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Imunidade recíproca para sociedades de economia mista, com destaque para a CDHU

O presente artigo tem como objetivo trazer, em linhas gerais, uma análise sobre a imunidade tributária recíproca em relação às sociedades de economia mista, com destaque para a CDHU - Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano do Estado de São Paulo

Introdução

A imunidade recíproca é uma regra constitucional que visa proteger determinadas entidades e instituições da cobrança de impostos. No contexto das sociedades de economia mista, que são entidades híbridas com participação tanto do poder público quanto do setor privado, a aplicação da imunidade recíproca tem gerado debates e questionamentos. Neste artigo, discutiremos os reflexos e as limitações da imunidade recíproca no contexto das sociedades de economia mista.

Imunidade Recíproca: Conceito e Fundamentos

A imunidade recíproca é uma garantia constitucional prevista no artigo 150, inciso VI, alínea "a", da Constituição Federal de 1988. Ela estabelece que a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios não podem cobrar impostos uns dos outros, desde que estejam envolvidos em suas atividades essenciais e que haja reciprocidade no tratamento, vejamos:

“Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:

VI - instituir impostos sobre:

a) patrimônio, renda ou serviços, uns dos outros; (...)”

Os fundamentos da imunidade recíproca residem no princípio federativo e na autonomia dos entes federativos. Ela busca preservar a harmonia e a cooperação entre a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, evitando que a participação se torne um obstáculo ao exercício de suas competências constitucionais.

Da Imunidade Recíproca para Sociedades de Economia Mista: Reflexos e Limitações

As sociedades de economia mista são entidades que possuem características tanto do setor público quanto do setor privado. Geralmente, elas são criadas para realizar atividades de interesse público, como a prestação de serviços públicos ou a exploração de atividades explicativas. No entanto, a presença de capital privado em sua composição suscita questionamentos sobre a aplicação da imunidade recíproca.

A jurisprudência tem entendido que a imunidade recíproca não se estende às sociedades de economia mista quando estas são criadas atividades de cunho oculto. Isso significa que, se uma sociedade de economia conjunta desenvolve uma atividade com propósito lucrativo e concorrer no mercado com outras empresas privadas, ela pode ser passível de controle sobre essa atividade específica.

Por outro lado, quando uma sociedade de economia exerce atividades relacionadas ao cumprimento de sua finalidade pública, como a prestação de serviços públicos ou a promoção do desenvolvimento econômico e social, ela pode se beneficiar da imunidade recíproca. Nesses casos, a sociedade de economia mista está desempenhando uma função essencial ao Estado e à coletividade, não devendo ser tributada pelos demais entes federativos.

No entanto, é importante ressaltar que a jurisprudência tem sido variada em relação à aplicação da imunidade recíproca para sociedades de economia mista, e cada caso deve ser analisado individualmente. A doutrina também tem divergências quanto ao tema, o que demonstra a complexidade e a necessidade de uma análise aprofundada em cada situação específica.

Da Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano do Estado de São Paulo – CDHU

A CDHU afirma que desempenha importante trabalho de nítida relevância social, com diversos programas, a merecer destaque o auxílio-moradia, consistente em subsídio temporário às famílias cujas residências foram afetadas por chuvas e intervenções urbanas e/ou ambientais e programas de parceira com Municípios, destinados à famílias com renda entre 1 e 10 salários mínimos, com reserva de unidades a grupos específicos, tais como idosos, portadores de deficiências graves, agentes de segurança; além de obras de reurbanização e recuperação ambiental em áreas degradadas dentre outros. Portanto, o serviço prestado a, sobretudo por força de seu objeto social, se reveste de caráter público, porque tem a finalidade maior de garantir o direito fundamental à moradia – dever de o Estado efetivá-lo, nos termos do artigo 6°. da Constituição Federal

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Muito embora o seu capital social seja majoritariamente público, não se pode deixar de considerar que se trata, em verdade, de SOCIEDADE DE ECONOMIA MISTA, estando sujeita ao regime jurídico de direito privado, não fazendo jus a qualquer benefício fiscal, à luz do artigo 173, § 2.º, da CF/88, a seguir:

art.173 Ressalvados os casos previstos nesta Constituição, a exploração direta de atividade econômica pelo Estado só será permitida quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo, conforme definidos em lei.

(...)§ 2.º - As empresas públicas e as sociedades de economia mista não poderão gozar de privilégios não extensivos às do setor privado.

