Por Lucas Soares Fontes
Introdução
-Releitura do instituto dos bens públicos pelas lentes do Pós-Positivismo.
-Noção pautada na instrumentalidade dos bens aos direitos fundamentais.
Conceito:
-Tratativa tradicional: classificação macroscópica de bens públicos e privados.
-Art. 98. CC: São públicos os bens do domínio nacional pertencentes às pessoas jurídicas de direito público interno; todos os outros são particulares, seja qual for a pessoa a que pertencerem
- Patrimonialidade Regime Jurídico
Espécies / Categorias (Classificação quanto á destinação):
Art. 99. São bens públicos:
I - os de uso comum do povo, tais como rios, mares, estradas, ruas e praças;
II - os de uso especial, tais como edifícios ou terrenos destinados a serviço ou estabelecimento da administração federal, estadual, territorial ou municipal, inclusive os de suas autarquias;
III - os dominicais, que constituem o patrimônio das pessoas jurídicas de direito público, como objeto de direito pessoal, ou real, de cada uma dessas entidades.
Art. 103. O uso comum dos bens públicos pode ser gratuito ou retribuído, conforme for estabelecido legalmente pela entidade a cuja administração pertencerem.
- Bens de Uso Comum (Domínio Público) característica principal é o interesse de todos e a possibilidade de fruição universal. Ex. ruas, praças e mares
2. Bens de Uso Especial são aqueles destinados a um fim determinado; é utilizado como estabelecimento de um ente público ou a execução de serviços públicos.
3. Bens Dominicais sem utilidade; sem destinação específica; bens desafetados ex. terras devolutas
Regime Jurídico dos bens públicos:
-Questionamento: A quais bens de propriedade do Estado deve-se conceder proteção diferenciada?
-A priori, sob o referencial teórico do pós-positivismo, defende-se em um afastamento da incidência do regime jurídico público impenhorabilidade, imprescritibilidade, inalienabilidade e impossibilidade de oneração sobre os bens públicos meramente dominicais; paralelamente, vislumbra-se o alargamento da incidência desse regime jurídico especial sobre todos aqueles bens, inclusive os privados, cuja afetação seja pública, ou seja, que se encontrarem vinculados à efetividade dos direitos fundamentais.
Fundamento do Regime Jurídico Diferenciado:
· Doutrina Tradicional: Suposta superposição do Estado em relação à sociedade, decorrentes da clássica noção de supremacia do interesse público sobre o privado. Apenas o patrimônio estatal e todo ele faz jus a tal diferenciação.
· Doutrina Moderna: Os bens devem ser um meio para que se garantam os direitos fundamentais.
Art. 5º, XXII garante o direito de propriedade.
Art. 5º, XXIII função social da propriedade. A função social dos bens públicos é a efetivação dos direitos fundamentais. A garantia aos direitos fundamentais veio preencher o antigo e outrora vazio conceito de interesse público. São os direitos fundamentais que devem pautar o agir administrativo. Assim, ainda que se trate de um direito fundamental individual - o qual, no tratamento clássico da doutrina, seria visto como um interesse privado - na tratativa moderna perfilhada nesta pesquisa, será visto como componente do interesse público e, portanto, como um objetivo de o Estado garanti-lo e perquiri-lo.
1. Imprescritibilidade:
CC, Art. 102. Os bens públicos não estão sujeitos a usucapião. [inconstitucionalidade¿]
-Art. 183, § 3º /CF impossibilidade de usucapião de imóveis urbanos pertencentes ao Poder Público
-Art. 191 /CF impossibilidade de usucapião de imóveis rurais pertencentes ao Poder Público
STF Súmula nº 340 - Desde a vigência do Código Civil, os bens dominicais, como os demais bens públicos, não podem ser adquiridos por usucapião.
-Bem público não pode ser usucapido, isto é, não pode ser objeto de ação de usucapião.
-Mesmo que um particular utilize uma propriedade pública pacificamente, de forma regular e perene, sem que o Estado a reclame nos prazos legais, não lhe ocorrerá a decadência do direito proprietário, bem como não o surgirá para o posseiro o direito a sua aquisição.
-Reconhecendo a existência de situações como a ocupação de bens públicos por particulares para fim de moradia, a legislação regulariza essas situações fundiárias, não permitindo a usucapião, mas concedendo o direito real de posse (uso). ENTRETANTO, essa concessão carece de segurança jurídica ao concessionário, principalmente por ser instituída por lei e poder ser revogada pelo mesmo instrumento, revelando-se, pois, precária.
LEI Nº 4.504/1964: Estatuto da Terra possui o instituto denominado de legitimação de posse. Há a necessidade do preenchimento dos seguintes requisitos: área máxima de 100 hectares; utilizada para moradia permanente; cultivo da terra, não possuir outra propriedade rural.
