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A importância da vítima ter um advogado criminalista

Agenda 03/07/2023 às 10:21

O Processo Penal é o ramo do Direito que regulamenta o instrumento utilizado pelo Estado para a imposição de uma sanção penal ao autor de um fato delituoso.

Isso porque para que uma pessoa seja submetida a uma condenação penal, é necessário que haja um procedimento em contraditório judicial em que o autor da ação penal (Ministério Público) apresente as provas, a defesa apresente a sua contraprova e o Juiz julgue. Assim, o processo penal é exatamente o ramo do direito que trata do procedimento para que seja aplicada uma sanção penal.

Portanto, é possível perceber que o processo penal deve tutelar os direitos fundamentais do réu e a os direitos fundamentais da vítima que se encontram em posições antagônicas. O réu conta com o direito à liberdade, o direito à ampla defesa e o devido processo legal.

Não há dúvidas de que há uma preocupação maior dos leigos sobre a necessidade de se contratar um bom advogado criminalista. Ocorre que não se pode negligenciar a importância do advogado criminalista na tutela dos direitos fundamentais da vítima como, por exemplo, o direito à segurança, o direito ao patrimônio e o direito ao devido processo legal.

O presente texto visa demonstrar a importância do advogado criminalista em todas as fases do processo penal na defesa dos interesses da vítima em um processo penal.

1 - Investigação:

A investigação criminal é realizada, em regra, pela Polícia Civil ou Polícia Federal, sendo o inquérito policial o instrumento utilizado. A investigação é conduzida pelo Delegado de Polícia, conforme previsto no artigo 2º da Lei 12.830/2013.

O inquérito policial é um procedimento administrativo que visa colher todos os elementos de informações (provas e indícios), a fim de verificar se houve ou não a prática de algum crime, bem como apontar a autoria do crime.

A importância do advogado criminalista na defesa dos interesses da vítima pode ser destacada na produção de provas, na defesa do patrimônio da vítima e no requerimento direcionado ao delegado ou Ministério Público para a decretação da prisão preventiva do investigado.

O Código de Processo Penal permite que a vítima requeira a produção de provas, conforme previsto no artigo 14 do Código de Processo Penal:

“Art. 14. O ofendido, ou seu representante legal, e o indiciado poderão requerer qualquer diligência, que será realizada, ou não, a juízo da autoridade”.

É legítimo o interesse da vítima no requerimento de provas direcionado ao Delegado de Polícia, uma vez que ela tem interesse na condenação do investigado, sendo certo que com a condenação, será possível a vítima obter a indenização civil pelo crime.

Ademais, não se pode negar que a vítima contém informações importantes para que o inquérito policial possa reproduzir toda a situação fática do crime, uma vez que a vítima sofreu diretamente com a prática do crime.

Como o Delegado de Polícia é o responsável pela investigação, é de sua atribuição decidir se a prova requerida pela vítima deve ou não ser realizada, com exceção do exame de corpo de delito, nos termos do artigo 184 do Código de Processo Penal.

Cumpre destacar que mesmo na hipótese de o Delegado de Polícia indeferir o requerimento de provas, é possível que o advogado criminalista requeira por meio do Promotor de Justiça que essa prova seja realizada.

Isso porque o inquérito policial tem como destinatário o Promotor de Justiça que decidirá posteriormente se é hipótese de oferecer a acusação formal contra o investigação (denúncia), requerer o arquivamento (não há crime) ou requisição de diligências, conforme previsto no artigo 16 c/c artigo 13, inciso II, do Código de Processo Penal.

No que concerne à atuação do advogado criminalista na defesa do patrimônio da vítima, é possível que o advogado criminalista requeira o sequestro de bens.

O sequestro é uma medida assecuratória cautelar de natureza patrimonial que pode ser utilizada pela vítima para resguardar o seu direito à reparação do dano causado pela prática do crime, conforme previsto no artigo 125 do Código de Processo Penal.

