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Teorias Políticas para compreensão do Direito Internacional Público: Velho Institucionalismo, Novo Institucionalismo, Escolha Racional, Construtivismo, Realismo e Liberalismo

Agenda 05/01/2023 às 05:24

Abordagem de teorias políticas para melhor compreensão da política internacional e do Direito Internacional Público, quais sejam, o velho institucionalismo, o novo institucionalismo, a Escolha Racional, o Construtivismo, o Realismo e o Liberalismo

No presente artigo, abordaremos, apoiados em bibliografia consultada, teorias políticas que nos trazem uma melhor compreensão da política internacional e do Direito Internacional Público, quais sejam, o velho institucionalismo, o novo institucionalismo, a Escolha Racional, o Construtivismo, o Realismo e o Liberalismo.

1. Velho Institucionalismo e Novo Institucionalismo

Nascimento (2009) apresenta uma sucinta discussão a respeito do que tem sido chamado de institucionalismo na literatura contemporânea das Ciências Sociais, em especial da Ciência Política. Além disso, a partir de seu texto, podemos identificar o que se compreende por velho institucionalismo e por novo institucionalismo, suas características e principais autores escolas.

Em resumo, o novo institucionalismo surge exatamente a partir de uma crítica ao behaviorismo/ velho institucionalismo caracterizados pela aceitação da idéia de que a soma de preferências individuais explicariam o comportamento coletivo (NASCIMENTO, 2009: 96). Assim, o institucionalismo contemporâneo, de acordo com Nascimento, afirma que a ação social é determinada por instituições e não meramente pelo somatório de preferências e, dessa forma, envolve questões para as quais traz um novo olhar e oferece algumas respostas originais, como, por exemplo, a definição conceitual e como se formam e se transformam instituições, o impacto das instituições sobre a ação humana, quais as posições metodológicas e epistemológicas que melhor se ajustam à análise institucional.

De uma forma geral, a característica principal do neo-institucionalismo é o argumento que a análise política é mais bem conduzida quando o foco analítico são as instituições (Ibid., 100), assim o argumento central dos neo-institucionalistas é que as instituições moldam a ação (Ibid., 103), possuindo lógica própria. Possuem conceitos, noções e modelos de abordagem de problemas específicos, como path dependence, veto players, veto points, actor-centred institucionalism. E Nascimento aponta ao longo do texto também diferenças entre três versões de institucionalismo, não sendo esta uma escola coerente e unificada: sociológico, histórico e da escolha racional. Há diversas diferenças entre cada uma dessas versões, que não as enfocaremos especificamente aqui, uma vez que, inclusive, há autores que, segundo Nascimento, sugerem que tais diferenças não são realmente importantes, embora em relação a questões metodológicas e epistemológicas, não sejam os autores neo-institucionalistas que decidam sobre diferentes caminhos neste sentido, mas os seus variados interesses teóricos, que acabam estimulando o surgimento de caminhos alternativos.

Nascimento possui em seu texto, interesse em demonstrar diferentes enfoques analíticos dos institucionalismos, inclusive utilizando para tanto uma tabela elaborada para este fim (cf. NASCIMENTO, 2009: 113-114). A partir de suas considerações, podemos discorrer a respeito das diferenças entre o velho institucionalismo e o novo institucionalismo.

Por velho institucionalismo, compreendemos o institucionalismo surgido na primeira metade do século XX, identificado como um conhecimento jurídico-formal, duramente criticado devido às suas características relacionadas às suas interpretações behavioristas e sua forma de enfocar as instituições. Além disso, este tipo de institucionalismo não problematizou o que seriam instituições, que, para os seus teóricos, se referiam somente a órgãos do Estado ou, mais precisamente, do governo (Ibid., 101). Este velho institucionalismo estava primordialmente preocupado em compreender o funcionamento das instituições, defendendo a preponderância da influência das estruturas sobre as condutas individuais e se baseando em um paradigma econômico neoclássico, procurando dar conta da maneira com que instituições modelavam a vida econômica, por exemplo. Alguns autores identificados com este velho institucionalismo podem ser John Commons e Wesley Mitchel.

