Símbolo do Jus.com.br Jus.com.br

Rio grande do norte: como as adversidades do sistema penitenciário propulsionam a criminalidade local.

Agenda 05/06/2023 às 16:56

Autores:

Davyd Talisson de Lima Dantas

Lara Gabriely Araújo de Carvalho

Odair José Félix Barbosa Júnior

Stela Cunha Jatobá de Menezes

RESUMO: Este artigo tem como finalidade expor ao leitor o atual cenário do sistema penitenciário potiguar e como suas adversidades contribuem com a criminalidade local. Partindo de um conceito histórico sobre a origem das prisões, é possível perceber como a superlotação é um problema presente desde sua concepção até os dias atuais. O artigo mostrará como o sistema carcerário no Brasil é defasado e como o estado do RN compartilha dessa realidade, ferindo o princípio da dignidade da pessoa humana - previsto no art. 1° da Constituição Federal de 1988 - e que, como consequência, contribuiu com a criação da facção criminosa atuante no estado que possui influência tanto dentro, como para além do cárcere. Por fim, mostrará caminhos que diminuam a criminalidade e violência como o investimento estatal em educação e trabalho.

PALAVRAS CHAVES: Sistema Penitenciário Potiguar, Princípio da Dignidade da Pessoa Humana, Violação dos Direitos Humanos, Superlotação.

ABSTRACT: This article aims to expose the reader to the current scenario of the Potiguar penitentiary system and how its adversities contribute to local crime. Starting from a historical concept about the origin of prisons, it is possible to see how overcrowding is a present problem from its conception to the present day. The article will show how the prison system in Brazil is outdated and how the state of RN shares this reality, violating the principle of human dignity - provided for in art. 1 of the 1988 Federal Constitution - and which, as a consequence, contributed to the creation of the criminal faction active in the state that has influence both inside and beyond

prison. Finally, it will show ways to reduce crime and violence, such as state investment in education and work.

KEYWORDS: Potiguar Penitentiary System, Principle of the Dignity of the Human Person, Violation of Human Rights, Overcrowding.

NOTA INTRODUTÓRIA

As condições das cadeias no Rio Grande do Norte vêm se tornado um tormento não só para os encarcerados, como também, para toda a população do estado. É fato que a situação extremamente precária recai sobre o presidiário de maneira prejudicial ao principal intuito do cárcere, a ressocialização. Após toda a rebelião comandada pelo Sindicato do Crime que aconteceu nas ruas do RN em março de 2023, em razão das péssimas circunstâncias prisionais, o Mecanismo Nacional de Prevenção a Tortura (MNPCT) esteve de volta ao Rio Grande do Norte para uma nova avaliação dentro das cadeias, onde foi constatado um cenário de horror vivido pelos detidos. (MONCAU e CARVALHO, 2023)

O ambiente insalubre das penitenciárias além de dificultar a ressocialização do indivíduo, fornece caminhos e maneiras para que aquele cidadão esteja cada vez mais dentro do mundo do crime. Nas cadeias brasileiras observa-se autores de menores delitos encarcerados com detentos de alta periculosidade, o que faz com que, muitas vezes, o cidadão saia da prisão ainda mais suscetível a cometer crimes de maior gravidade, como diz o ex presidente nacional da Ordem dos Advogados, Carlos Lamachia (2017).

Acho que o Brasil prende mal e, quando prende, em determinadas circunstâncias, ainda alimenta o crime. Encarceramos alguém por um acidente menor. Aí, colocamos essa pessoa dentro de um presídio, no qual ele vai conviver com presos de altíssima periculosidade.

Em síntese, é possível constatar a influência da situação degradante nas cadeias como um propulsor da criminalidade local, logo, este artigo tem como objetivo expor como as más condições das cadeias no Rio Grande do Norte leva o aumento considerável dos atos infracionais, por influência interna e externa nos presídios potiguares, deixando de lado o princípio da dignidade humana e fracassando no aspecto de ressocialização assegurado no artigo 22 da Lei de Execução Penal.

