ENQUANTO NÃO TEMOS um "Código Nacional de Normas Extrajudiciais" como intenciona o CNJ ( https://www.cnj.jus.br/corregedoria-nacional-abre-consulta-publica-sobre-consolidacao-de-normas-para-cartorios/) se mostra necessário recordar - principalmente para os que almejam iniciar a atuação no âmbito EXTRAJUDICIAL que as regras que devem ser observadas nesse cenário que foge ao Judiciário não estão apenas na Lei de Registros Publicos (Lei 6.015/73). Quem nos dera assim fosse. Assim como acontece com outros ramos do direito, as modificações na seara extrajudicial não perdoam e são egressas de diversas fontes: CNJ, Leis Federais e Normas locais principalmente, além de inclusive atos normativos da Receita Federal por exemplo... não podemos nos esquecer inclusive que precedentes judiciais também podem e deve ser trazidos para a Seara Extrajudicial pelos doutos ADVOGADOS já que aqui a provocação feita por estes profissionais pode e deve originar mudanças em atos normativos e com isso os efeitos benéficos com certeza não se limitarão aos casos concretos originários.
Sem prejuízo da recente Lei Federal 14.382/2022 (que instituiu o "Sistema Eletrônico dos Registros Públicos (SERP)" e introduziu diversas alterações legislativas) é necessário destacar que especificamente no Rio de Janeiro a CGJ/RJ publicou em 19/12/2022 no DJE o Provimento CGJ/RJ877/2022, nominado "Código de Normas da Corregedoria Geral da Justiça do Estado do Rio de Janeiro - Parte Extrajudicial". Todo Estado da Federação tem (ou pelo menos deveria ter) seu Código com Normas voltado para o âmbito Extrajudicial. Importa mencionar que o referido NCN aqui do Rio já conta com diversas atualizações desde sua publicação estando no momento da edição deste ensaio já atualizado com base nos Provimentos CGJ/RJ 26 e 27/2023 (publicados em 09/05/2023). O link para sua leitura integral é o http://cgj.tjrj.jus.br/consultas/legislacao/codigo-de-normas-da-corregedoria-geral-da-justica-do-estado-do-rio-de-janeiro-parte-extrajudicial.
POIS BEM, desde a LEI 11.441/2007 que em âmbito federal trouxe a possibilidade da realização do Inventário Extrajudicial muita coisa mudou. A regulamentação pela RESOLUÇÃO 35/2007 do CNJ em muito ajudou na prática dos Inventários Extrajudiciais, mas ela não parou no tempo e também vem sendo modificada com base nos avanços que o pensamento jurídico também projeta sobre as atividades extrajudiciais. Podemos destacar com base nas diversas modificações experimentadas na prática desses atos desde o ano de 2007, os seguintes pontos:
1. É LIVRE A ESCOLHA DO TABELIÃO PARA A REALIZAÇÃO DO INVENTÁRIO EXTRAJUDICIAL, PODENDO SER INCLUSIVE O ATO LAVRADO INTEIRAMENTE PELA VIA ELETRÔNICA (ON-LINE);
Essa regra tem base na Lei de Notários e Registradores (art. 8º) de tal modo que mesmo que nada tenha se passado aqui no Rio de Janeiro, por exemplo, ainda assim as partes poderão lavrar aqui o Ato Notarial de Inventário Extrajudicial. Importante anotar que caso a opção seja a lavratura remota (eletronicamente) com base no Provimento CNJ 100/2020 então aí sim as regras de territorialidade deverão ser observadas (art. 6º c/c art. 19, 20 e 21 do referido Provimento). A avaliação prudente do Advogado nessas hipóteses é imprescindível já que, como já se percebeu, regras de Códigos de Normas são locais e poderão variar conforme o Estado onde ocorrer a lavratura. Sem prejuízo, continua válida a representação por procuração de modo a permitir a lavratura presencial de um inventário em outro Estado, utilizando o Mandato.