Já o novo institucionalismo, em contrapartida, dá primazia analítica às instituições, mas não possui tradição unificada, havendo discordâncias em relação aos rumos que a análise institucional deve tomar, consistindo, por sua vez, em uma reação tanto às perspectivas estruturalistas quanto às perspectivas voluntaristas dentro das ciências sociais, reelaborando o problema agência-estrutura, que o velho institucionalismo não discutira. Em sua versão sociológica, por exemplo, reconhece a autonomia dos indivíduos e assume que as ações e relações sociais dão-se numa dimensão intermediáia entre os atores e as macroestruturas (Ibid., 113). Este novo institucionalismo surgiu na academia norte-americana, mas conheceu desde então muitas contribuições da ciência política européia. Alguns de seus autores principais são Fritz Scharpf, James March, Johan Olsen e Robert Lieberman e se divide na escolas norte-americana neo-institucional e na européia.

Podemos avaliar que o institucionalismo é uma teoria interessante, sobretudo, se queremos compreender o que levam agentes políticos a atuar de certa forma, bem como outras questões que possamos querer responder com base nas instituições.  

2. Teoria da Escolha Racional

Podemos dizer que escolha racional é uma expressão que tem por significado a escolha realizada racionalmente por um agente visando maximizar as possibilidades de alcançar suas metas e realizar seus projetos (MORO, 2009: 6). A esta concepção de escolha racional se referem as chamadas Teorias da Escolha Racional, para a qual os agentes sociais estariam interessados na maximização da riqueza, de votos, ou de outras dimensões mais ou menos mensuráveis em termos de quantidades e sujeitas a constrangimentos de recursos materiais (FEREJOHN & PASQUINO, 2001: 5).

A partir de Ferejohn e Pasquino (2001), podemos dizer que autores importantes em relação a essas teorias são, entre outros, Anthony Downs, Mancur Olson e James Buchanan. Como característica principal das Teorias da Escolha Racional, temos a noção, presente nos trabalhos desses teóricos, de que agentes levam em conta resultados esperados em relação às suas ações, calculando ao agir qual a melhor alternativa para atingir suas metas, maximizar benefícios e minimizar custos. Outra característica importante é que estas teorias possuem nos indivíduos suas unidades de análise, enfatizando decisões individuais, e se preocupando com o equilíbrio entre elas.

Podemos relacionar as abordagens da escolha racional e da escolha pública com a do institucionalismo. A Teoria da Escolha Pública tem como objetivo principal aplicar métodos da Economia a objetos tradicionalmente considerados do âmbito da ciência política, como grupos de interesse, partidos políticos, processo eleitoral, análise da burocracia e escolha parlamentar (PEREIRA, 1997: 419), assim pretende compreender como as instituições tomam suas decisões. Esta Teoria da Escolha Pública se relaciona com a Teoria da Escolha Racional em relação à noção presente nesta última, de que os agentes políticos fazem suas escolhas visando se beneficiar de alguma forma, por exemplo, através de reeleição. Esta relação entre as duas teorias referidas constitui uma ponte entre a Teoria da Escolha Racional e as abordagens do institucionalismo, nas quais, sobretudo no neo-institucionalismo de escolha racional, o enfoque sobre as instituições também leva a se dedicar especial atenção às regras do jogo (NASCIMENTO, 2009: 101) e às maneiras como os agentes lidam com as conseqüências não-planejadas ou imprevistas estabelecidas pela própria lógica das instituições. Dessa forma, se relacionam a escolha racional e o institucionalismo ao se procurar verificar como as instituições moldam a ação dos agentes ao lhes oferecer oportunidades e impor restrições. Além disso, uma das versões do neo-institucionalismo é conhecida, conforme apontamos acima, como neo-institucionalismo da escolha racional, exatamente por relacionar à abordagem neo-institucionalista basicamente as noções presentes nas Teorias de Escolha Racional.