SISTEMA CARCERÁRIO BRASILEIRO

O encarceramento nem sempre foi considerado um meio de privação de liberdade e ressocialização, pois, até o século XV, ele era apenas uma ferramenta punitiva aos cidadãos que, por algum motivo, fossem considerados dignos de tais repressões. De início, mais precisamente na Idade Média, as prisões foram pensadas para castigar membros do clérigo que não cumpriam suas missões. No Brasil, foi através da Carta Régia de 8 de julho de 1796, com a construção da Casa da Corte, que deu início ao sistema penitenciário brasileiro. (Rio de Janeiro. Poder Judiciário. Grupo de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário).

Somente no século XVIII as torturas foram exterminadas a partir da repressão da população que já estava enfraquecendo o governo devido a insatisfação por tais atos desumanos. Foi a partir disso que a prisão passou a ter intenção de privar o indivíduo da sociedade como ato punitivo. (SILVA, 2020). Nesse sentido, conforme Assis (2007):

A prisão figurando como pena é de aparecimento tardio na história do direito penal. No Brasil não foi diferente. No princípio, a prisão como cárcere era aplicada apenas aos acusados que estavam à espera de julgamento. Essa situação perdurou durante as Ordenações Afonsinas, Manuelinas e Filipinas, as quais tinham por base um direito penal baseado na brutalidade das sanções corporais e na violação dos direitos do acusado.

Essa situação perdurou até a introdução do Código Criminal do Império, em 1830. Este estatuto já trazia consigo ideias de justiça e de equidade, influenciado pelas ideias liberais que inspiraram as leis penais europeias e dos Estados Unidos, objeto das novas correntes de pensamento e das novas escolas penais.

Os detentos ficam sob total controle do Estado, o qual tem como objetivo maior ressocializar os internos e os prepararem de volta ao convívio civil. A Lei de Execução Penal, nº 7.210, de 11 de julho de 1984, especialmente os artigos 22 e 25, discorrem sobre os direitos dos presos brasileiros, bem como sua reintegração ao corpo civil.

“Art. 22. A assistência social tem por finalidade amparar o preso e o internado e prepará-los para o retorno à liberdade.

Art. 25. A assistência ao egresso consiste:

  1. - na orientação e apoio para reintegrá-lo à vida em liberdade;

  2. - na concessão, se necessário, de alojamento e alimentação, em estabelecimento adequado, pelo prazo de 2 (dois) meses.

Parágrafo único. O prazo estabelecido no inciso II poderá ser prorrogado uma única vez, comprovado, por declaração do assistente social, o empenho na obtenção de emprego.”

Ainda assim, é possível perceber que as dificuldades enfrentadas pelos sistemas carcerários são uma problemática enraizada na sociedade, dado que nem todos os presos possuem as mesmas oportunidades enquanto estão em privação de liberdade. Nesse sentido, ainda segundo Assis (2007), “já no início do século XX, a prisões brasileiras já apresentavam precariedade de condições, superlotação e o problema da não-separação entre presos condenados e aqueles que eram mantidos sob custódia durante a instrução criminal”, o que intensifica, de maneira preocupante, o aumento da criminalidade, revoltas de grupos faccionados e adversidades que impactam, além dos apenados, .a população no geral.

Assine a nossa newsletter! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos

