Autora: Rana Vilar Gurgel
RESUMO
O texto analisa as ações legais mediante a embriaguez ao volante buscando informar sobre a visão geral das leis, do direito penal e do princípio Nemo Tenetur se Detegere.
Palavras-chave: Crime. Embriaguez. Princípio.
ABSTRACT
The text analyzes legal actions based on drunk driving, seeking to inform about the general view of laws, criminal law and the Nemo Tenetur se Detegere principle.
Keywords: Crime. Drunkenness. Principle.
INTRODUÇÃO
A vida em sociedade sempre foi um desafio, desde os primórdios até os dias atuais, com o passar da evolução o âmbito social foi se fortalecendo e com ele os problemas aumentaram. Partindo dessa premissa, foi necessário fazer-se uso do direito para resolver esses problemas.
Dentro dos segmentos do direito, o penal está em última instância, sendo apenas aplicado caso os demais ramos do direito não tenham competências efetivas para solucionar a lesão cometida pelo indivíduo.
O tema embriaguez ao volante é um tema bastante abrangente no que diz respeito às leis que a rege, como também no significado de interpretação, seja em qualquer nível de segmento dentro da sociedade.
Diante disso, foi levantado a seguinte reflexão: as condutas normativas dentro de suas leis são eficazes no que tange a embriaguez ao volante?
Frente a esse questionamento, este trabalho tem como objetivo geral analisar as leis que norteiam as condutas sobre as ações de infração do condutor que dirige alcoolizado ou sob influência de substância psicotrópica um veículo automotor.
Para tanto, dentro do que foi abordado é verídico dizer que houve um esforço em relação a criação das leis para combater o crime de embriaguez ao volante, como também, das alterações nessas leis para melhor atender a inibição dessa lesão por parte dos agentes responsáveis por aplica-la. Porém, vale ressaltar que ao mesmo tempo em que essa lei pune também deixa brecha para o condutor, ou seja, permite que este tenha o direito que não querer realizar os testes de sangue e de bafômetro para que não possa produzir provas criminatórias de si mesmo.
1 – VISÃO GERAL DAS LEIS SOBRE EMBRIAGUEZ AO VOLANTE
A partir da Lei nº 9.503/97, de 23 de setembro de 1997 foi determinada a Lei nº 12.760, de 20 de dezembro de 2012 onde houve diversas modificações em relação ao Código de Trânsito Brasileiro.
Inicialmente aquela lei dizia que:
“Conduzir veículo automotor, na via pública, sob a influência de álcool ou substância de efeitos análogos, expondo a dano potencial a incolumidade de outrem”. As penas eram: “detenção, de 6 (seis) meses a 3 (três) anos, multa e suspensão ou proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor”.
Pelo alto número de acidentes de trânsito com vítimas fatais, no ano de 2008, foi criada a Lei Seca, assim chamada, a partir da edição da Lei nº 11.705. A partir daí a embriaguez ao volante passou a se configurar como:
“Um ato de Conduzir veículo automotor, na via pública, estando com concentração de álcool por litro de sangue igual ou superior a 6 (seis) decigramas, ou sob a influência de qualquer outra substância psicoativa que determine dependência”.
Com a criação da Lei Seca houve o intuito de gerar uma diminuição dos números de acidentes de trânsito referente a embriaguez ao volante devido o acusado fazer-se uso do bafômetro para mensurar a quantidade de álcool na corrente sanguínea, bem como, a realização do próprio exame de sangue.
Mais esse objetivo foi frustrado pelo fato das brechas deixadas pela própria lei, onde o acusado não seria obrigado a fornecer provas contra si mesmo, e isso gerou insatisfação por meio dos agentes que iriam aplicar a lei, ou seja, a criação dessa lei específica não poderia ser executada.
Dentro dessa premissa o artigo 306 do Código de Trânsito referida pela Lei nº 12.760/12 foi reformulada, sendo:
“Conduzir veículo automotor com capacidade psicomotora alterada em razão da influência de álcool ou de outra substância psicoativa que determine dependência: Penas - detenção, de seis meses a três anos, multa e suspensão ou proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor”.
Frente a essa nova reformulação a capacidade psicomotora alterada passou a ser o ponto forte, e para isso, de acordo com a medicina, existe uma região no cérebro responsável que comanda e determina o movimento dos músculos, e esse controle é chamado de capacidade psicomotora, e que envolve diversos fatores, como: coordenação motora, tonicidade, organização espacial e percepção visual, organização temporal e percepção auditiva, atenção, concentração, memória, desenvolvimento do esquema corporal e a linguagem. E para que haja essa alteração na capacidade psicomotora é necessário o uso de álcool ou de substâncias psicotrópicas.