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O critério de racionalidade pode ser uma das chaves para a definição de prioridades em políticas públicas, ao partirmos de uma visão puramente individualista de racionalidade e alcançarmos uma visão mais ampla, fazendo uso de diferentes significados de racionalidade, como aquele que nos diz que a racionalidade pode ser a capacidade do indivíduo de realizar uma escolha porque esta está entre os melhores atos disponíveis de acordo com suas crenças e não apenas seus desejos. As crenças são ancoradas na realidade concreta, conforme apontam Ferejohn e Pasquino (2001). Logo, um agente político com crenças que se refiram ao bem comum, a valores e não apenas aos fins para atingir suas metas que poderiam ser auto-centradas, consegue fazer uso da racionalidade visando uma definição correta de prioridades em políticas públicas.

Há também a idéia de que o agente político possa com base na racionalidade definir prioridades em políticas públicas a partir de sua expectativa em ser reeleito ou a idéia de que o agente político possa igualmente com base na racionalidade definir prioridades em políticas públicas de acordo com as possibilidades institucionais existentes para suas tomadas de decisão. Nos três casos, vemos diferentes significados da racionalidade para esta teoria.

Três exemplos de diferentes significados, assim, podem ser apontados: a) racionalidade referente a valores, b) racionalidade para maximização de ganhos e c) racionalidade referente a fins dentro de um arcabouço institucional existente. Os exemplos que damos acima convergem com essas três diferentes atribuições de significados à racionalidade: o agente político que usa a racionalidade visando o bem comum, o agente político que usa a racionalidade visando benefícios e ganhos e o agente político que usa a racionalidade para agir em um dado contexto conseguindo obter o menor custo para sua ação e o maior benefício dentro de um arranjo existente.

3. Construtivismo

Em linhas gerais, segundo Nogueira & Messari, o construtivismo surgiu nos estudos de Relações Internacionais e tem como premissa básica a de que vivemos em um mundo que construímos, no qual somos os principais protagonistas e que é produto de nossas escolhas, não sendo predeterminado e podendo ser transformado, ainda que dentro de certos limites. Assim, o construtivismo reflete o debate agentes X estrutura e leva as discussões das Relações Internacionais de volta ao embate entre idealistas e realistas, mas negando por sua vez a antecedência ontológica tanto aos agentes quanto à estrutura, afirmando que ambos são co-construídos (NOGUEIRA & MESSARI, 2005: 162-163). O construtivismo pode trazer das Relações Internacionais conceitos importantes de Teoria Social.   

Ainda segundo Nogueira & Messari, suas características fundamentais são as premissas de que (a) o mundo não é predeterminado, mas construído à medida que os atores agem, (b) nem agentes precedem à estrutura e a moldam para servir a seus interesses e preferências, nem a estrutura possui capacidade de constranger e limitar as opções e ações dos agentes, mas sociedade e indivíduos são co-constituídos, (c) ideias e valores que informam a relação do agente com o mundo material desempenham uma função central na formulação do conhecimento sobre este mesmo mundo.

Os autores apontam ainda que há duas outras premissas do construtivismo, mas que não são comuns a todos os construtivistas: (1) a negação da anarquia como estrutura que define a disciplina de Relações Internacionais, ou seja, a existência de normas e regras que organizam e norteiam as relações internacionais e (2) a anarquia internacional sendo compreendida como socialmente construída, podendo o sistema internacional variar entre o conflito e a cooperação.

