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Da aplicabilidade da moratória legal na execução trabalhista

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O presente artigo trata da polêmica sobre a possibilidade de aplicação da moratória legal na execução trabalhista

1. Noções introdutórias

Moratória se diz a Provisão do Príncipe, em virtude da qual os credores devem conceder aos seus devedores tempo determinado para essa provisão durante o qual não podem inquietá-los.

No Brasil, hodiernamente, o instituto da moratória legal apesar de encontrar alguma resistência, vem sendo cada vez mais utilizada. Encontra assentamento no artigo 745-A do Código de Processo Civil Brasileiro e representa um novo avanço introduzido pela Lei 11.382/2006:

Art. 745-A. No prazo para embargos, reconhecendo o crédito do exeqüente e comprovando o depósito de 30% (trinta por cento) do valor em execução, inclusive custas e honorários de advogado, poderá o executado requerer seja admitido a pagar o restante em até 6 (seis) parcelas mensais, acrescidas de correção monetária e juros de 1% (um por cento) ao mês. (Incluído pela Lei nº 11.382, de 2006).

§ 1o Sendo a proposta deferida pelo juiz, o exeqüente levantará a quantia depositada e serão suspensos os atos executivos; caso indeferida seguir-se-ão os atos executivos, mantido o depósito. (Incluído pela Lei nº 11.382, de 2006).

§ 2o O não pagamento de qualquer das prestações implicará, de pleno direito, o vencimento das subseqüentes e o prosseguimento do processo, com o imediato início dos atos executivos, imposta ao executado multa de 10% (dez por cento) sobre o valor das prestações não pagas e vedada a oposição de embargos. (Incluído pela Lei nº 11.382, de 2006).

O presente instituto revela a notória preocupação do legislador em garantir o cumprimento da dívida, de modo menos prejudicial ao devedor, incentivando com isso a solução do conflito.

Em que pesem divergências afirmando que a moratória judicial só encontra aplicação na execução extrajudicial, a tese majoritária afirma ser admissível em sede de execução do título judicial, que pode ser utilizado dentro do prazo para impugnação à pretensão do cumprimento da sentença, ou ainda em prazo para interposição de embargos à execução. E seu surgimento no processo condiz com a hipótese de suspensão voluntária dilatória do processo executivo, que apenas carece da concessão pelo juiz como forma de pacificação social, evitando a demora no cumprimento da sentença, dado à evidência de que o devedor pretende ver-se livre dela, bem como impedir a discordância do credor que, almejando receber o que tem direito de uma só vez, poderia (como realmente acontece) invadir de forma espoliativa o patrimônio do devedor, deixando-o à míngua de recursos mínimos que lhe possibilitem a sobrevivência, ou ainda, exaurindo todo este patrimônio antes mesmo que seu crédito venha a ser integralmente satisfeito.

Trazendo a matéria para a seara trabalhista, questiona-se a aplicabilidade do instituto no campo juslaboral, tendo em vista que a CLT silencia sobre o assunto. Todavia, a Consolidação traz em seu bojo a permissão da aplicação subsidiária das normas do direito processual comum, conforme dispositivo in verbis:

Art. 769 - Nos casos omissos, o direito processual comum será fonte subsidiária do direito processual do trabalho, exceto naquilo em que for incompatível com as normas deste Título.

Tal polêmica será o centro do presente trabalho, com análise doutrinaria e jurisprudencial sobre o tema.


2.     A moratória legal versus o artigo 889 CLT

Um dos pontos de dúvida sobre a aplicação ou não do instituto processual civil da moratória no processo trabalhista é se essa utilização entraria em confronto com o artigo 889 da Clt, in verbis:

Art. 889 - Aos trâmites e incidentes do processo da execução são aplicáveis, naquilo em que não contravierem ao presente Título, os preceitos que regem o processo dos executivos fiscais para a cobrança judicial da dívida ativa da Fazenda Pública Federal.

Aplicando a literalidade da lei apenas concluiríamos que a moratória legal não caberia no processo trabalhista, pois esse encontraria como fonte subsidiaria a lei 6830 de 22.09.1980, que dispõe exatamente sobre processo a cobrança judicial da dívida ativa da Fazenda Pública.

