INTRODUÇÃO
O marco inicial sobre a controvérsia sobre a criminalização da utilização da droga, começou a ser debatido quando a Defensoria Pública de São Paulo ingressou no STF com Recurso Extraordinário (RE n. 635659), com a tese de que o uso de droga vem a ofender tão somente a saúde do usuário, ou seja, uma autolesão, e por tal motivação não existe interesse social, em toda sua amplitude, que venha a justificar a manutenção da criminalização de uma conduta que venha a atingir apenas o usuário da droga.
HISTÓRICO DO JULGAMENTO
Rebuscando-se esse debate iniciado no ano de 2015, quando votaram o ministro-relator, Gilmar Mendes, juntamente com os ministros Edson Fachin e Luís Barroso. Contudo, o ministro Teori Zavascki pediu vistas do processo, interrompendo o julgamento do feito. No entanto, em razão do falecimento do ministro Zavascki, o procedimento judicial permaneceu sobrestado.
Vale ressaltar, que a partir da instituição da Emenda nº 58 de 2022, os pedidos de vista deverão ser devolvidos em até 90 (noventa) dias corridos, a contar da publicação da ata do julgamento, que houve interrupção, cujos autos serão liberados automaticamente para os demais ministros após o prazo fixado. No presente caso, a sistemática obedece ao critério pretérito, ou seja, o prazo para a devolução nos pedidos de vista era de 30 (trinta) dias, porém não havia essa possibilidade de liberação automática dos autos para prosseguimento do julgamento.
No dia 02 de agosto do presente exercício, o julgamento do RE 635659 feito foi retomado, com o voto do ministro Alexandre de Moraes, com repercussão geral (Tema 506), propondo a fixação de um critério nacional, exclusivamente, em relação à maconha, visando diferenciara usuários de traficantes de drogas.
Ademais disso, o ministro citou que o artigo 28 da Lei nº 11.343, de 2006 (Lei das Drogas) deixou de punir com prisão o porte de drogas, desde que para o consumo próprio, no entanto a regra não define os critérios objetivos visando diferenciara o consumo próprio do tráfico, deixando a critério de definição a critério do sistema de persecução penal, ou seja, da Polícia Judiciária, do Ministério Público e do Poder Judiciário, que deverá interpretar a norma legal de maneiras diversas.
Prosseguindo, afirmou que, dessa forma, o porte de pequena quantidade de entorpecentes passou, em muitos casos, a ser qualificado com tráfico, tornando a punição mais dura e aumentando significativamente o número de presos por tráfico. Além disso, pessoas presas com a mesma quantidade de droga e em circunstâncias semelhantes podem ser consideradas usuárias ou traficantes, dependendo da etnia, de nível de instrução, renda, idade ou de onde ocorrer o fato.
No entendimento ministerial de Moraes, essa distorção decorre do excesso de discricionariedade para diferenciar usuários de traficantes. Em respeito ao princípio da isonomia, o ministro destacou a necessidade de que os flagrantes de drogas sejam tratados de forma idêntica em todo o país, afirmando que, “O STF tem o dever de exigir que a lei seja aplicada identicamente a todos, independentemente de etnia, classe social, renda ou idade”.
Por outro lado, propôs o ministro, que sejam presumidas como usuárias as pessoas flagradas com 25g a 60g de maconha ou que tenham 6 plantas fêmeas. Assim, com base em levantamentos realizado sobre o volume médio de apreensão de drogas no Estado de São Paulo, no período de 2006 a 2017, o ministro chegou a essas quantidades de drogas, cujo levantamento foi promovido em conotação com a Associação Brasileira de Jurimetria, abrangendo mais de 1,2 milhão de ocorrências com prisões de drogas.
De conformidade com o entendimento do ministro Moraes, a autoridade policial não restaria impedida de realizar a prisão em flagrante pela prática de tráfico, quando a quantidade de maconha foi inferior ao limite apontado. No entanto, necessário se faz a comprovação da presença de outros critérios caracterizadores do tráfico, como na forma de acondicionamento da droga; a diversidade de entorpecentes; e a apreensão de instrumentos e celulares com contatos. Do mesmo modo, nas prisões em flagrante por quantidades superiores. Neste sentido, o magistrado, quando da audiência de custódia, deverá oferecer ao preso a possibilidade de comprovar que é usuário.
Com a conclusão do precitado voto, o ministro-relator, Gilmar Mendes, requereu adiamento do julgamento, com o esteio de construir uma nova solução consensual, perante os novos argumentos e pela mudança das circunstâncias a partir de 2015, quando da apresentação do seu voto, como a implementação das audiências de custódia, e por haver votado incialmente para descriminalizar todas as drogas para uso próprio.
Quanto aos outros dois votos apresentados anteriormente, o ministro Luís Roberto Barroso, propôs a discriminação, exclusivamente, em relação à maconha, do porte de até 25 gramas ou a plantação de até 6 plantas fêmeas, para diferenciar o consumo pelo tráfico, até que o Congresso Nacional edite lei sobre o tema.
Com relação ao ministro Edson Fachin, manifestou-se considerando a regra inconstitucional exclusivamente em relação à maconha, entendendo que os parâmetros para diferenciar traficantes de usuários devem ser fixados pelo Congresso Nacional.
No pertinente ao voto do ministro Cristiano Zanin, nega dá provimento ao recurso extraordinário, propondo a tese seguinte: “1. É inconstitucional o artigo 26 da Lei nº 11.343, de 2006. 2. Para além dos critérios estabelecidos no § 2º do art. 28 da Lei nº 11.343/2006, para diferenciar o usuário de maconha do traficante, o Tribunal fixa como parâmetro adicional a quantia de 25g ou 6 plantas fêmeas para configuração.
DA LEGISLAÇÃO SOBRE DROGAS
É cediço que há no Brasil uma legislação sobre drogas, cujas leis foram criadas para regular os relacionamentos entre as pessoas, que convivem na sociedade, com o esteio de nortear seus deveres e direitos. Ademais, oferecem as regras de convivência harmônica dentre as pessoas e concedem uma base sólida para desenvolver uma sociedade de plenitude livre, justa e benfeitora, considerada como prioritária encontrada nos desideratos fundamentais da República Federativa do Brasil, tipificada no artigo 3º da Carta Fundamental de 1988.
No pertinente ao esteio da legislação é de regulamentar o relacionamento das pessoas com as drogas, protegendo a saúde da população em geral, inclusive daquelas que são consideradas usuárias e com ênfase as dependentes de drogas. Ademais disso, tem com escopo dar proteção a segurança da sociedade contra todos os malefícios das drogas.
Vislumbra-se que na atualidade a norma legal vigente no Brasil, que cuida do tema das drogas é a Lei nº 11.343, datada de 23 de agosto de 2006, que foi alterada pela Lei nº 13.840, de 5 de agosto de 2019, que também cuida de alterar várias outras leis e demais legislações, para dispor sobre o SISNAD, promovendo as condições de atenção aos usuários ou dependentes de drogas e para tratar do financiamento da políticas sobre drogas.
A Lei nº 11.343, de 2006, institui o Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas (SISNAD), prescrevendo medidas para prevenção do uso de drogas, atenção e reinserção social de usuários e dependentes químicos. Ademais, prevê normas para repressão à produção e ao tráfico de drogas, definindo os crimes praticados nessas atividades e suas sanções penais, nos termos no artigo 28 desta norma, que trata dos crimes atinentes à posse de drogas ilícitas para consumo próprio, apresentando o elencando as seguintes sanções:
“Art. 28. Quem adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoas, drogas sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar será submetido às seguintes penas”:
“I – advertência sobre os efeitos das drogas”;
“II – prestação de serviço à comunidade”;
“III – medida educativa de comparecimento à programa ou curso educativo”.
“§ 1º. As mesmas medidas submetem-se quem, para seu consumo pessoal, semeia, cultiva ou colhe plantas destinadas à preparação de pequena quantidade de substância ou produto capaz de causar dependência física ou psíquica”.
“§ 2º. Para determinar se a droga se destinava a consumo pessoal, o juiz atenderá à natureza e à quantidade da substância apreendida, ao local e às condições em que se desenvolveu a ação, às circunstâncias sociais e pessoais, bem como à condução e aos antecedentes do agente”.
“§ 3º. As penas previstas nos incisos II e III do caput deste artigo serão aplicadas pelo prazo máximo de 5 (cinco) meses”.
“§ 4º. Em caso de reincidência, as pens previstas nos incisos II e III do caput deste artigo serão aplicadas pelo prazo máximo de 10 (dez) meses”.
“§ 5º. A prestação de serviços à comunidade será cumprida em programas comunitários, entidades educacionais ou assistenciais, hospitais, estabelecimentos congêneres, públicos ou privados sem fins lucrativos, que se ocupem, preferencialmente, da prevenção do consumo ou da recuperação de usuários e dependentes de drogas”.
“§ 6º. Para garantia do cumprimento das medidas educativas a que se refere o caput, nos incisos I, II e III, a que injustificadamente ser recuse o agente, poderá o juiz submetê-lo, sucessivamente a”:
“I – Admoestação verbal”.
“II – multa”.
“§ 7º. O juiz determinará ao Poder Público que coloque à disposição do infrator, gratuitamente, estabelecimento de saúde, preferencialmente ambulatorial, para tratamento especializado”.
