Inicialmente, ao analisar a postura de diversas operadoras de plano de saúde, nota-se que se trata de uma queixa cada vez mais frequente por parte dos consumidores, pois essas empresas estão rescindindo contratos de maneira unilateral, alegando meramente a ausência de conveniência da manutenção do contrato e informando que se trata de uma prerrogativa prevista em lei, o que acaba colocando milhares de consumidores em situação extremamente desvantajosa, uma vez que são obrigados a migrarem para outras operadoras e formularem novos contratos, tendo que desembolsar valores muito superiores.
Vale frisar que esse tipo de rescisão almejada pelas administradoras de plano de saúde por não ser acompanhado de qualquer justificativa, causa enorme surpresa nos beneficiários que estão arcando mensalmente com suas obrigações contratuais, como o adimplemento regular da mensalidade.
Ocorre que, os contratos geralmente elencados para promover a rescisão são aqueles onde os beneficiários possuem alguma comorbidade ou estão no meio de um tratamento relevante para sua saúde, o que acaba aumentando ainda mais o sentimento de aflição dos beneficiários. Essa postura por parte da administradora, reflete, em última instância, o seu viés econômico e o seu objetivo de reduzir ao máximo seus gastos, pois rescindindo os contratos mais onerosos, certamente o seu lucro irá aumentar.
Relevante destacar que a relação entre a operadora de plano de saúde e o beneficiário, submete-se as disposições do CDC, nos termos do que dispõe a Súmula nº 469 do Superior Tribunal de Justiça, que dispõe: “Aplica-se o CDC aos contratos de plano de saúde”.
Nesse contexto, as políticas de rescisão unilateral promovidas pelas operadoras são orientadas pelas disposições do CDC, o que, invariavelmente, aumenta o grau de proteção do beneficiários, conforme será visto a seguir.
Quando a operadora do plano de saúde poderá rescindir unilateralmente planos individuais/familiares?
No caso de plano de saúde individual, a própria Lei nº 9.656/98 (Lei dos planos de saúde) reservou um tratamento mais restritivo para eventual rescisão, uma vez que os contratantes, nessa espécie de plano, encontram-se em uma posição desfavorável frente a operadora do plano.
Nesse sentido, O art. 13, parágrafo único, II, da Lei 9.656/98 dispõe que os contratos de plano de saúde individuais ou familiares terão vigência mínima de um ano, proibindo a suspensão ou a rescisão unilateral do contrato, salvo por fraude ou não-pagamento da mensalidade por período superior a sessenta dias, consecutivos ou não, nos últimos doze meses de vigência do contrato, desde que o consumidor seja comprovadamente notificado até o quinquagésimo dia de inadimplência.
Desse modo, o parágrafo único do art. 13 da Lei nº 9.656/98 proíbe a rescisão unilateral imotivada do plano privado de assistência à saúde individual ou familiar por iniciativa da operadora, admitindo, nessa modalidade de contrato, apenas a rescisão justificada, com base em fraude ou inadimplência, o que deve ser previamente comunicado ao consumidor.
Quando a operadora do plano de saúde poderá rescindir unilateralmente o plano coletivo?
Conforme preceitua o parágrafo único do art. 13 da Lei nº 9.656/98, em se tratando de contrato de plano de saúde coletivo, a operadora pode fazer a rescisão unilateral e imotivada do contrato coletivo, desde que cumpridos os seguintes requisitos:
o contrato contenha cláusula expressa prevendo a possibilidade de rescisão unilateral;
o contrato esteja em vigência por período de pelo menos 12 meses; e
haja a prévia notificação da rescisão com antecedência mínima de 60 dias.
Esses requisitos estão previstos no art. 17 da Resolução Normativa DC/ANS nº 195/2009.
Desse modo, é possível a resilição unilateral do contrato coletivo de saúde, uma vez que a norma inserta no art. 13, II, b, parágrafo único, da Lei 9.656/98 aplica-se exclusivamente a contratos individuais ou familiares.
Não obstante essa previsão, o entendimento jurisprudencial consolidado no âmbito do STJ é no sentido de que tais requisitos somente são aplicados para possibilitar a rescisão unilateral quando se tratar de plano de saúde coletivo com quantidade igual ou superior a 30 (trinta) usuários, ou seja, em se tratando de plano de saúde com quantidade de usuários inferior a esta, a rescisão unilateral do contrato somente poderia se dar em caso de fraude ou inadimplência, nos moldes do disposto no art. 13, inciso II, da Lei nº 9.656/98.