Além da embriaguez, para se configurar como crime, o acusado deve estar conduzindo veículo automotor, sobre isso o Anexo I do Código de Trânsito Brasileiro diz: “todo veículo a motor de propulsão que circule por seus próprios meios, e que serve normalmente para o transporte viário de pessoas e coisas, ou para a tração viária de veículos utilizados para o transporte de pessoas e coisas. O termo compreende os veículos conectados a uma linha elétrica e que não circulam sobre trilhos (ônibus elétrico)”.
É importante destacar também que no artigo 306, em seu texto original dizia-se: “Conduzir veículo automotor, na via pública, sob a influência de álcool ou substância de efeitos análogos, expondo a dano potencial a incolumidade de outrem” (grifado). Dessa maneira, verificava-se como sendo um crime de perigo concreto, ou seja, o condutor estaria praticando ação perigosa, como o excesso de velocidade, andar em ziguezague ou em cima de calçadas e acostamentos, ou qualquer outra ação que seja anormal ou perigosa.
Em complemento, dentro do campo da prova infração penal o artigo 158 do Código de Processo Penal: “Quando a infração deixar vestígios, será indispensável o exame de corpo de delito, direto ou indireto, não podendo supri-lo a confissão do acusado”. Ou seja, por vestígios subentende-se que são, toda e qualquer marca, sinal, objeto, situação fática, e dentro desse crime, para o condutor, é o álcool ou a substância psicotrópica que possam ter alterado a capacidade psicomotora.
2 – DIREITO PENAL E SUAS CONDUTAS DIGNAS DE INTERVENÇÃO
Para informação instrutiva o direito foi subdividido em segmentos, como o civil, comercial, trabalhista, eleitoral, penal, etc. o direito é um ramo muito importante, pois é através dele que o Estado resolve os conflitos apresentados.
O direito é indissolúvel, porém, essa divisão em segmentos é de suma importância para facilitar o trabalho. E dentro dessa segmentação, pode-se destacar o direito penal como sendo o de maior relevância pelo fato de poder limitar o um dos maiores bens de qualquer indivíduo que é a liberdade de ir e vir perante a sociedade, por isso, deve ser utilizado e interpretado com inteligência.
O direito penal atua e é norteado pelos princípios da intervenção mínima e da ofensividade, e este diz que para o direito penal não há preocupação com bens jurídicos, pois é seleto do direito penal aplicar apenas a defesa, tão somente, dos bens jurídicos importantes na sociedade e dos crimes mais detestáveis.
O livre arbítrio no tocante a autonomia é uma direito assegurado pela Constituição, por isso, o direito penal não deve irromper a liberdade de qualquer indivíduo pelo fato deste ser somente utilizado como última opção e não a primeira.
Dentro do principio da ofensividade o direito penal só deve intervir se houver uma lesão sobre um bem jurídico “sendo insuficiente que esta conduta fira apenas conceitos morais, sociais, religiosos etc”.
É inconcepto que haja punição a fatos que não gerem lesões a bens jurídicos, e a escolha dessas condutas que devem ou não ser reprimidas se dá por meio da política criminal que é responsável por essa triagem dos bens jurídicos que são ou não tutelados pela norma penal.
A triagem desses bens jurídicos, dentro do principio da legalidade, é realizada pelo legislativo federal, pois sendo este o representativo da sociedade, tem a incumbência de selecionar as condutas apropriadas para a aplicação do direito penal.
Como falado anteriormente, o direito penal só deve ser pensado como ultima opção, apenas quando os outros ramos do direito se demonstrarem insuficientes na defesa dos bens jurídicos.
3 - ANÁLISE DO PRINCÍPIO DO NEMO TENETUR SE DETEGERE
Este princípio caracterizado pelo Pacto de San José da Costa Rica na Convenção Americana dos Direitos Humanos, diz em seu artigo 8, inciso 2, alínea g: Toda pessoa acusada de delito tem direito a que se presuma sua inocência enquanto não se comprove legalmente sua culpa. Durante o processo, toda pessoa tem direito, em plena igualdade, às seguintes garantias mínimas: g. direito de não ser obrigado a depor contra si mesma, nem a declarar-se culpada.
Pelo que se subentende, é verificado pelo direito garantido que o indivíduo não fica obrigado a depor e nem declarar culpa, ou seja, ele tem o direito de não se auto incriminar. E ainda, o individuo não pode ser forçado a realizar teste de sangue e o bafômetro.
Torna-se contraditório uma lei que foi criada especificamente para tentar combater esse crime, já que o condutor, sob efeito de álcool ou qualquer outra substância, assume o risco de morte ao dirigir um veículo automotor, porém, nesse contexto, há uma proteção legal dada pelo principio Nemo Tenetur se Detegere.
Nesse sentido, o condutor fica garantido a não produzir provas contra si mesmo, desse modo vale lembrar que no cenário atual houve um aumento na fiscalização dos órgãos públicos com o objetivo de inibir tais condutas, porém, vale refletir, no que diz o princípio acima citado, se essa fiscalização inibe essas condutas ou apenas favorece que os condutores continuem a fazerem ou cometerem tal crime, da embriaguez ao volante.