2. O INVENTÁRIO EXTRAJUDICIAL PODE SER FEITO MESM; QUE O (A) FALECIDO (A) TENHA DEIXADO TESTAMENTO VÁLIDO;
A regra já tem alguns anos aqui no Rio de Janeiro em que pese não constar [ainda] da Resolução 35/2007 do CNJ. Não se trata de exclusividade do Rio; alguns outros Estados (como São Paulo) permitem e a tramitação assim dependerá de autorização judicial (além de outras hipóteses). No Rio de Janeiro veja o art. 446 do NCN/2023;
3. INVENTÁRIOS ANTIGOS TRAMITANDO NA VIA JUDICIAL PODEM SER RESOLVIDOS NA VIA EXTRAJUDICIAL COM MAIS FACILIDADE E RAPIDEZ;
O artigo 2º da Resolução 35/2007 é claro sobre a "facultatividade" que é traço marcante de todos os procedimentos extrajudicializados (Inventário, Divórcio, Usucapião, Adjudicação Compulsória etc) - ou seja, não nos parece possível que seja criada alguma solução "extrajudicializada" que obrigue a via extrajudicial em detrimento da via judicial. A facultatividade deve mesmo ser a base das ferramentas judiciais que forem "extrajudicializadas". Dessa forma, temos que a via extrajudicial é só mais uma forma de resolver o Inventário e mesmo os já iniciados - desde que preencham os requisitos - podem ser convertidos para o meio extrajudicial. Como sempre recomendo, a avaliação do Advogado Especialista é importantíssima já que não são poucos os casos em que - pasmem - pode não ser vantajoso resolver na via extrajudicial ainda que os requisitos estejam preenchidos;
4. É PERMITIDO O INVENTÁRIO EXTRAJUDICIAL MESMO HAVENDO "UNIÃO ESTÁVEL" NO CASO CONCRETO;
Sim e a Resolução 35/2007 do CNJ permite expressamente mesmo quando haja no caso uma "União Estável" a ser resolvida. Veja os artigos 18 e 19 e principalmente acompanhe a evolução da jurisprudência nesse sentido;
5. PODE SER FEITO COM ISENÇÃO DE CUSTAS E EMOLUMENTOS E INCLUSIVE ASSITIDO POR DEFENSOR PÚBLICO;
É perfeitamente possível fazer o Inventário Extrajudicial com isenção de custas e emolumentos. É sempre recomendável analisar o contexto dessa concessão no seu Estado. No Rio de Janeiro as regras estão no ATO NORMATIVO CONJUNTO TJ/CGJ 27/2013 e também em alguns dispositivos do NCN/2023. Importante destacar que as normas do NCN que conflitarem com o Ato Normativo de 2013 não devem ser reputadas válidas já que a razão de ser da edição daquele ato de 2013 foi justamente o cumprimento de determinações expressas do CNJ que anularam o Ato Normativo sobre Gratuidades que anteriormente vigorava no Rio de Janeiro. Importa ressaltar que pode haver assistência por Defensor Público mas que mesmo assistido por Advogado Particular pode ainda assim o Inventário Extrajudicial (pelo menos aqui no Rio de Janeiro) ser lavrado com isenção de custas e emolumentos;
6. O IMPOSTO DEVE SER LANÇADO EM ATÉ 90 DIAS DO FALECIMENTO PARA NÃO INCIDIR MULTA;
As regras são da atual Lei Estadual 7.174/2015 e o lançamento do Imposto é feito inteiramente pela via remota (on-line) pelo Sistema ITD HEP da SEFAZ/RJ;
7. PODE SER POSSÍVEL RECONHECER A REMISSÃO E NÃO PAGAR ITCMD NO INVENTÁRIO;
Sim e também são regras da atual Lei Estadual 7.174/2015. Toda questão de remissão, isenção ou mesmo impugnação ao valor pode ser resolvida inteiramente pela via remota (on-line) pelo Sistema ITD HEP da SEFAZ/RJ, o que sem dúvidas representa muita vantagem e praticidade aos interessados;
8. O IMPOSTO PODE SER PARCELADO EM ATÉ 48 (QUARENTA E OITO) VEZES;
O imposto causa mortis (ITD ou ITCMD, como queira) pode ser parcelado em até 48 vezes conforme regras estabelecidas pela SEFAZ/RJ e por Lei Estadual. Há ainda previsão de parcelamento em até 60 (sessenta vezes) mas apenas mediante Decreto (que salvo engano ainda não foi editado). Muito importante é considerar que sobre o parcelamento incidirá correção e que enquanto não quitado o imposto a lavratura e o registro não poderão ser feitos. Avalie sempre sobre a viabilidade ou não do parcelamento e da quantidade de parcelas;
9. PODE SER FEITO MESMO SE HOUVER HERDEIROS INCAPAZES;
A regra do Rio de Janeiro já existia em outros Códigos Estaduais. As regras vieram originalmente no NCN/2023 mas já em Fevereiro de 2023 foram modificadas. Confira no Rio de Janeiro nos artigos 447 e seguintes do NCN/2023;