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O sequestro impede que o investigado tenha disponibilidade sobre os bens ou valores adquiridos com proventos da infração, sendo móvel ou imóvel. Ademais, cumpre destacar que caso não seja possível localizar os bens adquiridos com os proventos da infração, é possível que recaia sobre bens adquiridos de forma lícita, vide artigo 91, § § 1º e 2º, do Código Penal.

Nesse ponto, cumpre destacar os ensinamentos sobre sequestro feito pelo Promotor de Justiça Militar Renato Brasileiro de Lima:

“No âmbito processual penal, o sequestro é utilizado para recolher os proventos do crime, ou seja, o proveito obtido pelo criminoso como resultado da utilização econômica do produto direto da infração penal (v.g, dinheiro obtido com a venda do objeto furtado, veículos ou imóveis adquiridos com o dinheiro obtido com a venda de drogas etc.), visando impedir que o agente aufira qualquer tipo de com a prática delituosa, mas também indenizar a parte lesada” - Manual de Processo Penal - 4ed. 2016 - página 1124.

Além disso, o advogado criminalista poderá requerer a apreensão de bem móvel quando ele for o produto direto do crime, nos termos do artigo 240 do Código de Processo Penal.

Portanto, percebe-se que na fase investigativa é importante que o advogado criminalista tenha o zelo de se antecipar e requerer o sequestro e/ou a apreensão em desfavor dos bens do investigado, a fim de evitar que ele realize atos que tornem esses bens inacessíveis.

O sequestro deve ser requerido por um advogado perante o Juízo criminal, sendo que o advogado deve comprovar a existência do crime, indícios de autoria do crime, a presença de indícios de que os bens foram adquiridos pelo investigado com os proventos da infração, conforme previsto no artigo 126 do Código de Processo Penal.

No que concerne à apreensão de bem móvel produto direito do crime quando for domiciliar, deve ser comprovada quando fundadas razões que o bem esteja naquele local, nos termos do artigo 240, § 1º, do Código de Processo Penal.

Por fim, na fase investigativa o advogado criminalista tem papel importante na preservação da vida e segurança da vítima. Isso porque caso a vida dela esteja em perigo, poderá ser hipótese de decretação da prisão preventiva, nos termos do artigo 312 e 313 ambos do Código de Processo Penal.

O advogado não tem legitimidade para requerer a prisão na fase investigativa, uma vez que a sua legitimidade surge na fase do processo penal. Porém, isso não impede que ele apresente a vítima ao Promotor de Justiça para que informe a situação e este peça ao Juiz que seja decretada a prisão preventiva.

2 - Violência Doméstica:

A importância do advogado criminalista em favor da mulher vítima de violência doméstica é ainda mais acentuada considerando a gravidade e o índices de feminicídio, bem como de crimes contra a mulher.

A prática criminal em processos de violência doméstica demonstra que a atuação do advogado deve ser rápida e eficiente, a fim de que o agressor seja imediatamente submetido a alguma medida protetiva. Isso porque as agressões devem ser cessadas e há grandes chances das agressões evoluírem para um feminicídio.

A Lei Maria da Penha elenca diversas medidas protetivas que obrigam o agressor e que protegem a vítima, bem como regulamenta o proceder do Juiz, vejamos:

Art. 18. Recebido o expediente com o pedido da ofendida, caberá ao juiz, no prazo de 48 (quarenta e oito) horas:

I - conhecer do expediente e do pedido e decidir sobre as medidas protetivas de urgência;

II - determinar o encaminhamento da ofendida ao órgão de assistência judiciária, quando for o caso;

II - determinar o encaminhamento da ofendida ao órgão de assistência judiciária, quando for o caso, inclusive para o ajuizamento da ação de separação judicial, de divórcio, de anulação de casamento ou de dissolução de união estável perante o juízo competente; (Redação dada pela Lei nº 13.894, de 2019)

III - comunicar ao Ministério Público para que adote as providências cabíveis.

