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Prerrogativas do advogado e a praxe forense

Agenda 25/08/2023 às 10:35

A advocacia perde força e está cada vez mais prejudicada em nosso país, onde o advogado, indispensável à administração da justiça, não ostenta mais o respeito e estima de outros tempos.

Vale ressaltar, em decorrência da pandemia vivida, com pico entre os anos de 2020 e 2021, houve um brutal distanciamento entre a magistratura e a advocacia, que convenhamos já não andavam muito unidas.

Desse modo, o atendimento aos advogados, os despachos, as audiências e as sessões de julgamento passaram a ser totalmente remotas.

Com o avanço global no combate à epidemia, as atividades presenciais nos fóruns e tribunais foram retornando ao normal, havendo ordens das Cortes e do Conselho Nacional de Justiça (1), para que os magistrados permanecessem em suas comarcas, além de trabalharem presencialmente ao menos três vezes por semana na sede dos fóruns e tribunais.

Apesar disso, restou reconhecida a autonomia, constitucionalmente garantida aos tribunais pátrios para que regulamentassem a questão.

Pois bem. Em que pese as diretrizes lançadas, o fato é que existe um distanciamento jamais visto entre a advocacia e a magistratura.

Magistrados se negam a retornar a suas comarcas, ameaçam boicotes, realizam audiências de instrução e julgamento, seja em âmbito cível seja no criminal, à distância, remotamente, desvirtuando o seu real objetivo, qual seja o contato próximo com as partes, a garantia de que as testemunhas permanecerão sem contato umas com as outras, dentre outros fatores que restam tolhidos pela troca do ambiente presencial pelo virtual.

Importante relembrar que não existe hierarquia nem subordinação entre advogados, magistrados e membros do Ministério Público, devendo todos tratar-se com consideração e respeito recíprocos. (2) Temerário seria se houvesse alguma hierarquia ou subordinação entre os aludidos sujeitos.

Há de se reconhecer, apesar de alguns defenderem uma maior produtividade, que a advocacia e, principalmente o jurisdicionado, muito tem a perder com a praxe adotada após o pico da pandemia de Covid-19.

Outros fatores que merecem destaque, são os despachos e audiências por vídeo, além de, até mesmo, magistrados viabilizarem apenas aquele ato via ligação telefônica.

Não se está aqui a criticar a magistratura ou o sistema operacional de cada gabinete, pelo contrário. O único objetivo é demonstrar que a prestação jurisdicional é fortemente prejudicada com esse distanciamento.

A função que exerce o advogado requer um contato com o magistrado, contato esse que não se faz equivalente por meios de transmissão em tempo real.

Ora, sempre foi árdua tarefa captar a atenção dos julgadores em sessão de julgamento perante os tribunais, mesmo que nas sessões presenciais.

A situação muito piora quando apenas ofertada a possibilidade de sustentação oral em tempo real por vídeo, ou pasmem, sustentações orais gravadas por vídeo para que sejam assistidas pelos julgadores no lapso temporal de duração das sessões virtuais de julgamento.

Tal fato inviabiliza a interação e possibilidade de o patrono suscitar eventual questão de ordem durante o ato, sendo relevante para esclarecer questões de fato.

Em algumas cortes de justiça, já não é mais possível requerer a retirada do processo da pauta de julgamento virtual sob o fundamento de realização de sustentação oral, ao passo que o órgão judicial franqueia a possibilidade de envio de sustentação gravada.

Há notícias até mesmo de casos em que há a limitação do tempo de uso da palavra pelo advogado em dez minutos, e não mais em quinze como garantido regimentalmente.

Indagado se é possível ser breve em sua sustentação e se seria viável usar menos tempo do que os quinze minutos, por certo o advogado não ofertará negativa aos julgadores.

Todos sabemos que esse tipo de ato processual se revela totalmente diferente quando realizado a distância.