-Os dispositivos constitucionais referem-se, em seus respectivos caputs, à aquisição prescritiva pela via da usucapião especial urbana e rural. Adota-se esse entendimento porque as restrições aos direitos fundamentais devem se dar da forma mais tímida possível, a fim de se garantir um máximo de direitos aos cidadãos.
-Disposição topográfica das normas constitucionais: a função dos parágrafos nos textos legais é trazer um complemento àquilo que está disposto no caput do artigo no qual está contido, sendo o caput do artigo o dispositivo competente para aduzir normas gerais.
-Inconstitucionalidade do art. 102, CC: *Interpretação sistemática da Constituição. Supremacia hierárquica. Juízo de proporcionalidade, direito à moradia, ao trabalho, à dignidade da pessoa humana e à função social da propriedade contrabalanceado ao direito proprietário do Estado, Mínima restrição aos direitos fundamentais, *Disposição topográfica da norma constitucional restritiva à usucapião
-Conclusão > em relação aos bens meramente dominicais deve ser viabilizada a prescrição aquisitiva (desde que não se trate da usucapião especial, vedada constitucionalmente).
2. Impenhorabilidade
CF, Art. 100. Os pagamentos devidos pelas Fazendas Públicas Federal, Estaduais, Distrital e Municipais, em virtude de sentença judiciária, far-se-ão exclusivamente na ordem cronológica de apresentação dos precatórios e à conta dos créditos respectivos, proibida a designação de casos ou de pessoas nas dotações orçamentárias e nos créditos adicionais abertos para este fim.
-Compreende a impossibilidade de que os bens públicos sofram penhora para a satisfação de credores. -Regime dos precatórios
-A proibição constitucional refere-se à designação de dotação orçamentária a casos específicos e/ ou pessoas determinadas. Não é proibida, pois, a destinação de bens não afetos a interesse público para estes fins, ou seja, é permitido pelo ordenamento que se destine determinados bens ao pagamento de dívidas.
-Não são todas as dívidas públicas que podem receber este tratamento diferenciado > juízo de proporcionalidade entre os interesses conflitantes no caso concreto.
- Dívidas de natureza alimentícia.
-Dívida do Estado com o credor desapropriado:
3. Inalienabilidade
CC, Art. 100. Os bens públicos de uso comum do povo e os de uso especial são inalienáveis, enquanto conservarem a sua qualificação, na forma que a lei determinar.
CC, Art. 101. Os bens públicos dominicais podem ser alienados, observadas as exigências da lei.
Lei 8.666
Art. 19. Os bens imóveis da Administração Pública, cuja aquisição haja derivado de procedimentos judiciais ou de dação em pagamento, poderão ser alienados por ato da autoridade competente, observadas as seguintes regras:
I - avaliação dos bens alienáveis;
II - comprovação da necessidade ou utilidade da alienação;
III - adoção do procedimento licitatório, sob a modalidade de concorrência ou leilão
-O dispositivo restringe a aquisição àqueles que possuem condições financeiras privilegiadas.
-Os bens devem ser meios para a persecução do interesse público. Dessa forma, os bens devem ser alienados diretamente a quem os use na satisfação de algum direito fundamental
4. Não Onerabilidade
Art. 1.420. Só aquele que pode alienar poderá empenhar, hipotecar ou dar em anticrese; só os bens que se podem alienar poderão ser dados em penhor, anticrese ou hipoteca.
-No que se refere aos bens dominicais, não existe afetação a priori, e, portanto, é necessário que sejam destinados ao interesse público. Se esse interesse é atinente ao seu valor econômico, como garantia real, é patente que seja possível sua oneração.
Conclusão:
-As cláusulas especiais de proteção ao patrimônio público somente se sustentam quando os bens possuem destinação específica, um uso que cumpra a função social da propriedade. Posto isso, os bens meramente dominicais não devem ter tais gravações apriorísticas, mormente quando estas impedirem o cumprimento do interesse público, concebido como a promoção dos direitos fundamentais.
-Ampliando-se o raciocínio jurídico, percebe-se que existem bens privados que também atendem prioritariamente a direitos fundamentais, indo além do direito à propriedade de seu dono. É o caso dos bens das entidades do terceiro setor, dos concessionários, das escolas particulares e dos hospitais privados.
-Uma vez que tais entes auxiliam o Estado na realização do interesse público, o uso de seus bens ultrapassa a dominialidade privada, o que justifica uma proteção diferenciada para esses bens. Assim, embora sejam estes bens privados, devem ser regidos pelo regime jurídico publicístico.