As prisões brasileiras são, em geral, verdadeiros infernos dantescos, com celas superlotadas, imundas e insalubres, proliferação de doenças infectocontagiosas, comida intragável, temperaturas extremas, falta de água potável e de produtos higiênicos básicos. Homicídios, espancamentos, tortura e violência sexual contra os presos são frequentes, praticadas por outros detentos ou por agentes do próprio Estado. As instituições prisionais são comumente dominadas por facções criminosas, que impõem nas cadeias o seu reino de terror, às vezes com a cumplicidade do Poder Público. Faltam assistência judiciária adequada aos presos, acesso à educação, à saúde e ao trabalho. O controle estatal sobre o cumprimento das penas deixa muito a desejar e não é incomum que se encontrem, em mutirões carcerários, presos que já deveriam ter sido soltos há anos. Neste cenário revoltante, não é de se admirar a frequência com que ocorrem rebeliões e motins nas prisões, cada vez mais violentos. O sistema, como todos sabem, funciona de forma altamente seletiva e atinge quase exclusivamente os pobres. [...] A situação chegou ao ponto de motivar intervenções da Corte Interamericana de Direitos Humanos, que condenou o Estado brasileiro a cumprir medidas provisórias para garantir a erradicação das situações de risco e providenciar a proteção à vida e à integridade pessoal, psíquica e moral de pessoas privadas de liberdade em várias penitenciárias do país. Neste contexto, a prisão torna-se uma verdadeira “escola do crime”, e a perversidade do sistema ajuda a ferver o caldeirão em que veem surgindo e prosperando as mais perigosas facções criminosas. O encarceramento em massa não gera a segurança que promete, mas, ao contrário, agrava os índices de criminalidade e de violência social, em detrimento de toda a população. (BRASIL. SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. MINISTRO MARCO AURÉLIO, 2015).

O PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA

Silva (1998) alegou que a Alemanha foi pioneira em adotar a dignidade da pessoa humana, a qual está estabelecida em seu direito fundamental no art. 1°, n°1, que diz: "A dignidade humana é inviolável. Respeitá-la e protegê-la é obrigação de todos os Poderes estatais". A datar do contexto violento que o Estado nazista provocou, o qual dizimou milhões de pessoas e feriu cruelmente a dignidade dos indivíduos a partir dos acontecidos sanguinários, foi positivado na constituição este princípio que tem base filosófica. O constitucionalismo no Brasil, que sofre influência germânica desde 1934, também adotou este princípio na Constituição Federal de 1988, a qual o Estado Democrático de Direito tem fundamento na dignidade da pessoa humana (NOBRE JÚNIOR, 2011).

Art. 1°: A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:

I – a soberania; II – a cidadania;

  1. – a dignidade da pessoa humana;

  2. – os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa; V – o pluralismo político.

Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição. (BRASIL, 1988, art. 1°).

O Juiz de Direito André Gustavo Corrêa de Andrade (2003), classifica que “no centro do direito encontra-se o ser humano. O fundamento e o fim de todo o direito é o homem, em qualquer de suas representações”. Logo, é possível entender que no momento em que o indivíduo é considerado ser humano, este é possuidor de dignidade através de seus semelhantes, isto é, dos demais indivíduos da sociedade.

A dignidade da pessoa humana é uma qualidade intrínseca, inseparável de todo e qualquer ser humano, é característica que o define como tal. Concepção de que em razão, tão somente, de sua condição humana e independentemente de qualquer outra particularidade, o ser humano é titular de direitos que devem ser respeitados pelo Estado e por seus semelhantes. É, pois, um predicado tido como inerente a todos os seres humanos e configura-se como um valor próprio que o identifica. (SARLET, 1998)

Segundo Machado e Guimarães (2014), a atual situação carcerária brasileira apresenta-se precária, visto que existem inúmeros problemas internos nas penitenciárias nacionais que vão em sentido contrário ao que assegura os Direitos Humanos e, por consequência, esta dignidade. Estes impasses provocam, então, más condições de vida básica e revoltas constantes. Como fruto dessa ineficiência estatal, nasce as facções criminosas, que buscavam tanto melhorias dentro do sistema prisional, bem como a sobrevivência em meio ao caos em que estavam inseridos. No Rio Grande do Norte, duas lideram o cárcere, sendo estas o PCC (Primeiro Comando da Capital) que atua em todo território nacional, e o Sindicato do Crime que originou e atua no estado potiguar há pelo menos dez anos.

CENÁRIO DO SISTEMA POTIGUAR

A partir dos estudos realizados por Melo e Araújo (2017), é possível notar as características mais comuns entre os internos do sistema prisional do Rio Grande do Norte. Os dados mostram o nível de escolaridade, cor da pele e condições socioeconômicas, que são fatores significativos, dado que a maioria dos internos no Brasil são pessoas pretas, pobres, com ensino fundamental incompleto e marginalizados.

