OS DIREITOS POSSESSÓRIOS - que podem ou não estar embasados em documentos transmissivos dessa "posse" - possuem importância econômica e como sabemos podem originar a conversão em propriedade através da USUCAPIÃO (importância jurídica). Não por outra razão sabemos que pode haver sua transmissão por causa da morte do seu titular operando-se a transmissão "causa mortis" e sim tudo isso pode constar devidamente entabulado e formalmente distribuído entre os herdeiros através de INVENTÁRIO, tanto o JUDICIAL quanto o EXTRAJUDICIAL.
O Código Civil em seus artigos 1.206, 1.207 e 1.243 contempla a possibilidade da SOMA DAS POSSES pela transmissão "causa mortis":
"Art. 1.206. A posse transmite-se aos herdeiros ou legatários do possuidor com os mesmos caracteres.
Art. 1.207. O sucessor universal continua de direito a posse do seu antecessor; e ao sucessor singular é facultado unir sua posse à do antecessor, para os efeitos legais.
Art. 1.243. O possuidor pode, para o fim de contar o tempo exigido pelos artigos antecedentes, acrescentar à sua posse a dos seus antecessores ( art. 1.207 ), contanto que todas sejam contínuas, pacíficas e, nos casos do art. 1.242 , com justo título e de boa-fé".
De fato, a Lei é clara revelando que a POSSE tem importância e mesmo que não esteja arrolada no art. 1.225 como um "direito real", preenchidos os requisitos legais, ela tem potencialidade para a conversão em PROPRIEDADE (direito real elencado no inciso I do referido artigo 1.225) através de quaisquer modalidades de USUCAPIÃO.
A respeito da transmissão da posse pelo evento MORTE destaca o ilustre jurista FABIO ULHOA COELHO (Curso de Direito Civil. 2020):
"A posse não se transmite somente por negócios jurídicos. Fatos jurídicos também implicam a transferência da posse, como por exemplo a MORTE DO POSSUIDOR, que a transfere aos seus herdeiros. Qualquer que seja, entretanto, a causa jurídica da transmissão, ocorre sempre a perda da posse por uma pessoa e sua aquisição imediata por outra. Como direito exclusivo, a posse não pode ser adquirida por alguém sem que outrem a perca simultaneamente. Na aquisição e perda da posse, assim, um sujeito de direito sempre é substituído por outro na titularidade do direito sobre a coisa" .
Em que pese alguns prepostos em Cartórios do Rio ainda não saibam - quando deveriam - a novidade trazida pelo Novo Código de Normas Extrajudiciais do Estado do Rio de Janeiro em 2023 (Provimento CGJ/RJ 87/2022) está no art. 445 que amparado na melhor jurisprudência permite a realização do Inventário tanto de DIREITOS POSSESSÓRIOS quanto de imóveis "pendentes de regularização", com as devidas e louváveis ressalvas:
"Art. 445. Podem ser objeto de inventário bens e direitos, incluindo imóveis pendentes de regularização junto ao Poder Público, assim como DIREITOS POSSESSÓRIOS sobre imóveis, devendo constar do ato a ciência dos interessados de que o registro de propriedade ficará condicionado à sua efetiva regularização.
Parágrafo único. O inventário do direito possessório, por si só, não confere direito subjetivo aos herdeiros quanto à futura usucapião, cabendo ao tabelião aferir os elementos para lavratura da ata notarial e ao oficial registrador a viabilidade do seu registro" .
A ressalva é importante para que os desavisados não pretendam o registro do "Inventário dos Direitos Possessórios" junto ao RGI, o que de plano e com toda razão deve ser repelido já que o Registro de Imóveis não registra a posse mas sim a propriedade (e como vimos, a posse pode sim ser convertida em propriedade através da Usucapião - inclusive pela USUCAPIÃO EXTRAJUDICIAL).
POR FIM, a jurisprudência do SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA chancelando com todo acerto mais uma vez a importância e possibilidade do INVENTÁRIO DOS DIREITOS POSSESSÓRIOS:
"STJ. REsp. 1984847/MG. J. em: 21/06/2022. CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. DIREITO DAS SUCESSÕES. PARTILHA DE DIREITOS POSSESSÓRIOS SOBRE ÁREAS RURAIS NÃO ESCRITURADAS. AUTONOMIA ENTRE O DIREITO DE PROPRIEDADE E O DIREITO POSSESSÓRIO SOBRE BENS IMÓVEIS. EXPRESSÃO ECONÔMICA DO DIREITO POSSESSÓRIO QUE PODE SER OBJETO DE TUTELA. PARTILHA DO DIREITO POSSESSÓRIO. RESOLUÇÃO PARTICULAR DA QUESTÃO EM RELAÇÃO AOS HERDEIROS COM POSTERIOR RESOLUÇÃO DA QUESTÃO FUNDIÁRIA. POSSIBILIDADE. (...) 2- O propósito recursal é definir se é admissível, em ação de inventário, a partilha de direitos possessórios sobre bens imóveis alegadamente pertencentes ao falecido e que não se encontram devidamente escriturados. 3- Não apenas de propriedades formalmente constituídas é composto o acervo partilhável em razão do falecimento do autor da herança, na medida em que existem bens e direitos com indiscutível expressão econômica que, por vícios de diferentes naturezas, não se encontram legalmente regularizados ou formalmente constituídos sob a titularidade do falecido. 4- Diante da autonomia existente entre o DIREITO DE PROPRIEDADE e o DIREITO POSSESSÓRIO, a existência de expressão econômica do direito possessório como objeto de partilha e a existência de parcela significativa de bens que se encontram em situação de irregularidade por motivo distinto da má-fé dos possuidores, É POSSÍVEL A PARTILHA de direitos possessórios sobre bens imóveis não escriturados. 5- A partilha imediata dos direitos possessórios permite resolver, em caráter particular, a questão que decorre da sucessão hereditária, relegando-se a um segundo momento a discussão acerca da regularidade e da formalização da propriedade sobre os bens inventariados. Precedente. 6- Na hipótese, dado que a exclusão da partilha dos direitos sobre as terras se deu apenas ao fundamento de que seria impossível a partilha de áreas não escrituradas, impõe-se que, afastado esse óbice, seja determinado o regular prosseguimento da ação de inventário a fim de que seja apurada a existência dos direitos possessórios e a qualidade da posse alegadamente exercida, dentre outras questões relevantes para o reconhecimento do eventual direito a ser partilhado. 7- Recurso especial conhecido e provido, a fim de, afastado o óbice à partilha apontado no acórdão recorrido, determinar seja dado regular prosseguimento à ação de inventário".