Todavia, faz-se necessária uma interpretação sistemática das normas celetistas. O artigo 769 da CLT afirma que o direito processual comum será fonte subsidiária do direito processual do trabalho, exceto naquilo em que for incompatível e o 889 da CLT traz uma aplicação subsidiária ao processo de execução. Assim, fazendo uma análise conjunta podemos concluir que à execução trabalhista aplicam-se os dois artigos. ou seja, o instituto da moratória legal é aplicável à execução trabalhista, até mesmo porque o artigo 889 da CLT não impõe em momento algum uma aplicação subsidiária exclusiva ou taxativa.   


3.     Considerações doutrinárias e jurisprudenciais

No âmbito da Justiça trabalhista, a aplicabilidade da moratória legal encontra-se cada vez mais comum, tendo várias decisões favoráveis a sua aplicação.

Weber Leite ressalta que:

“As normas do CPC são subsidiariamente aplicáveis pelo juiz do trabalho, não vinculando o juiz, pois estes podem se valer das mesmas caso seja para dar maior efetividade a prestação jurisdicional, houver omissão (não sendo cabível se a CLT possui norma sobre a matéria a que se pretende buscar no processo civil , assim, as normas do processo civil só são empregadas no caso de omissão da legislação trabalhista) e, constatando-se eventual omissão, somente será utilizado quando houver compatibilidade com os princípios específicos e informativos do Processo laboral.”

     Assim, cabe ao juiz ponderar a real necessidade da aplicação do instituto diante do caso concreto, como assevera ainda o referido autor:

    “As normas do CPC são subsidiariamente aplicáveis pelo juiz do trabalho, não vinculando o juiz, pois estes podem se valer das mesmas caso seja para dar maior efetividade a prestação jurisdicional, houver omissão (não sendo cabível se a CLT possui norma sobre a matéria a que se pretende buscar no processo civil , assim, as normas do processo civil só são empregadas no caso de omissão da legislação trabalhista) e, constatando-se eventual omissão, somente será utilizado quando houver compatibilidade com os princípios específicos e informativos do Processo laboral.”

A norma do artigo 745-A do CPC satisfaz, portanto a exigência do art. 769 da CLT, pois se mostra compatível com os princípios informativos do Processo do Trabalho. Observe-se a colocação feita por Francisco das C. Lima Filho,

"Nomeadamente os princípios da celeridade, da conciliação e da proteção ao trabalhador, em regra autor das ações trabalhistas que poderá além de receber desde logo 30% de seu crédito, ver quitado o restante em razoável espaço de tempo (seis parcelas) sem ter que esperar uma longa e não raro morosa execução cheia de percalços que poderá inclusive terminar sem nenhuma efetividade, como a realidade e a experiência forense nos tem mostrado em muitos casos".

   No âmbito jurisprudencial, os tribunais têm posições divididas. Há tribunais que entendem ser possível a aplicação. Citamos abaixo algumas decisões recentes:

TRT-10 - Agravo de Petição AP 1165199581110856 DF 01165-1995-811-10-85-6 AP (TRT-10)

Data de publicação: 07/12/2012

Ementa: PARCELAMENTO DA DÍVIDA EM EXECUÇÃO PREVISTO NO ARTIGO745-A DO CPC . APLICAÇÃO SUBSIDIÁRIA AO PROCESSO DO TRABALHO. ADEQUAÇÃO. Não se visualiza qualquer impedimento à aplicação no processo do trabalho do parcelamento previsto no art. 745-A do CPC , até porque compatível com os princípios da efetiva execução e da menor onerosidade ao devedor, desde que, é lógico, observados os requisitos legais para tanto. Na hipótese, porém, não restaram atendidos dois dos requisitos imprescindíveis à adoção do procedimento em questão, quais sejam, a formulação do requerimento de parcelamento no prazo para o ajuizamento dos Embargos à Execução e a intimação prévia do Credor Exequente para manifestar sua concordância, ou não, com o pagamento na forma prevista no art. 745-A do CPC.

TRT-10 - Relatório e Voto. Agravo de Petição: AP 799201200410007 DF 00799-2012-004-10-00-7 AP Data de publicação: 31/01/2014

Decisão: em execução, invocando os termos do artigo 745-A do CPC. O Exequente apresenta contraminuta às fls. 271/278,... DA DÍVIDA EM EXECUÇÃO PREVISTO NOARTIGO 745-A DO CPC. APLICAÇÃO SUBSIDIÁRIA AO PROCESSO... é o precedente seguinte: ?EXECUÇÃO. PARCELAMENTO. ARTIGO 745-A DO CPC.?APLICABILIDADE NA EXECUÇÃO...