Para melhor efetivar as punições relacionadas a embriaguez ao volante houve algumas mudanças na Lei nº 13.546/2017, onde trouxe mudanças nos artigos 291, 302, 303 e 308 do Código de Trânsito Brasileiro. No artigo 291 foi acrescentado o 3º e 4º parágrafos, o 3º acabou sendo vetado e o 4º diz que a pena base deve ser aplicada mediante artigo 59 do Código Penal, pois haverá uma possibilidade dessa pena ser maior caso os requisitos deste artigo se prestem desfavoráveis ao caso.
Como forma de também coibir a embriaguez ao volante, foi instituída a operação balada segura no Estado do Rio Grande do Sul mediante lei nº 13.963/2012.
Com ações educativas e também de fiscalização nos locais onde o número de acidentes tem mais ocorrência, o objetivo era justamente diminuir a situação de alcoolemia nas rodovias.
Através desta ação, balada segura, o Departamento de Trânsito do Estado do Rio Grande do Sul objetivava preservar vidas por meio de uma mudança no comportamento dos indivíduos no trânsito. E essas ações consistiam em blitzes em locais como: bares, casas noturnas, hotéis, festas e eventos.
Essas blitzes ocorriam em horários onde o fluxo de veículos seria maior, e assim, a coibição perante os motoristas que dirigiam embriagados ou sob efeito de qualquer outra substância seria maior.
As ações tanto podem ser fiscalizatórias, quanto educativas e pedagógicas, onde a primeira busca combater a embriaguez e o uso dos itens de segurança enquanto a segunda busca sensibilizar sobre o risco em associar álcool e direção.
É bastante conhecido que uma das normatizações acerca desse tema foi a criação da Lei Seca, tendo o objetivo de diminuir os acidentes onde existiam essa relação de álcool e direção. Além disso, um fator importante foi a necessidade de punir com maior severidade o condutor que vier dirigir sob domínio do álcool.
Embora a lei exerça sua aplicabilidade, não gerou tantos resultados pelo fato do condutor somente realizaria o teste do etilômetro ou de sangue caso estivesse de boa vontade, ou seja, se o condutor acabasse no viés de ajudar com sua própria acusação.
Para tanto, somente com a lei nº 12.760/2012 a lei seca passou a melhor garantir sua aplicabilidade, pois passou a utilizar outros meios que são aptos a confirmar a presença do álcool ou de substâncias psicoativas no indivíduo, e assim, configurar a embriaguez ao volante.
CONCLUSÃO
É verificado que os acidentes de trânsito são responsáveis pelas mortes mais violentas no Brasil, e que na maioria dos casos o elemento principal que desencadeasse o acidente foi o álcool ou efeito de substância psicotrópicas. E todo esse processo gera desconforto desde as famílias que perdem seus entes queridos como do próprio Estado que arca com as consequências projetadas pelos efeitos econômicos dos acidentes.
Visto isso, nada mais adequado do que a utilização do direito penal para fazer valer a pena estabelecida por lei, pois este é o instrumento eficaz de proteção aos bens jurídicos envolvidos numa sociedade.
Para tanto, é de suma importância dizer que a legislação que pune criminalmente a embriaguez ao volante recebeu significativas mudanças, no entanto, é esperado que o direito penal se faça cumprir a lei ao qual foi incumbida e modificada dentro do seu especificado, e assim, reduza o número de casos de acidentes ocorridos por condutores embriagados ou sob efeito de substâncias psicotrópicas.
REFERÊNCIAS
COLOMBELLI, Rodrigo. O crime e a embriaguez ao volante face aos princípios da intervenção mínima, fragmentariedade e subsidiariedade. Revista da Escola Superior de Polícia Civil. Disponível em: http://www.revistas.pr.gov.br/index.php/espc/edicao-2-artigo-7. Acesso em 30 de maio de 2023.
KIST, Dario José. A configuração atual do crime de embriaguez ao volante - art. 306 do Código de Trânsito Brasileiro. Disponível em: https://www.mpba.mp.br/sites/default/files/biblioteca/a_configuracao_atual_do_crime_de_embriaguez_ao_volante_-_art._306_do_codigo_de_transito_brasileiro_-_dario_kist_0.pdf. Acesso em 01 de junho de 2023.
RODRIGUES, Éderson José. O crime de embriaguez ao volante e seu impacto na sociedade. Universidade Integrada do Alto Uruguai e das Missões. Departamento de Ciências Sociais Aplicadas. Curso de Direito. Erechim, 2018. Disponível em: https://www.uricer.edu.br/cursos/arq_trabalhos_usuario/4084.pdf. Acesso em 04 de junho de 2023.