Símbolo do Jus.com.br Jus.com.br

O "vagabundo e tarado" do desembargador, segundo Tiago Pavinatto. O Estado de Direito responde

Agenda 27/08/2023 às 13:28

 Linha de Frente, da Jovem Pan. O apresentador Tiago Pavinatto, segundo notícias no site Notícias da TV, foi demitido. O porquê? Não se retratou ao chamar o desembargador Airton Vieira, do Tribunal de Justiça de São Paulo, de "vagabundo e tarado". As palavras ditas por Tiago contra a honra do desembargador geraram debates nas redes sociais, em sites, blogues.

ESTADO DE DIREITO

Iniciemos pelo importante, o estado de Direito.

LEI Nº 12.015, DE 7 DE AGOSTO DE 2009

Altera o Título VI da Parte Especial do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal, e o art. 1o da Lei no 8.072, de 25 de julho de 1990, que dispõe sobre os crimes hediondos, nos termos do inciso XLIII do art. 5o da Constituição Federal e revoga a Lei no 2.252, de 1o de julho de 1954, que trata de corrupção de menores.

Art. 1° Esta Lei altera o Título VI da Parte Especial do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal, e o art. 1º da Lei no 8.072, de 25 de julho de 1990, que dispõe sobre os crimes hediondos, nos termos do inciso XLIII do art. 5o da Constituição Federal.

Art. 2° O Título VI da Parte Especial do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal, passa a vigorar com as seguintes alterações:

“TÍTULO VI

DOS CRIMES CONTRA A DIGNIDADE SEXUAL

CAPÍTULO I

DOS CRIMES CONTRA A LIBERDADE SEXUAL

Estupro

Art. 213. Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso:

Pena - reclusão, de 6 (seis) a 10 (dez) anos.

§ 1º Se da conduta resulta lesão corporal de natureza grave ou se a vítima é menor de 18 (dezoito) ou maior de 14 (catorze) anos:

Pena - reclusão, de 8 (oito) a 12 (doze) anos.

§ 2º Se da conduta resulta morte:

Pena - reclusão, de 12 (doze) a 30 (trinta) anos.” (NR)

“Violação sexual mediante fraude

Art. 215. Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com alguém, mediante fraude ou outro meio que impeça ou dificulte a livre manifestação de vontade da vítima:

Pena - reclusão, de 2 (dois) a 6 (seis) anos.

Parágrafo único. Se o crime é cometido com o fim de obter vantagem econômica, aplica-se também multa.” (NR)

“Assédio sexual

Art. 216-A. ....................................................................

..............................................................................................

§ 2º A pena é aumentada em até um terço se a vítima é menor de 18 (dezoito) anos.” (NR)

“CAPÍTULO II

DOS CRIMES SEXUAIS CONTRA VULNERÁVEL

Art. 218. Induzir alguém menor de 14 (catorze) anos a satisfazer a lascívia de outrem:

Pena - reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos.

Parágrafo único. (VETADO).” (NR)

“Ação penal

Art. 225. Nos crimes definidos nos Capítulos I e II deste Título, procede-se mediante ação penal pública condicionada à representação.

Parágrafo único. Procede-se, entretanto, mediante ação penal pública incondicionada se a vítima é menor de 18 (dezoito) anos ou pessoa vulnerável.” (NR)

“CAPÍTULO V

DO LENOCÍNIO E DO TRÁFICO DE PESSOA PARA FIM DE

PROSTITUIÇÃO OU OUTRA FORMA DE

EXPLORAÇÃO SEXUAL

“Estupro de vulnerável

Art. 217-A. Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de 14 (catorze) anos:

Pena - reclusão, de 8 (oito) a 15 (quinze) anos.

§ 1º Incorre na mesma pena quem pratica as ações descritas no caput com alguém que, por enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento para a prática do ato, ou que, por qualquer outra causa, não pode oferecer resistência.

§ 2º (VETADO)

§ 3º Se da conduta resulta lesão corporal de natureza grave:

Pena - reclusão, de 10 (dez) a 20 (vinte) anos.

§ 4º Se da conduta resulta morte:

Pena - reclusão, de 12 (doze) a 30 (trinta) anos.”

A decisão do desembargador Airton Vieira, do Tribunal de Justiça de São Paulo, ocorreu em 2011. Ora, sem maiores esforços, a decisão do desembargador deveria condenar, não absolver o réu por "estupro de vulnerável, "in verbis":

Art. 217-A. Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de 14 (catorze) anos:

Pena - reclusão, de 8 (oito) a 15 (quinze) anos.

