresas e empresas de pequeno porte deverão satisfazer os requisitos técnicos exigidos pelo instrumento convocatório da licitação desde o princípio. A inovação legal não permite a modificação de aspectos relacionados com a qualidade do objeto ofertado, mas apenas com o fator preço, tornando empatadas (iguais) propostas cujos preços originariamente são desiguais.

Ocorrido o empate ficto criado pela lei, a microempresa ou empresa de pequeno porte mais bem classificada, e a princípio somente ela, terá a preferência para desempatar esse resultado, o que poderá fazê-lo com a apresentação de preço inferior àquele registrado na proposta, inicialmente considerado como menor valor na disputa. Sobre o assunto, o inc. I do art. 45. da Lei Complementar nº 123/06 prevê:

Art. 45 Para efeito do disposto no art. 44. desta Lei Complementar, ocorrendo o empate, proceder-se-á da seguinte forma:

I - a microempresa ou empresa de pequeno porte mais bem classificada poderá apresentar proposta de preço inferior àquela considerada vencedora do certame, situação em que será adjudicado em seu favor o objeto licitado;2

Exercício do direito de preferência

A finalidade do empate ficto e do direito de preferência é favorecer as microempresas e empresas de pequeno porte, fazendo com que suas ofertas sejam consideradas empatadas com as propostas apresentadas por empresas não enquadradas nessa condição, mesmo quando forem superiores em até 5% ou 10%, conforme a modalidade de licitação. Nessa hipótese, é dada preferência para a licitante microempresa ou empresa de pequeno porte desempatar o resultado.

Sendo essa a lógica que orienta a criação do empate fictício com a faculdade de a beneficiária exercer o direito de preferência, a aplicação desse direito somente terá cabimento se a melhor proposta não for desde logo apresentada por uma licitante enquadrada na condição de microempresa ou empresa de pequeno porte.

Fica claro que o objetivo do legislador é fazer com que uma licitante microempresa ou empresa de pequeno porte tenha condições de vencer a licitação e ser contratada pela Administração Pública, mesmo que originariamente não tenha apresentado a melhor proposta, somente vindo a fazê-lo com a fruição dos benefícios ora previstos.

Assim, se a melhor proposta auferida na licitação for desde logo de licitante considerada microempresa ou empresa de pequeno porte, tal objetivo terá sido atingido, não sendo necessário aplicar o critério de empate e o direito de preferência, ainda que a segunda melhor oferta também tenha sido apresentada por licitante nessa condição e preencha os requisitos do art. 44. da Lei Complementar.

Ainda que essa conclusão seja evidente e óbvia, o legislador fez questão de registrar expressamente essa condição no § 2º do art. 45. da Lei Complementar nº 123/06, ao consignar que:

§ 2º O disposto neste artigo somente se aplicará quando a melhor oferta inicial não tiver sido apresentada por microempresa ou empresa de pequeno porte.

Possíveis efeitos da aplicação dos arts. 44. e 45 nas licitações realizadas pela modalidade pregão

No pregão, as propostas inicialmente apresentadas podem sofrer modificação de seu valor em função de lances ofertados posteriormente. Por conta dessa dinâmica, é possível que a aplicação da disposição contida no inc. I do art. 45. da Lei Complementar nº 123/06 se revele pouco eficiente nas licitações processadas pela modalidade pregão, especialmente em sua versão presencial.

No pregão presencial, as licitantes têm a faculdade de apresentar a melhor proposta independente da aplicação dos fatores previstos na Lei Complementar nº 123/06, pois o pregoeiro somente encerra a disputa quando todas as licitantes participantes da fase de lances deixam de cobrir a melhor oferta.3 Por conta disso, parece possível cogitar a verificação de alguns efeitos nos próximos pregões presenciais.

O primeiro, no sentido de que as licitantes não atingidas pelos benefícios da Lei Complementar nº 123/06 busquem encerrar a fase de lances cotando valor com margem de diferença superior a 5% para o preço da licitante enquadrada como microempresa ou empresa de pequeno porte. Daí, não haveria empate e restaria inviável a aplicação do direito de preferência. Nesse caso, a Administração obteria, em tese, uma boa vantagem, pois a disputa tenderia a ser acirrada, provocando considerável redução do preço final. No entanto, a finalidade da lei complementar não se concretizaria.