10. PODE SER FEITO INVENTÁRIO EXTRAJUDICIAL SOBRE BENS IRREGULARES PERANTE ÓRGÃOS PÚBLICOS ASSIM COMO "DIREITOS POSSESSÓRIOS" SOBRE IMÓVEIS;
Sim, a regra muito elogiável consta do artigo 445 do NCN/2023. Antes da expressa previsão, se fosse o caso, os interessados teriam inclusive que se socorrer de decisão judicial da Vara de Registros Públicos com confirmação do Conselho da Magistratura para obter a lavratura - o que poderia sacrificar uma grande vantagem da via extrajudicial: o tempo para seu desfecho;
11. AS CERTIDÕES PODEM SER OBTIDAS ELETRONICAMENTE, SEM A NECESSIDADE DE COMPARECIMENTO PRESENCIAL AO CARTÓRIO;
Sim, os sistemas eletrônicos são uma grande vantagem nos dias atuais no âmbito extrajudicial. As certidões podem ser obtidas por diversos sites (como do próprio TJRJ, assim como e-cartórios, registradores.onr e registrocivil.org). Importante ressaltar - como vamos explorar mais a fundo em post atualizado - que o rol de certidões para o INVENTÁRIO EXTRAJUDICIAL agora está reduzido e isso representa mais facilidade em resolver os casos por essa via; ainda assim nossa recomendação é sempre pela prudência e por não abrir mão da segurança que só as certidões podem atestar e conferir ao ato;
12. O REGISTRO DO INVENTÁRIO PODE SER FEITO ELETRONICAMENTE, SEM A NECESSIDADE DE COMPARECIMENTO PRESENCIAL AO CARTÓRIO;
Não só as Escrituras de Inventário e Partilha mas qualquer outro ato notarial que necessite de registro pode ser feito também pelas plataformas idealizadas pelas Centrais Eletrônicas. Exemplo disso muito utilizada por nós, inclusive, é a Central do SAEC - Serviço de Atendimento Eletrônico Compartilhado a cargo do "Operador Nacional do Sistema de Registro Eletrônico de Imóveis" (ONR) que é uma pessoa jurídica de direito privado, sem fins lucrativos (serviço social autônomo), instituída pela Medida Provisória nº 759, de 22/12/2016 (art. 54), convertida na Lei nº 13.465, de 11/7/2017 (art. 76) com sede no SRTVS, quadra 701, lote 5, bloco A, sala 221, Centro Empresarial Brasília, CEP 70.340-907, Brasília, DF - que possui seu funcionamento sob acompanhamento, regulação normativa e fiscalização da Corregedoria Nacional de Justiça do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), na função de Agente Regulador ( § 4º do art. 76 da Lei 13.465/2017);
13. A CESSÃO DE DIREITOS HEREDITÁRIOS PODE SER FEITA NOS MESMOS MOLDES E UTILIZADA NO INVENTÁRIO EXTRAJUDICIAL;
Sim e - por incrível que pareça - ainda hoje recebemos reclamações de alguns colegas que se deparam com funcionários de Cartórios informando que a realização de "Cessão de Direitos Hereditários" está proibida pela Corregedoria. Sinceramente, um tremendo desserviço. As regras que já constavam expressamente no Código Civil (arts. 1.793 e seguintes) agora são acrescidas das regras dos arts. 379 e seguintes do NCN/2023;
14. A VENDA ANTECIPADA DE BENS DO ESPÓLIO É ADMITIDA E INDEPENDENTEMENTE DE AUTORIZAÇÃO JUDICIAL;
A CGJ/RJ inovou ao permitir a "venda antecipada de bens do espólio" sem a necessidade de autorização judicial. As regras que já estavam no Código Extrajudicial anterior retornaram nos artigos 453 e seguintes do NCN/2023 e é muito importante que o (a) Advogado (a) atuante em Inventários Extrajudiciais conheça esse procedimento e principalmente o que fazer caso injustamente o Tabelionato se negue a lavrar o ato pretendido;
15. O INVENTARIANTE PODE LEVANTAR INFORMAÇÕES NECESSÁRIAS PARA A REALIZAÇÃO DO INVENTÁRIO E INCLUSIVE ASSINAR ESCRITURAS DEFINITIVAS DECORRENTES DE OBRIGAÇÕES PENDENTES DEIXADAS PELO (A) FALECIDO (A);
Sim, as regras estão perfeitamente alinhadas no artigo 11 da Resolução 35/2007 do CNJ (que foram inclusive aperfeiçoadas pelas Resoluções 326/2020 e 452/2022) e também constam expressamente do NCN/2023 no artigo 457.
Vê-se, portanto, que a atuação do Advogado no Extrajudicial deve ser pautada no conhecimento de todas as normas aplicáveis e nesta seara - assim como em qualquer outra - o profissional não é mero figurante; deve ter participação ativa no Direito que fora da Justiça é realizado - ou seja, o Direito que se constrói extrajudicialmente com importante participação do Advogado!