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Regulamentação jurídica do acesso à biodiversidade

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Até a RIO 92, a biodiversidade era considerada patrimônio da humanidade. A Convenção sobre Diversidade Biológica, no entanto, reconheceu os direitos soberanos dos Estados sobre seus recursos naturais.

Sumário: 1. Introdução. 2. Biodiversidade e patrimônio nacional. 3. Proteção jurídica à propriedade intelectual. 4. Competência para regulamentar o acesso à biodiversidade. 5. Consideração do patrimônio genético como bem da União. 6. Princípios protetivos aplicáveis ao acesso aos recursos genéticos. 7. Mecanismos de controle do acesso à biodiversidade. 8. Contrato de acesso. 9. Execução e acompanhamento dos contratos de acesso. 10. Repartição dos benefícios. 11. Retribuição ao Estado. 12. Acesso aos recursos em condições ex situ. 13. Desenvolvimento e transferência de tecnologia. 14. Proteção do conhecimento tradicional associado aos recursos genéticos. 15. Conclusão. Referências Bibliográficas.


1. Introdução

            A Constituição da República brasileira determina, em seu art. 225, que cabe ao Poder Público e à coletividade a defesa e a preservação do meio ambiente para as presentes e futuras gerações. Para assegurar a efetividade desse direito, impõe preservar a diversidade biológica e a integridade do patrimônio genético nacional.

            Até a Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente – RIO 92, em todo o mundo o acesso aos recursos genéticos não sofria qualquer restrição, pois a biodiversidade era considerada patrimônio da humanidade. O art. 15 da Convenção sobre Diversidade Biológica, no entanto, reconheceu os direitos soberanos dos Estados sobre seus recursos naturais, bem como que a competência para autorizar o acesso a recursos genéticos pertence aos governos nacionais, devendo as condições de acesso estar sujeitas à legislação nacional. A partir de então, difundiu-se a idéia de que os Estados nacionais têm direitos sobre seus próprios recursos biológicos, sendo responsáveis pela preservação de sua diversidade biológica e pela utilização sustentável destes recursos. Surge, assim, a necessidade de regulamentar adequadamente o acesso aos recursos genéticos nativos, a transferência de tecnologias pertinentes e a repartição justa dos benefícios derivados do uso destes recursos.

            Cabe aos Estados-Membros da Federação, com base na competência concorrente estabelecida pelo art. 24, inciso VI, da Constituição Federal produzir legislação capaz de preservar os recursos genéticos nativos e produtos derivados, em face do relevante interesse público envolvido.

            Uma tal regulamentação deve orientar-se segundo premissas de que os recursos genéticos nativos e produtos derivados são bens de relevante interesse público; o acesso e a exploração de tais recursos devem ficar sujeitos ao controle do Poder Público; o acesso às áreas situadas em unidades de conservação estadual ou de propriedade do Estado está sujeito a autorização do órgão competente que a administra ou é responsável por ela; que, quando houver conhecimento tradicional associado, o acesso e a exploração dos recursos somente podem acontecer após consentimento esclarecido das comunidades envolvidas e, ainda, que o Estado pode cobrar taxa pelo exercício do poder de polícia de controle do acesso aos recursos genéticos.

            A medida regulamentar é de especial importância para o combate dos efeitos nocivos decorrentes da adoção do sistema de patentes sobre os recursos genéticos existentes em território nacional. Segundo a Lei nº 9.279/96, os recursos naturais, da forma como existem na natureza, não são patenteáveis. Contudo, a engenharia genética tem conseguido sintetizar produtos recombinantes praticamente idênticos ou muito semelhantes aos existentes na natureza, dando margem a discussão quanto à possibilidade de patenteamento. Não são poucos os casos de patenteamento de recursos naturais nativos do território brasileiro.

            Juridicamente, pode-se patentear tanto o produto final quanto o seu processo de obtenção. Quando se chega a um novo produto farmacêutico, pede-se não somente uma, mas diversas patentes, envolvendo todos os processos científicos conhecidos para chegar-se àquele produto, abrangendo uma grande amplitude de direitos. Por outro lado, a inversão do ônus da prova, estabelecida no art. 42, § 2º, da Lei nº 9.279/96 sempre penaliza a pequena empresa.