IV - determinar a apreensão imediata de arma de fogo sob a posse do agressor. (Incluído pela Lei nº 13.880, de 2019)

Art. 19. As medidas protetivas de urgência poderão ser concedidas pelo juiz, a requerimento do Ministério Público ou a pedido da ofendida.

§ 1º As medidas protetivas de urgência poderão ser concedidas de imediato, independentemente de audiência das partes e de manifestação do Ministério Público, devendo este ser prontamente comunicado.

§ 2º As medidas protetivas de urgência serão aplicadas isolada ou cumulativamente, e poderão ser substituídas a qualquer tempo por outras de maior eficácia, sempre que os direitos reconhecidos nesta Lei forem ameaçados ou violados.

§ 3º Poderá o juiz, a requerimento do Ministério Público ou a pedido da ofendida, conceder novas medidas protetivas de urgência ou rever aquelas já concedidas, se entender necessário à proteção da ofendida, de seus familiares e de seu patrimônio, ouvido o Ministério Público.

§ 4º As medidas protetivas de urgência serão concedidas em juízo de cognição sumária a partir do depoimento da ofendida perante a autoridade policial ou da apresentação de suas alegações escritas e poderão ser indeferidas no caso de avaliação pela autoridade de inexistência de risco à integridade física, psicológica, sexual, patrimonial ou moral da ofendida ou de seus dependentes. (Incluído pela Lei nº 14.550, de 2023)

§ 5º As medidas protetivas de urgência serão concedidas independentemente da tipificação penal da violência, do ajuizamento de ação penal ou cível, da existência de inquérito policial ou do registro de boletim de ocorrência. (Incluído pela Lei nº 14.550, de 2023)

§ 6º As medidas protetivas de urgência vigorarão enquanto persistir risco à integridade física, psicológica, sexual, patrimonial ou moral da ofendida ou de seus dependentes. (Incluído pela Lei nº 14.550, de 2023)

Art. 20. Em qualquer fase do inquérito policial ou da instrução criminal, caberá a prisão preventiva do agressor, decretada pelo juiz, de ofício, a requerimento do Ministério Público ou mediante representação da autoridade policial.

Parágrafo único. O juiz poderá revogar a prisão preventiva se, no curso do processo, verificar a falta de motivo para que subsista, bem como de novo decretá-la, se sobrevierem razões que a justifiquem.

Art. 21. A ofendida deverá ser notificada dos atos processuais relativos ao agressor, especialmente dos pertinentes ao ingresso e à saída da prisão, sem prejuízo da intimação do advogado constituído ou do defensor público.

Parágrafo único. A ofendida não poderá entregar intimação ou notificação ao agressor

Art. 22. Constatada a prática de violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos desta Lei, o juiz poderá aplicar, de imediato, ao agressor, em conjunto ou separadamente, as seguintes medidas protetivas de urgência, entre outras:

I - suspensão da posse ou restrição do porte de armas, com comunicação ao órgão competente, nos termos da Lei nº 10.826, de 22 de dezembro de 2003 ;

II - afastamento do lar, domicílio ou local de convivência com a ofendida;

III - proibição de determinadas condutas, entre as quais:

a) aproximação da ofendida, de seus familiares e das testemunhas, fixando o limite mínimo de distância entre estes e o agressor;

b) contato com a ofendida, seus familiares e testemunhas por qualquer meio de comunicação;

c) freqüentação de determinados lugares a fim de preservar a integridade física e psicológica da ofendida;

IV - restrição ou suspensão de visitas aos dependentes menores, ouvida a equipe de atendimento multidisciplinar ou serviço similar;

V - prestação de alimentos provisionais ou provisórios.

VI – comparecimento do agressor a programas de recuperação e reeducação; e (Incluído pela Lei nº 13.984, de 2020)

VII – acompanhamento psicossocial do agressor, por meio de atendimento individual e/ou em grupo de apoio. (Incluído pela Lei nº 13.984, de 2020)

Art. 23. Poderá o juiz, quando necessário, sem prejuízo de outras medidas:

I - encaminhar a ofendida e seus dependentes a programa oficial ou comunitário de proteção ou de atendimento;

II - determinar a recondução da ofendida e a de seus dependentes ao respectivo domicílio, após afastamento do agressor;

III - determinar o afastamento da ofendida do lar, sem prejuízo dos direitos relativos a bens, guarda dos filhos e alimentos;

IV - determinar a separação de corpos.

