Símbolo do Jus.com.br Jus.com.br

Obrigatoriedade do Plano de Saúde em Custear o Procedimento de Criopreservação de Óvulos como Medida Preventiva à Infertilidade

O presente artigo aborda a obrigação dos planos de saúde em cobrir a criopreservação de óvulos em casos de condições médicas que afetam a fertilidade, como tratamentos de quimioterapia. Isso se baseia no princípio médico "primum, non nocere" (primeiro, não prejudicar) e é respaldado pela Lei nº 9.656/98, que define assistência à saúde como prevenção de doenças.

A criopreservação de óvulos, também conhecida como vitrificação de óvulos, é um procedimento médico que envolve a coleta, o congelamento e o armazenamento de óvulos de uma mulher em idade fértil para uso futuro. Essa técnica é frequentemente utilizada como uma medida preventiva à infertilidade e oferece a oportunidade de preservar a capacidade reprodutiva para o futuro.

Existem várias razões pelas quais uma pessoa pode optar por realizar a criopreservação de óvulos, incluindo:

  1. Motivos Médicos: Mulheres que enfrentam tratamentos médicos agressivos, como quimioterapia ou radioterapia, que podem afetar a fertilidade, podem optar por preservar seus óvulos antes do tratamento.

  2. Adiamento da Maternidade: Algumas mulheres escolhem adiar a gravidez por motivos pessoais ou profissionais, mas desejam manter a opção de ter filhos no futuro. A criopreservação de óvulos oferece flexibilidade nesse sentido.

  3. Condições de Saúde: Mulheres com condições médicas que podem afetar a fertilidade, como endometriose ou síndrome dos ovários policísticos, podem optar por preservar seus óvulos como precaução.

  4. Envelhecimento: A fertilidade feminina diminui com a idade, e muitas mulheres escolhem congelar óvulos quando são mais jovens para aumentar as chances de ter uma gravidez saudável mais tarde na vida.

O procedimento de criopreservação envolve estimulação ovariana para produzir múltiplos óvulos, coleta dos óvulos maduros e congelamento por meio da técnica de vitrificação. Os óvulos congelados podem ser armazenados por vários anos, e quando a mulher decide engravidar, eles são descongelados, fertilizados por meio da fertilização in vitro (FIV) e os embriões resultantes são implantados no útero.

A criopreservação de óvulos é uma opção importante para mulheres que desejam planejar sua família, mas têm preocupações com a fertilidade devido a tratamentos médicos ou ao envelhecimento. É uma medida preventiva que oferece esperança e oportunidades para realizar o sonho da maternidade quando o momento for mais apropriado.

O plano de saúde será obrigado a custear a criopreservação de óvulos?

Segundo o entendimento do STJ – Superior Tribunal de Justiça – os planos de saúde serão obrigados a custear o procedimento de criopreservação de óvulos como medida preventiva à infertilidade, quando presente condições médicas que podem afetar a fertilidade, especialmente em casos de pacientes em tratamento contra o câncer.

Ao analisar a questão ficou estabelecida uma distinção entre o tratamento da infertilidade e a prevenção da infertilidade como efeito adverso do tratamento prescrito ao paciente.

De acordo com a jurisprudência, o tratamento da infertilidade não é de cobertura obrigatória pelos planos de saúde. No entanto, quando se trata da prevenção da infertilidade como efeito adverso do tratamento, o plano de saúde pode ser obrigado a custear o procedimento de criopreservação de óvulos.

O princípio médico "primum, non nocere" (primeiro, não prejudicar) foi invocado para embasar essa obrigação de cobertura por parte dos planos de saúde. Esse princípio estabelece que o objetivo de todo tratamento médico é não causar mal ao paciente. Assim, quando o tratamento prescrito para o câncer de mama ou qualquer outra doença pode ocasionar a falência ovariana e, consequentemente, a infertilidade, a cobertura da criopreservação dos óvulos é considerada uma medida preventiva para atenuar os efeitos colaterais previsíveis e evitáveis da quimioterapia.

O art. 35-F da Lei nº 9.656/98, que dispõe sobre os planos e seguros privados de assistência à saúde, também respalda a obrigação de cobertura dos planos de saúde. Esse artigo estabelece que a assistência à saúde compreende todas as ações necessárias à prevenção da doença e à recuperação, manutenção e reabilitação da saúde, observados os termos da lei e do contrato firmado entre as partes.

Assine a nossa newsletter! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos

Dessa forma, a cobertura da criopreservação de óvulos como medida preventiva à infertilidade está inserida no escopo da assistência à saúde.

O que fazer caso o plano de saúde se recuse a custear a criopreservação de óvulos como medida preventiva à infertilidade nos casos acima citados?

Diante da negativa do plano de saúde em cobrir o procedimento de criopreservação de óvulos como medida preventiva à infertilidade, você pode tomar as seguintes medidas:

  1. Consultar um Advogado Especializado: Procure um advogado especializado em direito à saúde ou direitos do consumidor para avaliar o seu caso e orientá-lo sobre os próximos passos legais.

  2. Revisar o Contrato: Analise o seu contrato de plano de saúde para verificar se o procedimento de criopreservação de óvulos está explicitamente excluído da cobertura ou se existem cláusulas que justifiquem a negativa. Isso pode ser útil para embasar sua argumentação.

  3. Reunir Documentação: Colete toda a documentação médica que respalde a necessidade da criopreservação de óvulos, incluindo laudos, prescrições médicas e relatórios que demonstrem a relação entre a condição de saúde e a necessidade do procedimento.

  4. Negociação com a Operadora: Tente negociar com a operadora do plano de saúde por meio de recursos internos, como a ouvidoria. Apresente toda a documentação e argumentos que justifiquem a necessidade do procedimento.