            O patenteamento implica aquisição de propriedade intelectual e confere ao seu titular direitos patrimoniais sobre a invenção, tais como a proibição da reprodução da matéria viva, autorização para o desenvolvimento de pesquisas, concessão para venda de sementes e o recebimento de royaltes a cada operação comercial.

            Reconhecendo haver desproporção de recursos entre as empresas farmacêuticas estrangeiras e as nacionais, a Lei de Patentes, em seu art. 68, § 1º, impõe a obrigatoriedade da produção local do produto patenteado no Brasil. A interpretação tradicional dada pelo Brasil ao art. 5º da Convenção de Paris indica que a exploração efetiva somente se dá com a produção local do produto. Em caso de não exploração, tem-se a licença compulsória da patente do produto para que a exploração no País seja livre. Tal medida constitui consectário natural do princípio da função social da propriedade. Entretanto, o referido posicionamento confronta-se com o disposto no acordo TRIPs [01], que proíbe a obrigatoriedade de fabricação local e/ou restrições à importação, e tal situação pode gerar acirradas disputas judiciais sobre o assunto.

            O reconhecimento da propriedade intelectual sobre recursos genéticos importa em sérias repercussões sociais. Como principais conseqüências socioeconômicas da possibilidade de patenteamento de produtos farmacêuticos, pode-se citar o aumento de preços ao consumidor, a diminuição do consumo e do bem-estar dos consumidores, a transferência de divisas ao exterior, o gasto adicional do setor público e o custo fiscal da assistência. [02] Como aspecto positivo, pode-se imaginar a abertura dos processos de fabricação, que possibilita a absorção de novas tecnologias, sem os pesados investimentos na pesquisa. Mas, na verdade, a Lei de Patentes é capaz de produzir reserva de mercado para as empresas multinacionais, acentuando a oligopolização internacional do mercado brasileiro, com indesejável concentração do poder decisório sobre os interesses da população nacional.

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2. Biodiversidade e patrimônio nacional

            Vale observar que a Constituição brasileira, no art. 225, dispõe que todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.

            O meio ambiente, como bem juridicamente protegido, encontra definição legal no art. 3°, inciso I, da Lei n° 6.938, de 31 de agosto de 1981, que dispõe sobre a política nacional do meio ambiente. Por meio ambiente deve-se entender "o conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas".

            Diz ainda a Carta Política brasileira que, para assegurar a efetividade do direito ao meio ambiente, incumbe-se ao Poder Público preservar a diversidade e a integridade do patrimônio genético do País e fiscalizar as entidades dedicadas à pesquisa e manipulação de material genético (art. 225, § 1º). O § 4º do art. 225, expressamente, dispõe que "a Floresta Amazônica brasileira, a Mata Atlântica, a Serra do Mar, o Pantanal Mato-Grossense e a Zona Costeira são patrimônio nacional, e sua utilização far-se-á, na forma da lei, dentro de condições que assegurem a preservação do meio ambiente, inclusive quanto ao uso dos recursos naturais".

            A sociedade brasileira, ao reservar na Constituição de 1988 um capítulo especial para o meio ambiente, "toma consciência de que a qualidade do meio ambiente se transformara num bem, num patrimônio, num valor mesmo, cuja preservação, recuperação e revitalização se tornara num imperativo do Poder Público, para assegurar a saúde, o bem-estar do homem e as condições de seu desenvolvimento. Em verdade, para assegurar o direito fundamental à vida". [03]

            Mas, não se pode esquecer que o meio ambiente adquiriu relevância patrimonial expressiva. Cerca de 30% dos produtos farmacêuticos existentes no mercado advêm da bioprospecção. [04] O mercado farmacêutico movimenta anualmente mais de US$170 bilhões, [05] e o interesse econômico das grandes empresas em pesquisar e manipular o meio ambiente revela que a diversidade ambiental é bem patrimonial que confere significativo poder a seu detentor. Com efeito, as riquezas naturais significam poder. Mas, os interesses especulativos das grandes corporações não podem sobrepujar o interesse do povo brasileiro em preservar seu meio ambiente.