O segundo efeito cogitável é que as licitantes consideradas microempresas ou empresas de pequeno porte não permitam o encerramento da fase de lances havendo diferença de preços superior a 5% para o menor valor, quando este for cotado por licitante não enquadrada no mesmo conceito jurídico. Essa situação poderá ocorrer principalmente quando for possível, no pregão presencial, a licitante oferecer preço inferior ao seu, mas não inferior ao menor até então registrado.4 Isso permitiria a licitante microempresa ou empresa de pequeno porte manter a margem de 5% e somente ao final, com o exercício da preferência, cobrir a melhor oferta. Nessa hipótese, a Administração somente obteria maior redução nos preços das propostas se a licitante não considerada microempresa ou empresa de pequeno porte entrar efetivamente na disputa e for acompanhada por licitante que pretenda exercer o direito de preferência. Caso contrário, bastará a licitante microempresa ou empresa de pequeno porte guardar a margem de 5% e ao final oferecer valor inferior em pelo menos um centavo.

Outro efeito possível será o desinteresse pela disputa na fase de lances pelas empresas não enquadradas como microempresas ou empresas de pequeno porte, quando a melhor oferta for oferecida por licitante que goze desse status e, em vista de razões econômicas e de mercado não lhe seja possível oferecer lance inferior além da margem dos 5%. Isso provocaria a ausência da redução de preços em sua totalidade, também fazendo com que a Administração não obtenha a melhor vantagem.

Como se vê, em que pese as disposições da Lei Complementar nº 123/06 realizarem, em certa medida, seus fins, especificamente o acesso das microempresas e empresas de pequeno porte ao mercado de compras públicas, podem acabar provocando efeito reverso no que se relaciona com a competitividade e economicidade objetivas pelas licitações realizadas sob a modalidade pregão presencial.

Os mesmos efeitos poderão ser verificados também no pregão em sua versão eletrônica, porém, com a atenuante de que em função do encerramento aleatório,5 as licitantes microempresas ou empresas de pequeno porte não terão tanta facilidade para se manter dentro da margem dos 5%, provocando desde logo o oferecimento da melhor oferta. Além disso, será preciso manter o sigilo que envolve as licitantes na fase de lances no pregão eletrônico, inclusive de modo a não identificá-las como licitantes microempresas ou empresas de pequeno porte ou licitantes excluídas desse conceito.

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Empate entre licitantes microempresas ou empresas de pequeno porte

É possível também que ocorra o empate entre duas ou mais licitantes enquadradas como microempresas ou empresas de pequeno porte. Restará configurada essa situação quando duas ou mais licitantes nessa condição apresentarem propostas escritas (no pregão presencial) ou propostas iniciais no sistema eletrônico (no pregão eletrônico) com valores idênticos e não houver posterior redução na fase de lances.

Em situação dessa espécie, se o valor por elas apresentado for o melhor e assim se mantiver até o final da fase de lances, deverá ser feito um sorteio para apontar aquela que poderá reduzir sua oferta e sagrar-se vencedora da fase de lances. Atente-se que não bastaria a realização de sorteio com fundamento no art. 45, § 2º, da Lei nº 8.666/93, para efeito de desempate. Necessariamente deve haver o sorteio para indicação da licitante que poderá exercer o direito de preferência, com a conseqüente redução de preço pela licitante sorteada, para ser considerada vencedora da fase de lances. Em que pese a inexistência de previsão legal para solucionar hipótese tão específica e peculiar como essa, o disposto no art. 45, inc. III, parece indicar a solução mais adequada e específica para o caso:

Art. 45 Para efeito do disposto no art. 44. desta Lei Complementar, ocorrendo o empate, proceder-se-á da seguinte forma:

(...)

III - no caso de equivalência dos valores apresentados pelas microempresas e empresas de pequeno porte que se encontrem nos intervalos estabelecidos nos §§ 1º e 2º do art. 44. desta Lei Complementar, será realizado sorteio entre elas para que se identifique aquela que primeiro poderá apresentar melhor oferta.

Entretanto, caso o valor apresentado inicialmente pelas licitantes enquadradas na condição de microempresas ou empresas de pequeno porte sejam equivalentes, porém não o melhor ao final da fase de lances, o sorteio apenas será necessário em situação que será tratada adiante.