  5. Procedimentos Judiciais: Caso as negociações internas não tenham sucesso, você pode ingressar com uma ação judicial para garantir a cobertura do procedimento. Se seu caso se encaixar nas condições previamente mencionadas (como a prevenção de infertilidade como efeito adverso de tratamento), a jurisprudência e a legislação podem estar ao seu favor.

  6. Recorrer a Órgãos Reguladores: Você também pode registrar uma reclamação junto à Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), que regula os planos de saúde no Brasil. A ANS pode mediar a situação e oferecer orientações.

Lembre-se de que a ação legal pode ser adotada com celeridade e pleiteada em caráter liminar, a fim de obter a cobertura do procedimento de criopreservação de óvulos antes do início do tratamento para o câncer, o qual, como se sabe, não espera.

Conclusão

Ante o exposto, com base na jurisprudência atual e na legislação vigente, podemos concluir que os planos de saúde são obrigados a custear o procedimento de criopreservação de óvulos como medida preventiva à infertilidade, quando essa infertilidade é um efeito adverso previsível e evitável do tratamento prescrito ao paciente, como é o caso da quimioterapia para o câncer de mama.

Essa obrigação decorre do princípio médico "primum, non nocere", que busca evitar danos desnecessários e proporcionar a plena reabilitação da beneficiária ao final do tratamento. Além disso, o art. 35-F da Lei nº 9.656/98 respalda a cobertura da criopreservação como parte da assistência à saúde.

É importante ressaltar que essa obrigação de cobertura se estende até a alta do tratamento de quimioterapia prescrito para o câncer de mama. Após esse período, a beneficiária poderá arcar com os eventuais custos da reprodução assistida, uma vez que essa etapa não está incluída na cobertura do plano de saúde.

Portanto, diante dessas considerações, é fundamental que as pacientes em tratamento contra o câncer de mama tenham acesso ao procedimento de criopreservação de óvulos como medida preventiva à infertilidade, garantindo assim a possibilidade de realizarem o sonho da maternidade no futuro, mesmo após o tratamento oncológico.

Referências:

  1. .....

  2. MARANHÃO PEIXOTO, David Vinicius do Nascimento. Obrigação dos planos de saúde de custear cuidados a crianças autistas. Disponível em: https://www.migalhas.com.br/depeso/390770/obrigacao-dos-planos-de-saude-de-custear-cuidados-a-criancas-autistas. Acesso em: 01/11/2023.

  3. MARANHÃO PEIXOTO, David Vinicius do Nascimento. Direitos dos pacientes autistas: plano de saúde e documento necessário. Disponível em: https://www.migalhas.com.br/depeso/391648/direitos-dos-pacientes-autistas-plano-de-saude-e-documento-necessario. Acesso em: 01/11/2023.

  4. MARANHÃO PEIXOTO, David Vinicius do Nascimento. Ampla cobertura de tratamento multidisciplinar para autismo. Disponível em: https://www.migalhas.com.br/depeso/392528/ampla-cobertura-de-tratamento-multidisciplinar-para-autismo. Acesso em: 01/11/2023.

  5. MARANHÃO PEIXOTO, David Vinicius do Nascimento. Planos de saúde são obrigados a aceitar a inscrição de recém-nascidos. Disponível em: https://www.migalhas.com.br/depeso/395371/planos-de-saude-sao-obrigados-a-aceitar-a-inscricao-de-recem-nascidos. Acesso em: 01/11/2023.

  6. MARANHÃO PEIXOTO, David Vinicius do Nascimento. Plano de saúde cancelado de forma unilateral e sem justificativa. Disponível em: https://www.migalhas.com.br/depeso/393300/plano-de-saude-cancelado-de-forma-unilateral-e-sem-justificativa. Acesso em: 01/11/2023.

  7. .......

  8. ......

  9. BRASIL. Reclame Aqui. Amil. Negativa do tratamento do congelamento de óvulos em caso de quimioterapia. Disponível em: https://www.reclameaqui.com.br/amil/negativa-do-tratamento-do-congelamento-de-ovulos-em-caso-de-quimioterapia_d9JSHo8SZZDKhrHY/. Acesso em 01 de novembro de 2023.

  10. BRASIL. Reclame Aqui. Fertipraxis Centro de Reprodução Humana. Congelamento de óvulos e fertilização in vitro: erros, culpa e ganância da clínica. Disponível em: https://www.reclameaqui.com.br/fertipraxis-centro-de-reproducao-humana/congelamento-de-ovulos-e-fertilizacao-in-vitro-erros-culpa-e-ganancia-da_0gBZjc-WMrpJ23Jp/. Acesso em 01 de novembro de 2023.

Sobre o autor
David Vinicius do Nascimento Maranhão Peixoto

Advogado. Sócio do Escritório Nascimento & Peixoto Advogados Associados. Bacharel em Direito e pós-graduado em Ciências Criminais. Atualmente cursando extensão em Processo Administrativo e bacharelado em Ciências Econômicas. Membro da Comissão de Ciências Criminais na Ordem dos Advogados do Distrito Federal. Começou sua atuação no mundo jurídico junto às Defensorias Públicas da União e do Distrito Federal, atuando nos ramos do direito penal, penal militar e direito civil e família. Atuou como assessor jurídico junto ao Núcleo de Atendimento de Brasília da Defensoria Pública do Distrito Federal. Além disso, tem notória atuação em casos que envolvem fraudes bancárias e também no combate a golpes aplicados no mercado financeiro. Advogado atuante em fraudes bancárias, telefone e WhatsApp (61) 99426-7511.  nascimentopeixotoadvogados@gmail.com

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!