            Não é demais lembrar que a bioprospecção [06] farmacêutica, muitas vezes, implica o acesso aos costumes de comunidades tradicionais locais ou indígenas. [07] O conhecimento tradicional das comunidades locais ou indígenas é patrimônio cultural da nação brasileira e, como tal, também deve ser preservado. Por conhecimento tradicional associado deve-se entender todo conhecimento, inovação ou prática individual ou coletiva de população indígena ou comunidade local, com valor real ou potencial, associado a recurso genético ou a produtos derivados, protegido ou não por regime de propriedade intelectual. [08]


3. Proteção jurídica à propriedade intelectual

            A Lei Federal nº 9.279, de 14 de maio de 1996, estabeleceu no Brasil a proteção jurídica para a propriedade intelectual, por meio do sistema de patentes. Tal sistema é adotado em muitos outros países do mundo e é reconhecido pela organização Mundial do Comércio - OMC. Reconhecida a patente de determinada invenção, o titular do direito adquire direitos morais e patrimoniais sobre o objeto da patente. Isso significa, por exemplo, que o titular do direito de propriedade pode impedir a utilização do objeto da patente ou cobrar royaltes pela utilização permitida.

            Vale observar que nem tudo pode ser objeto de patente. Conforme o art. 8º da referida lei, "é patenteável a invenção que atenda aos requisitos de novidade, atividade inventiva e aplicação industrial". Complementando essa idéia, o art. 9º estabelece que "é patenteável como modelo de utilidade o objeto de uso prático, ou parte deste, suscetível de aplicação industrial, que apresente nova forma ou disposição, envolvendo ato inventivo, que resulte em melhoria funcional no seu uso ou em sua fabricação". Isto quer dizer que pode-se obter a patente de produtos e de processos de criação e transformação de produtos. Os milionários interesses da industria farmacêutica podem oferecer exemplos elucidativos: é possível obter patente sobre o produto farmacêutico em si e dos diversos processos químicos pelos quais se chega a esse produto final. Mas, a propriedade intelectual exige que os objetos ou processos decorram da atividade criativa do espírito humano. Não se pode patentear as coisas como se encontram na natureza ou os processos naturais. Nesse sentido, esclarece o inciso IX do art. 10 que não se considera invenção nem modelo de utilidade o todo ou parte de seres vivos naturais e materiais biológicos encontrados na natureza, ou ainda que dela isolados inclusive o genoma ou germoplasma de qualquer ser vivo natural e os processos biológicos naturais.

            No entanto, o art. 18 da Lei de Patentes, em seu inciso III, permite a patente de organismos transgênicos derivados daqueles que são encontrados na natureza. Dispõe o referido artigo que não são patenteáveis "o todo ou parte dos seres vivos, exceto os microorganismos transgênicos que atendam aos três requisitos de patenteabilidade - novidade, atividade inventiva e aplicação industrial - previstos no art. 8º e que não sejam mera descoberta".

            A disposição legal deixa clara a possibilidade de patenteamento dos organismos transgênicos, quando estiverem presentes as características da novidade, atividade inventiva e aplicação industrial. O transgênico não existe na natureza, mas deriva de elemento constante na natureza. É considerado, portanto, uma invenção do gênio criativo do homem e não simples descoberta. Esclarece o parágrafo único do art. 18 da Lei de Patentes que "para os fins desta Lei, microorganismos transgênicos são organismos, exceto o todo ou parte de plantas ou de animais, que expressem, mediante intervenção humana direta em sua composição genética, uma característica normalmente não alcançável pela espécie em condições naturais". A redação não é muito clara, mas pode-se chegar à conclusão de que são considerados organismos transgênicos o todo ou a parte de plantas ou de animais que expressem, mediante intervenção humana direta em sua composição genética, uma característica normalmente não alcançável pela espécie em condições naturais. O todo ou a parte de plantas ou de animais que não expressem essa característica não será considerada transgênico e não permite o patenteamento. Assim, havendo a intervenção criativa do homem, há possibilidade de reconhecer propriedade intelectual para o todo ou a parte de plantas ou de animais que apresentem as alterações genéticas produzidas pelo gênio inventivo do homem.