De efeito, vale ressaltar que, na presente Lei de Drogas não há previsão da pena de prisão para usuários e dependentes químicos, quando flagrados em posse de drogas para consumo próprio.
Neste sentido, a Lei das Drogas, estriba-se como importante e necessário a preservação a saúde pública, justificada por meio do que prescreve o preceito do artigo 28, da Lei nº 11.343, de 2006, cujo dispositivo possui natureza penal, embora não tenha previsão da punição com sanção de prisão do infrator que, exclusivamente, obtiver drogas para uso pessoal.
Nesta legislação, embora o porte de drogas para uso pessoal esteja tipificado como crime, as sanções dirigidas aos usuários de drogas, ou seja, advertência, multa e prestação de serviço, não direcionam a nenhum meio de prisão, discrepando do preceito inserido no artigo 1º da Lei de Introdução ao Código Penal, que reza em afirmar que ser crime toda infração penal punida com reclusão ou detenção.
Consequentemente, vislumbra-se que o esteio do legislador foi de tratar de maneira atípica o usuário de drogas, passando a não mais considera-lo como um delinquente, mas como uma pessoa que necessita de maiores cuidados e de proteção por parte do Estado. Ademais disso, há uma cristalina diferenciação quanto a maneira de lidar dispensada entre os usuários e traficantes, ou seja, para estes as sanções são tidas com pesadas e enérgicas, enquanto que àqueles as penas são mais leves e brandas.
Destarte, vislumbra-se, lamentavelmente, que as precitadas medidas apontadas não têm surtido o resultado esperado, no pertinente a repressão, punição e, muito menos ainda, sobre a ressocialização do usuário dependente de drogas. Assim, salvo raras exceções a condenação do agente infrator com base no artigo 28, da Lei das Drogas e, quando a ação judicial atinge o STF, verifica-se normalmente a aplicação do princípio da insignificância, redundando na extinção da punibilidade do implicado.
Na prática processual, dar-se-á a denominada suspensão informal do processo, quando o usuário é intimado a comparecer à audiência no Juizado Especial Criminal, que é designada na delegacia de polícia, passando a assistir uma palestra gerada pelo Serviço Psicossocial do Tribunal de Justiça para, seguidamente, a manifestação do representante do Ministério Público pedindo a suspensão informal do processo, com o escopo de que o agente infrator possa fazer parte das reuniões com o psicólogo do Poder Judiciário, encarregado de promover o convencimento dos efeitos maléficos das drogas, além da importância sobre o tratamento apropriado a causa.
Porquanto, na hipótese do usuário venha a comparecer a todas as reuniões, dar-se-á os arquivamentos dos autos e, destarte, a extinção da punibilidade do infrator. Ademais, vindo a novamente a delinquir, o procedimento deverá ser ratificado, porém a figura da reincidência não será aplicada ao infrator.
Vale relevar, ainda, que na hipótese do usuário de drogas ser processado e condenado, de regra ser-lhe-á imputada uma das sanções previstas na Lei Antidrogas, contudo, na maioria dos casos nenhum resultado positivo será produzido, como em alhures noticiado, levando o infrator a sentir a sensação de impunidade pela prática da infração cometida.
Por outro lado, a analisada lei quando dispõe sobre a conduta de uma pessoa que se dedica à produção e ao tráfico de drogas, infringido algumas condutas incriminadoras previstas nesta lei, sujeitar-se-á à pena de prisão, além do pagamento de multa, nos termos do artigo 33 da Lei das Drogas, que trata da produção, distribuição e do tráfico de drogas ilícitas, tipificando com as penas de reclusão de 5 (cinco) a 15 (quinze) anos e multa.
Ademais disso, a Constituição Federal vigente, prevê em seu artigo 243, que quaisquer glebas localizadas em regiões do País, onde forem encontradas culturas ilegais de plantas psicotrópicas ou a exploração de trabalho escravo na forma da lei serão expropriadas e destinadas à reforma agrária e a programas de habitação popular, sem qualquer indenização ao proprietário e sem prejuízo de outras sanções prevista em lei, observado, no que couber, o disposto no art. 5º. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 81, de 2014).
No pertinente a Lei das Drogas, vale ressaltar o texto do artigo 25, autorizando a FUNAD a dispor de recursos financeiros, em prol das instituições da sociedade civil, sem fins lucrativos, que atuam nas áreas de atenção à saúde e da assistência social, que atendam a usuários ou dependentes de drogas.
Releva dizer que, o Fundo Nacional Antidrogas (FUNAD) é munido de bens, direitos ou de valores apreendidos decorrentes dos delitos previstos na Lei de Drogas ou objeto de medidas assecuratórias, logo após a decretação do seu perdimento em prol da União.
Com a criação da MP nº 885 de 2019, convertida na Lei nº 13.886, de 2019, dispondo sobre questionamentos ligados ao FUNAD, com o esteio de corrigir graves controvérsias relativas à administração judiciária, concernentemente as apreensões de bens oriundos do tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, cujo resultado possibilitou gerar receita, para investimentos em inúmeras ações ligadas ao enfrentamento das drogas, quanto a redução de oferta, com na diminuição do consumo.
DAS NORMAS QUE CUIDAM DAS DROGAS ILÍCITAS
No pertinente as legislações que tratam das drogas ilícitas no Brasil, são as seguintes:
1 – Decreto-Lei nº 2.848, de 1940 – Código Penal, que foi alterado pela Lei nº 7.209, de 1984.
2 – Lei nº 6.368, de 1976, dispondo sobre Medidas de Prevenção e Repressão ao Tráfico ilícito e uso indevido de substâncias entorpecentes ou que determinem dependência Física ou Psíquica, e dá outras providências. (Foi revogada pelo art. 75, da Lei nº 11.343, de 2006 (Lei de Drogas).
3 – Lei nº 7.560, de 1986, criando o Fundo de Prevenção, Recuperação e de Combate às Drogas de Abuso (FUNCAB), que dispõe sobre os bens apreendidos e adquiridos com produtos de tráfico ilícito de drogas ou atividades correlatas, e dá outras providências.
4 – Lei nº 8.764, de 1993, cria a Secretaria Nacional de Entorpecentes – MJ.
5 – Decreto nº 1.796, de 1996, Cria o Departamento Nacional de Entorpecentes – MJ.
6 – Medida Provisória nº 1.669, de 1998, transforma o Departamento de entorpecentes em Secretaria Nacional Antidrogas (SENAD) e o Conselho Federal de Entorpecentes (CONFEN) em Conselho Nacional Antidrogas (CONAD), no âmbito da Casa Militar da Presidência da República.
7 – Lei nº 10.2016 de 2001, dispõe sobre a proteção e os direitos das pessoas portadoras de transtornos mentais e redireciona o modelo assistencial em saúde mental.
8 – Medida Provisória nº 2.143-36, de 2001, altera a denominação do Fundo Nacional Antidrogas de FUNCAB para FUNAD e transfere sua gestão do Ministério da Justiça para a SENAD/GSI.
9 – Decreto nº 4.345, de 2002, institui a Política Nacional Antidrogas (PNAD).
10 – Lei nº 10.409, de 2002, dispõe sobre a prevenção, o tratamento, a fiscalização, o controle e a repressão à produção, ao uso e ao tráfico ilícito de produtos, substâncias ou drogas ilícitas que causem dependência física ou psíquica, assim elencados pelo Ministério da Saúde, e dá outras providências. (Foi revogada pela Lei nº 11.343, de 2006).
11 – Lei nº 11.343, de 2006, institui o Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas (SISNAD), prescreve medidas para prevenção do uso indevido, atenção e reinserção social de usuários e dependentes de drogas; estabelece normas para repressão à produção e ao tráfico ilícito de drogas; define crimes e dá outras providências. (Foi alterada pela Lei nº 13.840, de 2019).
Vale salientar que, a precitada lei foi criada por meio da MP nº 115 de 2002, de autoria do senador Ramez Tebet (falecido) e sancionada pelo então presidente Luís Inácio Lula da Silva.
12 – Lei nº 11.754, de 2008, o Conselho Nacional Antidrogas passa a se chamar Conselho Nacional de Políticas sobre Drogas (CONAD) e a Secretaria Nacional Antidrogas passa a Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas (SENAD).
13 – Portaria nº 3.088, de 2011, institui a Rede de Atenção Psicossocial para pessoas com sofrimento ou transtorno mental e (com necessidades decorrentes do uso de crack, álcool e outras drogas, no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). Foi alterada pela Portaria nº 3.588, de 2017.
14 – Resolução CFM nº 2.057, de 2013, consolida as diversas resoluções da área da psiquiatria e reitera os princípios universais de proteção ao ser humano, à defesa do ato médico privativo de psiquiatrias e aos critérios mínimos de segurança para os estabelecimentos hospitalares ou de assistência psiquiátrica de quaisquer natureza, definindo também o modelo de anamnese e roteiro pericial em psiquiatria.
15 – Resolução CONAD nº 01, de 2015, regulamenta, no âmbito do Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas (SISNAD), as entidades que realizam o acolhimento de pessoas, em caráter voluntário, com problemas associados a uso nocivo ou dependência de substância psicoativa, caracterizada como Comunidades Terapêuticas.
16 – Resolução CIT nº 32, de 2017, estabelece as Diretrizes para o Fortalecimento da Rede de Atenção Psicossocial (RAPS) (Institui a “Nova Política Nacional de Saúde Mental”).