Momento para aplicação dos arts. 44 e 45 no pregão

No pregão, a incidência das regras previstas nos arts. 44. e 45 da Lei Complementar nº 123/06 exige, em primeiro lugar, identificar o momento de aferição do empate. Isso porque se diferencia o valor da proposta do valor do lance, sendo o primeiro aquele apresentado na proposta escrita, no pregão presencial, ou na proposta encaminhada inicialmente pelo sistema, no pregão eletrônico. A partir daí, a modificação desse valor ocorre por meio de lances sucessivos, em fase própria, qual seja, a fase de lances.

A identificação do momento de aferição do empate assume relevância apenas em relação à licitação realizada pela modalidade pregão em sua versão presencial, pois nesta somente o autor da oferta de valor mais baixo e aqueles com ofertas com preços até 10% superiores ingressarão na fase de lances (art. 4º, inc. VIII, da Lei nº 10.520/02). Ademais, uma vez que no pregão eletrônico todas as licitantes participam da fase de lances, não faria sentido iniciar a disputa aplicando as disposições da Lei Complementar nº 123/06, já que ao final dessa etapa o resultado pode ser modificado.

A primeira vista, seria possível cogitar a aferição do empate e aplicação do direito de preferência para o desempate se dar logo na abertura das propostas inicialmente apresentadas pelos licitantes. Isso com base na interpretação literal do inc. I do art. 45:

I - a microempresa ou empresa de pequeno porte mais bem classificada poderá apresentar proposta de preço inferior àquela considerada vencedora do certame, situação em que será adjudicado em seu favor o objeto licitado. (Grifamos.)

De acordo com esse raciocínio, uma vez abertas as propostas das licitantes seriam aplicados os arts. 44. e 45 da Lei Complementar nº 123/06. Todavia, não parece adequado que a aferição de empate e conseqüente exercício de preferência se dêem tão-somente em relação às propostas iniciais no pregão. Tal entendimento não assegura efetiva preferência, mas apenas que as licitantes consideradas microempresas ou empresas de pequeno porte com propostas inicialmente fora da margem dos 10% (art. 4º, inc. VIII, da Lei nº 10.520/02), pudessem obter a chance de ingressar na fase de lances. Ademais, como dito, essa interpretação surtiria efeitos somente no pregão presencial, uma vez que o critério da Lei nº 10.520/02, inexplicavelmente, não é aplicado ao pregão eletrônico.6

Assim, em que pese o emprego da expressão "proposta" no inc. I do art. 45, o § 3º desse mesmo artigo permite formar outra interpretação, de modo que o critério legal de empate e o exercício da preferência, no pregão, sejam aplicados ao final da fase de lances. De acordo com esse dispositivo da Lei Complementar nº 123/06, a microempresa ou empresa de pequeno porte mais bem classificada poderá apresentar nova proposta no prazo máximo de cinco minutos após o encerramento dos lances.

Então, encerrada a fase de lances, se a vencedora for uma microempresa ou empresa de pequeno porte, não haverá incidência das regras em análise (art. 45, § 2º). Todavia, se a melhor proposta for apresentada por uma empresa excluída desse conceito, cumprirá ao pregoeiro verificar se alguma licitante microempresa ou empresa de pequeno ofereceu lance final com preço até 5% superior ao melhor registrado. Havendo licitante nessa condição, o pregoeiro deverá convocá-la formalmente para, no prazo de cinco minutos, se assim desejar, ofertar nova proposta inferior àquela inicialmente vencedora da fase de lances.

Prazo de cinco minutos

Seja qual for a versão pela qual se processa o pregão, não faz sentido o prazo de cinco minutos previsto no § 3º do art. 45. da Lei Complementar nº 123/06 iniciar imediatamente após o encerramento da fase de lances, como menciona a letra da Lei. Nesse momento, o pregoeiro necessariamente ainda não sabe se haverá ou não propostas empatadas ou mesmo se será o caso de uma licitante microempresa ou empresa de pequeno porte pretender se valer do direito de preferência.

Somente após o encerramento da fase de lances e passando a ordem inicial de classificação da fase de lances em revista, é que o pregoeiro poderá identificar se há ou não propostas empatadas conforme o critério legal. Além disso, a própria Lei Complementar nº 123/06 determina que a microempresa ou empresa de pequeno porte mais bem classificada seja convocada para apresentar nova proposta no prazo máximo de cinco minutos após o encerramento dos lances.