O sistema carcerário do RN compartilha da realidade existente nas demais penitenciárias brasileiras, as quais apresentam uma série de fatores alarmantes que carecem de uma rápida ação do Estado para com estas contrariedades.

Os dados atualizados em março de 2017, de acordo as informações prestadas pela Seção de Inteligência e Informação Penitenciária do RN é de que Estado do Rio Grande do Norte possui uma população carcerária de 8.127 presos, sendo 7.635 do sexo masculino e 492 do sexo feminino. Estão distribuídos nos seguintes regimes: fechado com 3.173 detentos, semiaberto com 1.129, aberto com 829, provisório com 2.996, sob medida de segurança há 46 deles, além daqueles custodiados pela Secretaria de Segurança Pública, sob responsabilidade da polícia civil. O número de vagas existentes no sistema prisional corresponde a 4.326, o que representa um déficit de 3.801 vagas, ou seja, o Sistema Penitenciário do RN possui pouco mais da metade de vagas necessárias para comportar sua população. Além disso, rebeliões, fugas, violência internas são eventos corriqueiros que têm piorado a realidade prisional do estado (MELO; ARAÚJO, 2017)

Ao analisar os dados atualizados do Sistema Integrado de Informações Penitenciárias (Infopen), observou-se que, no ano de 2022, no estado potiguar, havia uma população carcerária de 12.067 detentos (um aumento percentual de aproximadamente 49% sobre o total de 2017 como evidenciado na pesquisa feita por Melo e Araújo) para uma capacidade de 8.920 internos, ou seja, uma insuficiência de 3.147 vagas. Destes, 11.306 são homens e 752 são mulheres que estão dispersos pelos regimes fechado, semiaberto e aberto, assim como em situação provisória ou sentenciados. Com relação à cor de pele, foi possível perceber que a população branca aumentou em relação a população preta. Aproximadamente 20% dos detentos homens são brancos, enquanto 13% são pretos. Já em relação a população feminina, 21% são mulheres pretas e 20% brancas.

Outro problema identificado no cenário potiguar é encarceramento de presos sem diferenciar o grau de periculosidade, o que fomenta o recrutamento dos que ainda aguardam decisão judicial para o mundo do crime organizado e, como consequência, obtém-se, o aumento da criminalidade em decorrência da desativação das detenções provisórias que existiam no estado. Nesse contexto, Madruga (2019, p. 30), em seus estudos, constatou que:

Destaca-se que em 2017 a SEJUC, em virtude do processo de reestruturação do sistema, começou a desativar os 20 Centros de Detenção Provisória do estado: Patu (fechado em janeiro de 2018) e, em 2017, os de Currais Novos, Centros de Detenção Provisória/CDP da zona sul, Ribeira, da zona norte de Natal, de Assú, Nova Parnamirim, Santa Cruz, de Macau,6. Os apenados desses CDPs desativados foram transferidos para outros, o que acabou aumentando o problema da superlotação.

Nesse diapasão, é notório como as penitenciárias do RN carecem de uma atenção maior do Estado Brasileiro, pois, ainda conforme Madruga (2019, p. 32), “as penitenciárias locais se transformaram em verdadeiras usinas de revolta humana, sendo, portanto, indispensável a implantação de mecanismos que dificultem a prática criminosa”.

CRIMINALIDADE NO RIO GRANDE DO NORTE

O Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCRIM) e a Conectas Direitos Humanos fizeram uma denúncia na Organização das Nações Unidas (ONU) sobre o descaso vivenciado pelos presos no sistema carcerário do Rio Grande do Norte, a qual exigiam “medidas imediatas por parte das autoridades brasileiras sobre as práticas de tortura e outros tratamentos cruéis, desumanos e degradantes, que violam normas internacionais de direitos humanos” (COELHO, 2023). É válido reiterar como essas problemáticas agravam a criminalidade e os conflitos dentro do sistema prisional potiguar que, consequentemente, acabam sendo berço de organizações criminosas que detêm controle e influências que vão para além dos muros do cárcere.