17 – Portaria nº 3.588 de 2017, altera as Portarias de Consolidação no 3 e nº 6, de 28 de setembro de 2017, para dispor sobre a Rede de Atenção Psicossocial, e dá outras providências (Normatiza a “Nova Política Nacional de Saúde Mental”).
18 – Resolução CONAD nº 01, de 2018, define as novas diretrizes para o realinhamento e fortalecimento da PNAD – Política Nacional sobre Drogas, aprovada pelo Decreto nº 4,345, de 26 de agosto de 2002 (esta Resolução permitiu a formulação da “Nova Política sobre Drogas” com a publicação do Decreto nº 9.761, de 11/04/2019).
19 – Decreto nº 9.761, de 2019, aprova a Política Nacional sobre Drogas (PNAD) (Institui a “Nova Política Nacional sobre Drogas”).
20 – Lei nº 13.840, de 2019, altera a Lei nº 11.343 de 2006, para tratar do Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas, definir as condições de atenção aos usuários ou dependentes de drogas e tratar do financiamento das políticas sobre drogas e dá outras providências (Institui a “Nova Lei de Drogas”).
21 – Lei nº 13.844, de 2019, estabelece a organização básica dos órgãos da Presidência da República e dos Ministérios.
22 – Lei nº 13.886, de 2019, acelera à destinação de bens apreendidos ou sequestrados que tenham vinculação com o tráfico ilícito de drogas.
23 – Portaria nº 01, de 2020, regulamenta o art. 63-D da Lei nº 11.343, de 2006, dispondo sobre a incorporação e a doação de bens do Fundo Nacional Antidrogas, e dispõe sobre a indicação para uso provisório no curso de processo judicial e sobre os casos de destruição e de inutilização de bens objetos de apreensão e perdimento em favor da União.
DAS CONVENÇÕES INTERNACIONAIS E SUAS POLÍTICAS E LEGISLAÇÃO SOBRE DROGAS
1 – Decreto nº 54.216, de 1964, trata da Convenção Única de Entorpecentes.
2 – Decreto nº 79.388, de 1977, trata da Convenção sobre Substâncias Psicotrópicas.
3 – Decreto nº 76.248, de 1975, trata do Protocolo de Emendas à Convenção de 1961.
4 – Decreto nº 162, de 1991, trata da Convenção Contra o Tráfico Ilícito de Entorpecentes e Substâncias Psicotrópicas.
DA INCONSTITUCIONALIDADE DA LEI ANTIDROGA
Na data de 26/12/2008, o ministro Celso de Melo do STF, manifestou-se afirmando, referindo-se a Lei de Drogas (Lei nº 11.343/2006), que está mesmo prevendo o contrário, o acusado de tráfico de entorpecentes tem direito à liberdade provisória. Assim, proibindo a concessão da liberdade, como prevê o artigo 44 da lei, “É ofender os princípios constitucionais da presunção de inocência, da dignidade da pessoa humana e da proporcionalidade”. Razão pela qual, o dispositivo é inconstitucional.
Porquanto, essa foi a conclusão do ministro Celso de Mello, quando analisou o pedido liminar de Habeas Corpus impetrado contra a decisão do STJ, mantendo o decreto de prisão contra uma acusada de tráfico de drogas. Segundo o STJ, há o entendimento de que o inciso XLIII, do artigo 5º da CF/88 prevê que o tráfico de entorpecentes constitui crime inafiançável e de não ser possível dar liberdade para alguém acusado de um crime inafiançável.
Ademais disso, o STJ levou em consideração que o tráfico de drogas é apontado como crime hediondo, o que justificaria, mais uma vez, o indeferimento da liberdade provisória. Além disso, a Lei nº 11.343, de 2006 deixa claro que não há liberdade para o acusado de tráfico de entorpecentes.
Diante dessa controvérsia, vale dizer que o STF teve outro entendimento, uma vez que o ministro Celso de Mello lembrou que a Corte já considerou inconstitucional o artigo de lei com conteúdo idêntico ao da Lei de Drogas. Neste caso, há o direcionamento do artigo 21 do Estatuto do Desarmamento, que proibia a liberdade provisória para os acusados de porte ou posse ilegal de arma de fogo de uso permitido ou restrito e para o acusado de disparo de arma de fogo. Assim, a norma foi declarada inconstitucional na ADI n. 3.112, relatada pelo ministro Ricardo Lewandowski, nos termos seguintes:
“Essa vedação apriorística de concessão de liberdade provisória, reiterada no artigo 44 da Lei 11.343/2006 (Lei de Drogas), tem sido repelida pela jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, que a considera incompatível, independentemente da gravidade objetiva do delito, com a presunção de inocência e a garantia do due process, dentre outros princípios consagrados pela Constituição da República”.
Ademais, o mesmo fato está tipificado no artigo 7º da Lei nº 9.037, de 1995 (Lei do Crime Organizado), cujo artigo prevê que “não será concedida liberdade provisória, com ou sem fiança, aos agentes que tenham tido intensa e efetiva participação na organização criminosa”.
Segundo, ainda, o ministro Celso de Mello, leis como estas mostram que o poder público, principalmente no processo penal, age “imoderadamente” por não observar o princípio da razoabilidade, afirmando que, “A exigência de razoabilidade traduz limitação material à ação normativa do Poder Legislativo. O exame da adequação determinando ato estatal ao princípio da proporcionalidade, exatamente por viabilizar o controle de sua razoabilidade, inclui-se, por isso mesmo, no âmbito da própria fiscalização de constitucionalidade das prescrições normativas emanadas do poder público. Esse entendimento é prestigiado pela jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, que, por mais de uma vez, já advertiu que o Legislativo não pode atuar de maneira imoderada, nem formular regras legis cujo conteúdo revele deliberação absolutamente divorciada dos padrões de razoabilidade”.
Na data de 13/09/2022, a 1ª Turma Recursal Criminal da Cidade de Santos (SP), decidiu de ofício e incidentalmente a inconstitucionalidade do artigo 28 da Lei nº 11.343 de 2016 (Lei da Droga), que trata do porte de drogas para uso próprio, absolvendo um jovem que havia sido detido com 16 gramas de maconha, com fulcro no artigo 386, inciso III, do CPP, por não constituir essa situação uma infração penal.
No entendimento da Turma Recursal, a pouca quantidade de maconha, para uso próprio não configura crime, dispondo que, "A criminalização da conduta de portar droga para uso próprio, além de violar a autonomia e a autodeterminação do indivíduo, decorrências lógicas da dignidade humana, equivaleria a criminalizar a própria vítima", conforme justificativa do Desembargador-relator da Apelação, Juiz Gustavo Henrichs Favero.
No mesmo tom, os magistrados, Wilson Julio Zanluqui e Orlando Gonçalves de Castro Neto, seguiram o relator.
Em seu voto, constante de 20 laudas, o Juiz-Relator, Gustavo Favero, manifestou-se defendendo o entendimento no pertinente a atipicidade da posse e do porte de entorpecentes, para consumo próprio, rechaçando os argumentos de quem sustenta o inverso.
Ademais disso, de acordo com o relator, “a conduta atribuída ao usuário, carece de tipicidade material porque, ao contrário de que se difunde, o bem jurídico tutelado pelo artigo 28 da Lei nº 11.343, de 2006, é a ‘integridade física’ e não a ‘incolumidade pública’, diante da ausência de transcendência da conduta”.
Em seguida, o Juiz-Relator fez a citação dos artigos 3º, inciso I, e 5º, inciso X, que estabelecem como direito fundamental a liberdade da vida privada, bem como a impossibilidade de penalização da autolesão sem efeitos a terceiros, afirmando que, “Daí a razão pela qual não se pune criminalmente qualquer outra forma de autolesão, sendo como exemplo clássico o suicídio tentado”.
Em ato contínuo, o Relator votou pelo afastamento da alegação da corrente que defende a criminalização da conduta prevista no artigo 28 da Lei Antidroga, segundo a qual, o consumidor de drogas financia o tráfico, mencionando que, “O usuário de drogas não tem qualquer controle sobre o comportamento do traficante”.
Nos termos do acórdão, punir o dependente ou consumidor eventual com a justificativa de combater o tráfico, seria responsabilizá-lo pelo ato do verdadeiro culpado pela violação à saúde pública, no caso, o traficante, afirmando que, “Uma punição fundada na incapacidade do Estado de controlar o verdadeiro comportamento danoso”, frisou a decisão.
No pertinente a discriminação, concernente a utilização da lei, no sentido de “impor uma forma de pensamento”, o Juiz, relator do caso, criticou porque a legislação não pune a autolesão ou o consumo de drogas, salvante se referidas condutas atinjam ou possam atingir terceiros, como na hipótese de mutilação visando fraudar seguro ou no caso de direção de veículo automotor sob efeito de álcool, em concentração acima do admitido.
Em sua conclusão, o Relator Favero, admitiu que, “O Estado só age para evitar que a conduta de uma pessoa interfira na vida de outra, garantindo o exercício harmônico das liberdades humanas. (...). É arbitrária, portanto, a punição de alguém que apenas desejou ingerir algo, causando mal unicamente a si próprio”.