            Os problemas gerados com o patenteamento dos transgênicos são claramente apontados pelo Prof. Marcelo Varella. [09] Como principal problema tem-se a possibilidade de a engenharia genética conseguir sintetizar produtos recombinantes praticamente idênticos ou muito semelhantes aos presentes na natureza e, com a obtenção do patenteamento, sejam reconhecidos direitos patrimoniais sobre organismos que podem ser encontrados na natureza. Por outro lado, com o reconhecimento da propriedade intelectual sobre processos de obtenção de produtos é comum que um mesmo titular obtenha o patenteamento de todos os processos conhecidos para se chegar a determinado produto final, instituindo monopólio contrário aos interesses sociais.

            Em especial quando se trata de patenteamento na indústria farmacêutica, não se pode esquecer suas repercussões sociais.

            "As patentes nesse setor geram fortes conseqüências sobre a economia dos países, para uns positivas, para outros negativas ao desenvolvimento científico e tecnológico. Seus efeitos atingem a população como um todo, uma vez que os produtos farmacêuticos fazem parte do que chamamos de produtos de consumo inelásticos, ou seja, a população tem que comprá-los, mesmo a preços mais elevados, pois são indispensáveis à manutenção da vida, à própria existência humana. Em um país como o Brasil, de dimensões continentais e com um dos maiores índices populacionais do planeta, onde a pobreza e o conseqüente grande numero de doenças assolam milhões de pessoas diariamente, o desenvolvimento deste setor atinge prioridade ímpar, situando-se lado a lado com os problemas mais importantes de nossa nação." [10]

            Dada a magnitude do interesse social envolvido, não pode o Poder Público descuidar do patrimônio genético que pertence ao povo brasileiro. Nesse contexto de defesa das riquezas nacionais, a regulamentação do acesso à biodiversidade ganha especial colorido: impedir que a exploração da biodiversidade contrarie os interesses sociais.

            A Constituição brasileira, ao mesmo tempo em que garante o direito de propriedade, impõe que esta deva atender à sua função social. A função social da propriedade é considerada pela Constituição de 1988 como princípio fundamental da ordem econômica (art. 170, inciso III), sendo que esta tem por finalidade assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social. Certamente, os dispositivos constitucionais que vinculam o direito de propriedade à observância de sua função social representam concessão à democracia social. Se a propriedade não atende à sua função social, o interesse da coletividade deve prevalecer sobre o interesse individual.

            Sobre o tema, a Ministra de Estado de Meio Ambiente Marina Silva já ressaltou:

            Nossa situação - a de um país dotado de enormes recursos de diversidade biológica - deve ser vista como um trunfo para a resolução de importantes problemas internos, sobretudo aqueles relacionados à miséria e à fome e, ao mesmo tempo, para o estabelecimento de uma referência forte e propositiva no âmbito das relações internacionais. É, assim, tarefa das mais relevantes, tanto para a sociedade quanto para seus representantes, dedicar ao tema biodiversidade o esforço político, técnico e institucional que ele requer, como alavanca estratégica de nossa construção como nação." [11]


4. Competência para regulamentar o acesso à biodiversidade

            O art. 24, inciso VI, da Constituição Federal brasileira reza que compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre florestas, caça, pesca, fauna, conservação da natureza, defesa do solo e dos recursos naturais, proteção do meio ambiente e controle da poluição.

            A competência concorrente estabelecida é novidade estatuída pela Constituição brasileira de 88 e, segundo lição do prof. Raul Machado Horta, "cria outro ordenamento jurídico dentro do Estado Federal, o ordenamento misto, formado pela participação do titular do ordenamento central e dos titulares de ordenamentos parciais". [12]

            A repartição da competência legislativa decorre da nova conformação que se deu ao federalismo brasileiro. Com efeito,

            "... o federalismo de hoje é consciente de sua dimensão política e não é visto apenas como uma técnica de convivência de disparidades em uma certa unidade, pelo contrário, sobretudo após a década de sessenta, em razão das severas críticas de que foi e tem sido objeto o welfare state, o federalismo passa a ser visto como instrumento de uma maior efetividade da cidadania, inclusive direta, na medida em que descentraliza o poder e permite uma maior proximidade do cidadão dos pólos de poder, dos centros de decisão". [13]

            É a consolidação do federalismo vertical ou de cooperação.