A operadora do plano de saúde poderá rescindir unilateralmente o plano coletivo contratado para menos de 30 usuários?
Como pontuado acima, a previsão legislativa que prevê a possibilidade de rescisão unilateral na modalidade de plano coletivo, limita-se aos planos de saúde coletivos com quantidade igual ou superior a 30 (trinta) usuários.
Essa diferença se deve pelo fato de que os planos de saúde contratados para menos de 30 (trinta) usuários assemelham-se a planos individuais ou familiares, o que impõe a incidência do CDC, a fim de obrigar a operadora a apresentar uma justificativa idônea para validar a rescisão unilateral. Nesse sentido:
PROCESSUAL CIVIL. CONTRATOS. AGRAVO INTERNO NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO INTERNO NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO RECURSO ESPECIAL. PLANO DE SAÚDE COLETIVO COM APENAS 4 (QUATRO) BENEFICIÁRIOS. RECURSO ESPECIAL EM CONFRONTO COM JURISPRUDÊNCIA DESTA CORTE. DECISÃO MANTIDA.
1. "Inquestionável a vulnerabilidade dos planos coletivos com quantidade inferior a 30 (trinta) beneficiários, cujos estipulantes possuem pouco poder de negociação diante da operadora, sendo maior o ônus de mudança para outra empresa caso as condições oferecidas não sejam satisfatórias. Não se pode transmudar o contrato coletivo empresarial com poucos beneficiários para plano familiar a fim de se aplicar a vedação do art. 13, parágrafo único, II, da Lei n. 9.656/1998, porém, a rescisão deve ser devidamente motivada, incidindo a legislação consumerista" (EREsp 1.692.594/SP, Relator Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 12/2/2020, DJe 19/2/2020).
2. Agravo interno a que se nega provimento.
(AgInt nos EDcl no AgInt nos EDcl no REsp n. 1.789.569/SP, relator Ministro Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, julgado em 24/8/2020, DJe de 28/8/2020). Grifei.
(...) O art. 13, parágrafo único, II, da Lei nº 9.656/98, que veda a resilição unilateral dos contratos de plano de saúde, não se aplica às modalidades coletivas, tendo incidência apenas nas espécies individuais ou familiares.
No entanto, no caso de planos coletivos empresariais com menos de trinta usuários, em vista da vulnerabilidade da empresa estipulante, dotada de escasso poder de barganha, não se admite a simples rescisão unilateral pela operadora de plano de saúde, havendo necessidade de motivação idônea.
STJ. 4ª Turma. REsp 1.776.047-SP, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, julgado em 23/04/2019 (Info 646). Grifei.
Assim, diante do entendimento exarado nas jurisprudências colacionadas acima, de rigor concluir que a rescisão unilateral é vedada para a modalidade de planos de saúde coletivos contratados para menos de 30 usuários, uma vez que aplicável as mesmas disposições acima mencionadas para contratos individuais e familiares que vedam essa modalidade de rescisão (art. 13, parágrafo único, II, da Lei 9.656/1998).
A operadora do plano de saúde poderá rescindir unilateralmente o plano coletivo para mais de 30 usuários, caso haja algum tratamento em curso?
Não. Outra exceção construída pela jurisprudência, onde não será possível a resilição unilateral, será nos casos em que esteja em curso tratamento médico que assegure a sobrevivência ou a preservação da incolumidade física e/ou psíquica do beneficiário, devendo ser assegurada a continuidade dos cuidados assistenciais prescritos a usuário internado ou em pleno tratamento médico garantidor de sua sobrevivência ou de sua incolumidade física, até a efetiva alta, desde que o titular arque integralmente com a contraprestação devida.
Isso coloca uma pá de cal no intuito da administradora de aumentar seu lucro rescindindo os contratos mais onerosos, pois são justamente os casos em que existem tratamentos médicos em curso onde a rescisão unilateral, mesmo em se tratando de plano coletivo, não poderá ser efetivada.
Em caso de rescisão unilateral, o beneficiário pode migrar de plano aproveitando as carências?
