O Direito Real de Habitação é um instituto legal que busca proteger o cônjuge sobrevivente de uma situação de insegurança quanto à moradia no caso de falecimento de seu cônjuge atual. Trata-se de uma condição que mantém o direito à moradia mesmo que a pessoa não seja herdeira integral ou sequer parcial do imóvel, cumpridas certas condições.
No artigo de hoje, veremos como funciona, quais as características e os requisitos do direito real de habitação, além de respondermos algumas das principais dúvidas que recebemos por aqui.
O que é o direito real de habitação?
O Direito Real de Habitação não é uma novidade legal no Brasil. Atualmente, ele emana do artigo 1.831 do Código Civil de 2002, o qual determina:
Ao cônjuge sobrevivente, qualquer que seja o regime de bens, será assegurado, sem prejuízo da participação que lhe caiba na herança, o direito real de habitação relativamente ao imóvel destinado à residência da família, desde que seja o único daquela natureza a inventariar.
De forma resumida, pode-se entender que se trata do direito de uma pessoa continuar morando na residência em que já morava com seu cônjuge falecido, caso esta seja a única residência deixada entre os bens.
Este direito de moradia se sobrepõe à própria destinação dos bens do inventário, embora não altere as quantidades nele definidas. Em outras palavras, os herdeiros não podem retirar o cônjuge de sua residência para venderem ou darem outro fim a este bem enquanto a pessoa continuar morando lá. No tópico a seguir, veremos quais as características deste direito.
Características do direito real de habitação
Como se observa no texto legal, o direito real de habitação possui várias características citadas. Além disso, há outras que são interpretadas doutrinariamente e fazem parte das regras que o regem. Vamos abordar as principais delas de maneira separada:
Não é tácito
O direito de habitação não é tácito nem presumido. Isso significa que ele precisa ser pedido explicitamente ao longo do inventário para que seja concretizado. Destarte, não se presume automaticamente a necessidade de direito de habitação pelo simples fato de haver um único imóvel residencial no inventário, pois o exercício deste direito não é obrigatório.
Não se renuncia tacitamente
Se, por um lado, o exercício do direito de habitação não é presumido, sua renúncia também não é. O fato de o cônjuge sobrevivente não pedir pela manutenção da sua moradia no processo de inventário não significa que abriu mão de exercê-la.
Em outras palavras, este é um tema que precisa ser abordado no processo para que ele tenha completa validade. Seja o resultado a manutenção da moradia ou não, ela precisa ser tratada, sob pena de que ainda esteja sob disputa de herdeiros.
Sem prejuízo de sua herança
O texto legal inclui um trecho que diz que o direito de habitação sobre o imóvel destinado à residência de família ocorre “sem prejuízo da participação que lhe caiba na herança”. Significa dizer que ter garantido o direito de moradia não tem qualquer efeito positivo ou negativo sobre a parte de cada herdeiro.
Em outras palavras, se o cônjuge sobrevivente tiver direito a 50% do imóvel em que reside e um filho tiver direito aos outros 50%, estes percentuais serão mantidos assim, a despeito de o cônjuge poder continuar morando nele. O filho em questão será igualmente herdeiro dos 50%, apenas não poderá alienar o bem ou dar qualquer outra finalidade para ele enquanto o cônjuge sobrevivente o utilizar como residência.
Retroage ao momento da morte
Embora não haja reconhecimento tácito do direito à habitação, o direito em si surge no momento da morte do cônjuge. Isso significa que se ele for solicitado e deferido em juízo, seus efeitos retroagem justamente a este momento de falecimento.
Desta forma, quaisquer negócios jurídicos que tenham sido realizados pelos herdeiros impossibilitando a moradia do cônjuge sobreviventes não poderão ter efeito. Em outras palavras, se o bem for vendido, por exemplo, aquela venda será considerada inválida, pois já no momento do negócio havia o impedimento em função do direito de moradia.
Não se confunde com usufruto
É importante entender, com clareza, que o direito real de habitação compreende exatamente isso: a habitação e a moradia. Trata-se de algo diferente do usufruto – como aquele que existe para alguém que doa um imóvel em vida, com reserva de usufruto.
Quem tem o usufruto pode dispor do bem como quiser, desde que não o venda, por não se tratar mais do proprietário. Quem tem moradia tem poderes menos amplos: pode residir à sua maneira, mas não pode dispor do bem como um instrumento negocial. Não é possível, por exemplo, alugar ou locar partes que não utilize.