Porém, antes da LEI Nº 12.015, DE 7 DE AGOSTO DE 2009? O réu seria ou não condenado? Para isso, o DECRETO-LEI Nº 2.848, DE 7 DE DEZEMBRO DE 1940 (1) antes da  LEI Nº 12.015, DE 7 DE AGOSTO DE 2009:

DECRETO-LEI Nº 2.848, DE 7 DE DEZEMBRO DE 1940

TÍTULO VI

Dos crimes contra os costumes

CAPÍTULO I

DOS CRIMES CONTRA A LIBERDADE SEXUAL

(...)

CAPÍTULO IV

DISPOSIÇÕES GERAIS

(...)

Presunção de violência

Art. 224. Presume-se a violência, se a vítima:

a) não é maior de quatorze anos;

b) é alienada ou débil mental, e o agente conhecia esta circunstância;

c) não pode, por qualquer outra causa, oferecer resistência.

Importantíssimo! Na alínea "a", da norma do artigo 224, do DECRETO-LEI Nº 2.848, DE 7 DE DEZEMBRO DE 1940, "não é maior de quatorze anos". No entanto, trata-se de "presunção de violência", contra menor de quatorze anos, e não "livre consentimento".

Na página do Ministério Público do Paraná (2):

JURISPRUDÊNCIA - Sexo com menor de 14 anos é crime, mesmo com consentimento, decide STJ - 27/08/2014 - 09:00

(...)

A partir da Lei 12.015/09, que modificou o Código Penal em relação aos crimes sexuais, o estupro (sexo vaginal mediante violência ou ameaça) e o atentado violento ao pudor (outras práticas sexuais) foram fundidos em um só tipo, o crime de estupro. Também desapareceu a figura da violência presumida, e todo ato sexual com pessoas com menos de 14 anos passou a configurar estupro de vulnerável.

A jurisprudência sobre a questão, no entanto, varia. O próprio STJ declarou que a presunção de violência no crime de estupro tem caráter relativo, ao inocentar homem processado por fazer sexo com meninas com menos de 12 anos. No Habeas Corpus 73.662/1996, o ministro do Supremo Tribunal Federal Marco Aurélio relativizou a presunção de violência após ficar comprovado no processo o consentimento da mulher e que sua aparência física e mental era de pessoa com mais de 14 anos.

Histórico

Denunciado por sua companheira, o réu foi absolvido em 2009 pelo juízo de primeiro grau do Tribunal de Justiça de São Paulo. Para a magistrada, a menor não foi vítima de violência presumida, pois "se mostrou determinada para consumar o coito anal com o padrasto. O que fez foi de livre e espontânea vontade, sem coação, ameaça, violência ou temor. Mais: a moça quis repetir e assim o fez".

O TJ-SP manteve a absolvição pelos mesmos fundamentos. Conforme o acórdão, a vítima narrou que manteve relacionamento íntimo com o padrasto por diversas vezes, sempre de forma consentida, pois gostava dele. A maioria dos desembargadores considerou que o consentimento da menor, ainda que influenciado pelo desenvolvimento da sociedade e dos costumes, justificava a manutenção da absolvição.

Para o ministro do STJ, Rogério Schietti, é frágil a alusão ao "desenvolvimento da sociedade e dos costumes" como razão para relativizar a presunção legal de violência prevista na antiga redação do Código Penal. O "caminho da modernidade", disse Schietti, é o oposto do que foi decidido pela Justiça paulista.

"De um estado ausente e de um Direito Penal indiferente à proteção da dignidade sexual de crianças e adolescentes, evoluímos paulatinamente para uma política social e criminal de redobrada preocupação com o saudável crescimento físico, mental e afetivo do componente infanto-juvenil de nossa população", afirmou o ministro.

Ele também considerou "anacrônico" o discurso que tenta contrapor a evolução dos costumes e a disseminação mais fácil de informações à "natural tendência civilizatória" de proteger crianças e adolescentes, e que acaba por "expor pessoas ainda imaturas, em menor ou maior grau, a todo e qualquer tipo de iniciação sexual precoce".

A 6ª Turma deu provimento ao recurso para condenar o padrasto pela prática do crime de atentado violento ao pudor, cometido antes da Lei 12.015. O processo foi remetido ao TJ-SP para a fixação da pena.