Concluindo pela existência de uma licitante apta a usufruir o direito de preferência, o pregoeiro deve formalmente convocá-la para essa finalidade específica, bem como registrar o exato momento em que se iniciará a contagem do prazo para tanto. O dever de transparência exige a indicação formal do momento em que se inicia a contagem do prazo, já que o decurso desse lapso temporal sem manifestação da licitante importa em preclusão de seu direito de preferência.

Cite-se, ainda, que a ausência de indicação do momento exato de fruição do prazo em análise impede posteriormente o efetivo controle dos atos do pregoeiro. Não há meios adequados para se examinar se o prazo legal foi cumprido se não houver a clara e inequívoca indicação de seu início e fim.

Identificação da licitante como microempresa ou empresa de pequeno porte

Outro fator relevante para o exercício da preferência, é a identificação da licitante como sendo uma microempresa ou empresa de pequeno porte. O novo Estatuto Nacional da Microempresa e da Empresa de Pequeno Porte define, em seu art. 3º, as pessoas enquadradas nessa condição:

Art. 3º Para os efeitos desta Lei Complementar, consideram-se microempresas ou empresas de pequeno porte a sociedade empresária, a sociedade simples e o empresário a que se refere o art. 966. da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002, devidamente registrados no Registro de Empresas Mercantis ou no Registro Civil de Pessoas Jurídicas, conforme o caso, desde que:

I - no caso das microempresas, o empresário, a pessoa jurídica, ou a ela equiparada, aufira, em cada ano-calendário, receita bruta igual ou inferior a R$ 240.000,00 (duzentos e quarenta mil reais);

II - no caso das empresas de pequeno porte, o empresário, a pessoa jurídica, ou a ela equiparada, aufira, em cada ano-calendário, receita bruta superior a R$ 240.000,00 (duzentos e quarenta mil reais) e igual ou inferior a R$ 2.400.000,00 (dois milhões e quatrocentos mil reais).7

Facilmente percebe-se a ausência de indicação legal acerca de critério para identificação de uma microempresa ou empresa de pequeno porte, além da previsão contida no art. 3º e parágrafos. Disso surge dificuldade para o pregoeiro saber quais licitantes são verdadeiramente enquadradas como microempresas ou empresas de pequeno porte, portanto merecedoras dos benefícios e preferências estabelecidas na Lei Complementar nº 123/06 e quais não são.

A prova de inscrição no Regime Especial Unificado de Arrecadação de Tributos e Contribuições devidos pelas Microempresas e Empresas de Pequeno Porte – Simples Nacional, não parece ser o único documento hábil a comprovar se a licitante está enquadrada nessa condição. Isso porque, toda licitante inscrita nesse regime, com certeza, será microempresa ou empresa de pequeno porte, mas nem toda microempresa ou empresa de pequeno porte estará obrigatoriamente inscrita nesse regime.8 Trata-se de uma faculdade e não obrigação, optar pelo recolhimento mensal, mediante documento único de arrecadação de tributos.

Na falta de um documento oficial que identifique, sem dúvida, qual licitante é uma microempresa ou empresa de pequeno porte, sugere-se o edital disciplinar a forma de comprovação. De igual modo, sugere-se também a solicitação de uma declaração nesse sentido. Assim, a licitante enquadrada nessa condição deverá declará-la no momento de seu credenciamento no pregão. Isso permitirá ao pregoeiro identificá-la como beneficiária de tratamento diferenciado, nos exatos limites da Lei Complementar nº 123/06.

Essa forma de comprovação é, obviamente, relativa, pois admite prova em sentido contrário. Assim, se uma licitante resolver recorrer de decisão do pregoeiro alegando que licitante recorrente fez falsa declaração, caberá à recorrente o ônus da prova. Se a licitante recorrente não produzir prova necessária para procedência de seu recurso, por força do princípio da legalidade e seus desdobramentos (verdade material e autotutela), entende-se que a Administração deva diligenciar no sentido de apurar se a licitante recorrida efetivamente preenche os requisitos legais para receber o tratamento dispensado pela Lei Complementar nº 123/06.

