A CESSÃO DE DIREITOS HEREDITÁRIOS, sob a égide do Código Civil de 2002 é realizada através de Escritura Pública, em qualquer Cartório de Notas, e permitirá com isso que qualquer pessoa que não seja herdeiro (ou mesmo qualquer dos herdeiros, se essa for a intenção) possa receber um quinhão do acervo hereditário. É bem verdade também que a Cessão pode ou não tratar de bem determinado da herança. As regras são aquelas dispostas no art. 1.793 e seguintes do Código Civil:
"Art. 1.793. O direito à sucessão aberta, bem como o quinhão de que disponha o co-herdeiro, pode ser objeto de cessão por escritura pública.
§ 1º. Os direitos, conferidos ao herdeiro em conseqüência de substituição ou de direito de acrescer, presumem-se não abrangidos pela cessão feita anteriormente.
§ 2º. É ineficaz a cessão, pelo co-herdeiro, de seu direito hereditário sobre qualquer bem da herança considerado singularmente".
Como já falamos outrora, é importante observar que a Cessão de Direitos Hereditários pode ser cogitada apenas no intervalo entre o falecimento do autor da herança e a realização da partilha: é que antes do falecimento não há que se falar em "herança" e muito menos em transacionar suposta herança já que a vedação é clara no art. 426 do mesmo CCB:
"Art. 426. Não pode ser objeto de contrato a herança de pessoa viva".
Doutro turno, também não há que se falar em Cessão de Direitos Hereditários se esses já foram resolvidos com a partilha (art. 1.997 c/c art. 2.023 do CCB).
Quem pode ceder a herança por inteiro pode também ceder PARTE da herança, e também merece destaque o fato de que a Cessão pode ser manejada tanto dentro do INVENTÁRIO JUDICIAL como no INVENTÁRIO EXTRAJUDICIAL e nossa recomendação será sempre que seja feita antes da finalização do Inventário (ainda que possa ser feita, no caso do Extrajudicial, tudo na mesma Escritura Pública). É que por si só a Cessão de Direitos Hereditários pode reclamar a apresentação de determinadas Certidões, verificação de alguns itens que podem gerar exigência e também imposto específico (que pode ser ITBI ou ITCMD, conforme o caso) e, caso haja algum atraso na solução da Cessão certamente a lavratura do Inventário restará comprometida.
A Resolução 35/2007 do CNJ (de leitura obrigatória para quem pretende atuar no Extrajudicial) contempla com acerto a utilização da Cessão de Direitos Hereditários em sede de Inventário Extrajudicial, senão vejamos:
"Art. 16. É possível a promoção de inventário extrajudicial por cessionário de direitos hereditários, mesmo na hipótese de cessão de parte do acervo, desde que todos os herdeiros estejam presentes e concordes".
Sendo feita, portanto, a cessão de parte da herança o comparecimento dos herdeiros/cedentes é necessário já que na ocasião os mesmos recolherão o que ainda lhes cabe. A cessão por inteiro dispensa o comparecimento destes já que nada terão a receber, já tendo transacionado então a totalidade do que lhes poderia caber na sucessão - sendo importante frisar que embora a Escritura de Cessão de Direitos Hereditários (e de MEAÇÃO, quando for o caso) não obrigue a presença de ADVOGADO (como acontece no Inventário) é muito cauteloso e recomendável por parte dos interessados que obtenham assessoria jurídica por parte deste Profissional haja vista os RISCOS DO NEGÓCIO, sendo certo que a Cessão de Direitos Hereditários é um NEGÓCIO ALEATÓRIO que sujeita o adquirente/cessionário inclusive aos riscos de NADA RECEBER considerando a regra do art. 1.997 ("a herança responde pelo pagamento das dívidas do falecido"). A esse respeito lição do clássico jurista CAIO MARIO DA SILVA PEREIRA (Instituições de Direito Civil. 2018) para quem:
"O cessionário recebe a herança no estado em que se acha, correndo portanto os riscos de ser mais ou menos absorvida pelas dívidas. Subordinada às normas disciplinadoras da cessão de crédito, o cedente responde pela existência da herança (veritas nominis). Somente se obriga pelo valor do direito cedido (bonitas nominis) no caso de fazê-lo por expresso. Negócio jurídico aleatório, o cessionário toma sobre si os riscos da quantidade. Não responde, portanto, o cedente se na partilha vierem as coisas a existir em quantidade menor do que a esperada, a não ser que haja ressalva expressa. Dado o seu caráter aleatório, não responde o cedente pela evicção".
POR FIM, decisão do TJSC que ilustra muito bem as consequencias do RISCO possivelmente não bem calculados sobre esse tipo de negócio claramente de risco:
"TJSC. 4015584-69.2018.8.24.0000. J. em: 22/01/2019. AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO SUCESSÓRIO. AÇÃO DE EXECUÇÃO. ÓBITO DO EXECUTADO NO CURSO DA AÇÃO. ESCRITURA PÚBLICA DE INVENTÁRIO E PARTILHA. VIÚVA MEEIRA. DIREITOS HEREDITÁRIOS A ELA CEDIDOS PELAS TRÊS FILHAS (ÚNICAS HERDEIRAS). DECISÃO QUE DETERMINOU O PROSSEGUIMENTO DA EXECUÇÃO APENAS CONTRA AS TRÊS FILHAS DO EXECUTADO (CEDENTES). PEDIDO DE DIRECIONAMENTO DA LIDE À VIÚVA. CABIMENTO. RESPONSABILIDADE DA CESSIONÁRIA. LIMITAÇÃO AO QUINHÃO RECEBIDO DAS CEDENTES. Como é o acervo hereditário que responde pelas dívidas da herança, cabe ao cessionário, que assume o lugar do cedente, responder pelas dívidas do espólio, até limite do quinhão recebido. ALEGAÇÃO DE IMPENHORABILIDADE DOS BENS. QUESTÃO NÃO ABORDADA PELA DECISÃO AGRAVADA. NÃO CONHECIMENTO NO PONTO. RECURSO CONHECIDO EM PARTE E PROVIDO".