Com informações da Secretaria de Comunicação Social do STJ.(grifos do autor)

Fique sempre informado com o Jus! Receba gratuitamente as atualizações jurídicas em sua caixa de entrada. Inscreva-se agora e não perca as novidades diárias essenciais!
Os boletins são gratuitos. Não enviamos spam. Privacidade Publique seus artigos

Destaco:  A jurisprudência sobre a questão, no entanto, varia. Ora, No Estado de Direito, as sentenças. Para "não variar" é necessário súmula. Súmula é: É um extrato, um resumo, um compêndio das reiteradas decisões exaradas pelos tribunais superiores versando sobre uma determinada matéria. (3)

Cada tribunal brasileiro possui suas respectivas súmulas. Por exemplo, o Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro possui suas súmulas, justamente para uniformizar entendimentos. Evita-se, assim, divergências dentro do próprio  Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro. Mais claro: súmula serve como referencial para casos semelhantes.

No entanto, "cada tribunal" possui suas respectivas súmulas. História:

3.Origem da Súmula no Brasil e Uniformização da Jurisprudência

 A origem da súmula no Brasil data de 1963, tendo como mentor e propagador o ministro Victor Nunes Leal, do Supremo Tribunal Federal. Acerca de sua criação, o relato de SOUZA (2006, p. 253): A origem da súmula no Brasil remonta à década de 1960. Sufocado pelo acúmulo de processos pendentes de julgamento, a imensa maioria versando sobre questões idênticas, o Supremo Tribunal Federal, após alteração em seu regimento (sessão de 30.08.1963) e enorme trabalho de Comissão de Jurisprudência, composta pelos ministros Gonçalvez de Oliveira, Pedro Chaves e Victor Nunes Leal, este último seu relator, em sessão de 13.12. 1963, decidiu publicar oficialmente, pela primeira vez, a Súmula da sua Jurisprudência, para vigorar a partir de 01.03.1964. A edição da Súmula – e dos seus enunciados individualmente – é resultante de um processo específico de elaboração, previsto regimentalmente, que passa pela escolha dos temas, discussão técnico-jurídica, aprovação e, ao final, publicação para conhecimento de todos e vigência.(4)

Súmula

Superior Tribunal de Justiça (STJ)

RECURSO ESPECIAL N. 1.480.881-PI (2014/0207538-0)

Relator: Ministro Rogerio Schietti Cruz 

Recorrente: Ministério Público do Estado do Piauí 

Recorrido: A R de O

 Advogado: Andréa Rebelo Fontenele 

Interes.: Defensoria Pública da União - “Amicus Curiae” 

Advogado: Defensoria Pública da União

 EMENTA 

RECURSO ESPECIAL. PROCESSAMENTO SOB O RITO DO ART. 543-C DO CPC. RECURSO REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. ESTUPRO DE VULNERÁVEL. VÍTIMA MENOR DE 14 ANOS. FATO POSTERIOR À VIGÊNCIA DA LEI 12.015/2009. CONSENTIMENTO DA VÍTIMA. IRRELEVÂNCIA. ADEQUAÇÃO SOCIAL. REJEIÇÃO. PROTEÇÃO LEGAL E CONSTITUCIONAL DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. RECURSO ESPECIAL PROVIDO. 

1. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça assentou o entendimento de que, sob a normativa anterior à Lei nº 12.015/2009, era absoluta a presunção de violência no estupro e no atentado violento ao pudor (referida na antiga redação do art. 224, “a”, do CPB), quando a vítima não fosse maior de 14 anos de idade, ainda que esta anuísse voluntariamente ao ato sexual (EREsp 762.044/SP, Rel. Min. Nilson Naves, Rel. para o acórdão Ministro Felix Fischer, 3ª Seção, DJe 14.4.2010).

2. No caso sob exame, já sob a vigência da mencionada lei, o recorrido manteve inúmeras relações sexuais com a ofendida, quando esta ainda era uma criança com 11 anos de idade, sendo certo, ainda, que mantinham um namoro, com troca de beijos e abraços, desde quando a ofendida contava 8 anos. 

3. Os fundamentos empregados no acórdão impugnado para absolver o recorrido seguiram um padrão de comportamento tipicamente patriarcal e sexista, amiúde observado em processos por crimes dessa natureza, nos quais o julgamento recai inicialmente sobre a vítima da ação delitiva, para, somente a partir daí, julgar-se o réu.