Quando houver o cancelamento do plano privado coletivo de assistência à saúde, deverá ser permitida aos usuários a migração para planos individuais ou familiares, observada a compatibilidade da cobertura assistencial e a portabilidade de carências, desde que a operadora comercialize tal modalidade de contrato e o consumidor opte por se submeter às regras e aos encargos peculiares da avença.
Por outro lado, a operadora de plano de saúde não pode ser obrigada a oferecer plano individual a usuário de plano coletivo extinto se ela não disponibiliza no mercado tal tipo de plano. Não é ilegal a recusa de operadoras de planos de saúde de comercializarem planos individuais por atuarem apenas no segmento de planos coletivos. Com efeito, não há norma alguma que as obrigue a atuar em determinado ramo de plano de saúde.
Contudo, os beneficiários de plano de saúde coletivo, após a resilição unilateral do contrato pela operadora, têm direito à portabilidade de carências ao contratar novo plano observado o prazo de permanência no anterior, sem o cumprimento de novos períodos de carência ou de cobertura parcial temporária e sem custo adicional pelo exercício do direito.
Em tal hipótese, caberá à operadora — que rescindiu unilateralmente o plano coletivo e que não comercializa plano individual — comunicar diretamente aos usuários sobre o direito ao exercício da portabilidade, "indicando o valor da mensalidade do plano de origem, discriminado por beneficiário", assim como o início e o fim da contagem do prazo de 60 dias (art. 8º, § 1º, da Resolução Normativa DC/ANS n. 438/2018)
O que fazer se a operadora do plano de saúde me notificar acerca da rescisão unilateral? Quais medidas adotar?
Com base em todo o exposto, caso a operadora de plano de saúde notifique você sobre a rescisão unilateral do contrato, é importante considerar as seguintes medidas a serem adotadas:
Verifique a legalidade da rescisão: Primeiro, confirme se a operadora está agindo de acordo com as leis e regulamentos aplicáveis. Para planos individuais, a rescisão unilateral só é permitida em casos de fraude ou não pagamento das mensalidades por período superior a sessenta dias, conforme estabelecido na Lei nº 9.656/98. Para planos coletivos, a rescisão é permitida apenas se houver uma cláusula no contrato que permita a rescisão unilateral, e esta deve ser notificada com antecedência mínima de 60 dias.
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Consulte um advogado: Se você acredita que a rescisão é injusta ou ilegal, é aconselhável consultar um advogado especializado em direito do consumidor ou direito da saúde. Um advogado poderá analisar a situação e orientá-lo sobre os próximos passos legais a serem tomados.
Mantenha todos os registros: Guarde todos os documentos relacionados ao seu contrato de plano de saúde, notificação de rescisão, correspondências e comprovantes de pagamento. Esses registros podem ser cruciais se você decidir contestar a rescisão.
Explore a portabilidade de carências: Se a operadora rescindir o contrato, você pode ter direito à portabilidade de carências ao contratar um novo plano de saúde individual ou familiar, desde que atenda aos requisitos estabelecidos pelas regulamentações. Isso pode ajudar a garantir a continuidade da cobertura médica com o mínimo de interrupção.
Busque a reparação por danos morais: Caso a rescisão unilateral cause a você aflição psicológica significativa, você pode considerar buscar reparação por danos morais. Para isso, é importante consultar um advogado para avaliar a viabilidade de uma ação legal nesse sentido.
Lembre-se de que quanto antes você agir, maiores serão as chances de reverter a situação, portanto, é importante buscar orientação jurídica específica para o seu caso.
Referências:
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MARANHÃO PEIXOTO, David Vinicius do Nascimento. Direitos dos pacientes autistas: plano de saúde e documento necessário. Disponível em: https://www.migalhas.com.br/depeso/391648/direitos-dos-pacientes-autistas-plano-de-saude-e-documento-necessario. Acesso em: 01/11/2023.
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MARANHÃO PEIXOTO, David Vinicius do Nascimento. Planos de saúde são obrigados a aceitar a inscrição de recém-nascidos. Disponível em: https://www.migalhas.com.br/depeso/395371/planos-de-saude-sao-obrigados-a-aceitar-a-inscricao-de-recem-nascidos. Acesso em: 01/11/2023.
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