Além disso, a C.D.H.U. (Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano do Estado de São Paulo), que se dedica à construção de habitações populares, não presta serviço público em caráter exclusivo, de modo que diversas empreiteiras e agentes financeiros com atuação no segmento da construção civil, explorando o ramo de programas de acesso à moradia de interesse social.

Em consonância a tais argumentos está este Egrégio Tribunal de Justiça que, julgou nesta mesma seara, envolvendo a Excipiente inclusive, para afastara imunidade recíproca defendida por ela, conforme recentíssimos acórdãos. Vejamos:

EXECUÇÃO FISCAL. IPTU. IMUNIDADE RECÍPROCA AFASTADA. BENEFÍCIO CONSTITUCIONAL INAPLICÁVEL A EMPRESAS ESTATAIS QUE NÃO EXPLOREM ATIVIDADE ECONÔMICA EXCLUSIVA DO ESTADO. CABIMENTO, PORÉM, DA ISENÇÃO PREVISTA NA LEGISLAÇÃO LOCAL. APELO DO MUNICÍPIO IMPROVIDO. Empresa estatal que não explora atividade econômica exclusiva do Estado, a Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano do Estado de São Paulo não faz jus a imunidade tributária. Tem direito, no entanto, à isenção prevista em lei municipal (Francisco Morato).(TJSP; Apelação Cível 1501949-78.2020.8.26.0197; Relator (a): Botto Muscari; Órgão Julgador: 18ª Câmara de Direito Público; Foro de Francisco Morato - SEF - Setor de Execuções Fiscais; Data do Julgamento: 20/06/2022; Data de Registro: 20/06/2022)

Agravo de instrumento – Execução fiscal – Município de São Vicente – IPTU e Taxas de Coleta de Lixo e de Sinistros de 2014, 2015 e 2016 – Exceção de pré-executividade oposta pela CDHU sustentando a sua ilegitimidade passiva pela alienação do bem, a imunidade recíproca, bem como a inconstitucionalidade das Taxas – Decisão que extinguiu a execução (artigo 485, VI, do CPC) fundada na imunidade recíproca e na isenção tributária municipal, reconhecendo a ilegitimidade passiva da CDHU e determinando o prosseguimento contra o coexecutado adquirente – Decisão de primeiro grau que merece ser anulada - Descabimento da imunidade para a CDHU, sociedade de economia mista sujeita ao regime de direito privado – Aplicação do artigo 173, §2º, da CF – Descabimento da ilegitimidade passiva com o direcionamento da execução fiscal apenas contra o mutuário adquirente e coexecutado – Propriedade que só se transfere com o registro no Cartório de Registro de Imóveis (artigo 1245 do CC) – Responsabilidade tributária solidária entre proprietário e possuidor adquirente – CDA que indica imóvel tendo por contribuinte CDHU e corresponsável cessionário adquirente – CDA que não pode mais ser alterada (Súmula 392 do STJ) – Inconstitucionalidade das Taxas não examinada em primeiro grau – Possibilidade do exame em sede de agravo de instrumento por analogia ao disposto no artigo 1.013, §1º do CPC – Inconstitucionalidade reconhecida somente para Taxa de Sinistros – Violação dos artigos 77 do CTN e artigo 145, II, da CF – Tese firmada em repercussão geral pelo STF - TEMA 16 - Decisão anulada - Recurso provido em parte. (TJSP; Agravo de Instrumento 2043300-12.2022.8.26.0000; Relator (a): Fernando Figueiredo Bartoletti; Órgão Julgador: 18ª Câmara de Direito Público; Foro de São Vicente - Vara da Fazenda Pública; Data do Julgamento: 28/06/2022; Data de Registro: 28/06/2022)

Apelação - Execução Fiscal – Município de Francisco Morato – IPTU de 2016 a 2019 – Exceção de pré-executividade - Sentença que reconhece aplicável à CDHU a imunidade tributária recíproca prevista no art. 150, VI "a" e §2º da CF, bem como a isenção tributária prevista em leis municipais - Extinção da execução fiscal no mérito (artigo 487, I do CPC) – Descabimento da imunidade para a CDHU, sociedade de economia mista sujeita ao regime de direito privado - Aplicação do artigo 173, §2º, da CF - Entretanto, o apelo não pode ser provido - CDA que indica imóvel tendo por contribuinte apenas a própria CDHU – Ausência de prova da alienação do imóvel indicado na CDA para mutuário – CDA que não pode mais ser alterada (Súmula 392 do STJ) - Aplicação obrigatória da exceção à cobrança do tributo nos termos das Leis Municipais 1.215/1990 (artigo 1º, III), 1.217/90 (artigo 7º) e 1.252/91 (artigo 6º) – Sentença mantida – Majoração de honorários (artigo 85, §3º e §11, do CPC). Recurso improvido. (TJSP; Apelação Cível 1501950-63.2020.8.26.0197; Relator (a): Fernando Figueiredo Bartoletti; Órgão Julgador: 18ª Câmara de Direito Público; Foro de Francisco Morato - SEF - Setor de Execuções Fiscais; Data do Julgamento: 28/06/2022; Data de Registro: 28/06/2022)