4. A vítima foi etiquetada pelo “seu grau de discernimento”, como segura e informada sobre os assuntos da sexualidade, que “nunca manteve relação sexual com o acusado sem a sua vontade”. Justifi couse, enfi m, a conduta do réu pelo “discernimento da vítima acerca dos fatos e o seu consentimento”, não se atribuindo qualquer relevo, no acórdão vergastado, sobre o comportamento do réu, um homem de idade, então, superior a 25 anos e que iniciou o namoro – “beijos e abraços” – com a ofendida quando esta ainda era uma criança de 8 anos.

5. O exame da história das ideias penais – e, em particular, das opções de política criminal que deram ensejo às sucessivas normatizações do Direito Penal brasileiro – demonstra que não mais se tolera a provocada e precoce iniciação sexual de crianças e adolescentes por adultos que se valem da imaturidade da pessoa ainda em formação física e psíquica para satisfazer seus desejos sexuais.

6. De um Estado ausente e de um Direito Penal indiferente à proteção da dignidade sexual de crianças e adolescentes, evoluímos, paulatinamente, para uma Política Social e Criminal de redobrada preocupação com o saudável crescimento, físico, mental e emocional do componente infanto-juvenil de nossa população, preocupação que passou a ser, por comando do constituinte (art. 226 da C.R.), compartilhada entre o Estado, a sociedade e a família, com inúmeros refl exos na dogmática penal.

7. A modernidade, a evolução moral dos costumes sociais e o acesso à informação não podem ser vistos como fatores que se contrapõem à natural tendência civilizatória de proteger certos segmentos da população física, biológica, social ou psiquicamente fragilizados. No caso de crianças e adolescentes com idade inferior a 14 anos, o reconhecimento de que são pessoas ainda imaturas – em menor ou maior grau – legitima a proteção penal contra todo e qualquer tipo de iniciação sexual precoce a que sejam submetidas por um adulto, dados os riscos imprevisíveis sobre o desenvolvimento outro de sua personalidade e a impossibilidade de dimensionar as cicatrizes físicas e psíquicas decorrentes de uma decisão que um  adolescente ou uma criança de tenra idade ainda não é capaz de livremente tomar. 

8. Não afasta a responsabilização penal de autores de crimes a aclamada aceitação social da conduta imputada ao réu por moradores de sua pequena cidade natal, ou mesmo pelos familiares da ofendida, sob pena de permitir-se a sujeição do poder punitivo estatal às regionalidades e diferenças socioculturais existentes em um país com dimensões continentais e de tornar írrita a proteção legal e constitucional outorgada a específicos segmentos da população. 

9. Recurso especial provido, para restabelecer a sentença proferida nos autos da Ação Penal n. 0001476-20.2010.8.0043, em tramitação na Comarca de Buriti dos Lopes/PI, por considerar que o acórdão recorrido contrariou o art. 217-A do Código Penal, assentando-se, sob o rito do Recurso Especial Repetitivo (art. 543-C do CPC), a seguinte tese: Para a caracterização do crime de estupro de vulnerável previsto no art. 217-A, caput, do Código Penal, basta que o agente tenha conjunção carnal ou pratique qualquer ato libidinoso com pessoa menor de 14 anos. 

O consentimento da vítima, sua eventual experiência sexual anterior ou a existência de relacionamento amoroso entre o agente e a vítima não afastam a ocorrência do crime.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Terceira Seção, por unanimidade, dar provimento ao recurso especial representativo da controvérsia, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator, assentando-se a seguinte tese: para a caracterização do crime de estupro de vulnerável previsto no art. 217-A, caput, do Código Penal, basta que o agente tenha conjunção carnal ou pratique qualquer ato libidinoso com pessoa menor de 14 anos. O consentimento da vítima, sua eventual experiência sexual anterior ou a existência de relacionamento amoroso entre o agente e a vítima não afastam a ocorrência do crime. Os Srs. Ministros Nefi Cordeiro, Gurgel de Faria, Reynaldo Soares da Fonseca, Newton Trisotto (Desembargador Convocado do TJ/SC), Ericson Maranho (Desembargador convocado do TJ/ SP), Leopoldo de Arruda Raposo (Desembargador convocado do TJ/PE), Felix Fischer e Maria Th ereza de Assis Moura votaram com o Sr. Ministro Relator. Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Sebastião Reis Júnior.