Porém, é igualmente importante saber que a moradia garante, sim, que a pessoa tem o direito de permanecer no imóvel com o formato familiar que constitui. Pode-se morar com outras pessoas, sem distinção de serem seus filhos, um novo cônjuge ou quem quer que seja.
Aplica-se a qualquer regime de bens
A legislação é absolutamente clara ao explicitar que o direito real de habitação cabe ao cônjuge sobrevivente em “qualquer que seja o regime de bens”. Neste sentido, o direito à moradia existe mesmo quando existe a separação dos bens, pois não se trata de uma direito à propriedade, e sim à própria manutenção de sua residência.
Essa foi uma inovação importante do Código Civil de 2022. Até então, o direito real de habitação só existia no caso de comunhão universal de bens. Hoje, porém, o direito não apenas se estende a qualquer regime, como independe sequer do casamento. O reconhecimento de uma união estável, mesmo que retroativo, é suficiente para reconhecer o direito à moradia.
Perguntas Frequentes sobre o Direito Real de Habitação
Separamos algumas das perguntas mais comuns que recebemos sobre a temática nesta seção, na expectativa de que as respostas sejam úteis para tirar as suas dúvidas:
Como o Direito Real de Habitação altera o inventário?
O Direito de Habitação não tem qualquer impacto sobre os percentuais de cada herdeiro sobre o inventário. Desta forma, ele não prejudica nem favorece o cônjuge ou os demais herdeiros neste sentido.
O único impacto que haverá neste sentido é que o imóvel, mesmo que pertença a demais herdeiros, não poderá sofrer nenhum tipo de alienação efetiva que prejudique a característica de moradia do cônjuge sobrevivente.
O Direito de Habitação também se aplica a casas de praia ou campo?
O direito de habitação se aplica somente ao imóvel único que tenha natureza de moradia permanente. Assim, mesmo que uma casa de praia seja a única deixada pelo cônjuge, ela não estará apta a se classificar como habitação caso tenha sido utilizada somente para férias ou lazer.
Isso se aplica a quaisquer imóveis, mesmo que sejam na cidade de moradia, que já não fossem usados para tal fim. O direito de moradia é sobre a manutenção desta condição e não sobre a criação de uma nova relação de residência com um bem.
Quando os herdeiros poderão dispor sobre o bem imóvel sob direito de moradia?
Os herdeiros recuperarão seu direito de dispor livremente, inclusive alienando o bem, quando cessar o direito de moradia. Isso pode acontecer por uma situação de mudança de endereço, pelo fim da ocupação do imóvel como sua residência definitiva ou pelo falecimento da pessoa.
A pessoa viúva pode viver com um novo cônjuge no imóvel sobre o qual obteve direito real?
Sim. O direito à moradia não é limitado ao cônjuge sobrevivente. Outras pessoas podem continuar morando ou passando a morar com este indivíduo, sem desconfigurar a situação de moradia. Embora seja uma situação que desagrada alguns herdeiros, viver com um novo cônjuge naquela residência não impacta o direito de moradia.
Os demais herdeiros podem cobrar aluguel sobre a moradia?
O direito real de moradia já é reconhecido no próprio registro do bem, de forma que não gera o direito de recebimento de qualquer contrapartida por parte dos herdeiros dele. Não há como cobrar aluguel sobre um direito que já é garantido à pessoa.
Qual deve ser a especialidade de advogado para abordar questões de Direito Real de Habitação?
O Direito Real de Habitação se dá no âmbito do inventário. Por isso, trata-se de uma questão de Sucessão, que é uma das áreas específicas de Direito de Família. Assim sendo, é essencial contar com um escritório de advocacia que não apenas tenha experiência em Direito de Família, mas na própria área de sucessões.
Isso garantirá mais agilidade para a solução da demanda, além de permitir identificar com antecipação possíveis pontos de litígio, buscando evitá-los desde o início. Também é importante considerar um escritório que trabalhe com a possibilidade de uma resolução extrajudicial da questão, evitando um longo e custoso conflito na Justiça.
Além dos benefícios materiais, esta sensibilidade auxilia a lidar em um momento que normalmente é envolto pela situação já delicada de perder alguém. Se você precisa de auxílio jurídico em alguma questão relacionada ao Direito de Habitação, entre em contato com a nossa equipe e agende uma consulta!