Assim sendo, o acórdão, ressalvando de que não se trata de apologia ou sequer aprovação ao uso de drogas, classificou de inadmissível a marginalização de pessoas em razão de hábitos condenados por parte da população. Porquanto, o acórdão fez menção ao artigo 3º, inciso IV, da Carta Fundamental vigente, que veda todas as formas de discriminação.
Finalizando, de acordo com a decisão, por ser o Direito Penal a última ratio do controle social, dirigido as condutas mais graves, esse direito não pode ser utilizado para proibir comportamentos praticados na esfera íntima da pessoa, sob pena de atentar contra a dignidade humana, a pluralidade, a intimidade e a isonomia previstas na Carta Magna de 1988.
Rebuscando-se, in concreto, o presente caso, policiais civis, no dia 18/12/2019, surpreenderam um jovem de 28 anos com um pequeno tablete de maconha, fato esse ocorrido em Guarujá (SP). Quando da abordagem o rapaz alegou que o entorpecente seria para o seu uso. O MP pediu a condenação do rapaz, pela prática do crime previsto no artigo 28 da Lei de Drogas.
Em seguida, o juiz Alexandre das Neves, do Juizado Especial Criminal de Guarujá (SP), condenou o réu à pena de prestação de serviços à comunidade pelo prazo de 3 (três) meses, afastando a hipótese de delito de bagatela, com o fundamento de que a pequena quantidade de maconha, apenas serve para afastar o tráfico, e nunca como excludente de ilicitude ou culpabilidade.
Na data de 29/11/2021 a sentença foi prolatada, enquanto que a defesa apelou pedindo a absolvição e, subsidiariamente, a aplicação de pena mais branda, com a advertência. Assim, quando declarou inconstitucional o artigo 28 da Lei de Droga e absolver o réu, a Turma Recursal ressalvou que a decisão se ateve ao aspecto jurídico, sem discutir a política de repressão às drogas adotada no País. (Processo n. 1526757-06.2019.8.26.0223).
No mesmo sentido, o Supremo Tribunal Federal (STF), quando julgou o RE nº 635.659-SP, em Repercussão Geral, interposto pelo Defensor Público-Geral do Estado de São Paulo, contra o Acórdão do Colégio Recursal do Juizado Especial Cível de Diadema (SP) que, por entender constitucional o artigo 28 da Lei nº 11.343, de 2006, manteve a condenação pela prática do crime de porte de drogas para consumo próprio.
Assim, neste recurso extraordinário, com fundamento no artigo 102, inciso III, alínea “a”, da CF/88, foi alegada a violação ao artigo 5º, inciso X, do mesmo Diploma Maior.
Em seguida, a parte recorrente argumentou que o crime (ou a infração) previsto no artigo 28 da Lei de Droga ofende ao princípio da intimidade e da vida privada, direito expressamente previsto no artigo 5º, inciso X, da CF/88 e, porquanto, o princípio da lesividade, valor basilar do Direito Penal (fls. 153).
Após observados os demais requisitos de admissibilidade do presente recurso extraordinário, passou-se à análise da existência de repercussão geral.
Assim, no caso, a presente controvérsia constitucional, cinge-se a determinar se o preceito constitucional invocado autoriza o legislador infraconstitucional a tipificar penalmente o uso de drogas para consumo pessoal.
De efeito, trata-se de discussão que alcança, certamente, grande número de interessados, sendo necessária a manifestação desta Corte para a pacificação da matéria.
Destarte, revela-se tema com manifesta relevância social e jurídica, que ultrapassa os interesses subjetivos da causa. Nesse sentido, entende configurada a repercussão geral da matéria constitucional.
Em decorrência de todas as controvérsias sob alegação de ineficiência da atual Lei de Drogas, pelo simples fato de não haver conseguido até então, a diminuição do crescimento e do avanço das drogas no País, tem-se verificado que no âmbito da sociedade essa discussão sobre a insuficiência da norma e de possíveis modificações que tem por esteio atingir o comportamento do usuário de drogas, tipificado na Lei nº 11.343 de 2016, além das medidas eficazes a serem adotadas pelo Estado brasileiro.
Diante desse debate, exsurge do Projeto de Lei nº 7.663, de 2010, de autoria do deputado federal e médico, Osmar Terra (MDB-RS), acrescentando e alterando dispositivos da Lei nº 11.343/16, para tratar do Sistema Nacional de Políticas sobre Drogas, dispondo sobre a obrigatoriedade da classificação das drogas; introduz circunstâncias qualificadoras dos crimes previstos nos artigos 33 usque 37; define as condições de atenção aos usuários ou dependentes de drogas e dá outras providências.
Vale ressaltar, a presença comprovada do antagonismo entre o anteprojeto de que a “Lei de Drogas: é preciso mudar” e o PL nº 7.663, de 2010, ficando demonstrado tratar-se de um tema bastante polêmico e controverso, no âmbito do próprio Poder Legislativo, no pertinente a forma legiferante de lidar com o questionamento das drogas.
É cediço que ambas proposições apresentaram modificações fundamentais na atual Lei Antidrogas. Porquanto que, a primeira traz em seu contexto medidas bem mais brandas, no pertinente ao usuário, enquanto que a segunda apresenta uma forma bem mais enérgica e dura aos infratores do artigo 28 da Lei nº 11.343, de 2006, inclusive prevendo a possibilidade de uma internação forçada, inadmissível pelo nosso atual ordenamento jurídico.
Destarte, diante dessas controvérsias, incumbe a população brasileira, por meio dos seus representantes eleitos, promover a escolha de conformidade com os estudos e resultados já atingidos, sobre a proposta que melhor venha se enquadrar com a realidade presente.
COMPETÊNCIA PARA LEGISLAR SOBRE DROGAS
Na data de 17/08/2023, quando o STF retomou o julgamento do processo onde está sendo discutido a descriminalização do porte de drogas para consumo próprio, senadores e especialistas, por unanimidades, passaram a defender que o Congresso Nacional é o único competente Poder da República, legítimo e responsável para promover mudanças na Lei de Drogas no País (Lei nº 11.343/2006).
De efeito, esse tema foi tomado em sessão no Plenário do Senado Federal, coincidentemente, na mesma data em que o STF retomou o julgamento sobre a mesma temática quando, evidenciou-se as manifestações contrárias aos votos já prolatados pelos membros da Corte até aquele momento.
Em decorrência do precitado fato, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, que já havia sido contrário a discussão sobre o tema drogas pelo STF, afirmou que “o assunto é complexo, transversal e qualquer mudança na legislação deve ser liderada pelo Legislativo, único lugar próprio e com legitimidade para o tratamento jurídico do tema”. De acordo com o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, o Congresso reúne a competência para ouvir todos os Poderes e a sociedade civil.
Ademais disso, diz que devem ser ouvidos os representantes do setor de saúde, da área jurídica, de comunidades terapêuticas e tantos quantos seja necessário. Assim sendo, as duas Casas do Congresso Nacional, os efetivos representantes da população e das unidades da Federação, podem e devem participar ativamente desse debate, que não se restringe a um único Poder, tampouco ao Poder Judiciário. A participação deve ser de todos os Poderes, de toda a sociedade, sob a liderança do Parlamento, não podendo haver nenhum tipo de restrição de foro de discussão, que não permita uma amplitude desse debate com a sociedade brasileira.
No pertinente ao requerimento para a realização do debate, este foi de iniciativa do senador, Efraim Filho (União-PB), que ratificou às críticas do presidente do Senado, onde o autor do requerimento avaliou que, “o tema exige coragem e lucidez do Congresso para que suas competências não sejam atropeladas por outro Poder. Ademais, o senador se manifestou sobre o aspecto técnico, pois, segundo ele, deve ser levado em consideração além da quantidade de drogas apreendida, além da manutenção da equiparação entre o tráfico de entorpecentes e crimes hediondos e a complexidade de se definir um critério objetivo para diferenciar consumidor e traficante”.
Ainda questionando, o parlamentar afirmou que, “Fica uma pergunta: como descriminalizar o consumo se, ao mesmo tempo, a produção e a distribuição das drogas seguem sendo crimes? Vejam a complexidade da matéria. A Constituição de 1988 equipara o tráfico de entorpecentes ao crime hediondo. E continuamos perguntando: apenas a quantidade de drogas seria suficiente para determinar a diferenciação entre o usuário e o traficante? E se o traficante começar a comercializar pequenas quantidades de droga dentro do limite do tal "uso pessoal", sobre o qual o STF se dispõe a fixar esse entendimento?”
No mesmo entendimento, manifesta-se o promotor de Justiça do MP do TJDFT, José Theodoro Corrêa de Carvalho, alertando que, durante toda a sua atuação no Judiciário, tem observado que os traficantes usam estratégias para não serem flagrados e presos, limitando-se ao transporte de pequena quantidade de droga para evitar problemas maiores com a polícia e a Justiça. Para ele, a decisão do STF é um equívoco pois não considera que a fixação de uma quantidade mínima seja suficiente para distinguir traficantes de usuários e assim resolver a questão do alto índice de encarceramento no Brasil.
E, continuou,
“É comum que eles tragam poucas drogas consigo e tenham estoques ou divisão de tarefas para que eles evitem um problema maior com a polícia e com a Justiça. Então, a fixação em critérios objetivos para definir qual seria o enquadramento entre usuário e traficante também me parece um equívoco. É normal que nós tenhamos situações de traficantes flagrados com um único grama de uma substância ilícita e que tenhamos provas cabais de que eles estavam ali vendendo aquele único grama”.