            Como o novo modelo de ordem jurídica concilia a participação dos entes federativos, tornou-se necessário definir as regras da participação da União e dos Estados na formação do sistema jurídico misto. Nos parágrafos do art. 24, o texto constitucional esclarece que, no âmbito da legislação concorrente, a competência da União limitar-se-á a estabelecer normas gerais. O que significa que aos Estados-Membros coube a regulamentação das particularidades regionais. Expressamente a Constituição Federal esclarece que a competência da União para legislar sobre normas gerais não exclui a competência suplementar dos Estados. Nem mesmo a inexistência de norma geral, de competência da União, impede que o Estado-Membro estabeleça proteção jurídica ao meio ambiente. Novamente a Constituição é expressa em afirmar que, inexistindo lei federal sobre normas gerais, os Estados exercerão a competência legislativa plena, para atender a suas peculiaridades. Nesse caso, a superveniência de lei federal sobre normas gerais suspende a eficácia da lei estadual, apenas no que lhe for contrário.

            Assinala ainda o prof. Machado Horta que

            "... é manifesta a importância desse tipo de legislação em federação continental, como a brasileira, marcada pela diferenciação entre grandes e pequenos Estados, entre Estados industriais em fase de alto desenvolvimento e Estados agrários e de incipiente desenvolvimento industrial, entre Estados exploradores e Estados consumidores.. . A legislação concorrente, não obstante as omissões, alargará o domínio dos poderes reservados aos Estados e certamente abrirá aos Estados um período de atividade legislativa profundamente diverso do período de retraimento dos poderes reservados, no qual viveram os Estados-Membros, em contraste com a plenitude dominadora dos poderes enumerados da Federação". [14]

            Com base na competência concorrente estabelecida, os Estados-Membros da Federação podem e devem produzir legislação capaz de preservar os recursos genéticos nativos e produtos derivados, em face do relevante interesse público envolvido. Nesse aspecto estarão regulamentando a Convenção da Biodiversidade, que ingressou na ordem jurídica nacional por meio do Decreto Legislativo nº 2, de 1994, e do Decreto Executivo n° 2.519, de 1998. Sobre a legislação protetiva do meio ambiente, o Supremo Tribunal Federal já se manifestou várias vezes no sentido da pertinência da legislação estadual, supletiva e complementar à federal. [15]

            Externando zelosa preocupação com necessidade de regulamentar o acesso à biodiversidade, o Estado do Amapá já conta com a Lei Estadual nº 388/97. Do mesmo modo, o Estado do Acre conta com a Lei Estadual nº 1.235/97.

            Em Minas Gerais, a Secretaria de Estado Ciência e Tecnologia constituiu comissão para elaborar um anteprojeto de lei para subsidiar legislação relativa ao acesso à biodiversidade no Estado. [16] O anteprojeto transformou-se no Projeto de Lei nº 1.214, de 22 de setembro de 2000 que, mesmo após receber aprovação em todas as comissões, lamentavelmente, foi arquivado na casa legislativa estadual por não ter sido aprovado na legislatura em que teve início.

            No ano de 2001, tramitavam no Congresso Nacional brasileiro os Projetos de Lei nº 306/95, nº 4.579/98 e nº 4751/98, que visavam regulamentar o inciso II do § 1ºe o § 4º do art. 225 da Constituição, os arts. 1º, 8º, alínea "j", 10, alínea "e", e 15 da Convenção sobre Diversidade Biológica, dispondo sobre o acesso ao patrimônio genético e ao conhecimento tradicional associado, bem como sobre a repartição dos benefícios derivados de sua utilização. Não obstante a complexa discussão que se travava no Congresso Nacional, o Vice-Presidente da República, no exercício da Presidência, editou a Medida Provisória nº 2.052, de 29 de junho de 2000, regulamentando o acesso à biodiversidade. Essa medida provisória foi reeditada, sucessivamente, e permanece em vigor até os dias atuais por força do disposto na emenda Constitucional n° 32/01, atualmente com o número 2.186-16/01.

Sobre o autor
Fernando Antonio Nogueira Galvão da Rocha

juiz civil do Tribunal de Justiça Militar, professor adjunto da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ROCHA, Fernando Antonio Nogueira Galvão. Regulamentação jurídica do acesso à biodiversidade. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 12, n. 1465, 6 jul. 2007. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/10103. Acesso em: 22 nov. 2024.

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