Essas premissas e características fundamentais do construtivismo servem, a nosso ver, como modelos explicativos para o Direito Internacional Público, estabelecendo elementos teóricos e analíticos para uma melhor compreensão acerca dos efeitos de discursos, significados e valores nas relações internacionais e de análises a respeito de expectativas em relação a mudanças ou manutenção do status quo de diferentes realidades políticas e sociais ao redor do mundo, em relação a normas, que por sua vez resultam da interação entre Estados-membros da sociedade internacional e influenciam processos de tomada de decisão, justificando, legitimando e tornando certos atos possíveis.  

Adler (1999) propõe uma Agenda  de Pesquisa Construtivista que indica que

A evolução da política ambiental internacional oferece outro campo fértil para a pesquisa construtivista. Tome-se, como exemplo, o conceito de "desenvolvimento sustentável". Condições físicas levaram indivíduos a desenvolver em suas mentes esse conceito normativo e causal. Após ter circulado intensamente, o conceito foi oficialmente adotado pela Comissão Mundial sobre o Ambiente e o Desenvolvimento em 1987, e mais tarde pela Conferência do Rio. Surgiram instituições da ONU para implementar políticas de desenvolvimento sustentável; mesmo os Estados Unidos adotaram-no como política ambiental oficial. Com tudo isso, o desenvolvimento sustentável tornou-se um entendimento intersubjetivo com base em que problemas e soluções referentes ao meio ambiente e desenvolvimento são analisadas, e repertórios de ação formulados. Por haver mais de uma interpretação do desenvolvimento sustentável, e por alguns deles serem conflitantes, uma definição intersubjetiva consensual está sendo desenvolvida apenas na e pela prática; isso permite aos fatores materiais deixarem sua marca. De qualquer modo, esse entendimento começou a determinar políticas que atuam no mundo material, afetando o ambiente físico, as pessoas e seu bem estar. (ADLER, 1999: 231).

Por exemplo, em relação ao meio ambiente, podemos inferir que a Teoria Construtivista pode contribuir com os internacionalistas voltados ao tema à medida que esclarece, por exemplo, de que forma conceitos como desenvolvimento sustentável, desenvolvido na mente dos indivíduos, passa a orientar políticas e um repertório de ações em âmbito internacional para solucionar problemas referentes ao meio ambiente. Uma interpretação construtivista aqui representa uma abordagem importante ao problematizar o quanto são conflitantes as interpretações a respeito de desenvolvimento sustentável e o quanto é a prática que estabelece uma definição consensual. Logo, esse entendimento construtivista permite uma análise mais bem elaborada a respeito de políticas que passam a afetar as pessoas e seu bem-estar.

Em relação aos Direitos Humanos, por exemplo, a abordagem da Teoria Construtivista permite uma discussão e compreensão mais profunda a respeito de limites, reveses e benesses das ações humanitárias, conforme aponta trabalho de Alarcon (2011), verificando, por exemplo, a necessidade de uma nova perspectiva para as missões de peace-building.

4. Realismo e Liberalismo

Segundo Dougherty e Pfaltzgraff (2003), o Realismo ou teoria realista, é um pensamento baseado em um sistema internacional cuja característica fundamental é a anarquia, a ausência de autoridade legal. A essência de soberania, para esta teoria, é igualmente legal entre os Estados, de modo que não existe sob esta perspectiva autoridade legal superior ao Estado. Mas os Estados não são iguais em capacidade: alguns possuem amplos meios à sua disposição, outros possuem pouco poder. Logo, a hierarquia do sistema internacional é o resultado da diferenciação dos Estados quanto às suas capacidades, sendo tais Estados empurrados para estratégias de auto-ajuda pela estrutura do sistema internacional, tendo inclusive que alcançar segurança nessa auto-ajuda através de formas como, por exemplo, o armamento. À medida que cada Estado se arma, surge um dilema de segurança em que cabe a pergunta: até que ponto o esforço de um Estado por alcançar a sua segurança não é entendido por outro Estado como uma ameaça à segurança deste?