Nessa perspectiva, Beatriz Moura Barbosa, em 2021, fez uma análise sobre a relação entre a expansão do Sindicato do Crime do Rio Grande do Norte (SDC) e o

cenário criminal no estado, a qual alegou que este grupo teve as inovações tecnológicas ao seu favor, dado que as comunicações entre faccionados de dentro para fora do presídio se consolidaram em meio a ineficiência dos agentes estatais para com o monitoramento destes aparelhos. A onda de ataques contra patrimônio público e civil em território norte-rio-grandense, em 2023, é um exemplo da recorrente violência praticada pela facção supracitada. Este episódio – considerado como reivindicação por parte dos internos – foi consequência das circunstâncias vivenciadas dentro dos presídios, os quais foram mencionados no início deste tópico. (MACHADO, 2023).

Dos 167 municípios do RN, 90% estão dominadas pelo Sindicato do Crime, sendo os demais (quatro cidades que compõem a região metropolitana de Natal, a capital e Mossoró) considerados territórios de conflito com a facção do Primeiro Comando da Capital (PCC) pelo tráfico de drogas no estado, o que contribui com o aumento da criminalidade local e adversidades violentas. Isto posto, em 2018, o RN era o estado com maior taxa de homicídios no Brasil, sendo 2.386 mortes apenas em 2017, correspondendo a 68 assassinatos para cada grupo de 100 mil habitantes (BARBOSA, 2018).

Para amenizar essas situações, é necessário que o Estado invista em uma ressocialização eficaz através de políticas públicas que possibilitem os apenados a se prepararem de volta à sociedade. O trabalho pós-cárcere, por exemplo, é uma alternativa que deve ser considerada. É nesse contexto que Souza, Dantas e Navarro (2020, p. 8) discorrem sobre a importância do trabalho tanto durante o regime fechado, quanto em liberdade.

O trabalho representa uma ferramenta intrínseca à própria existência humana. É válido ressaltar que o trabalho como um dever social e condição de dignidade do homem encontra-se perfilhado na Lei de Execução Penal. Ora, se ao adentrar em estabelecimento penal, ao indivíduo é concedido um ofício como forma de garantir-lhe uma remuneração e o direito ao desconto de um dia de pena para cada três dias trabalhados, por que não ter o direito de exercer uma função também fora da prisão?

A resposta para essa questão pode ser compreendida a partir do momento em que é relembrado a tríplice finalidade da pena: retributiva, preventiva (seja geral ou especial) e reeducativa. Assim, para que ocorra o reingresso ao convívio social que possa ser garantido o direito ao trabalho.

A educação também deve ser analisada como uma das possibilidades de reintegração civil, pois, “a partir da educação, impera-se a socialização como instrumento de conformação social, tornando, assim, um indivíduo social e integrado.” (FERREIRA, 2020, p. 14), ou seja, esta é uma ferramenta essencial na formação moral do indivíduo para que este possa viver conforme a cultura e normas de onde está inserido.

Em contrapartida a esse pensamento, o Rio Grande do Norte, em 2021, através do Censo Escolar de Educação Básica, registrou a maior taxa de reprovação (10,7%) e abandono escolar (14,7%) do Ensino Médio em todo o Nordeste. (TRIBUNA DO NORTE, 2022). A evasão escolar está, também, ligada à criminalidade no Brasil, inclusive no estado potiguar. Nesse sentido, o sociólogo Marcos Rolim, através de uma entrevista à BBC, disse que "muitos meninos que se afastam da escola são, de fato, recrutados pelo tráfico de drogas e são socializados de forma perversa [...]” (GUIMARÃES, 2017). Como retrato disso no sistema penitenciário potiguar, do total de presos em 2022, apenas 841 concluíram o ensino fundamental e apenas 127 possuem o ensino superior completo. Isto posto, tais controvérsias abrem margens para que jovens e adolescentes sem perspectiva de vida sejam inseridos no mundo do crime e compactuem com os enormes índices de violência tanto do estado, como do país.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Diante do exposto, compreende-se que o Rio Grande do Norte sofre muitas consequências devido à precariedade enfrentada no interior dos presídios, o que acaba abrindo portas para desafios maiores, dentro e fora desses locais.