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TRT-4 - Inteiro Teor. AGRAVO DE PETICAO AP 312200533204003 RS 00312-2005-332-04-00-3 (TRT-4)

Data de publicação: 29/01/2009

Decisão: subsidiariamente, a aplicação do artigo 745-A do CPC , no sentido de ser autorizado o parcelamento... do artigo 745-A do CPC , no sentido de ser autorizado o parcelamento do débito em seis parcelas,... 745-A do CPC (fls. 500/503). No entanto, embora faça menção de que estaria indicando bens...

     Alguns tribunais, entretanto, vêm entendendo em sentido oposto, ou seja,  incabível o instituto em análise no processo trabalhista:

TRT-1 - Agravo de Peticao AP 00000220220115010008 RJ (TRT-1)

Data de publicação: 04/02/2014

Ementa: ACÓRDÃO EM AGRAVO DE PETIÇÃO ARTIGO 745-A DO CPC . INAPLICÁVEL AO PROCESSO DO TRABALHO. Inexiste omissão na CLT que permita a aplicação do artigo 745-A, do CPC. O artigo 880 , da CLT fixa prazo e procedimentos para pagamento da dívida pela executada, não comportando o título judicial qualquer parcelamento contrário à vontade do credor.

TRT-2 - AGRAVO DE PETICAO AGVPET 4942920115020 SP 00004942920115020443 A28 (TRT-2)

Data de publicação: 21/02/2014

Ementa: O parcelamento da dívida prevista no artigo 745-A do CPC é inaplicável na Justiça do Trabalho.


4.     Conclusão

Longe de esgotar o tema, diante do estudo proposto é possível chegar à conclusão que o artigo 745-A é compatível com a execução trabalhista, devendo sua aplicabilidade ser ponderada no caso concreto.

O direito do Trabalho e o processo que o envolve possui características historicamente peculiares que o fizeram desenvolver-se de modo mais eficiente que muitos ramos processuais, fazendo com que as respostas às ações sejam mais eficientes e céleres, entendemos que negar a aplicabilidade da moratória legal seria causar um retrocesso no desenvolvimento processual trabalhista, que além da sua busca reconhecida pela celeridade, almeja soluções viáveis e que não impossibilitem muitas vezes a continuidade do empreendimento em nome do bem estar social.

Assim, o instituto da moratória legal pode ser aplicado ao processo trabalhista, não havendo ilegalidade e sendo compatível com os princípios que regem o direito trabalhista. Ressalta-se que sua aplicação não deve ser feita de modo impositivo e deve observar a necessidade do caso concreto.


Bibliografia

BRASIL. Código de Processo Civil (1973). Lei n° 5.869 de 11 de janeiro de 1973. Vade Mecum Acadêmico de Direito. Anne Joyce Angher. 8. ed. São Paulo: Rideel, 2009.

COUTINHO FILHO, Gabriel Lopes. Cabimento do parcelamento do crédito na execução trabalhista, na forma do art. 745-A, do CPCJus Navigandi, Teresina, ano 18n. 3758[15] out. [2013]. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/25516>. Acesso em: 22 abr. 2014.

MARAL, Paulo Osternack. O direito ao parcelamento do débito (art. 745-A do CPC) incide no cumprimento de sentença?. Informativo Justen, Pereira, Oliveira e Talamini, Curitiba, nº 28, junho 2009, disponível em http://www.justen.com.br/informativo.

LEITE, Imperatriz Beraldino Weber. Análise do artigo 745-A do Código de Processo Civil com a redação dada pela Lei 11.382 de 2006. Disponível em http://www.lfg.com.br.

PINTO, Bruno Ítalo Sousa. Artigo 745-A do CPC: a natureza jurídica do parcelamento da dívida e outras polêmicas . Jus Navigandi, Teresina, ano 12, n. 1897, 10 set. 2008.

THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil.Processo de execução e cumprimento da sentença, processo cautelar e tutela de urgência. 42ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2008.

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Sobre a autora
Patrícia Karla de Sousa Moura

Graduada em Direito pela Universidade Federal do Piauí. Pós Graduanda em Direito e Processo do Trabalho pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Advogada.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MOURA, Patrícia Karla Sousa. Da aplicabilidade da moratória legal na execução trabalhista. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 20, n. 4222, 22 jan. 2015. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/31016. Acesso em: 26 abr. 2024.

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