Neste tom, o senador Sérgio Moro (União-PR), ratificou as palavras do promotor, afirmando que, “atualmente o tráfico se constitui em uma cadeia muito organizada que consegue se adaptar a essas alterações, como a que vem sendo ventilada pelo STF. Moro defendeu que outros indícios sejam levados em consideração para diferenciar traficante e consumidor, além do critério de quantidade de droga para o porte”. Quando se estabelece um parâmetro absoluto: "Olhe, abaixo de 60 gramas vai ser consumidor, acima pode ser traficante", é um grande risco de as operações serem estruturadas no varejo, no distribuidor pequeno dessa maneira, para evitar responsabilização. Será que é sábio estabelecer um parâmetro fixo?”
EXPERIÊNCIA DE OUTROS PAÍSES
Ressalte-se que o deputado Osmar Terra (MDB-RS), que já vem promovendo essa discussão há mais de 20 anos, fez um alerta relacionado aos efeitos do consumo de drogas no Brasil e o risco que a descriminalização pode ampliar a dependência e o comprometimento da saúde da sociedade brasileira, além do fortalecimento do crime organizado no Brasil. É preciso se espelhar nas experiências de outros países, que vieram a afrouxar a legislação. São registrados aumento do tráfico, da dependência química e da violência, afirmando que, “O tráfico nunca esteve tão forte como está agora, 10 anos depois no Uruguai. O Uruguai está tendo chacinas, 14 pessoas foram mortas há duas semanas. No Uruguai, triplicou o número de homicídios porque os traficantes se transferiram para lá; é liberado, é uma coisa em que pegam leve. São 1,2 mil farmácias no Uruguai, e só 20 estão vendendo a maconha, o que é o permitido. Na esquina, está o traficante vendendo mais barato e mais potente a droga, e vendendo as outras junto”.
Segundo o presidente da Associação Brasileira de Psiquiatria, Antônio Geraldo da Silva, disse que, uma possível facilitação no acesso a entorpecentes pode agravar a situação do Brasil, que já registra cerca de 70 milhões de pessoas com algum transtorno mental, enquanto 11,3% da população sofre com sintomas depressivos, alertando que, “Sabe qual é a quantidade prevista que é segura para o consumo da maconha? Zero! Não há quantidade prevista de segurança do uso. Se há que banir uma droga da face da Terra, é a maconha. Então, a gente tem que diminuir é a produção. Nós temos que diminuir a possibilidade de distribuição. Nós conseguimos fazer isso com o antibiótico. Nós podemos conseguir fazer isso com todas as drogas”.
ATIVISTAS A FAVOR DA DESCRIMINALIZAÇÃO
De acordo com o entendimento do coordenador da Unidade de Pesquisa em Álcool e Drogas da Universidade Federal de São Paulo, Ronaldo Laranjeira, a mobilização de ativistas a favor da descriminalização das drogas contaminou a discussão no STF. Assim sendo, os primeiros votos já proferidos até o momento estão em descompassos com as opiniões das famílias brasileiras sobre o assunto e também com a ciência. Sem seguida, mencionou uma pesquisa coordenada por ele junto a famílias brasileiras, segundo a qual, 85% dos entrevistados são contrários a qualquer liberalização de entorpecentes. No mesmo tom, os senadores Marcos Rogério (PL-RO) e Jorge Seif (PL-SC) também tiveram a mesma visão.
Na oportunidade, o senador Marcos Rogério, afirmou que, “A Constituição vai determinar que todo poder emana do povo que o exerce por meio dos seus representantes legítimos, legitimamente eleitos. Portanto, o poder originário, central, absoluto está com o povo. E a delegação para a representação, para o exercício desse poder, está dentro desta Casa, do Congresso Nacional, Senado e Câmara”.
Em outra monta, os senadores Esperidião Amin (PP-SC) e Cleitinho (Republicanos-MG) chegaram a defender a realização de um plebiscito sobre o tema. Na oportunidade, o senador Amin, afirmou que, “Eu não tenho dúvida de que mais de 80% da sociedade brasileira não aprova medidas de liberação, especialmente porque nós não temos condições de controlar essas medidas sofisticadas de micro peso. Por isso eu acho que é oportuno que nós deliberemos, e acho que é necessário que o que for decidido ou que venha a ser decidido seja submetido à consulta popular sob a forma de plebiscito. Plebiscito é uma consulta que se faz previamente, ou sob a forma de referendo, que, como o nome diz, significa aprovação da sociedade para aquilo que nós acharmos que é o certo”.
Neste mesmo sentido, os senadores Zequinha Marinho (Podemos-PA), Magno Malta (PL-ES) e Eduardo Girão (Novo-CE), passaram a criticar a postura do STF, entendendo eles que a Corte está “degradando uma geração e comprometendo o futuro do país”, uma vez que, o país não possui políticas públicas e programas para lidara com as consequências da descriminalização. Em seguida, o senador Magno Malta, afirmou que, “Caso o STF julgue pela legislação do porte de maconha, o congresso terá que reverter essa posição. Não vamos entrar no mérito, o mérito que haver é o seguinte: em se exacerbando lá, nós tenhamos a competência de criar algo aqui o instrumento que anula aquilo que vai se decidir do lado de lá”.
PAÍSES QUE DESCRIMINARAM AS DROGAS
No pertinente a América do Sul, o primeiro a ser destacado foi o Paraguai que, a partir de 1988, o uso pessoal de drogas não é crime. No pertinente a Maconha a quantidade máxima para ser considerado o uso pessoal é de 10 gramas, e no caso da Cocaína é de 2 gramas.
Em segundo lugar a Colômbia, que a partir de 1994, já estabelecia que, quem carrega drogas para uso pessoal não pode ser preso. Em seguida, ocorreu um revés em 2009, mas em 2011 a decisão anterior voltou a vigorar, fixando a quantidade em 20 gramas de cannabis como admitida e para a cocaína em 1 grama. No ano de 2014, a droga foi aprovada para os fins medicinais.
Em segundo lugar o Peru no ano de 2003, embora o porte de drogas já era admitido há mais de 10 anos. Contudo, a polícia tem o costume de prender os consumidores de drogas, até que a Justiça decida em torno da quantidade da droga, no pertinente a caracterização do tráfico ou não.
Em terceiro o Chile no ano de 2007, e após 8 anos da descriminalização, o governo determinou que a quantidade máxima permitida de maconha é de 10 gramas. Enquanto que o cultivo pode ser de até 6 plantas. Em Santiago, capital do país, existem várias lojas de acessórios, para quem cultiva a planta em casa.
Em quarto lugar a Argentina em 2009, onde o governo admite o porte de pequenas quantidades, para consumo próprio, mas somente em lugares privados. O grande problema é que muitas pessoas são enquadradas como traficantes, mesmo portando pequenas quantidades de drogas. Mas, nas bancas do país vendem revistas que tratam da cultura da canábica.
Na Bolívia e Venezuela, o porte da droga para uso pessoal não é crime, no entanto, a pessoa está sujeita a ser encaminhada para internação e tratamento.
Em quinto lugar o Equador que, a partir de 2013, uso pessoal não é considerado crime. No caso da maconha, a quantidade máxima é de 10 gramas para configurar a utilização pessoal, enquanto que de cocaína é 2 gramas.
No sexto lugar o Uruguai, onde o então presidente, José Mujica, no ano de 2013, tornou o Uruguai o único a regulamentar todo o ciclo de consumo da maconha, deixando-o sob o controle do Estado. Assim, os maiores de 18 anos podem adquirir e cultivar a erva de forma legal e mediante cadastro. Ademais, vale dizer que desde o ano de 1973 outras drogas já haviam sido descriminalizadas.
NA AMÉRICA DO NORTE E CENTRAL
Nos Estados Unidos, a partir de 2012, a política sobre drogas vem mudando de conformidade com o Estado. Nos Estado do Colorado, Washington, Washington, Oregon e Alasca, inclusive Washington (DC), a capital do país, já ocorreram as legalizações do consumo recreativo de maconha, enquanto que para as demais regiões, a maconha é autorizada só para fins medicinais.
Em Costa Rica, de acordo com a legislação, considera a maconha ilegal, mas na prática, quem for pego com quantidade considerada de uso pessoal não pode ser preso.
Na Jamaica, o país de Bob Marley, no início de 2015, o porte de até 55 gramas de maconha, para uso pessoal e o plantio de até 5 mudas, foram autorizados.
No México, a partir de 2009, o porte de até 5 gramas de maconha; de meio grama de cocaína; 50 miligramas de heroína ou uma drágea de ecstasy, são considerados de uso pessoal, sendo incabível a prisão. Contudo, após a ocorrência de 3 (três) apreensões, o usuário é obrigado a se submeter a tratamento, senão deverá ser processado.
NA EUROPA
Na Holanda, por ser considerado um dos países pioneiros na tolerância ao uso pessoal de drogas, é famosa pelo Coffee Shops, onde a venda da maconha é admitida. Assim, o porte de até 5 gramas e o cultivo de até 5 pés de maconha, também são aceitos, até em consumo público. Esse país é famoso também pela política de redução de danos, com o fornecimento de seringas descartáveis a viciados, em pontos determinados. No ano de 2023, os turistas não podiam entrar nos Coffee Shops, porém a proibição foi afastada.
