A alienação judicial se dá por iniciativa particular ou por leilão. Deve-se destacar que leilão é a alienação pública de bens (móveis ou imóveis), sob pregão de leiloeiro, cujo arrematante será aquele que oferecer o maior lance. No processo judicial, trata-se do meio de expropriação do bem do devedor para os fins da satisfação do crédito ao credor.
O presente artigo visa trazer a lume o procedimento de leilão proveniente de processo judicial – art. 879, II, do CPC – quando o objeto da excursão é um bem imóvel. Não se pretende esgotar o tema ou tratar das demais espécies de leilão, o objetivo é chamar atenção para alguns elementos que envolvem a alienação do imóvel a partir dos atos do agente leiloeiro, das especificações do edital, por fim, e não menos importante, da ciência dos interessados.
A ideia, neste contexto, é expor pontos frágeis que por vezes deixam de ser levados em consideração, todavia, podem viciar o procedimento na sua integralidade ao ponto de seu desfazimento em razão de eventual invalidade, ou dar causa à ineficácia do ato ou, ainda, sua resolução, gerando prejuízos substanciais, seja para o executado que terá seu bem expropriado de maneira indevida, seja para quem busca a aquisição do bem para fins de moradia, de investimento seja para o exequente que não terá seu crédito satisfeito.
Do ponto de vista legislativo, a alienação judicial está topologicamente delineada nos art. 879. a 903 do CPC, contudo, a depender do caso concreto, outros dispositivos deverão ser seguidos. Deve-se atentar também aos entendimentos firmados pelos Tribunais no que se refere aos eventuais requisitos que dizem respeito ao tema da alienação judicial.
Dispõe o § 1º do art. 880. do CPC que o juiz fixará: o prazo em que a alienação será efetivada, preço mínimo, condições de pagamento, eventuais garantias e, se for o caso, a corretagem do leiloeiro.
Com relação ao profissional leiloeiro, deve-se atentar que sua atividade é disciplinada pelo Decreto 21.981/1932, bem como, pela Instrução Normativa DREI/ME 52, de 29 de julho de 2022, e ela possui natureza pessoal,1 não podendo ser delegada senão por moléstia ou impedimento ocasional em seu preposto. Acrescente-se que o art. 57. da IN-DREI/ME52 veda o exercício da atividade leiloeira por meio de pessoa jurídica, enfatizando seu caráter pessoal, excetuando apenas as hipóteses previstas em lei.
Após sua nomeação, o leiloeiro poderá ser substituído somente a pedido ou de acordo hipóteses previstas na legislação2. Na alienação judicial, sua atuação se dará por nomeação após a penhora efetiva seguida de avaliação dentro do rito de cumprimento de sentença ou da ação de execução. Sua finalidade é levar a termo a alienação para fins de satisfação do crédito.
É importante salientar que o leiloeiro no exercício de sua atividade que incorrer em condutas proibidas pela legislação (e.g.; aquele que vier a exercer atividade empresária cujo objeto exceda a leiloaria, ou participar da administração e/ou de fiscalização em sociedade de qualquer espécie, em seu nome ou alheio),3 poderá ser sancionado com pena de impedimento ou suspensão, o que o tornará inapto para sua atuação.
A inidoneidade do leiloeiro pode ser reconhecida de ofício ou por provocação da parte interessada. A impugnação deve ser realizada tão logo a parte tome ciência do seu impedimento, em homenagem à boa-fé, que norteia a prática os atos processuais. A inidoneidade do leiloeiro macula o leilão e poderá vir a gerar sua invalidação.
O leilão será precedido de Edital, nos termos dos art. 886. e 887 CPC, sendo indispensáveis as seguintes informações:
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características do imóvel (e.g. trata-se de terreno com edificação ou não, suas divisas etc.);
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remissão à matrícula e seus registros;
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o valor que o imóvel foi avaliado,
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forma de sua realização (virtual ou presencial);
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local, dia e a hora de sua realização;
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identificação dos autos de processo em que o bem tenha sido penhorado;
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ocorrência de ônus, caso haja (e.g. art. 804. CPC);
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existência de recurso ou processo pendente que recaiam sobre o bem a ser alienado.
Na alienação judicial de imóvel é relevante destacar, no edital, a existência ou não de dívidas de origem condominial ou de tributos que recaiam sobre o imóvel já que estas possuem natureza propter rem. Tal informação é relevante para dar clareza para eventuais adquirentes.
O edital será publicado em prazo não inferior a 05 (cinco) dias da realização do feito, sendo a publicação efetivada por meio da rede mundial de computadores (internet) e, nas situações em que haja impossibilidade, seja feita por meio de jornais de grande circulação, tal qual, colocados à disposição em locais de costume reservado para negócios de acordo a localidade, inteligência do art. 887. §1º ao § 5º CPC.
