A lei 9.307/96 , conhecida como lei da Arbitragem, foi um marco histórico no ordenamento jurídico nacional, uma vez que regulamentou este importante método de solução de conflitos. É importante ressaltar que tal instrumento tem como função principal desafogar o tão sobrecarregado Poder Judiciário brasileiro. A enorme judicialização faz com que o poder judiciário peca a eficiência, fazendo com que processos demorem anos, em alguns casos décadas, para serem concluídos.
Apesar de tratar-se de procedimento que visa desafogar o poder judiciário e trazer maior eficiência para as partes na solução de seus conflitos, a constitucionalidade da lei 9.307/96 foi questionada, pois parte da doutrina acreditava na existência de um conflito entre a mesma e o disposto no art. 5º, XXXV, CF (a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito); porém, como escrito por Carlos Roberto Gonçalves ao abordar o tema:
“No caso da arbitragem, entretanto, ela é escolhida livremente pelas partes, não havendo qualquer imposição do legislador. A lei faculta, e não impõe, aos interessados esse modo de composição privada de lides” (Gonçalves, 2021 p. 628).
Além disso, é mister mencionarmos que, com a redação dada pela lei 9.129/2015, é permitida a arguição de nulidade da sentença arbitral perante o Poder Judiciário, bem como quando uma das partes se recusar a celebrar o compromisso arbitral quando houver cláusula compromissória.
Fica claro, portanto, que, mesmo sendo desvinculada do poder judiciário, a arbitragem tem um papel constitucional importantíssimo, pois ao desafogar aquele poder, contribui de forma definitiva para a razoável duração dos processos (art.5º, LXXVIII, CF); além, é claro, de aumentar a eficiência na solução de conflitos entre as partes.
Analisada a constitucionalidade da lei de arbitragem, passamos analisar a eficácia das sentenças prolatadas pelo juiz arbitral. Antes, porém, faz-se necessário ressaltar outro aspecto positivo da arbitragem: a sentença será proferida no prazo estipulado pelas partes, ou no prazo máximo de seis meses caso nenhum prazo tenha sido convencionado (art. 23, lei 9.307/96). Observe que há uma inversão total da prática vista no Poder Judiciário, onde as partes apresentam suas demandas e argumentos e ficam à mercê do juiz aguardando que o mesmo possa analisar o processo. Na arbitragem, as partes determinam ao árbitro o prazo que ele terá para analisar e proferir a sentença arbitral.
A sentença proferida pelo árbitro não fica sujeita a recurso ou a homologação pelo poder judiciário (art. 18, lei 9.307/96); porém a parte interessada poderá acionar o Poder Judiciário para que seja declarada a nulidade da mesma, ação esta que seguirá o rito comum e deverá ser proposta em até noventa dias após o recebimento da notificação da respectiva sentença arbitral.
Importante entender, portanto, que o legislador expressou claramente sua intenção de não ser possível recorrer de uma decisão arbitral, admitindo-se o acionamento do Poder Judiciário somente nos casos em que se busca a anulação da mesma, e somente com base nas hipóteses presentes no art. 32 da lei de arbitragem (art. 33, lei 9.307/96). Mesmo nestes casos, a 3ª turma do STJ, seguindo o voto do Exmo. Sr. Ministro Marco Aurélio Belizze, entendeu que as ações anulatórias não podem ser usadas apenas para manifestar inconformismo com a sentença arbitral:
As ações anulatórias não servem à simples revisão do mérito da sentença arbitral, mas devem estar fundadas em uma das hipóteses previstas no artigo 32 da Lei de Arbitragem, a exemplo da nulidade da convenção de arbitragem, da escolha de árbitro ilegítimo e da decisão proferida fora dos limites da convenção de arbitragem (Belizze, 2019).
Segundo o art. 32, a sentença arbitral é nula se:
I - for nula a convenção de arbitragem; (Redação dada pela Lei nº 13.129, de 2015)
II - emanou de quem não podia ser árbitro;
III - não contiver os requisitos do art. 26 desta Lei;
IV - for proferida fora dos limites da convenção de arbitragem;
V - (Revogado pela Lei nº 13.129, de 2015)
VI - comprovado que foi proferida por prevaricação, concussão ou corrupção passiva;
VII - proferida fora do prazo, respeitado o disposto no art. 12, inciso III, desta Lei; e
VIII - forem desrespeitados os princípios de que trata o art. 21, § 2º, desta Lei.
Trata-se, portanto, de rol taxativo de hipóteses em que caberia a interferência do judiciário, caso acionado pela parte interessada. Neste sentido, a interferência do judiciário tem caráter absolutamente excepcional, porém nunca revisional.
“A sentença arbitral produz, entre as partes e seus sucessores, os mesmos efeitos da sentença proferida pelos órgãos do Poder Judiciário e, sendo condenatória, constitui título executivo” (art. 31, lei 9.307/96). É mister enfatizar que o árbitro não possui poder coercitivo direto, sendo-lhe vedada a prática de atos executivos. Em outras palavras, o árbitro não tem o poder de determinar a execução forçada do direito reconhecido, sendo tal poder exclusivo do Poder Judiciário, que o exercerá, se provocado, tendo como fundamentação a sentença arbitral.
A lei 9.307/96 deixou explícita a autonomia do árbitro para decidir os conflitos que lhe são apresentados, sendo que suas decisões só podem ser questionadas por meio de ação anulatória; e nem poderia ser diferente, pois a arbitragem respeita o princípio da autonomia das partes. Em última instância, as partes concordaram em escolher determinado árbitro e concordaram também com o procedimento arbitral. Questões como indeferimento de provas pelo árbitro não são objeto de análise pelo Poder Judiciário, uma vez que, segundo o Ministro Marco Aurélio Belizze:
“o exame quanto à suficiência das provas ou à necessidade de realização de determinada prova é providência que compete exclusivamente ao juiz da causa – no caso, o tribunal arbitral. Assim, o indeferimento de determinada prova, desde que idoneamente fundamentado pelo juízo arbitral, não importa em ofensa ao contraditório” (Belizze, 2019)
Como dito anteriormente, as sentenças arbitrais são rápidas e irrecorríveis (salvo nas hipóteses de nulidade), sendo que as mesmas constituem títulos executivos. Por tudo isso, a arbitragem apresenta-se como um instrumento alternativo ao Poder Judiciário na resolução de conflitos e vem ganhando cada vez mais protagonismo, uma vez que exige a concordância das partes na determinação do juízo arbitral e também no procedimento arbitral, o que a torna extremamente eficiente no cumprimento de sua função.
REFERÊNCIAS
Belizze, Marco Aurélio. 2019. Consultor Jurídico. [Online] conjur.com.br, 27 de maio de 2019. [Citado em: 15 de Abril de 2023.] https://www.conjur.com.br/2019-mai-27/stj-ve-mero-inconformismo-nega-anulacao-sentenca-arbitral.Gonçalves, Carlos Roberto. 2021. Direito civil brasileiro: contratos e atos unilaterais. 18ª. São Paulo : Saraiva Educação, 2021. Vol. 3.