PORTUGAL
Ao término da ditadura em Portugal, as drogas ingressaram com toda a força na década de 70, quiçá porque fosse um país isolado, reprimido, muito pouco atraente para o turismo na época. Assim com a entrada dos entorpecentes, juntamente com a liberdade para criar uma real crise social. Segundo, João Goulão, diretor do Serviço de Intervenção de Comportamentos Aditivos e Dependências (SICAD), “Não havia família sem algum viciado”.
Em seguida, os governos Democráticos tentaram resolver esse problema, por meio da mão dura, ou seja, tolerância zero com os traficantes e com os consumidores, sobre os quais pesava o sistema penal, caso fossem pegos em flagrante. Contudo, a situação cada dia piorava mais, uma vez que, o consumo crescia em igual ritmo das doenças infecciosas e da superlotação dos presídios, isto até abril de 1999.
Passados 20 anos, Portugal deu uma guinada em suas políticas, tornando-se um país de referência mundial, quando o governo aprovou uma nova estratégia, que seria implementada dois anos depois, após longos debates com a sociedade civil e no Parlamento. A legislação estava longe de ser considerada revolucionária: descriminalizar o consumo dos que portassem no máximo 10 doses de determinada substância ilícita, diferentemente do que ocorre na Espanha. Porém, o que fez diferençar foi mudança de sensibilidade com relação aos viciados, que deixaram de ser tratados como criminosos, que passaram a receber programas de cuidados, por meio da substituição de heroína por metadona e foram inseridos no sistema de saúde para o tratamento de suas doenças.
Destarte, os resultados foram imediatos, embora o consumo global de drogas não haver diminuído. Nos casos de heroína e cocaína, as duas drogas mais problemáticas, passou a afetar 1% da população portuguesa para 0,3%. Por outro lado, as contaminações por HIV entre os consumidores caíram pela metade, ou seja, na população total, passaram de 104 novos casos por milhão ao ano em 1999, para 4,2 em 2015, enquanto que a população carcerária em razão dos motivos relacionados às drogas caiu de 75% a 45%, de acordo com a Agência Piaget para o Desenvolvimento (APDES).
De efeito, José Queiroz, diretor da APDES, define essa política como “Uma abordagem humanista que não julga, baseando-se na confiança e no relacionamento com as pessoas. A lei criada estabeleceu as bases, porém de pouco teria servido caso não tivesse sido acompanhada de medidas sociais e de recursos destinados a serviços, a exemplo da redução de danos, ou seja, a de mitigar na medida do possível as consequências negativas das drogas, de uma perspectiva que não se baseia na perseguição, mas na informação, no atendimento médico e nos serviços aos dependentes, sendo os mais frequentes são os de oferecer material esterilizado para aqueles que injetam; metadona para aqueles que procuram abandonara o vício em heroína; espaços de consumo supervisionado, conhecidos também por naco-salas ou de conformidade com a tendência mais recente e progressista, de centros onde se possa examinar as substâncias, a fim de que os usuários saibam exatamente o que estão colocando no corpo.
Porquanto, cada vez mais países, por meio de ONGs, estão oferecendo esses serviços em lugares de lazer, como festivais de música e aos poucos abrindo sedes fixas, com já acontecem em Portugal, na Holanda e na Suíça.
Releva dizer que, há ampla literatura científica demonstrando como esse tipo de política reduz a morte por overdose e melhora a saúde dos consumidores, em especial as taxas de HIV, que caem automaticamente onde essas políticas são implementadas, a exemplo do vírus da Aids, que vem caindo em todo o mundo. Porém continua aumentando particularmente nos países do Leste da Europa, onde a maioria das soluções de redução de danos é proibida. Assim, uma em cada oito pessoas que injeta drogas no mundo é soropositiva e apenas 1% vive em um país em que essas políticas são aplicadas, conforme a Harm Reduction International.
No pertinente a algumas pesquisas apontam a inserção da segurança do cidadão, nos lugares em que são adotadas medidas mais avançadas quanto as drogas, são aumentadas, como veio a acontecer em Vancouver desde que abriu uma narco-sala. Contudo, a ideologia nem sempre é alinhadas as evidências, ou seja, os países mais conservadores continuam a restringi-las, inclusive perseguindo os viciados, com está acontecendo na Rússia e nas Filipinas.
RELATÓRIO MUNDIAL SOBRE DROGAS 2022
De acordo com o lançamento datado de 27/06/2022, do Relatório Mundial sobre Drogas, originado do Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC), em torno da legalização da cannabis sativa Lineu (Maconha) em algumas partes do mundo, tem tendência a indicar um aumento do uso e dos impactos relacionados à saúde. O citado relatório, disponível na língua inglesa, revela também um aumento recorde na fabricação de cocaína, expansão de drogas sintéticas para novos mercados e lacuna contínuas na disponibilização de tratamentos para usuários de drogas, mormente para as mulheres.
Nos termos do relatório, em torno de 284 milhões de pessoas, na faixa entre 15 e 64 anos utilizam drogas em 2020, significando 26% a mais no período de 10 anos pretérito. Consta que os jovens estão utilizando drogas, cujos níveis de uso em diversos países, superiores aos da geração passada.
Na África e na América Latina, os indivíduos com menos de 35 anos, representam a maioria das pessoas em tratamento, em face dos transtornos associados ao uso de drogas.
No geral, o relatório faz uma estimação de que 11,2 milhões de pessoas no mundo estavam injetando drogas durante o ano de 2020, e cerca da metade deste número sobrevive com hepatite C, e 1,4 milhões sobrevive com HIV, enquanto 1,2 milhões vivem com ambos.
A diretora-executiva do UNODC, Ghada Waly, quando comentava sobre esse relatório, afirmou que, emergências globais com a da COVID-19, aumentaram as vulnerabilidades e não impediram que as estatísticas de apreensão e fabricação de muitas drogas ilícitas atingissem níveis recordes: “ao mesmo tempo, as percepções errôneas sobre a magnitude do problema e os danos associados estão privando as pessoas de cuidados e tratamento e levando os jovens a comportamento prejudiciais. Precisamos destinar recursos e atenção necessários para abordar todos os aspectos do problema mundial das drogas, incluindo o fornecimento de cuidados baseados em evidências a todos os que deles necessitam, e precisamos melhorar a base de conhecimentos sobre a relação das drogas ilícitas com outros desafios urgentes, tais como conflitos e degradação ambiental”.
Ademais disso, o relatório enfatiza a importância de mobilizar a comunidade internacional, os governos, a sociedade civil e as partes interessadas a tomarem medidas urgentes para proteger as pessoas, inclusive fortalecendo a prevenção ao uso de drogas e o tratamento por meio da oferta de drogas ilícitas.
No que diz respeito a Maconha, na América do Norte a legalização da Cannabis Sativa Lineu, tudo indica ter provocado aumento no uso diário da erva, sobretudo de produtos mais potentes e principalmente entre os jovens adultos. Ademais foram relatados aumentos atinentes a pessoas com distúrbios psiquiátricos, suicídios e hospitalizações. No mesmo sentido, a legislação aumentou a receita tributária e, no geral, houve redução das prisões pela posse da substância ilícita.
Quanto ao tráfico de drogas, a produção de cocaína bateu um novo recorde, com o crescimento na taxa de 11% no ano de 2019, atingindo em torno de 1.982 toneladas no ano de 2020. Com relação as apreensões de cocaína também cresceram para um recorde de 1.424 toneladas, também em 2020. Em 2021, quase 90% da cocaína apreendida globalmente foi traficada em contêineres e/ou por via marítima. Assim sendo, os dados das apreensões sugerem que o tráfico de cocaína vem se expandindo para outras regiões, fora dos principais mercados da América do Norte e Europa, com o crescimento dos níveis de tráfico direcionado à África e Ásia.
No período de 2016 a 2020, o tráfico de metanfetaminas permanece em sua expansão geograficamente, tendo 117 países relatado sobre apreensões de metanfetaminas, contra 84 países no período de 2006 a 2010, enquanto isso as quantidades de metanfetaminas apreendidas quintuplicaram no período d 2010 a 2020.
No pertinente ao ópio, a produção mundial cresceu 7% no período de 2020 a 2021 para 7.930 toneladas, predominando devido a um aumento da produção no Afeganistão. No entanto, neste mesmo período, a área mundial de cultivo da papoila ou papoula do ópio decresceu de 16% para 246,8 mil hectares.
Quando as tendências regionais, em muitos países da África e da América do Sul e Central, a maioria dos usuários que estão em tratamento por uso de drogas é devido a transtornos associados ao uso da maconha. No leste e sudeste Europeu e na Ásia Central, os opioides são responsáveis pelo maior número de pessoas que estão recebendo atendimento médico em face dos transtornos associados.
Com relação as mortes por overdose, nos Estados Unidos e no Canadá, predominam em razão de uma epidemia pelo uso não medicinal de Fentanil, que continuam a bater recordes. Assim, estimativas preliminares nos Estados Unidos apontam para mais de 107 mil mortes por overdose de drogas no ano de 2021, contra quase 92 mil em 2020.