Apelação - Execução Fiscal – Município de Guarulhos – IPTU de 2018 – Exceção de pré-executividade - Sentença que reconhece aplicável à CDHU a imunidade tributária recíproca prevista no art. 150, VI "a" e §2º da CF - Extinção da execução fiscal – Descabimento da imunidade para a CDHU, sociedade de economia mista sujeita ao regime de direito privado - Aplicação do artigo 173, §2º, da CF - Sentença anulada – Prosseguimento da execução, com inversão dos honorários e majoração - Recurso Provido. (TJSP; Apelação Cível 1520892-96.2019.8.26.0224; Relator (a): Fernando Figueiredo Bartoletti; Órgão Julgador: 18ª Câmara de Direito Público; Foro de Guarulhos - SETOR DE EXECUÇÕES FISCAIS DA COMARCA DE GUARULHOS; Data do Julgamento: 22/06/2022; Data de Registro: 22/06/2022)

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Cite-se, em acréscimo, que o Colendo Supremo Tribunal Federal já decidiu especificamente acerca de tal matéria:

“AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. DIREITO TRIBUTÁRIO. IMUNIDADE TRIBUTÁRIA RECÍPROCA. SOCIEDADE DE ECONOMIA MISTA QUE NÃODESEMPENHA SERVIÇO PÚBLICO EM REGIME DE EXCLUSIVIDADE. IMPOSSIBILIDADE. PRECEDENTES.1. Nos termos da jurisprudência do STF, para que seja assegurada a garantia prevista no art. 150, VI, a, da Constituição Federal, não se exige somente que a empresa estatal preste serviço público essencial, mas também que o serviço seja prestado em regime de exclusividade. 2. In casu, a CDHU (Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano do Estado de São Paulo), por ser sociedade de economia mista dedicada à construção de habitações populares, não presta serviço público em caráter exclusivo, tendo em vista que programas de acesso à moradia de interesse social são abertos a diversas empreiteiras e agentes financeiros que atuam no segmento da construção civil. 3. Agravo regimental a que se nega provimento.” (STF, Segunda Turma, ARE 1236338 SP– 1556715-19.2017.8.26.0090 – Ministro Edson Fachin, v.u., j. 22/06/2020) (grifo nosso)

Do Tema 1122 STF

O Tema 1122 trata da Imunidade tributária recíproca em favor de sociedade de economia mista prestadora de serviço público relativo à construção de moradias para famílias de baixa renda.

O Supremo Tribunal Federal (STF), reconheceu repercussão geral no Tema 1122, e assim, definirá em Plenário, sobre o alcance da imunidade a impostos, em especial o IPTU, a sociedades de economia mista prestadora de serviço público. O julgamento considerará a atuação deficitária, sem operar necessariamente com lucratividade, e quando desempenha função eminentemente estatal.

A imunidade recíproca é tema que tem sido debatido pelo STF em mais de uma oportunidade. Os julgados passaram por inúmeras discussões, especialmente pelas limitações impostas à aplicação da imunidade recíproca e interpretações sobre o que delimitaria e diferenciaria uma atividade essencialmente pública de uma atividade privada.

Nesse diapasão, a questão até então apresentada é se bastaria a existência de lucro para afastar a imunidade recíproca ou se, diante do contexto fático particular de cada caso, deveria ser respeitada a preponderância da exploração de serviço público mediante o uso de bens públicos, ainda que existente a lucratividade limitada pelo próprio interesse público.

Atualmente o feito encontra-se sobrestado no STF.

Conclusão

A imunidade recíproca é um princípio importante no ordenamento jurídico brasileiro, visando proteger entidades e instituições da cobrança de impostos. No caso das sociedades de economia mista, a aplicação desse princípio tem gerado debates e questionamentos devido à natureza híbrida dessas entidades.

A jurisprudência tem entendido que a imunidade recíproca para a sociedade de economia mista não se estende às atividades exploração econômica, mas pode ser aplicada quando elas desempenham atividades relacionadas à finalidade pública. No entanto, a análise de cada caso específico é necessária para definir a extensão da imunidade recíproca para essas entidades.

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