RSSTJ, a. 9, (46): 685-721, dezembro 2017

Então. Podemos considerar que o desembargador Airton Vieira, do Tribunal de Justiça de São Paulo, contrariou os entendimentos do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e do Supremo Tribunal de Justiça (STF)? Vejamos:

A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça assentou o entendimento de que, sob a normativa anterior à Lei nº 12.015/2009, era absoluta a presunção de violência no estupro e no atentado violento ao pudor (referida na antiga redação do art. 224, “a”, do CPB), quando a vítima não fosse maior de 14 anos de idade, ainda que esta anuísse voluntariamente ao ato sexual (EREsp 762.044/SP, Rel. Min. Nilson Naves, Rel. para o acórdão Ministro Felix Fischer, 3ª Seção, DJe 14.4.2010).(grifo do autor)

Quando ocorreu o entendimento? Em 2017 ( RSSTJ, a. 9, (46): 685-721, dezembro 2017). Importante destacar que o termo "crime de vulnerável" foi introduzido no Código Penal pela LEI Nº 12.015, DE 7 DE AGOSTO DE 2009. Antes dessa lei, inexistia o termo. 

Entrei em contato com o Tribunal de Justiça de São Paulo

Saudações!

Sobre Airton Vieira, do Tribunal de Justiça de São Paulo.

O caso é de 2011.

No ordenamento jurídico pátrio, como reflexo social, novas interpretações, de doutrinadores, de magistrados, de desembargadores e de juízes. O Direito não é imutável. Diante disso, penso, a decisão baseou-se no entendimento jurisprudencial da época e, possivelmente, do Supremo Tribunal Federal.

Mudanças ocorreram, principalmente pela internacionalização dos direitos humanos. O Estado de Direito atual não é o mesmo do Estado de Direito, por exemplo, do início do século XX. Se antes a legítima defesa da honra, para o direito de homicídio do gênero feminino, por parte do gênero masculino, em defesa da honra desse gênero, atualmente, por novo entendimento sobre a dignidade humana, como princípio Constitucional, independentemente do gênero, sexualidade, etnia etc., não é mais possível o feminicídio.

Poderia o TJ-SP fornecer explicações técnicas sobre o caso?

Obrigado!

Resposta:

Olá, Sérgio

Como vai?

O Tribunal de Justiça de São Paulo não emite nota sobre questão jurisdicional. Os magistrados têm independência funcional para decidir de acordo com os documentos dos processos e seu livre convencimento. Essa independência é uma garantia do próprio Estado de Direito. Quando há discordância da decisão, cabe às partes a interposição dos recursos cabíveis, previstos na legislação vigente.

Atenciosamente

Cecília Abbati

DIRETORIA DE COMUNICAÇÃO SOCIAL

Assessoria de Imprensa

Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo

SPr 3 - Secretaria da Presidência

Rua Onze de Agosto, s/nº, sala 212 - Sé - São Paulo/SP - CEP: 01018-010

Tels: (11) 4802-9313 / 9444 / 9447 / 9449

Cels: (11) 98213-6854 / 94955-6609/ 94955-7042

E-mail: imprensatj@tjsp.jus.br

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A decisão do desembargador ocorreu em 2009. 

Os magistrados têm independência funcional para decidir de acordo com os documentos dos processos e seu livre convencimento.

Mas o "livre convencimento" não é "fazer como se quer". Ou seja, O "livre convencimento" não está desentranhado do Estado de Direito. 

Da Folha de S. Paulo:

Em nota, a assessoria do magistrado afirmou que a decisão se baseou no que o STF e especialistas da área entendiam na época.

"Entretanto, em 2015, o STJ trouxe uma nova diretriz para casos dessa natureza, ao estabelecer que a experiência sexual ou consentimento de uma vítima menor de 14 anos não isenta o crime de estupro de vulnerável. Ainda assim, em 2018, o ministro Felix Fischer, do STJ, validou a decisão anterior, mesmo após a mudança de posicionamento".

O magistrado também enviou o que chamou de explicações técnicas sobre o tema.

Segundo ele, no recurso de apelação de 2014 o fazendeiro foi absolvido "em razão da adoção de critério amplamente difundido na jurisprudência e na doutrina (reconhecimento do 'erro de tipo'), por meio do qual as circunstâncias do caso concreto (compleição física, consentimento da vítima e sua eventual experiência sexual anterior) poderiam ser aptas para afastar a vulnerabilidade absoluta de crimes envolvendo menores de 14 anos."