Ao que tudo indica, a fixação de condição no edital exigindo declaração das licitantes de que são microempresas ou empresas de pequeno porte, conforme acima sugerida, vem sendo adotada pelos órgãos e entidades da Administração Pública que já fazem previsão da aplicação da Lei Complementar nº 123/06 em suas licitações. Cite-se, nesse sentido, modelo de declaração constante de edital de licitação promovida pelo Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo.9

Representação no pregão presencial

Como visto, nas licitações pela modalidade pregão, a Lei Complementar nº 123/06 estabelece um prazo certo para o exercício do direito de preferência, o que permite concluir pela inexistência de interrupção do procedimento licitatório que propicie a intimação do representante da licitante beneficiada para manifestação em data posterior. Ao contrário, esgotado o prazo de cinco minutos preclui o direito de exercer esse direito.

Sendo titular do direito em tela e pretendendo exercê-lo, mais do que nunca a licitante deverá se fazer representar por pessoa habilitada no pregão presencial. Consideram-se aptos para tanto o representante legal com poderes definidos no ato constitutivo da sociedade empresária ou da sociedade simples ou, ainda, o próprio empresário a que se refere o art. 966. da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002, enquadrados como microempresas ou empresas de pequeno porte. Além deles, também estará apto para exercer a representação o procurador constituído por instrumento de mandato específico para esse fim.

Dessa forma, ainda que a Administração não condicione a participação no pregão presencial à efetiva representação da licitante na sessão, ela deve estar ciente de que não terá prazo extra para apresentação de nova oferta, ainda que seja merecedora do benefício previsto no art. 45, inc. I, da Lei Complementar nº 123/06.

Redução a termo da nova proposta

A licitante que se valer da prerrogativa prevista no inc. I do art. 45. da Lei Complementar nº 123/06 deverá formalizar verbalmente (no pregão presencial) ou por meio eletrônico (no caso de pregão eletrônico) o valor da nova proposta. Essa oferta deve ser inferior àquela até então melhor classificada e sua declaração tem efeito vinculante. Todavia, no pregão presencial não nos parece que o pregoeiro possa deixar de exigir sua formalização por escrito, ainda que isso se dê com a assinatura da ata da sessão de licitação. No pregão eletrônico, o próprio sistema já se encarrega de formalizar o novo valor.

Contudo, há casos em que o valor da oferta se forma a partir da composição de custos de insumos e encargos em planilhas de preços, a exemplo da contratação de serviços de limpeza, vigilância, obras e serviços de engenharia, etc. Nesses casos, o Decreto federal nº 5.450/05 – Regulamento do Pregão Eletrônico no âmbito da Administração Pública federal – prevê, no § 6º de seu art. 25, que:

§ 6º No caso de contratação de serviços comuns em que a legislação ou o edital exija apresentação de planilha de composição de preços, esta deverá ser encaminhada de imediato por meio eletrônico, com os respectivos valores readequados ao lance vencedor. (Grifamos.)

Classificação

Licitante

Status

Preço

A

Não ME / Não EPP

100

B

ME

101

C

EPP

102

X

EPP

102

D

EPP

103

E

ME

106

Assim, além da nova oferta dentro do prazo de cinco minutos, a licitante também deve apresentar planilha com preços readequados ao valor final. Ainda que o decreto crie a obrigação de a planilha de composição de preços ser encaminhada de imediato, é de se reconhecer a necessidade de o edital fixar um prazo condizente para tanto, pois a expressão "de imediato" tem conteúdo e alcance bastante subjetivos.

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Sobre o autor
Ricardo Alexandre Sampaio

Advogado e Consultor jurídico na área de licitações e contratos. Especialista em Direito Administrativo. Diretor técnico da Zênite Informação e Consultoria S.A., Coordenador Editorial das Revistas Zênite de Licitações e Contratos - ILC e de Direito Administrativo e LRF - IDAF. Colaborador da obra: "Lei de Licitações e Contratos Anotada" (6ª ed., 2005, Zênite Editora). Autor de diversos artigos jurídicos.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SAMPAIO, Ricardo Alexandre. A questão da preferência das micro e pequenas empresas no pregão. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 14, n. 2042, 2 fev. 2009. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/12277. Acesso em: 23 abr. 2024.

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