Ora, o sentimento de segurança de um Estado só pode sobreviver às custas do sentimento de insegurança de outro Estado. Tal desconfiança gerada é a causa da chamada corrida armamentista e é este o dilema de segurança que caracteriza um sistema internacional cuja estrutura é anárquica, baseada no poder, embora desprovida de autoridade na forma de instituições capazes de formularem regras de conduta, mecanismos coercitivos fundados em consenso global ou em acordo ao alcance das próprias leis e instituições promulgarem e garantirem o cumprimento.

A teoria realista ocupou uma posição dominante no estudo das relações internacionais no período que vai do final da Segunda Guerra Mundial até o início da década de 1980 e possui como alguns de seus pressupostos, que (i) o sistema internacional é baseado em Estados que funcionam como atores centrais, (ii) a política internacional constitui uma luta pelo poder em um ambiente anárquico e no qual os Estados dependem das suas próprias capacidades para garantia de sua sobrevivência, (iii) os Estados se relacionam com base na existência de uma soberania, apesar de haver patamares de capacidade entre os Estados, (iv) Estados são atores unitários e política interna pode ser separada da externa, (v) o poder é o conceito mais importante na explicação e previsão de conduta dos Estados. O Realismo busca saber o que explica a conduta dos Estados e sua sobrevivência e saber o que produz e explica a dinâmica do sistema internacional (DOUGHERTY & PFALTZGRAFF, 2003: 80-81).

O Liberalismo por sua vez é outro paradigma na teoria das Relações Internacionais, segundo Nogueira e Messari (2005). Para estes autores, o Realismo escolhe a visão de mundo Liberal como seu alvo principal e procura desacreditá-la. Contudo, o Liberalismo é o que chamam de componente essencial de todo edifício conceitual das Relações Internacionais, sendo uma tradição do pensamento ocidental, que não é coerente e unificada e originou desde o Iluminismo até o século XX teorias tanto sobre o lugar do indivíduo na sociedade ou sobre a natureza do Estado até sobre a legitimidade das instituições de governo, além de teorias sobre a organização da Economia.

Em relação a problemas internacionais, a tradição liberal se caracteriza por valores e conceitos centrais como a liberdade dos indivíduos, uma vez que parte da noção moderna de que os seres humanos são dotados de razão e definem seu destino de maneira autônoma. Dessa forma, os indivíduos não dependem de senhores, governantes nem do clero para que decidam como viver, sendo livres e iguais porque são dotados de capacidade de decidir o que é bom e justo como indivíduos que fazem parte de uma comunidade, sendo dotados também de capacidade de decidir como alcançar a própria felicidade. Essa concepção gera no Liberalismo a questão da importância de se construir uma sociedade bem-ordenada e que assegure aos indivíduos as melhores condições para o exercício da sua liberdade. É esta visão acerca da capacidade humana de determinar sua direção, segundo Nogueira e Messari, que marcam a perspectiva liberal das Relações Internacionais: o Estado passa a ser percebido como um mal necessário e ameaça potencial, à medida que protege indivíduos contra ameaças externas como invasões e agressões em um mundo no qual os Estados estão sempre promovendo guerras, mas leva os indivíduos sob proteção deste Estado a correrem o risco de exercício tirânico do poder por parte dos seus próprios governantes. Logo, há uma contradição entre o dever de proteção em relação aos cidadãos contra inimigos externos e conseqüências nocivas às liberdades individuais, da promoção de conflitos armados.

Assim, os liberais chegam à conclusão de que o Estado de conflito potencial que caracteriza o sistema internacional é uma ameaça à própria liberdade no interior dos Estados e dessa forma, é fundamental que se faça da promoção da paz mundial uma tarefa primordial da política externa de nações comprometidas com o bem-estar de seus cidadãos.

