É certo a necessidade de existir o direito penal, para manter a ordem social, proteger os bens jurídicos mais importantes e preservar a liberdade individual diante de um Estado excessivamente interventor. Entretanto, algumas limitações existem tanto no momento da criação da lei quanto no momento de sua aplicação.
Algumas dessas limitações estão previstas em documentos como a Constituição da República de 1988 e nos Códigos Penal e de Processo Penal, porém temos princípios com igual função. Uma dessas previsões de grande importância é a contida no artigo 5°, inciso XLV da Constituição de 1988, ao estatuir que “nenhuma pena passará da pessoa do condenado”.
Em claro acolhimento ao princípio da personalidade ou da intranscendência o constituinte buscou impedir que pessoas não envolvidas com o fato criminoso viessem a ser penalizadas. Isto traz algumas circunstâncias que devem ser consideradas, pois não podemos olhar apenas para a pena aplicada diretamente a pessoa do infrator, mas também seus reflexos.
É o caso, por exemplo, do indivíduo que após praticar crime é condenado a uma prestação pecuniária. Momento no qual o juiz define um valor muito alto, de modo a prejudicar a sobrevivência e o sustento da família do apenado, ferindo frontalmente o princípio da intranscendência. Ora, o magistrado não aplicou de modo escrachado a pena a outrem que não o agressor, porém, por via reflexa, condenou uma família inteira à miséria.
Devendo, portanto, o juiz, num saudável desempenho de sua função, sopesar todas as consequências de sua decisão, de maneira a atender a finalidade da pena e, ainda assim preservar o direito de terceiros à dignidade. Entretanto a disposição constitucional traz como que uma exceção à regra.
Qual seja, a pena pecuniária poderá atingir os bens deixados pelo infrator após sua morte e tidos por herança, porém somente atingirá só e tão somente esses bens, digo, os da herança, não podendo adentrar no patrimônio dos herdeiros. Tudo isto para preservar a dignidade e impedir que um crime produza penas ad aeternum (eternamente).
Portanto, não poderá a pena ser passada para pessoa que não o responsável pelo crime, seja de modo claro, com a incidência direta, seja de modo reflexo, quando os efeitos da pena são tão extensos que atingem aqueles que não deveria atingir. Devemos estar atentos a esta última situação, pois ocorre com mais frequência que imaginamos.
Estando o condenado e seus familiares diante de uma dessas situações, a atitude mais acertada é entrar em contato com um advogado qualificado e que tenha consciência de todas essas circunstâncias. Somente ele terá as melhores orientações, recorrendo aos tribunais, se preciso for, para que seus direitos e de quem você ama sejam preservados.
Publicado originalmente em: https://kawanikcarloss.com.br/meu-familiar-pode-pagar-por-um-crime-que-eu-cometi