Ao decorrer do artigo, foi esclarecido o verdadeiro motivo do surgimento das prisões, as quais, em primeiro momento, apenas a punição deveria ser praticada, e como consequência, as pessoas deixariam de cometer erros. Porém, a partir da evolução da sociedade, somente o "punir por punir" atacava diretamente os princípios da Dignidade Humana, pois não resolveria o problema e a chance dessas pessoas evoluírem eram muito baixas.

Portanto, é cabível o argumento de que muitos detentos não têm as mesmas oportunidades em privação de liberdade, vários deles não possuem família ou amizade, resultando em um ódio ainda maior do estado escasso que vivem. Por isso, independente dos erros cometidos por esses presos, é preciso e necessário

manter o respeito e a dignidade, dado que, de acordo com as pesquisas, a grande maioria dos detentos não têm escolha ao entrar em facções, pois precisam delas para obter uma vida mais segura e harmônica dentro e fora das cadeias, influenciando ainda mais o crime e a não ressocialização, que é o principal objetivo das prisões brasileiras.

Dessa forma, conclui-se que o Brasil deve trabalhar uma maior atenção ao ensino de base, como a educação nas escolas, programas para que as crianças valorizem seu tempo praticando atividades educacionais e esportivas, para que não desviem para o caminho do crime, e consequentemente, no futuro não precisem viver essas situações de vulnerabilidade, muitas vezes sem saída.

REFERÊNCIAS

BARBOSA, Anderson. Mapa revela cidades já dominadas e em disputa por facções criminosas no RN. G1, 2018. Disponível em:

<https://g1.globo.com/rn/rio-grande-do-norte/noticia/2018/08/21/mapa-revela-cidades

-ja-dominadas-e-em-disputa-por-faccoes-criminosas-no-rn.ghtml>. Acesso em: 01 de junho de 2023.

BARBOSA, Beatriz Moura. Cadeias comandadas: análise da expansão do Sindicato do Crime no RN a partir da omissão estatal nas penitenciárias potiguares. 2021. 68f. Monografia (Graduação em Direito) - Centro de Ciências Sociais Aplicadas, Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2021.

BRANDÃO, Marcelo. Más condições das prisões facilitam crescimento de facções, dizem especialistas. Agência Brasil, 2017. Disponível em: https://agenciabrasil.ebc.com.br/geral/noticia/2017-01/mas-condicoes-das-prisoes-fa cilitam-crescimento-de-faccoes-dizem-especialistas#. Acesso em: 04 jun 2023.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília, DF: Senado Federal, 1988. Disponível em:

<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.html>. Acesso em: 01 de junho de 2023.

BRASIL. Ministério da Justiça e Segurança Pública. 13° Ciclo - Sistema Integrado de Informação Penitenciária (Infopen). Disponível em:

<https://www.gov.br/depen/pt-br/servicos/sisdepen/relatorios-e-manuais/relatorios/R N>. Acesso em: 15 de maio de 2023.

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. ADPF 347/DF. Plenário. Relator: Ministro Marco Aurélio. Publicado em: 09/09/2015. Disponível em: https://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=10300665.

Acesso em: 02 jun 2023.

COELHO, Rodrigo Durão. Entidades denunciam na ONU as péssimas condições dos presídios do Rio Grande do Norte. Brasil de Fato, 2023. Disponível em:

<https://www.brasildefato.com.br/2023/04/20/entidades-denunciam-na-onu-as-pessi mas-condicoes-dos-presidios-do-rio-grande-do-norte>. Acesso em: 02 jun 2023.

COMTE-SPONVILLE, André; DOS MODERNOS, A. Sabedoria. O princípio fundamental da dignidade humana e sua concretização judicial. Revista da EMERJ, v. 6, n. 23, 2003.

DA SILVA, José Afonso. A dignidade da pessoa humana com valor supremo da democracia. Revista de direito administrativo, v. 212, p. 89-94, 1998.

DE ASSIS, Rafael Damaceno; AFONSINAS, Ordenações. As prisões e o direito penitenciário no Brasil. 2007.