Outro exemplo desse distanciamento, mas dentro do processo, é o que vem sendo adotado no primeiro grau de jurisdição da justiça do Distrito Federal, onde o processo pode ser enviado, após a instrução processual para ser sentenciado por juiz diverso, lotado em um núcleo de gestão de metas do judiciário.

É compreensível que haja uma iniciativa desse tipo, ainda mais quando a tarefa do magistrado brasileiro se revela altamente desafiadora com uma carga de trabalho estratosférica, tendo ainda que cumprir todas as metas estipuladas pelo CNJ.

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Porém, não me parece justo sacrificar esse contato com os advogados, com as partes pelo magistrado, apenas para que sejam cumpridas as referidas metas.

Não se pode abandonar valores, vidas, contidas no bojo de processos judiciais, que necessitam desse contato humano com o julgador, para atender princípios de celeridade que se perfazem, na prática, inócuos quando sentenciados por juízes outros que não aqueles que receberam e processaram a demanda.

Aliás, de outra borda importante mencionar a excelência dos serviços prestados pelo TJDFT, tendo sido agraciado com o Selo Diamante do CNJ por dois anos consecutivos.

O trabalho judicante, antes artesanal, passou a ser industrial, algo totalmente incompatível com as peculiaridades e detalhes contidos em cada processo, condizentes a um bem da vida de determinado sujeito, merecendo tratamento adequando e, principalmente, o contato próximo, sendo por vezes necessário o olho no olho, para um julgamento mais humano.

Se tornou muito sacrificante para a advocacia conseguir o contato com o magistrado para expor o caso e as necessidades de seus constituintes.

Compreendo ser relevante a adequação de certas condutas do magistrado para a administração da condução e conclusão dos processos, mas alguns casos tornam o exercício da advocacia um tanto quanto penoso.

Principalmente no que diz respeito aos despachos, tão importantes. Nos dias atuais há de se marcar horários com magistrados na maioria dos casos, alguns até condicionam o despacho ao ingresso do processo em pauta de julgamento, o que não faz sentido para nenhum dos lados, em razão de, via de regra, quanto incluso em pauta o voto já estar confeccionado, o que esvaziaria o ato processual.

Além disso, fato relevante por mim presenciado, em determinada sessão de julgamento o desembargador fazer constar em ata que recebeu o causídico para despacho, mesmo sem marcação, “o advogado estava na porta do gabinete e foi recebido mesmo sem ter agendado”, como se fosse um diferencial receber o advogado sem que ele houvesse marcado previamente, e confesso que esse episódio me motivou a escrever esse pequeno texto, o qual demorou meses para sair, tamanha a minha reflexão sobre publicá-lo ou não.

O Estatuto da Advocacia é de clareza solar ao dispor que é direito do causídico dirigir-se diretamente aos magistrados nas salas e gabinetes de trabalho, independentemente de horário previamente marcado ou outra condição, observando-se a ordem de chegada. (3)

Portanto, esse distanciamento que se apresenta de diversas maneiras na praxe forense é totalmente prejudicial a uma justa e humanizada prestação jurisdicional, posto que em algumas situações sacrifica direitos legalmente deferidos aos advogados, subjugando, por consequência, os direitos dos próprios jurisdicionados.

Tudo quanto posto acima não se revela em uma crítica ou em fomentar uma batalha entre a advocacia e a magistratura, mas apenas um desafogo percebido após alguns anos de advocacia observando o que acontece nos fóruns e tribunais, com vistas a aprimorar, acima de tudo, a prestação jurisdicional.

  1. Procedimento de Controle Administrativo 0002260-11.2022.2.00.0000

  2. Artigo 6°, do Estatuto da Advocacia

  3. Artigo 7°, inciso VIII, do Estatuto da Advocacia.

Sobre o autor
Luís Eduardo de Resende Moraes Oliveira

Membro da Associação Brasiliense de Direito Processual Civil; Membro da Comissão de Processo Civil da OAB/DF.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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