A importância de uma análise mais detida do edital, instrumento responsável por trazer ditames para a alienação judicial merece atenção uma vez que sua inobservância poderá ensejar a invalidação do procedimento. Neste sentido, tratar das características do imóvel, fazer menção à matrícula, valor de avaliação, ocorrência de ônus ou registros de natureza de direito real existentes (art. 804. do CPC), entre outros aspectos a depender do caso concreto, tem por finalidade proporcionar aos interessados informações que retratem a realidade do bem4.
Não é de hoje que nos deparamos com notícias de hastas realizadas a preço vil, descrição incompleta ou errada do imóvel, matrícula desatualizada sem que se tenha conhecimento de eventuais gravames, localização incompleta, defasagem do valor de mercado (seja pela valorização, seja pela desvalorização após a avaliação), existência ou não de débitos condominiais, ou de impostos municipais, ocupação do imóvel seja por terceiro ou pelo executado, ausência de informações do processo que deu causa a venda judicial, falta de intimação dos interessados, bem como, do réu ou de seu cônjuge (excetuando a hipótese em que o regime de casamento for o de separação absoluta) etc5.
As partes envolvidas ao longo da marcha processual, no momento da excursão, são as principais protagonistas do feito e a cada uma cabe a fiscalização dos ditames normativos os aspectos da alienação judicial. Diferente disso, o desrespeito a esta norma poderá implicar tanto invalidação, como ineficácia ou até mesmo a resolução da arrematação de acordo com os termos do art. 903, incisos I, II e II, § 1º e § 2º do CPC.
No tocante à publicidade do leilão, conforme previsto na legislação, é de responsabilidade do leiloeiro providenciar a ciência tempestiva das pessoas indicadas no art. 889. do CPC, sob pena de nulidade dos atos subsequentes.
Seguindo a ordem dispositiva, temos como interessados: o executado, o coproprietário do bem que tenha penhorada sua fração ideal, o titular de usufruto, enfiteuse, direito de moradia ou concessão de direito real de uso, o credor pignoratício, hipotecário, anticrético, fiduciário, ou com penhora anteriormente averbada, promitente comprador, promitente vendedor, União, Estado, Distrito Federal, Município, em situações que o imóvel é tombado etc.
Para o executado, a norma prevê, conforme dispõe o art. 826. do CPC, o direito de remir a execução, pagando ou consignando o valor do débito atualizado mais os consectários devidos mesmo após a alienação dos bens. Por esta razão a necessidade de se intimar o devedor.
Referente aos credores de garantia real, o objetivo da norma é proporcionar a eles as prerrogativas que lhes foram conferidas pelo direito real ou a averbação que antecedeu a penhora.
No tocante aos bens tombados uma vez que recaem sobre estes a natureza administrativa restritiva do poder público (e.g.: destruição, demolição, pintura, reforma etc.), sua alienação não ocorrerá sem a intimação da União, Estado/DF e Município para que lhes sejam resguardado o direito de preferência em igualdade de oferta, conforme dispõe o art. 892, § 3º do CPC.
Das prescrições dispositivas inseridas no art. 889. do CPC, infere-se que o critério normativo foi conferir aos legitimados em testilha a prerrogativa de exercer seus direitos e faculdades no que lhes couberem. Para tanto, fundamental o cumprimento das regras previstas sob pena de viciar o procedimento.
Na prática da alienação judicial, importante dizer que algumas questões são fundamentais de serem observadas. Olhando pela perspectiva de erros ou de omissões que violem os aspectos normativos que envolvem o leilão, sua análise deve ser realizada no caso concreto e ter por objeto verificar hipóteses de vícios independentemente das circunstâncias que os justifiquem, mas que podem causar a frustração da alienação.
O objeto deste estudo teve por finalidade abordar o agente leiloeiro, pontos do edital, bem como os aspectos de publicidade chamando atenção para requisitos que integram a alienação judicial para que ela seja válida e eficaz.
REFERÊNCIAS
MOUZALAS, Rinaldo, NETO, João Otávio Terceiro e MADRUGA Eduardo. Processo Civil - volume único.12. ed. rev. atual. e ampl. Salvador Juspodivm, 2020.
NERY JUNIOR, Nelson Neri, NERY, Rosa Maria de Andrade. Código de Processo Civil Comentado. 20. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2021.
SÁ, Renato Montans de. Manual de direito processual civil. Ed. – São Paulo: SaraivaJur 2022.
Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015.
Decreto Federal 21.981/32, de 19 de outubro de 1932.
Instrução Normativa DREI nº 52/2022
Notas
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Art. 11. do decreto 21.981/1932.
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Conferir a IN – DREI/ME 52
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Art. 75-76 e 90 do DREI/ME nº.52, e do Decreto 21.981/1932 – Capítulo das Penalidades.
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MONTANS, Renato. Manual de direito processual civil. 7. ed. São Paulo: SaraivaJur, 2022, p. 1264-1270.
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Vide art. 886. do CPC.