Para além da vida, o bem maior do indivíduo é sua liberdade, e é nesse sentido que surge o Direito Penal, digo, nasce como protetor da liberdade do indivíduo. De início pode parecer contraditório, já que tem suas disposições voltadas para criar crimes e estabelecer penas, entretanto tal impressão não merece prosperar. Explico.
O Estado, tido como o poder público, expresso na organização desse mesmo Estado com a estruturação do Executivo, Legislativo e Judiciário tem uma força muito maior que a pessoa em sua individualidade pode apresentar. Ora, é de conhecimento geral que o poder público possui todo um aparato para se sobrepor à própria sociedade, utilizando-se das forças policiais, sejam elas civis, militares ou mesmo do exército, bem como do sistema penitenciário.
Assim sendo, a única barreira entre a força do Estado e a pessoa humana é a lei. É bem verdade que o Direito penal e a Legislação Penal Extravagante criam sim crimes e estabelecem penas. De outro modo não poderia ser, a aceitação do que é certo ou errado está presente no consciente de toda pessoa, ocorrendo variações de acordo com questões culturais, sociais e de educação, entretanto a aplicação do que seria crime não pode ficar sem parâmetros objetivos, pois quem detivesse o poder teria margem para aplicar sua própria vontade de modo a cometer graves injustiças e subjugar inocentes.
Desse modo, o Direito Penal surge como garantia de que ninguém, esteja ele no centro do poder ou não, crie crimes conforme sua vontade e aplique-os sem qualquer critério pré-definido. Como bem estabelece a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 em seu artigo 5°, inciso XXXIX, ao dizer que “não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal”, disposição também presente no Código Penal em seu artigo 1°.
Porém a criação de crimes não encontra limitação apenas na Constituição Federal, mas também em normas tidas para além do que está escrito, isto é, é limitado por princípios do próprio Direito Penal. São eles o Princípio da Intervenção Mínima, que se subdivide em Princípio da Fragmentariedade e em Princípio da Subsidiariedade, e o Princípio da Proporcionalidade.
O Princípio da Intervenção Mínima estabelece que somente poderá ser criado um crime quando existir a real necessidade de proteger um bem jurídico que não pode ser resguardado por outro ramo do direito, como por exemplo, o Direito Civil, sendo necessário a aplicação de uma pena mais grave a quem lesione esse bem. O subprincípio da Fragmentariedade diz que apenas fragmentos, ou partes, dos bens jurídicos podem ser protegidos pelo Direito Penal, não podendo ser objeto de sua proteção todo e qualquer direito, pois apresenta forte reação ao lesionador. Já o subprincípio da Subsidiariedade explica que a lei penal somente pode ser usada quando mais nenhum outro ramo conseguir proteger o bem jurídico, devendo ser usada em último caso.
Por último, o Princípio da Proporcionalidade diz que a criação de um crime deve ocorrer apenas quando for a atitude mais vantajosa para o meio social, posto que ao ser criado um crime também será imposta uma pena, de modo a onerar toda a sociedade.
Ou seja, o Direito Penal não cuida apenas de criar crimes e estabelecer penas, que são sim necessárias para um bom convívio social, mas tem por principal objetivo proteger toda a sociedade da vontade arbitrária do Estado, que se apresenta tão forte. Proteção esta que decorre ao ficar estabelecido que somente a lei pode criar um crime e estabelecer uma pena, além de o legislador e o aplicador da lei estarem amarrados pelos princípios já mencionados.