No que diz respeito as apreensões, nos dois maiores mercados de metanfetaminas, as apreensões têm crescido, aumentando 7% na América do Norte, em comparação com o ano pretérito, enquanto no sudeste Asiático cresceu 30% em relação anterior. Ademais, foi relatado o aumento de 50% no ano de 2020 em relação ao ano de 2019 de apreensões de metanfetaminas no sudoeste Asiático. Isso revela uma grande desigualdade que permanece na disponibilidade de opioides farmacêuticos para fins de consumo medicinal.
No ano de 2020, na América do Norte, para cada um milhão de habitantes, havia 7,5 mil doses a mais de medicamentos para o controle da dor do que a quantidade disponível, para esta mesma população na África Ocidental e Central.
Com relação as Zonas de Conflito, o relatório destaca que as economias de drogas ilícitas podem florescer em situações de conflitos e onde o Estado de Direito é fraco e, destarte, pode prolongar ou alimentar conflitos.
Segundo as informações do Oriente Médio e do Sudeste Asiático, tendem a demonstrar que situações de conflito podem atuar como um imã para a fabricação de drogas sintéticas que, na realidade, podem ser produzidas em qualquer lugar. Assim, uma consequência que pode ser ainda mais importante, quando a zona de conflito está próxima dos mercados consumidores.
De acordo com a história, as partes em conflito têm utilizado de drogas para financiar os conflitos e gerar renda. Assim, o Relatório Mundial sobre Drogas 2022, revela também que os conflitos podem interromper e modificar as rotas do tráfico de drogas, como ocorreu na região dos Balcãs e, bem mais recente, na Ucrânia.
Na Ucrânia, deu-se um significativo crescimento no número de laboratórios de anfetaminas. Em 2020, foram desativados 79, em comparação com 17 no ano de 2019, sendo que 67 desses laboratórios estavam produzindo anfetaminas, em comparação com 5 no ano de 2019. Significa que, este é o maior número de laboratórios desativados relatado em um determinado país em 2020.
No que pertine aos Impactos Ambientais, de conformidade com o relatório, os mercados de drogas ilícitas podem ter impactos locais, comunitários ou individuais sobre o meio ambiente. Dentre as principais descobertas indicam que a emissão de carbono relativo ao cultivo da maconha interna é em média 16 a 100 vezes maior que a do cultivo da maconha externa, e que a emissão de 1 kg de cocaína é 30 vezes maior que a das amêndoas de cacau.
Com relação ao cultivo ilegal da coca, há outros impactos ambientais que apontam para o desmatamento substancial associado ao cultivo ilegal da coca, onde resíduos são gerados durante a fabricação de drogas sintéticas que podem ser 5-30 vezes o volume do produto final, enquanto que o despejo de resíduo podem afetar diretamente o solo, a água e o ar, além organismos, animais e a cadeia alimentar de forma indireta.
Quando ao gênero, há o apontamento de que as mulheres permanecem como a minoria dos usuários de drogas em todo o mundo, contudo há uma tendência de aumentar sua taxa de consumo de drogas e a progredir mais rapidamente do que os homens, com relação aos transtornos associados ao uso de drogas. Atualmente, as mulheres representam em torno de 45-49% dos usuários de anfetaminas e dos usuários não medicinais de estimulantes farmacêuticos, opioides farmacêuticos, sedativos e tranquilizantes.
Porquanto, a lacuna de tratamento continua sendo grande para as mulheres em todo o mundo, embora as mulheres representem quase um em cada dos usuários de anfetaminas, elas são apenas uma em cada cinco pessoas em tratamento de transtornos associados ao uso de anfetaminas.
Ademais disso, o Relatório Mundial sobre Drogas 2020, destaca a ampla gama de papeis desempenhados pelas mulheres na economia global da cocaína, incluindo o cultivo de coca, o transporte de pequenas quantidades de drogas, a venda aos consumidores e o contrabando para as prisões.
Em suma, o Relatório fornece uma visão global da oferta e demanda de opiáceos, cocaína, maconha, estimulantes do tipo anfetamina e novas substâncias psicoativas (NPS), assim como o seu impacto sobre a saúde. Quando a disponibilidade do Relatório Mundial sobre Drogas está em: https://www.unodc.org/unodc/data-and-analysis/world-drug-report-2022.html.
CONSEQUÊNCIAS PELO USO DAS DROGAS
Vislumbra-se que para a contenção dos efeitos nefastos das drogas, precisa-se ter o entendimento dos riscos e as consequências dos efeitos das drogas, mormente sobre a saúde mental e físicas dos indivíduos. Ademais, pela presença dos danos ao organismo do usuário, a utilização de substâncias ilícitas gera verdadeiros impactos sociais e econômicos em grande escala.
Neste sentido, apresentar-se-á na oportunidade um resumo sobre o uso de drogas no Brasil, com destaque sobre os efeitos que tais substâncias provocam no organismo e por que esse fato necessita de urgentes intervenções.
Assim sendo, perquire-se quais as drogas mais consumidas pelos brasileiros? A resposta são a maconha, a cocaína e o esctasy (uma droga classificada com psicoativa alucinógena, conhecida popularmente com a “droga do amor”, uma vez que aumenta a percepção de cores e sons, além de ampliar o sentido do tato durante o sexo), onde são consumidas, mormente, nas regiões sul e sudeste, líderes dessa prática ilícita.
Assim, em razão da fácil disponibilidade dessas substâncias, contribui para impulsionar o consumo e, destarte, o surgimento de novos adeptos, principalmente os adolescentes e jovens, que se inserem no prejudicial submundo das drogas.
É cediço que atualmente no Brasil estamos passando por interferências no poder de legislar sobre as drogas, embora se tenha notícias de que existem projetos para combater o narcotráfico no Congresso Nacional, contudo, essas políticas estão sofrendo interferências de interessados, inclusive de outros países latino-americanos, cuja economia depende basicamente do comércio ilegal dessas drogas.
O grande problema do Brasil está em sua localização geográfica, favorecendo o mercado em decorrência da fronteira com a Colômbia e a Bolívia, conhecidos como grandes produtores de cocaína e ópio. Em razão desse fato, o Brasil passou a ser um centro distribuidor e exportador desses produtos ilícitos, contribuindo para elevar o consumo em toda a América Latina.
No pertinente aos tipos de drogas, cujo uso e o trafica são considerados os principais e atuais problemas na sociedade contemporânea, principalmente porque os fabricantes estão cada vez mais preparados, por meio da composição das drogas, com a sintetização de novas substancias muito mais prejudiciais à saúde, assim sendo, os principais e mais comuns tipos de drogas são: a maconha, a cocaína, o ecstasy, a heroína, o crack e o álcool.
Com relação a Maconha, no ano de 2016, o Relatório Mundial sobre Drogas, divulgado pelo Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crimes (UNODOC), conforme acima relatado, a maconha foi a drogas mais consumida no mundo. Enquanto que no Brasil, segundo dados divulgados na mídia, há confirmação de que 1,5 milhões de brasileiros consomem maconha diariamente, e que os grupos mais expostos são os adolescentes e jovens, como os maiores usuários.
No que diz respeito a Cocaína, de acordo com os dados fornecidos pelo Observatório Brasileiro de Informações sobre Drogas (OBID), em torno de 5% dos óbitos atinentes às drogas aconteceram pelo uso de cocaína. Quanto aos efeitos graves da cocaína, são destacados pelas lesões cerebrais; a perda da sensibilidade das mucosas nasais, e a destruição dos dentes que vem a ocorrer, quando a droga é esfregada nos dentes ou nas gengivas, de imediato há uma reação química entre a cocaína e a saliva, constituindo a formação de um ácido que destrói o esmalte dos dentes, deixando-os enfraquecidos e quebradiços.
Tratando-se do Ecstasy, substância essa muito usada em festas raves ou em encontros de universitários, que faz parte do grupo de drogas sintéticas e que são consumidas oralmente. Seus efeitos, provocam alterações cerebrais em minutos, causando uma falsa sensação de felicidade, de euforia e no aumento da libido.
Quanto a Heroína, que é derivada do ópio e sintetizada a partir da morfina. No que diz respeito ao seu uso é injetável e seus efeitos são imediatos, uma vez que o cérebro a absolve rapidamente. Ademais, essas drogas opiáceas costumam a alterar o funcionamento do sistema digestivo e do sistema nervoso central, além de provocar tonturas, náuseas e alucinações em demasia.
No pertinente ao Crack, conhecido como o lixo da cocaína, é uma droga que vicia muito rapidamente e rapidamente seu efeito desaparece. Quando do seu uso, a fumaça atinge facilmente os pulmões e deste para o cérebro, ocasionando efeitos de euforia e falsa coragem. Assim, quando atinge as regiões cerebrais, o crack vem a provocar a destruição dos neurônios, podendo ocasionar graves lesões. De acordo com uma pesquisa da Universidade Federal de São Paulo, o Brasil vem a ocupar o 1º lugar no ranking de consumo de crack no mundo. Essa droga é de grande aceitação, tendo em vista o seu irrisório preço. Porquanto, em face da sua fácil disponibilidade, a droga é bastante comum entre moradores de ruas, além de adolescentes e jovens.
E, finalmente, o Álcool, cujos efeitos sobre o organismo humano, pode causar graves sequelas ou lesões irreversíveis, mormente no fígado e nas áreas cerebrais, responsáveis pelo controle da motricidade. Ademais, o vício do álcool pode afetar a memória, a capacidade de raciocínio e de concentração.