O Liberalismo diverge do Realismo em relação à anarquia que caracteriza o sistema internacional, pois até pode concordar que esta seja uma situação do presente, mas prevê que possa existir uma ordem mais cooperativa e harmoniosa entre os Estados por via de uma transformação, e é em relação a qual transformação seria essa que diferentes pensadores liberais ofereceram respostas, como o estabelecimento do livre-comércio, da democracia ou de instituições internacionais. Essa visão liberal foi chamada por críticos realistas como utópica (NOGUEIRA & MESSARI, 2005: 57-66).

Segundo Nogueira e Messari, os elementos constitutivos do que se convencionou chamar de neoliberalismo é de que ainda que exista uma anarquia entre os Estados no sistema internacional. O problema está em como mudar o contexto da interação entre os Estado de modo que possam identificar interesses comuns, pois o contexto da interação estratégica pode mudar por meio de da formação de instituições, que desempenham funções básicas para a formação das preferências dos atores: (a) aumentam o fluxo de informações, permitindo transparência acerca de interesses e intenções dos Estados, podendo reduzir a incerteza característica do sistema anárquico, (b) permitem o controle do cumprimento de compromissos para verificação recíproca entre as partes de um regime se estão cumprindo os acordos firmados, reduzindo as chances de trapaças e (c) instituições podem mudar as expectativas dos atores a respeito da solidez dos acordos ao longo do tempo, reduzindo incertezas a partir da existência de regras e procedimentos que gerem a previsibilidade de um comportamento responsável. Assim, as instituições apareceram como variáveis importantes para explicação de resolução de conflitos por meio de arranjos cooperativos e os liberais conseguiram apresentar uma visão  alternativa ao ceticismo reo-realista. Hoje, um Liberalismo contemporâneo possui um enfoque robusto e influente, mas distinto do Liberalismo clássico e com outras decorrências após o neo-liberalismo. (NOGUEIRA & MESSARI, 2005: 88-101)

Em relação ao neo-realismo, Dougherty e Pfaltzgraff apontam que esta teoria se distingue do neoliberalismo em relação ao significado que atribuem à anarquia existente no sistema internacional. Mas os neo-realistas também convergem com os neoliberais em relação às possibilidades de promoção de uma cooperação internacional, apesar de divergirem sobre a probabilidade do sucesso dessa cooperação. De acordo com os neo-realistas, segundo estes autores, as instituições internacionais não são capazes de proporcionar substituto para a confiança nas capacidades do Estado. Assim, vemos como as diferenças entre neo-realistas e neoliberais se distancia da demarcação de campos intelectuais existente no debate entre realistas e liberais, o que representa um progresso na teoria das Relações Internacionais.

Alguns dos vários elementos constitutivos do neo-realismo podem ser considerados (i) a permanência, em relação ao Realismo, do poder como variável-chave, mas elegendo diferentemente como conceito-chave a política, (ii) esforço em ultrapassar a abordagem unidimensional do realismo e poder abranger uma variedade maior de fenômenos em cada um dos níveis de análise que se estendem do impacto dos fatores domésticos sobre a política externa até as implicações da estrutura sistêmica internacional no tocante aos padrões de interação dos Estados, um uma análise de constelação, procurando reinterpretar e aperfeiçoar a teoria realista e, para finalizarmos, (c) premissa de que é preciso estabelecer alto grau de cooperação interdisciplinar a fim de se alcançar progresso essencial na nossa capacidade de analisar e prever processos e comportamentos políticos de sistemas como o Estado.

As implicações advindas do uso de uma ou outra teoria para estudos políticos atuais sobre temas, por exemplo, como o meio ambiente ou os direitos humanos são muitas, mas podemos destacar que para ambas as teorias, questões como as relativas ao meio ambiente ou à promoção dos direitos humanos devem perpassar uma grande compreensão acerca da soberania dos Estados e da busca por equilíbrio no sistema internacional.