DE SOUZA, Luis Antônio Gonçalves; DANTAS, Soraya Braga; NAVARRO, Arthur Martins Marques. O direito ao trabalho como instrumento na concreção da ressocialização dos presos egressos do sistema prisional. Sociedade em Debate, v. 2, n. 01, 2020.

FERREIRA, Marcela Sousa. Educação prisional como ressocialização do indivíduo: limites e possibilidades. 2020.

GUIMARÃES, Thiago. Pesquisa identifica evasão escolar na raiz da violência extrema no Brasil. BBC. 28 de maio de 2017. Disponível em:

<https://www.bbc.com/portuguese/brasil-40006165>. Acesso em: 01 jun 2023.

MACHADO, Leandro. Facções nunca dormem: a guerra silenciosa por trás de ataques no Rio Grande do Norte. BBC News Brasil, 2023. Disponível em:

<https://www.bbc.com/portuguese/articles/cn4rjlllyjvo>. Acesso em: 01 jun 2023.

MACHADO, Nicaela Olímpia; GUIMARÃES, Issac Sabbá. A realidade do sistema prisional brasileiro e o princípio da dignidade da pessoa humana. Revista Eletrônica de Iniciação Científica. Itajaí, Centro de Ciências Sociais e Jurídicas da UNIVALI, v. 5, n. 1, p. 566-581, 2014.

MADRUGA, Seridó et al. 2 - AS PRISÕES NO RIO GRANDE DO NORTE: CENÁRIO ATUAL. CENTRO UNIVERSITÁRIO FACEX-UNIFACEX, p. 30-32.

MELO, J. R. S.; ARAÚJO, R. M. A cogestão no sistema penitenciário do Rio Grande do Norte: limites e contribuições. Ágora: revista de divulgação científica, [S. l.], v. 22, n. 1, p. 87–103, 2017. DOI: 10.24302/agora.v22i1.1479. Disponível em: http://www.periodicos.unc.br/index.php/agora/article/view/1479. Acesso em: 15 de maio de 2023.

MONCAU, Gabriela; CARVALHO, Igor. Tortura, tuberculose e desnutrição no RN: nova perícia em presídios mostra cenário 'alarmante'. Brasil de Fato, 2023. Disponível em:

https://www.brasildefato.com.br/2023/04/16/tortura-tuberculose-e-desnutricao-no-rn- nova-pericia-em-presidios-mostra-cenario-alarmante. Acesso em: 04 jun 2023.

NOBRE JÚNIOR, Edilson Pereira. O direito brasileiro e o princípio da dignidade da pessoa humana. 2011.

RIO DE JANEIRO. PODER JUDICIÁRIO. GRUPO DE MONITORAMENTO E

FISCALIZAÇÃO DO SISTEMA CARCERÁRIO. Histórico. Disponível em:

<http://gmf.tjrj.jus.br/historico>. Acesso em: 01 jun 2023.

SARLET, Wolfgang Ingo. A dignidade da pessoa humana. Revista de Direito Administrativo, v. 212, p. 84-94, 1998.

SILVA, Vítor Rodovalho. A crise no sistema penitenciário brasileiro. 2020.

TRIBUNA DO NORTE. RN tem a 2ª maior taxa de abandono escolar do Ensino Médio no Brasil. Natal, 2022. Disponível em: http://www.tribunadonorte.com.br/noticia/rn-tem-2a-maior-taxa-de-abandono-escolar- do-ensino-ma-dio-no-brasil/539163. Acesso em: 03 jun 2023.

Sobre o autor
Rilawilson José de Azevedo

Dr. Honoris Causa em Ciências Jurídicas pela Federação Brasileira de Ciências e Artes. Mestrando em Direito Público pela UNEATLANTICO. Licenciado e Bacharel em História pela UFRN e Bacharel em Direito pela UFRN. Pós graduando em Direito Administrativo. Policial Militar do Rio Grande do Norte e detentor de 19 curso de aperfeiçoamento em Segurança Pública oferecido pela Secretaria Nacional de Segurança Pública.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!