V - determinar a matrícula dos dependentes da ofendida em instituição de educação básica mais próxima do seu domicílio, ou a transferência deles para essa instituição, independentemente da existência de vaga.

Portanto, cabe ao advogado criminalista informar a vítima todas as medidas protetivas que visa lhe proteger, bem como as medidas protetivas que obrigam o agressor, sendo certo que, na hipótese de descumprimento, é possível a decretação da prisão preventiva, nos termos do artigo 313, inciso III, do Código de Processo Penal, bem como o descumprimento, por si só, configura o crime previsto no artigo 24-A da Lei Maria da Penha.

3 - Processo Penal:

Na fase do processo penal, a atuação do advogado ganha ainda mais destaque, uma vez que a legislação penal permite a figura do assistente do Ministério Público, conforme previsto no artigo 268 do Código de Processo Penal, cuja redação é a seguinte: “Em todos os termos da ação pública, poderá intervir, como assistente do Ministério Público, o ofendido ou seu representante legal, ou, na falta, qualquer das pessoas mencionadas no Art. 31”.

O Assistente do Ministério Público é a vítima ou seu representante legal que, por meio de um Advogado, atua no processo penal com o escopo de buscar a condenação do autor do crime com uma pena justa e o seu direito à indenização pelo dano praticado pelo crime.

O Assistente do Ministério Público deverá requerer ao Juiz a sua admissão no processo em qualquer fase, sendo que o Ministério Público deverá ser ouvido.

O artigo 271 do Código de Processo Penal regulamenta o direito de produção de prova pelo Assistente do Ministério Público: “Ao assistente será permitido propor meios de prova, requerer perguntas às testemunhas, aditar o libelo e os articulados, participar do debate oral e arrazoar os recursos interpostos pelo Ministério Público, ou por ele próprio, nos casos dos arts. 584, § 1º, e 598”.

Assim, percebe-se que o Advogado criminalista que atua na defesa da vítima tem papel importante na produção da prova, uma vez que tem legitimidade para requerer, independentemente do Ministério Público.

Ademais, o Advogado conta com a prerrogativa de despachar com o Juiz e com o Promotor de Justiça, momento em que poderá conversar com eles e tentar convencer sobre os seus requerimentos, conforme previsto no artigo 7º, inciso VIII, da Lei 8906/94.

Por fim, cumpre destacar que o Advogado criminalista na defesa dos interesses da vítima tem a legitimidade de recorrer da sentença, independentemente do Ministério Público, conforme previsto no artigo 577 do Código de Processo Penal.

4 - Conclusão:

Diante dos argumentos apresentados, pode-se concluir que o advogado criminalista que atua na defesa dos interesses da vítima exerce importante papel na proteção dos direitos à segurança, à liberdade e ao patrimônio da vítima. Isso porque o advogado criminalista, conforme já destacado, conta com legitimidade processual para requerer medidas probatórias e restritivas em desfavor do agressor e a favor da vítima tanto na fase do inquérito policial quanto na fase judicial, sendo certo que a atuação do advogado criminalista célere e eficaz pode evitar uma eventual morte ou crime grave, bem como que o autor do crime torne os bens inacessíveis, o que impede que a vítima tenha o seu direito à indenização.

Sobre o autor
Lucas Carvalho Cantalice

Nosso escritório Queiroz de Mello e Cantalice - Advocacia criminal, possui uma equipe altamente qualificada de advogados criminalistas, com mais de 35 anos de experiência no setor. Somos especialistas em Direito Criminal, Direito Processual Penal e Direito Penal Econômico. www.queirozecantalice.com.br

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