Assim, para estudos identificados o neo-realismo ou o realismo, seria importante verificar o quanto cada Estado corre o risco de deixar as preocupações globais com o meio ambiente afetarem seu poder, pois deve haver uma cooperação internacional, mas instituições internacionais não serão capazes de proporcionar por si mesmas um substituto para a confiança nas capacidades do Estado. Logo, quem deve solucionar questões referentes ao meio ambiente em seu território são os Estados e é importante a estudiosos do neo-realismo estudarem de que forma é fundamental que os Estados verifiquem logo o que devem fazer nesse sentido, antes de correrem o risco de serem interditados internacionalmente a pretexto de supostas preocupações globais ambientais.

Em relação aos direitos humanos, situação semelhante, mas vamos pensar nas implicações advindas do uso das teorias liberais e neo-liberais para estudos jurídicos no campo do Direito Internacional Público sobre este tema. Ora, as teorias liberais e neo-liberais possuem como legado a própria noção de direitos humanos, portanto, nada mais coerente do que defender sua promoção desses direitos a nível mundial. No entanto, para não se permitir que, a pretexto da promoção dos direitos humanos em dado país, se realize ataques contra a integridade de seus habitantes e de seu Estado, é necessário se verificar o quanto para esta finalidade já não existe um fluxo de informações e transparência sobre respeito aos direitos humanos no interior dos Estados e ao mesmo tempo instituições que permitam o controle do cumprimento de compromissos e verificação recíproca entre países signatários de tais compromissos em relação ao cumprimento dos acordos firmados em respeito aos direitos humanos, visando solidez do acordo e ao mesmo tempo reduzindo incertezas em relação ao cumprimento de regras e procedimentos de um comportamento responsável por parte dos Estados soberanos.

Referências bibliográficas

ADLER, Emanuel. O Construtivismo no estudo das relações internacionais. Lua Nova, São Paulo, nº 47, 1999.

ALARCON, Danilo. Revisitando o papel dos organismos internacionais nas missões de peace-building sob a ótica construtivista: os casos de Afeganistão e Somália. Trabalho apresentado no I Encontro Acadêmico-Científico de Relações Internacionais da PUC-Goiás, Goiás, junho de 2011.

DOUGHERTY, James & PFALTZGRAFF, Jr., Robert. Relações Internacionais. As Teorias em Confronto. Lisboa: Gradiva, 2003

FEREJOHN, John & PASQUINO, Pasquale. A Teoria da Escolha Racional na Ciência Política: Conceitos de Racionalidade em Teoria Política. Revista Brasileira de Ciências Sociais, São Paulo, vol. 16, nº 45, fevereiro de 2001.

MORO, Eduardo João. A Teoria da Escolha Racional e a Explicação do Voto. Intratextos, Rio de Janeiro, vol. 1, nº 1, 2009.

NASCIMENTO, Emerson Oliveira. Os Novos Institucionalismos na Ciência Política Contemporânea e o Problema da Integração Teórica. Revista Brasileira de Ciência Política, nº 1, janeiro-junho de 2009

NOGUEIRA, João Pontes & MESSARI, Nizar. Teoria das Relações Internacionais. Rio de Janeiro: Elsevier, 2005.

PEREIRA, Paulo Trigo. A Teoria da Escolha Pública (Puclic Choice): uma abordagem neoliberal? Análise Social, Lisboa, vol. 32, nº 141, 1997 (2º volume)

Sobre o autor
Carlos Eduardo Oliva de Carvalho Rêgo

Advogado (OAB 254.318/RJ). Doutor e mestre em Ciência Política (UFF), especialista em ensino de Sociologia (CPII) e em Direito Público Constitucional, Administrativo e Tributário (FF/PR), bacharel em Direito (UERJ), bacharel e licenciado em Ciências Sociais (UFRJ), é professor de Sociologia da carreira EBTT do Ministério da Educação, pesquisador e líder do LAEDH - Laboratório de Educação em Direitos Humanos do Colégio Pedro II.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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