De acordo com o IBGE, mais de 50% dos estudantes do 9º ano já ingeriram bebida alcoólica e destes 21,4% noticiam que já se embriagaram uma vez na vida. Esses dados são recentes e alertam para o envolvimento precoce com o alcoolismo.
No pertinente ao acesso fácil das drogas ilícitas, no ano pretérito, foram divulgadas estatísticas com base no Relatório Mundial sobre Drogas, alertando sobre a grande dificuldade que as autoridades têm de controlar o tráfico, uma vez que um dos fatores que mais dificultam o controle é a facilidade do acesso a essas substâncias.
De acordo com os especialistas, existe uma grande expansão, resultante da impulsão pela oferta desses produtos no mercado ilícito, assim com vem a ocorrer na produção de drogas sintéticas, na fabricação do ópio e da cocaína, que está em nível cada vez mais alto. Assim, a difusão do consumo vem ampliando o mercado de cocaína, de anfetaminas e de metanfetaminas, para regiões além das que comumente são exploradas. Ademais, o tráfico de drogas se utiliza das facilidades do mercado darknet para promover o consumo, através das vendas online.
Vale ressaltar que, esse relatório mundial enfatiza o impacto das consequências das drogas, sobre as camadas populares e mais vulneráveis da sociedade. Neste sentido, como ora ocorre nos países desenvolvidos, no terceiro mundo, os indivíduos mais pobres são os que sofrem os piores efeitos das drogas psicoativas. Assim sendo, os dados desse relatório demonstram que o uso de drogas é bem maior entre jovens de 18 a 25 anos. Enquanto que, para os que estão na fase de crescimento, o impacto vem a ser muito mais prejudicial, uma vez que, o lobo frontal, área responsável pela conduta, ainda está em formação.
Com relação aos fatores de risco para o uso de drogas, leva-se em consideração aos fatores que vêm a influenciar os adolescentes e jovens, tornando-se propensos ao consumo de substância ilícitas, nada mais é do que o histórico de traumas ou de abuso na infância. Assim, as crianças que sofreram maus tratos, por negligências dos seus pais, ou que passaram por uma vida muito difícil, têm a tendência de absolver esses traumas e tornarem-se revoltadas.
Na ocorrência de distúrbios mentais, presente está a instabilidade psíquica, considerada um dos problemas que motivam as pessoas a procurarem drogas, principalmente os indivíduos em situação social vulnerável, com ocorre com os moradores de rua, cuja tendência é buscar o alívio dos seus sofrimentos nessas substâncias ilícitas.
Por outro lado, dentre as classes privilegiadas há pessoas com doenças mentais ou emocionais, que recorrem ao abuso de entorpecentes. Ressalte-se a presença de maior perigo está na associação entre drogas e as doenças mentais, podendo gerar um ciclo vicioso, ou seja, a doença é apontada como causa e também como consequência pelo uso das drogas na vida de ambos indivíduos.
Um outro fato importante é o estado de pobreza, cujo livre acesso às drogas ocorre em todos os lugares, expondo a sociedade ao risco dos impactos negativos ocasionados por esse problema. Porquanto, nessas regiões habitadas por pessoas vulneráveis, a disseminação desse vício é bem maior, além das motivações de ordem estrutural, a exemplos da fome, do desemprego e a carência de estrutura familiar, também, contribuem para degenerar a situação.
Ademais disso, o desequilíbrio emocional vem a estimular a adesão ao vício, cuja situação pode gerar quadros de violência e de agressividade.
No que pertine a utilização de drogas por colegas, é um outro fator de motivação para o consumo da droga, em vista da convivência com pessoas ou grupos de usuários, pois, em face de jovens e adultos residirem nas proximidades de locais de acesso a droga ou convivem com pessoas viciadas, tornam-se vulneráveis ao vício.
Com pertinência aos filhos de usuários de drogas, que são afetadas pelo uso de substâncias ilícitas pelos genitores, têm enorme grande tendência a adquirir elevada tensão emocional, além de outros sintomas prejudiciais, onde elas acabam envolvendo-se de forma precoce com as drogas. Ademais, a maior parte dos filhos de usuários, chegam a apresentar comprometimento cognitivo, inclusive no desenvolvimento motor e físico, e ainda, são susceptíveis a doenças respiratórias, como a asma e a bronquite, além de reações alérgicas ou quadros de intolerância alimentar.
De efeito, esses filhos usuários mergulham no submundo das drogas, em face de suas negligências e falta com a educação dos filhos, resultando em diversos problemas ao longo da vida, de quem cresceu nesses ambientes hostis.
Quando da infância, esses filhos apresentam irritabilidade, agressividade e déficit de atenção, e também são mais propensos aos desvios de comportamento e têm muita dificuldade de aprendizado. Com a chegada da adolescência, surge o transtorno de hiperatividade e com alguns aspectos característicos da personalidade antissocial que costumam ser comuns. Quando adultos, vem a instabilidade emocional, doenças como depressão, a síndrome do pânico e a esquizofrenia.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Conclui-se que com a aprovação da descriminação das drogas, fica estabelecida a certeza do aumento compulsivo de usuários de drogas, na mesma proporção de crescimento dos traficantes e passadores de drogas. Assim, diante dessa liberdade deliberada, certamente não haverá restrição tão somente da maconha, mas também da cocaína e suas substâncias derivadas (lixos), além de outras drogas afins.
No pertinente a competência atributiva de conhecer as questões das drogas, não há o que perquirir de modo contrário, uma vez que, compete absolutamente ao Poder Legislativo, por meio do Congresso Nacional, de legislar sobre as drogas, nos termos do artigo 22, inciso I, da CF/88, mormente quando a tese reza sobre a descriminação do porte da maconha, para uso pessoal, pelo aborto e demais condutas que devem ser pautadas pelo debate público. Assim, vislumbra-se que, pela descriminação do uso da maconha, exsurge uma porta aberta para o ingresso de outras drogas, o crescimento desenfreado do tráfico, uma vez que em nosso país não há cultivo da droga e, tampouco, admitido.
Contudo, a exemplo de tudo que foi em alhures comentado, chega-se à conclusão de que o Brasil, no presente momento, não dispõe de nenhum planejamento, principalmente de estrutura hospitalar e financeira, para viabilizar o consequente tratamento dos dependentes de drogas, uma vez que, os gastos com as drogas oneram pode demais os cofres públicos, além gerarem enorme prejuízo com tratamentos visando a recuperação dos viciados ou mesmo como a comorbidades associadas à dependência.
Releva afirmar que, dados atuais apontam que os gastos do SUS, com usuários de drogas, já passaram dos R$ 9 bilhões de reais
Dispõe a história dos países que aderiram a posse para uso próprio da maconha, redundaram com a inicialização dos jovens e culminaram em transtornos mentais associados ao uso das drogas, além da transmissão de doenças, a exemplo da Aids por meio da droga injetável compartilhada.
No que pertine a interferência do STF, tomando para si a competência para decidir sobre a posse e uso pessoal da maconha, a Corte está agindo com imposição ao Poder Legislativo, em prejuízo ao equilíbrio e harmonia entre os poderes da República, de acordo com o preceito do artigo 2º da CF/88, em vista de que as funções são indelegáveis. Destarte, passa a ser uma obrigação dos deputados federais e dos senadores, que foram eleitos pelo povo, para legislar e debater com a sociedade, através de audiências públicas, para perquirir se determinada lei deve ser revogada ou atualizada, uma vez que convivemos em uma República, onde a Democracia é um princípio fundamental, prevista no artigo 1º da CF/88 e bastante cristalina em seu parágrafo único, aludindo que: “Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição”.
Por outro lado, é cediço que o Poder Judiciário é detentor de legitimidade técnica, não lhe competindo decidir sobre questões de cunho político, diante da carência de legitimidade popular que é conferida pelo voto. Ademais disso, é sabido que a instituição ou revogação de tipos penais é uma decisão de natureza eminentemente política e, assim sendo, deve ser decidida pelo povo, por meio de amplo debate entre os seus representantes, que foram legitimamente eleitos.
No pertinente ao tópico relativo a inconstitucionalidade da Lei Antidrogas, em alhures enfocada por meio da ampla jurisprudência pátria, não há como mensurar com relação a avaliação da Lei nº 11.343, de 2006, em prejuízo dos preceitos legais da Lei Maior e das demais leis infraconstitucionais, acima mencionadas, que tratam da mesma matéria. Porquanto, uma lei ordinária aprovada, sem haver passada pelo crivo da sociedade, que não pode sobrepor as demais regras, acima apontadas, tampouco servir de amparo para a promoção de liberalidades, por parte de quaisquer dos poderes da República, salvante o Poder Legislativo.
FONTES DE PESQUISAS
- Constituição Federal de 1988 – Leis Infraconstitucionais - Consultor Jurídico – 26/12/2008 – Priscylla Costa – El Pais – 06/05/2019 - Folha de S. Paulo – 16/09/2020 – Global Drug Polyce Index – 10/11/2021 – UFMG – 10/11/2021 – UNODC – Viena – 27/06/2022 - Consultor Jurídico – 13/09/2022 – Eduardo Velozo Fuccia - Controvérsias a Respeito da Eficácia da Lei Antidrogas – 29/07/2013 – Norberto Coutinho Júnior – STF – 02/08/2023 – Jornal UNESP – 14/08/2023 – STF – Jurisprudência – RE 653,659-SP.