Ele indicou que, na ocasião, foram mencionados precedentes do STF de ministros como Marco Aurélio Mello, Luiz Fux, Teori Zavascki e a doutrina de Guilherme de Souza Nucci. "O acórdão foi unânime quanto à absolvição do réu, pese embora um desembargador tenha divergido para absolvê-lo por insuficiência de provas e não por "erro de tipo"."

"Precedentes do STF". A decisão do desembargador ocorreu em 2009, que fique solar.

  STF e STJ tiveram entendimento em 2017 sobre relação sexual, ou ato libidinoso, ainda que com consentimento de pessoa menor de quatorze anos de idade:

A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça assentou o entendimento de que, sob a normativa anterior à Lei nº 12.015/2009, era absoluta a presunção de violência no estupro e no atentado violento ao pudor (referida na antiga redação do art. 224, “a”, do CPB), quando a vítima não fosse maior de 14 anos de idade, ainda que esta anuísse voluntariamente ao ato sexual (EREsp 762.044/SP, Rel. Min. Nilson Naves, Rel. para o acórdão Ministro Felix Fischer, 3ª Seção, DJe 14.4.2010).(grifo do autor)

O desembargador proferiu decisão pelo Estado de Direito de sua época. Logo, chamá-lo de "vagabundo e tarado" em nada condiz com o propósito de levar informação, relevante, para a sociedade brasileira. Podemos discordar de certas decisões como, por exemplo, do STF, no caso Maria Prestes (Olga Benário) [Habeas Corpus nº 26155].

Podemos divergir de antiga decisão sobre estupro marital:

“Exercício regular de direito. Marido que fere levemente a esposa, ao constrangê-la à prática de conjunção carnal normal. Recusa injusta da mesma, alegando cansaço. Absolvição mantida. Declaração de voto. (...) A cópula intra matrimonium é dever recíproco dos cônjuges e aquele que usa de força física contra o outro, a quem não socorre escusa razoável (verbi gratia, moléstia, inclusive venérea, ou cópula contra a natureza) tem por si a excludente da criminalidade prevista no art. 19, n. III (art. 23, III, vigente), do Código Penal, exercício regular de direito” (TJGB — RT, 461/444).

Pode-se apoiar, considerar, moralmente correto:

“Não há falar em relação sexual admitida, com base em alegação de congressos sexuais anteriores, pois até o marido pode ser agente ativo dessa espécie de delito” (RJTJRS, 174/157).

Notem. Duas decisões sobre o estupro marital. Na época, decisões contrárias, mas tudo no Estado de Direito da época. 

NOTAS:

(1) — BRASIL. Câmara dos Deputados. Legislação Informatizada - DECRETO-LEI Nº 2.848, DE 7 DE DEZEMBRO DE 1940 - Publicação Original. Disponível em: https://www2.camara.leg.br/legin/fed/declei/1940-1949/decreto-lei-2848-7-dezembro-1940-412868-public...

(2) — _____.  Ministério Público do Paraná.  JURISPRUDÊNCIA - Sexo com menor de 14 anos é crime, mesmo com consentimento, decide STJ. Disponível em: https://mppr.mp.br/Noticia/JURISPRUDENCIA-Sexo-com-menor-de-14-anos-e-crime-mesmo-com-consentimento-...

(3) —_____. Ministério Público Federal. Glossário de termos jurídicos. Disponível em: https://www.mpf.mp.br/es/sala-de-imprensa/glossario-de-termos-juridicos#R1

(4) — CARVALHO, Flávio Pereira de. O histórico do processo legislativo de criação da súmula vinculante no Brasil. Disponível em: https://www2.senado.leg.br/bdsf/bitstream/handle/id/180414/historico_processo_legislativo.pdf?sequen...

Sobre o autor
Sérgio Henrique da Silva Pereira

Articulista/colunista nos sites: Academia Brasileira de Direito (ABDIR), Âmbito Jurídico, Conteúdo Jurídico, Editora JC, Governet Editora [Revista Governet – A Revista do Administrador Público], JusBrasil, JusNavigandi, JurisWay, Portal Educação, Revista do Portal Jurídico Investidura. Participação na Rádio Justiça. Podcast SHSPJORNAL

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!